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16 de Janeiro: martírio do franciscano S. Berardo e seus companheiros

Written By Beraká - o blog da família on segunda-feira, 16 de janeiro de 2023 | 10:57

 


 

 

"Senhor, a quem iremos? Só Tu tens palavras de vida eterna" ( João 6, 68)

 

 

 

Em 1219, S. Francisco de Assis enviou em missão para Marrocos seis dos seus mais destemidos frades menores, apaixonados do Evangelho, precursores de todos os missionários portugueses, lançados ao mar tenebroso e à conquista dos povos para Cristo obedecendo ao mandato do Infante de Assis em serviço do Rei dos reis, Jesus Cristo. E lá foram os obedientes frades de origem italiana: Vital, Berardo, Otão (sacerdotes), Pedro (Diácono), Acúrsio e Adjuto (Leigos). Foram recebidos em Coimbra pela rainha D. Urraca, mulher de Afonso II que então reinava em Portugal. Continuaram para Alenquer onde se apresentaram à infanta D. Sancha, filha de D. Sancho primeiro e irmã do rei D. Afonso II, fundadora do primeiro convento franciscano em Portugal. Seguiram viagem e depois de passarem em Lisboa, chegaram a Sevilha. Aí ficaram uma semana, finda a qual foram à mesquita, precisamente no dia em que os mouros festejavam Maomé e começaram a pregar a doutrina de Jesus e denunciando que o profeta Maomé não passava de uma idolatria. Corridos à pancada para fora da mesquita, passaram a Marrocos, onde começam a percorrer as ruas pregando o nome de Jesus e, quando vêem aproximar-se o Miramolim Aboidil, com mais ânimo continuaram a proclamar a mensagem cristã. O Miramolim mandou-os prender e ficaram numas masmorras vinte dias sem comer nem beber. Uma vez libertos, apressaram-se em retomar a sua missão. Decretada mais uma vez a sua morte, o Sultão encarrega o seu filho Abosaide de os prender e decapitar. É chegado então, e definitivamente o momento tão desejado por estes frades, finalmente o martírio pelo nome de Jesus iria por fim acontecer. Foi realmente uma morte violenta a destes cinco frades. São açoitados e, atados de mãos e pés, arrastam-nos de um lado para o outro com cavalos e em seguida, sobre seus corpos descarnados deixam cair azeite a ferver, continuando depois a arrastá-los pelo chão mas desta vez sobre vidros e cacos espalhados pelo chão. O Miramolim ainda os tentou com dinheiro e mulheres. Mas não havia nada a fazer e o Miramolim dizia então que só a espada poderia calar aqueles homens decididos e firmes no que diziam. “O nossos corpos miseráveis estão nas tuas mãos sob a tua autoridade, mas as nossas almas estão nas mãos de Deus. Com a sua ira no limite, o Miramolim pegou na sua cimitarra a acabou com a vida daqueles cinco frades, rachando-lhes o crânio ao meio e depois decepando-lhes as cabeças. Era o ano de 1220. Cedo acabou a tarefa missionária daqueles cinco frades, mas a sua voz continua a ecoar por toda a terra e a sua mensagem até aos confins do mundo. Os Mártires de Marrocos foram canonizados pelo Papa Sisto IV em 1481.


 

 



São Francisco e o Sultão DO EGITO









Por Frei Almir Guimarães

 



Há oitocentos anos, São Francisco dirigiu-se ao Egito (1219-2019) realizando o sonho de ir ao encontro dos muçulmanos. Na ocasião teve uma “audiência” especial com o Sultão. O Ministro Geral da OFM, Michael Anthony Perry, em Carta de 7 de janeiro de 2019, escreve: “O aniversário do encontro de Francisco com Al-Malik Al-Kamil, em Damieta de 1219, nos convida a perguntarmo-nos de novo quais ações e palavras que agradariam a Deus no meio do pluralismo e da complexidade do mundo de hoje”. André Vauchez, renomado historiador francês, autor de muitas obras em torno da história medieval, escreveu uma alentada biografia de São Francisco (François d’Assise. Entre histoire et mémoire, Fayard, Paris,2009). Nossa intenção é apresentar aqui quase uma tradução do capítulo sobre o encontro de Francisco com o Sultão (Sortir d’Italie et rencontrer l’Islam (1217-1220) p. 135-154).





I. Precedentes da viagem






O estado da Ordem e o espírito de Francisco





Por ocasião do Capítulo Geral da Fraternidade de Francisco de Assis que se reuniu na Porciúncula, na solenidade de Pentecostes, em maio de 1217, foram tomadas duas decisões particularmente importantes: a criação de províncias à frente das quais seriam colocados ministros e o envio, para fora da Itália, de alguns grupos de frades que se dirigiriam uns para a Terra Santa e outros para a Inglaterra, Alemanha e Hungria. A Fraternidade tomava assim importante decisão: os frades foram tomando consciência de que sua vocação tinha um cunho universal. No começo nem tudo foi bem-sucedido. Houve mesmo fracassos em várias das missões, salvo a da Inglaterra. Mesmo tendo partido cheios de entusiasmo, os frades enfrentaram sérias dificuldades. Antes de tudo, não conheciam a língua, o que dificultava a comunicação. Não dispunham de texto papal a respaldar a missão fora da Itália, o que suscitava certamente desconfiança nos países aos quais se haviam dirigido. Na Alemanha foram considerados hereges e até mesmo perseguidos. Francisco não conseguia aceitar a ideia que, devendo ser o modelo para seus irmãos, permanecesse na Itália onde não corria risco algum. Resolveu dirigir-se à França, na realidade, para a parte norte do país. O Poverello sentia-se atraído por este país, antes de tudo pelo fato de conhecer a língua, mas sobretudo porque a França tinha em alta estima a Eucaristia. Francisco teria querido morrer ali devido o respeito que lá se prestava ao Corpo de Cristo. A princípio tal motivação pode parecer estranha. Ela se explica, no entanto, devido a sua piedade eucarística particularmente intensa e ao lugar que ela ocupava nas regiões ao norte dos Alpes na devoção dos fiéis.Desde o final do século XII, o bispo de Paris, Maurice de Sully, prescrevera a genuflexão diante da hóstia consagrada e nas regiões setentrionais – Artois, Flandres e Brabante – as beguinas, como Maria de Oignies (+ 1213), como também Ida de Nivelles (+1231) levavam intensa vida espiritual, centrada na humanidade de Cristo e sua presença “real” nas espécies do pão e do vinho.Francisco partiu para a França após o Capítulo Geral de 1217 sem, no entanto, concluir a viagem. Em Florença encontrou o cardeal Hugolino, que desaconselhou seu intento, e segundo certas fontes, o proibiu de continuar a viagem. Francisco acedeu a esta ordem e voltou para Assis. Um pequeno grupo de frades ganhou Paris, sob a direção de Frei Pacífico, que deveria ser o primeiro ministro da nova província da França.Houve este encontro com o cardeal Hugolino. Não há dúvidas quanto à historicidade do fato. Seu alcance, porém, é difícil de ser avaliado. As versões de que dispomos a respeito do assunto divergem. O que se pode dizer que, se não foi o primeiro encontro de Francisco com o cardeal, certamente foi a conversa mais aprofundada entre Francisco e o cardeal-bispo de Óstia, um dos membros mais influentes do Sacro Colégio que, posteriormente, deveria assumir papel importante na vida de Francisco e dos frades menores. Em 1217, Hugolino ainda não tinha nenhuma responsabilidade institucional para com a Fraternidade de Francisco e não há razão para se crer que já tivesse sucedido ao cardeal beneditino João de São Paulo que havia morrido em 1214 ou 1215 e que tinha tido um encontro caloroso com Francisco por ocasião de sua viagem a Roma anos antes. Depois, Hugolino seria o cardeal protetor.Hugolino acabava de realizar missão de pacificação nas cidades da Itália central e setentrional. Buscava fazer com que os habitantes dessas regiões se reconciliassem sob a égide da Santa Sé e que contribuíssem para as despesas ocasionadas pela Cruzada que estava para se realizar. Desde que começou a fazer parte do Sacro Colégio, Hugolino foi incumbido, por Inocêncio III, de delicadas tarefas de modo particular da relação com o Império. Hugolino não era um mero diplomata. Mesmo não podendo ser equiparado a Francisco, era um homem profundamente religioso, que não hesitava em buscar conselhos junto a um mestre espiritual cisterciense, Rainier de Ponza que tinha sido discípulo de Joaquim de Fiore.O encontro de Hugolino com Francisco não se reduziu, contrariamente ao que imaginou Paul Sabatier em sua famosa Vie de Saint François, publicada em 1893-94, a um confronto com um prelado autoritário, encarregado de transformar a Fraternidade franciscana em Ordem religiosa, sujeita à Igreja romana e um homem simples e evangélico que queria guardar a espontaneidade simples e o frescor do movimento que ele havia lançado. A interpretação mais digna de crédito é a que fornece a Legenda Perusina, segundo a qual Hugolino deu a Francisco um conselho e que ele, na verdade, não observou: não deixar a Itália antes que sua fundação tivesse solidez. Naquele momento a dificuldade tinha origem na Cúria romana e nos bispos, que no Concilio do Latrão IV, redigiram a aprovaram um cânon relativo às Ordens novas que dizia: “Proibimos no futuro a criação de qualquer Ordem nova… Quem quiser seguir o caminho da vida religiosa deverá escolher uma das Ordens já aprovadas. Francisco, naquele momento, nada mais dispunha do que uma aprovação oral de sua Fraternidade como Ordem feita pelo Papa. Não tinha nem regra nem privilégios. Recentemente levantou-se a hipótese de que Honório III tenha aprovado em 1216 ou 1219 uma regra pequena, diferente do texto que Inocêncio III havia aprovado oralmente em 1209 para que os Menores não fossem atingidos pela decisão conciliar. Nada mais incerto já que documento algum aluda a esta hipótese. Fato é que não seria conveniente que Francisco, em tais circunstâncias, deixasse a Itália.Durante esses momentos de diálogo, sem dúvida, difíceis, Francisco teria dito a Hugolino: “Julgais vós, Senhor, que Deus tenha enviado os frades apenas a estas terras (da Itália)? A verdade é que o Senhor escolheu e enviou os frades para proveito e salvação de todos os homens do mundo inteiro; não só as terras dos crentes os hão de receber, como também as dos infiéis. Observem eles o que prometeram a Deus, e Deus lhes ministrará o necessário, seja em terra de infiéis, seja em terra de crentes” (Legenda Perusina, n.82).Desta maneira, no momento em que sobrevivência de sua fundação podia estar correndo risco, o Pobre de Assis afirmava clara e publicamente seu caráter universal e sua vocação de deixar as fronteiras da cristandade. Francisco é, com efeito, o primeiro santo da Idade Média a buscar contato com o mundo muçulmano e o ter conseguido. Segundo Tomás de Celano, seu primeiro biógrafo, havia ele planejado desde 1212 dirigir-se a Síria, para pregar a penitência aos sarracenos e outros infiéis. O navio em que tinha embarcado, em Ancona, no entanto, foi presa de uma tempestade e precisou fazer o caminho de volta. Foi o ano em que grupos de jovens, chamados “Pastoraux” partiram em grande número da França e da Alemanha com destino a Terra Santa, por vezes atravessando a Itália central. Talvez a tentativa de Francisco tenha se inserido nesse contexto. Há o registro de uma viagem de Francisco ao Marrocos tendo como escopo pregar a palavra de Cristo ao emir al-Mumenin que reinava em Marrakesh. O santo, no entanto, na Espanha, ficara doente e foi obrigado a voltar para a Itália.Por ocasião do Capitulo de 1217 não havia Francisco concebido ambicioso projeto de apostolado missionário para além do mundo cristão? Não enviara ele vários grupos de frades a diversos países da Europa, mas também Frei Gil a Tunis e frei Elias para a Palestina com alguns companheiros?

 




O sonho de Francisco se realiza





Continuamos a transcrever, em tradução e adaptação, as reflexões de André Vauchez, a respeito da estadia de Francisco nas terras muçulmanas e junto ao Sultão, em sua obra “François d’Assise”, Fayard, Paris, p. 135-154. 






Em 1219, finalmente Francisco consegue realizar seu sonho: partindo de Ancona no mês de junho com Pedro Cattani aporta em São João d’Acre onde encontra Frei Elias e seus companheiros que Já se encontravam lá. A partir daí, fim de julho ou começo de agosto, chega a Damieta, porto importante, situado no delta do Nilo que estava ocupado pelas tropas dos cruzados. No dia 12 de abril, com efeito, Inocêncio III, edita a bula Quia maior por meio da qual convidava os prelados da Igreja a se reunirem em Concílio em Roma. No ano de 1215, havia lançado forte apelo aos cristãos do Ocidente pela Cruzada. Depois de ter traçado um perfil bastante sombrio do fundador do Islã, anunciava a derrota definitiva e última dos sarracenos:Um filho da perdição, o pseudo-profeta Maomé se levantou. Por meio de incitações terrestres e prazeres carnais, fez com que muitos se desviassem da verdade. Sua perfídia durou até nossos dias. Temos fé em Deus de que o fim da Besta está próximo. O número (da Besta) segundo o Apocalipse de João, é 666 sendo que já se transcorreram certa de seiscentos anos (citação do autor Tolan). A iniciativa da nova Cruzada – a quinta segundo a lista tradicional – deve-se ao sucesso da grande vitória dos reis de Castela e Aragão expulsando de suas terras os adversários muçulmanos do sul da Espanha, com exceção da parte extrema que iria se constituir no reino de Granada. Diante do clima de exaltação e de euforia, criado por este sucesso, o Papa, sem dúvida, teve a impressão que era o momento de dar o golpe mortal e decisivo. Tomou, então, todas as providências para que o empreendimento fosse bem sucedido: organização de uma Cruzada para reconquistar Jerusalém tomada dos cristãos por Saladino em 1187; restrições legais atingindo os muçulmanos e judeus vivendo em terra cristã para melhor distingui-los dos fiéis e colocar este últimos ao abrigo de sua influência; estrita limitação de relacionamentos, a começar pelo campo sexual, com os “blasfemadores de Cristo”, etc. Parte desse programa foi implementada por ocasião do Concilio do Latrão IV, em particular por meio do cânon Ad liberandum que previa uma mobilização de três anos, acompanhada de uma trégua de Deus colocando fim às guerras no interior da cristandade, tudo para preparar a nova Cruzada e que ela tivesse êxito. A Igreja convocou todos os cristãos em idade de portar armas a participarem da Cruzada em razão da fidelidade que deviam ao Cristo humilhado e ultrajado pela perda da Terra Santa. Depois da morte de Inocêncio III este projeto foi retomado por seu sucessor Honório III (1216-1227) e um frota transportando alguns milhares de cruzados deixou a Itália rumo ao Egito, na primavera de 1218. A finalidade prevista para a expedição era tomada de Damieta, principal porto de escoamento econômico do Egito no Mediterrâneo. As tropas desembarcaram na cidade a 29 de maio, quando o sultão “ayyûbide” Al-Malik Al-Kamil (o rei perfeito), sobrinho de Saladino, acabava de suceder seu pai Al-Adil. A tomada da cidade, feita sem as previsões e medidas necessárias, não se concluía. Os combates se arrastavam. O novo Sultão, por sua vez, inexperiente, não soube aproveitar a falta de habilidade dos Cruzados. Os participantes da Cruzada ignoravam tudo a respeito do país e viviam se desgastando em vãs querelas, de modo particular depois da chegada de um legado pontifício, o cardeal espanhol Pelágio que interferia em tudo, semeando a cizânia no campo cristão. É nesse contexto que se situa a chegada de Francisco de Assis em Damieta, ao longo do verão de 1019. Sua presença nesse lugar, durante vários meses e sua tentativa de converter o Sultão à fé cristã são fatos solidamente atestados. Todos os hagiógrafos, desde Tomás de Celano que escreveu sua Vida em 1228-1229, pouco depois de sua morte, até Boaventura de Bagnoregio, autor, no começo dos anos 1260, da Legenda Maior, o atestam. Há também outros testemunhos exteriores à Ordem franciscana: o mais antigo é do prelado francês Tiago de Vitry, bispo de São João d’Acre, desde 1216 e que participou da Cruzada e menciona a presença de Francisco em Damieta, em dois de seus escritos: uma carta que endereçou do Egito, em 1220, a Honório III e uma passagem de sua História ocidental, redigida em Acre, na qual demoradamente escreve sobre os primórdios dos Frades Menores. Mencionemos ainda, duas crônicas de origem leiga que, redigidas na Terra Santa pouco depois dos acontecimentos, aportam complementos importantes: crônica de Ernoul, escudeiro de Belian II de Ibelin, que deixou um relato em francês da terceira à quinta Cruzada e continuando a crônica latina de Guilherme de Tyr. Este texto nos chegou com o trabalho e resumo de Bernardo, o Tesoureiro ( 1227-1229); um pouco mais tarde, em torno de 1229-1231, o autor anônimo da Legenda de Heráclio fornece informações preciosas sobre o encontro de Francisco com o Sultão. Atribui o fracasso final da quinta Cruzada aos pecados do cruzados. O testemunho desses cronistas, que pertenciam ao círculo de João de Brienne, rei de Jerusalém, presente em Damieta, em 1219, é extremamente precioso já que estavam muito bem informados em questões relativas ao além mar e às Cruzadas e que consideraram o gesto de Francisco uma loucura, porque a seus olhos não era possível acordo entre a Cristandade e o Islã. Por isso tudo, mesmo havendo contradições entre os documentos não se pode negar que Francisco lá esteve. Quais os objetivos de Francisco quando desembarcou em Damieta e o que fez ele durante os meses em que passou diante da cidade sitiada entre julho-agosto e novembro de 1219? Certamente nunca passou por sua cabeça associar-se à Cruzada na qualidade de combatente. Seu estado de vida de religioso o impedia de pegar em armas e nada estava tão longe de seu estilo de vida, avesso a toda forma de violência, nem como capelão militar. Pode-se dizer que naquele contexto ele via uma ocasião de colocar à prova o ideal evangélico dos Frades Menores. De fato, Tiago de Vitry lamenta amargamente, em sua carta de 1220 ao Papa que vários membros de seu relacionamento, tanto clérigos como leigos, fascinados pela personalidade e exemplo de Francisco, o abandonaram durante o cerco de Damieta para seguir o Poverello e entrar em sua Ordem. Logo que chegou, Francisco se deu conta que a situação estava bloqueada no plano militar e que as armas não levariam a nada. O cerco da cidade já durava mais de um ano sem grandes resultados e uma ofensiva lançada pelos cruzados em 29 de agosto de 1219 contra as tropas do Sultão redundaram num fracasso sanguinolento. Foi neste momento que Francisco, aproveitando-se de uma trégua deixou o acampamento cristão e foi para o campo adversário com um único companheiro, Frei Iluminado de Rieti depois de ter comunicado ao legado Pelágio que lhe recusou todo salvo-conduto e não deixou de manifestar a desaprovação pelo que estava pretendendo fazer.Francisco teria gritado: “Sudam, sudam” (sultão, sultão) ao aproximar-se das fileiras dos inimigos. Foi preso pelos soldados egípcios que o conduziram a seu mestre. Nenhuma das fontes da época afirma que tenha sido objeto de violências. Na realidade o fato em si não tem nada tão incrível porque este cristão por ser alguém que estivesse renegando sua fé e quisesse mudar de campo de batalha ou de religião, ou um emissário dos cruzados encarregado de uma mensagem diplomáticas.





O QUE AS FONTES FALAM DESSE ENCONTRO?












Estamos sempre na companhia de André Vauchez, notável historiador da Idade Média e de seu relato histórico abordando o encontro de São Francisco com o Sultão do Egito (1219). A respeito deste famoso encontro, registrado por muitos cronistas e hagiógrafos, e imortalizado por Giotto no ciclo de afrescos que pintou em torno de 1300 na Basílica superior de Assis (imagem no alto), há ao menos duas tradições: para os cronistas exteriores à Ordem franciscana, Francisco teria procurado – na realidade em vão – converter o sultão e seu povo. Tiago de Vitry, testemunha do acontecimento, assim escreve em sua carta de 1220 ao Papa: “Ardente de zelo pela fé cristã, (Francisco) não teve medo em atravessar o campo do inimigo, e depois de ter pregado por uns dias a Palavra de Deus aos sarracenos, não conseguiu grandes resultados (modicum profecit). Retomando o tema em sua Historia occidentalis em 1226, o referido prelado afirma que a simples presença de Francisco transformara o Sultão do Egito de animal feroz que era no início, em ouvinte dócil, tendo permitido que Francisco lhe dirigisse a palavra por alguns dias. Temendo, no entanto, que ele viesse a converter seus súditos, determinou o sultão que o Poverello fosse reconduzido ao campo dos cruzados, pedindo que rezasse a Deus pedindo que ele lhe revelasse a lei e a fé que mais lhe agradavam. Nesse meio tempo acontece o fracasso da Cruzada e Francisco já estava sendo considerado um santo. Em seu relato, Tiago de Vitry engrandece e dramatiza o acontecimento acentuando que o Sultão ficou muito impressionado com as palavras de Francisco e pouco faltou para se converter à fé cristã. Para os autores franciscanos, ao contrário, o Poverello teria ido ter com o Sultão ansiando pelo martírio. Desta maneira, na Vita prima de Tomás de Celano o fim trágico do martírio seria prefigurado pelos maus-tratos infligidos pelos soldados do Sultão que o haviam prendido. Al-Kamil tê-lo-ia tratado com amabilidade e teria ouvido o Santo defender o cristianismo contra os doutores da lei muçulmana que estavam à sua volta. Depois da disputa oratória, o Sultão quis agradar a Francisco oferecendo-lhe presentes que ele recusou dizendo “desprezá-los como esterco”, o que teria causado admiração ao soberano. Não querendo empalidecer a imagem de seu herói pela evocação de um fracasso, o hagiógrafo conclui sua elaboração justificando que a recusa de Deus de lhe dar o martírio tinha uma explicação: uma graça singular estava reservada para ele no alto do Alverne com a impressão do estigmas de Cristo em seu corpo. Na Legenda Maior (IX, 8), Boaventura afirma ter obtido um relato de Frei Iluminado de Rieti, único companheiro de Francisco que estava com ele na ocasião: depois de terem sido maltratados pelos soldados que o haviam prendido, os dois foram levados à presença do Sultão que os acolheu com benevolência e que questionou a respeito do motivo daquela visita. Francisco respondera “que tinha sido enviado de além dos mares, não por qualquer homem mas pelo Deus Altíssimo; que vinha indicar-lhe e a seu povo, o caminho da salvação e anunciar-lhe o Evangelho da verdade. Depois pregou ao Sultão os mistérios da Trindade e da Redenção”. Dando-se conta que o Sultão hesitava em se converter, propôs que se submetesse ao julgamento de Deus propondo-lhe uma “ordália” (um desafio): os sacerdotes muçulmanos e entrariam no fogo e ver-se-ia, concluída a prova, qual seria a religião superior. Os “clérigos” muçulmanos rejeitaram a prova por considerarem-na uma loucura. Francisco propôs ao Sultão de enfrentar a prova sozinho. Este último recusou. Ficou no espírito do Sultão admiração por Francisco e até mesmo um certo desejo de se converter ao cristianismo. Não o fez temendo reação por parte de seu povo. Ofereceu então, presentes a Francisco que ele não aceitou retornando ao acampamento dos cristãos porque não via em Al-Kamil sinal algum de autêntica piedade. Tal versão dos fatos foi imortalizada por Dante em alguns versos famosos da Divina Comédia:




“Para lá se dirigiu, com sede pelo martírio, para pregar Cristo e seus apóstolos na presença do orgulhoso Sultão. Encontrando, contudo, um povo difícil de se converter e não querendo ficar inativo, foi recolher alguns frutos no solo da Itália”.





Embora à primeira vista nenhum episódio relatado nas Vidas possa parecer mais legendário no mal sentido do termo, o encontro do Pobre de Assis com o Sultão do Egito é, sem dúvida, um dos mais bem atestados do ponto de vista histórico, mesmo que seu significado mais preciso nos escape. Talvez seu significado devesse ser explicado por aquele momento dos acontecimentos: momento em que cada campo procurava contemporizar as coisas já que de lado a lado não havia perspectiva de vitória. É sabido que Al-Malik Al-Kamil era pessoa tolerante e aberta em matéria de religião. Um clérigo alemão e futuro cardeal, Olivier de Paderborn (+1227), feito prisioneiro pelos muçulmanos, no momento da derrota final dos cruzados em agosto de 1221, fez, numa carta que dirigiu ao Sultão depois de sua libertação, um vibrante elogio por sua magnanimidade e bondade. O Sultão do Egito mostrara a esse visitante cristão inesperado que a hospitalidade muçulmana não era uma questão de palavras. Não se deve estranhar que o Sultão tenha colocado o visitante sob sua proteção. O comportamento de Francisco, segundo a descrição de Boaventura, surpreende, antes de tudo, pela proposta da aposta-desafio (ordália) aos clérigos muçulmanos, procedimento estranho da parte de um homem evangélico. Não podemos, no entanto, esquecer que Francisco era alguém que se alimentava de referências bíblicas e que algumas delas exerceram influência sobre seu modo de agir, como é o caso da passagem do livro dos Reis (1Rs 18,20-48). Lá vemos Elias confrontando-se com os sacerdotes de Baal para provar ao rei Acab a superioridade do Deus de Israel sobre Baal de quem Jezabel defendia o culto: apesar de todo empenho dos sacerdotes não conseguiram com que o fogo queimasse o sacrifício que estavam oferecendo, enquanto que o de Elias foi imediatamente consumido pelas labaredas, razão pela qual os sacerdotes de Baal foram degolados pela multidão que veio a se converter ao Deus de Israel. Se Francisco não conhecia este texto certamente não podia ignorar o cântico dos três jovens na fornalha ardente (Dn 3, 1-30) ou a história de Daniel na cova dos leões (Dn 6, 1-30) tantas vezes mencionada na liturgia, relatos de mártires que tiveram como desfecho a confusão dos perseguidores e o reconhecimento do verdadeiro Deus por parte de Nabucodonosor. De outro lado, nos movimentos religiosos populares que floresceram na Itália nos séculos XI e XII dos quais Francisco fora herdeiro e continuador o recurso à prova de fogo era conhecido. Basta lembrar um certo Pedro, qualificado de “Igneo”, quer dizer, homem de fogo, um eremita toscano que, em meados do século XI, atravessou nu um braseiro para convencer os padres simoníacos de se juntarem aos partidários da reforma da Igreja o que foram obrigados a fazer depois da prova em questão. Dispomos, por fim do testemunho de um autor árabe do século XV, Ibn al-Zayyat, que evoca um epitáfio colocado sobre o túmulo do grande místico Fakhr al-Din, conselheiro espiritual de Al-Kamil, que se podia ver no cemitério do Cairo que dizia: “Este tem virtude conhecida de todos. Sua célebre aventura com Al-Malik Al-Kâmil e o que lhe aconteceu devido a um monge, tudo é muito conhecido” Segundo Louis Massignon, que por primeiro sentiu sua atenção atraída por um tal texto, o monge cristão ( rahib) não seria outro senão Francisco de Assis e parecendo correto identificar Fakhr al-Din, que morreu nonagenário, ao sábio que, segundo o relato de São Boaventura, teria tomado distância no momento em que Francisco propusera a prova do fogo, sem dúvida, menos por medo, mas pelo fato de reprovar procedimento tão bárbaro em matéria de religião.

 

 

 

BIBLIOGRAFIA:

 

 



-https://evangelhoquotidiano.org/PT/display-saint/34a05455-11cd-47b6-a561-ae9bb776fe55



 

-https://franciscanos.org.br/carisma/franciscosultao.html#gsc.tab=0






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