A política, para Espinosa, se dá no domínio da imaginação, é lugar
de paixões. Mesmo que alguns homens ajam algumas ou muitas vezes de acordo com
a razão, não se pode diferenciar o desejo cego e a razão nas ações políticas; a
liberdade de ânimo, ou fortaleza, que como virtude ou perfeição está presente
naquele que tem o poder de operar segundo a razão (TP[1] II 7) e cuja mente está
sob jurisdição de si própria, não de outrem, essa fortaleza de ânimo, diz
Espinosa, “é uma virtude privada” (cf. TP I 6). Não cabe ao Estado decidir
sobre o que leva seus cidadãos a agir desejo cego ou razão, seu papel e sua
virtude é a segurança internamente e a paz na relação com outros Estados.
Naturalmente, seria
melhor se os homens se guiassem sempre pela razão e pudessem agir sempre como
causa adequada, mas não é isso que acontece na natureza e não é isso que se
exige no exercício efetivo da política. Embora, em certo sentido, a razão possa
reprimir e moderar os afetos, o caminho que ensina, diz Espinosa, “é
extremamente árduo; de tal modo que aqueles que se persuadem de poder induzir,
quer a multidão, quer os que se confrontam nos assuntos públicos, a viver
unicamente segundo o que a razão prescreve, sonham com o século dourado dos
poetas, ou seja, com uma fábula” (TP I 5).
Aliás, se os homens agissem sempre racionalmente, o Estado, como
mediador das relações humanas e salvaguarda da paz e da segurança comuns, seria
completamente dispensável e o direito natural, que se define para Espinosa como
potência, seria determinado apenas pela potência da razão (cf. TP II 5). Mas os
homens são naturalmente discordantes, e se compadecem de quem está mal,
“invejam quem está bem”, estão mais propensos à vingança que ao perdão, oprimem
uns aos outros por pensarem diferente e se vangloriam do que fazem para
prejudicar os demais (explica o TP I 5).
Com efeito,“se estivesse tanto em nosso poder vivermos segundo os
preceitos da razão como conduzidos pelo desejo cego, todos se conduziriam pela
razão e organizariam sabiamente a vida, o que não acontece minimamente, pois
cada um é arrastado pelo seu prazer.” (TP II 6)
Se pudessem, os
homens não deixariam arrastar-se por paixões; a razão não é, no entanto,
persuasiva ou forte o suficiente para vencer a força das paixões: “não está em
poder de cada homem usar sempre da razão e estar no nível supremo da liberdade
humana.” (TP II 8). E na verdade, a razão não pode jamais erradicar a paixão,
uma paixão só pode ser vencida por outra mais forte.
Com efeito, ao separar liberdade e contingência no Tratado
político, Espinosa mostra sua íntima relação com a razão:
“Quanto mais livre,
pois, considerarmos ser o homem, menos podemos dizer que ele pode não usar da
razão...” (TP II 7)
“Chamo totalmente livre ao homem na medida em
que ele é conduzido pela razão” (TP II 11).
Ainda que saibamos que não é da natureza humana agir sempre de
acordo com a razão, cabe investigar o sentido dessa razão no interior da
política e, cabe perguntar em que sentido o melhor estado, o estado
democrático, aquele que melhor preserva as liberdades individuais, pode ser dito
um estado racional. Vejamos:
Paixões políticas
Os homens são guiados o mais das vezes por um desejo cego. O que
se não essas paixões avassaladoras levaria alguém a arriscar a própria vida
pela liberdade de todos? (cf. Ética III P7).
O homem é parte da natureza e, nesse sentido, sofre
necessariamente mudanças que não provêm exclusivamente de sua própria natureza,
mudanças que não decorrem dele mesmo como causa adequada; por isso, “o homem
está sempre, necessariamente, submetido às paixões” (E IV, P4 corol.). E como
“a potência humana é bastante limitada, sendo infinitamente superada pela
potência das causas exteriores” (E IV Apêndice cap.32), nós homens estamos
sempre sujeitos às paixões.
A razão não se opõe às paixões e, sobretudo, não ao desejo. Em
primeiro lugar, a razão não pode vencer as
paixões e um homem livre, racional, é também e sempre um homem passional, já
que é parte da natureza, cuja potência é muito maior do que a sua. O
conhecimento verdadeiro não pode refrear um afeto, uma paixão não se extingue
pela presença do verdadeiro, a razão não pode vencer as paixões (cf. EIV P14).
Por outro lado, o conhecimento verdadeiro que, enquanto
verdadeiro, nada pode em relação às paixões, enquanto afeto pode sim refrear
outros afetos. Ademais, há afetos que “estão de acordo com as regras da razão
humana” (E IV P18 esc.); por isso “é preciso conhecer tanto a potência de nossa
natureza quanto sua impotência, para que possamos determinar, quanto à
regulação dos afetos, o que pode a razão e o que não pode.” (E IV P17 esc.).
Em segundo lugar, a razão e a compreensão de si mesmo como parte
de um todo, gera o desejo de agir. A razão não pode ordenar nada contra a natureza, segundo
a qual buscamos o que é útil. Ora, a compreensão de si mesmo como parte da
natureza mostra que nada é mais útil ao homem do que o próprio homem e que nada
pode ser mais vantajoso do que “estarem todos em concordância com tudo, de
maneira que as mentes e os corpos de todos componham uma só mente e um só
corpo” (E IV P18 esc.). Daí que “os homens que buscam, sob a condução da razão,
o que lhes é útil, nada apetecem para si que não desejem também para os outros”
(EIV P18 esc.). Em poucas palavras, a razão, sozinha, nada pode em relação às
paixões, mas a razão está ligada ao nosso desejo e o conhecimento do verdadeiro
é também um afeto, uma paixão.
“Há um desejo que
nasce da compreensão racional do verdadeiro. O homem racional, livre, deseja
para os outros o que deseja para si. E deseja de maneira apaixonada, a razão
jamais poderia erradicar uma paixão, e há afetos que estão de acordo com as
regras da razão humana. A própria compreensão do verdadeiro pode ser entendida
como um afeto.”
Por que alguém que é livre individualmente e que, portanto, se
sabe como uma parte da Natureza imensa, e sabe que sua potência é infinitamente
superada por causas exteriores, arrisca sua vida pela liberdade política de
todos? Sabemos que um homem racional deseja para os outros o que deseja para si
e age de maneira apaixonada, porque há afetos que estão em conformidade com a
razão. Esse homem arriscaria sua vida pela democracia?Estado democrático,
Estado que garantiria a segurança e a paz para seus cidadãos e, com isso,
ofereceria as condições para que estes cidadãos experimentassem a fortaleza de
ânimo, que leva alguém a considerar, mesmo contra as aparências, suas forças
suficientes para derrotar esse oponente.
Se há ingenuidade, esta não está na convicção da luta pela
democracia, mas na crença de que a liberdade democrática poderia ser gerada a
partir do esclarecimento racional da multidão, o que, por si só, levaria a um
movimento coletivo organizado. A ingenuidade estaria talvez no caminho
“iluminista” que se pretendia adotar para dar origem à democracia e não na luta
pela liberdade, que aparecia como inevitável para todos que lutaram contra a
ditadura militar brasileira entre 1964 e 1985.
A ideia era mobilizar grupos de operários e trabalhadores rurais,
demonstrando racionalmente sua situação real, e desfazendo qualquer cadeia
imaginativa de explicação, para levá-los a ver a situação a que teriam direito
por natureza, isto é, a liberdade política.
Ora, um afeto só pode
ser erradicado por outro afeto mais forte, uma imaginação “é mais intensa
enquanto não imaginamos nada que exclui a existência presente da coisa
exterior” (E IV P9 demonstração). Se em Espinosa a razão não rivaliza com os
afetos e a imaginação, tampouco é capaz de vencê-los sozinha (Cf. E IV P6-P8).
A luta pela liberdade democrática não é fruto de uma ação ingênua
e irrefletida, ela fala a nossa essência, àquilo que define profundamente cada
um de nós, mas a tentativa de organizar por meio da razão a multidão
em um só corpo e em uma só mente é inócua: “aqueles que se persuadem de poder
induzir (…) a multidão (…) a viver unicamente segundo o que a razão prescreve,
sonham com o século dourado dos poetas, ou seja, com uma fábula” (TP I 5).
A política não pode ser instituída pela razão,
diz a filósofa Marilena Chaui[5]. Mas, veremos, podemos ter um Estado
que concorde com os ditames da razão, a saber, um
o Estado democrático, que, diz Espinosa no TTP “parece o mais natural e o que
mais se aproxima da liberdade que a natureza concede a cada um” (TTP XVI, p.195
(Ed. brasileira p.242)). Precisamos, então, entender, para concluir, em que
sentido o Estado democrático é um Estado que concorda com a razão, embora não
seja instituído pela razão.
Ditadura
Antes de concluirmos, porém, cabe uma pergunta suplementar: “Se é de nossa essência o esforço de perseverar no ser e
resistir a tudo que possa destruir nossa liberdade e, por outro lado, a virtude
do Estado está na garantia da segurança e da paz para seus cidadãos, um regime
ditatorial que mata violentamente seus oponentes pode ser dito um Estado?”
Um governo que dirige seus súditos pela supressão da liberdade e
pela tentativa da supressão da liberdade de pensar, que governa pela arbitrariedade
de Atos impositivos que visam “regulamentar” a prisão e o assassinato de
opositores, pode ser dito propriamente um Estado, se a virtude deste é a
segurança de seus cidadãos?
No estado civil, diz
Espinosa, “cada cidadão não está sob jurisdição de si próprio, mas da cidade” e
não tem direito de decidir o que é justo ou injusto, isso cabe à cidade, já que
“o corpo do estado deve ser conduzido como que por uma só mente” (TP III 5).
Contra a objeção de que sujeitar-se ao juízo de outrem é
irracional, Espinosa afirma que a razão não pode ensinar nada contra a
natureza, de modo que, se todos esforçam-se para perseverar no ser e preservar
sua liberdade, e isso não é possível quando todos e cada um são arrastados por
afetos, contrários uns aos outros, então é racional observar os direitos da
cidade e cumprir as ordens do poder soberano (TP III, 6).
A finalidade do Estado para Espinosa é a paz e seus textos não têm
por objeto o estado de guerra que é uma ditadura; o TP e o TTP oferecem,
todavia, elementos para pensarmos sobre uma ditadura militar. Por exemplo, ao
descrever o exército monárquico no capítulo VII de seu Tratado
político, Espinosa afirma que não deve ser atribuído ao exército nenhum
salário, já que sua maior recompensa é a liberdade – enquanto no estado natural
a recompensa da virtude bélica é estar sob jurisdição de si próprio, não ser
dominado, no estado civil, em que todos os cidadãos são conduzidos como que por
uma só mente, todos zelam por si, por sua liberdade, e essa é a recompensa.
Espinosa alerta sobre o risco de se conceder pagamento aos homens
do exército:
“eles são homens que
só conhecem as artes da guerra, que em tempo de paz, devido ao ócio excessivo,
são corrompidos pelo luxo, e que finalmente, como não têm fortuna de família,
não pensam senão em rapinas, discórdias civis e guerras. Podemos até afirmar
que um estado monárquico assim é realmente um estado de guerra, e que só o
exército goza de liberdade, enquanto os restantes são servos.” (TP VII, 22)
Os soldados que
recebem salário “habituados à disciplina militar (…) costumam desprezar a turba
dos cidadãos” (TP VII 28).
Cada regime político é superior ao outro quanto menor for o número
de instituições necessárias para impedir o risco de tirania”[2]. Assim, se a ditadura e a
tirania não são propriamente o objeto dos textos políticos de Espinosa, elas
servem todavia de contra-exemplo para pensar o Estado.
Ora, para que o corpo do Estado seja conduzido como que por uma só
mente, isto é, para que a vontade da cidade seja considerada a vontade de
todos, ou que haja uma união de ânimos, é preciso que “a cidade se oriente
maximamente para o que a sã razão ensina ser útil a todos os homens” (TP III 7)
– não é esse o caso em um governo ditatorial.
Com efeito, se no estado civil os homens estão sob jurisdição da
cidade e não de si próprios, isso não significa que “os homens percam a
natureza humana e adquiram outra, nem que a cidade tenha o direito de fazer com
que os homens voem ou, o que é igualmente impossível, que os homens olhem como
honroso o que provoca riso ou náusea.” (TP IV, 4).
Não está no direito da cidade induzir qualquer de seus súditos a
fazer coisas que “a natureza humana abomina a tal ponto que as tem por piores
que qualquer mal” (TP III 8), como testemunhar contra si mesmo, torturar-se,
não se esforçar por evitar a morte.
Assim como não se
pode obrigar um súdito a ceder sua faculdade de julgar (e crer, por exemplo,
que a parte é maior do que o todo), assim também ninguém pode ser induzido a
amar o que odeia ou odiar o que ama – isso, diz Espinosa (cf. TP III 8).
Também não está no direito da cidade, diz Espinosa, “aquilo que
provoca indignação na maioria” (TP III 9); mas os tiranos encontram meios de
fazer isso: “em toda parte a verdade é, a
maioria das vezes, deformada pelos que lhe são hostis ou são culpados,
principalmente onde domina um só, ou poucos, que não olham nos processos
judiciais ao direito e à verdade” (TP VII, 27).
“Os principais
assuntos do Estado são tratados nas costas da plebe, que “não faz conjecturas
senão a partir das poucas coisas que não podem ser escondidas” (TP VII 27),
assim a plebe faz juízos errôneos e interpreta mal os fatos. Isso quando, não
contente em esconder os assuntos do Estado e deformar a verdade, o governante
resolve promulgar leis “que determinam aquilo que cada um deve acreditar e
proíbem que se diga ou escreva qualquer coisa contra esta ou aquela opinião”,
leis “freqüentemente instituídas a título de concessão ou até de cedência à ira
dos que não podem suportar as naturezas livres” (ESPINOSA - TTP XX, p. 307).
E assim, esses governantes agem contra a liberdade de pensar e,
diz Espinosa, “por uma não sei que terrível autoridade, podem facilmente
transformar em raiva a devoção da plebe amotinada e instigá-la contra quem eles
quiserem” (TTP XX, p 244/ ed. brasileira p.307).
Um homem pode ter outro sob seu poder, segundo Espinosa, não
apenas quando o detém amarrado ou lhe tira os meios de se defender ou fugir,
mas também se lhe incutir medo ou se mediante benefício o vincular de tal
maneira a si que aquele prefere fazer sua vontade; nesses dois últimos casos
não apenas o corpo daquele homem está sob jurisdição alheia, mas também sua
mente (cf. TP II 10).
“A cidade não pode jamais agir contra a liberdade de pensar dos
cidadãos, mas uma ditadura, sabemos agora, não é um Estado, mas um estado de
guerra, no qual os governantes tirânicos usam de todas as táticas e técnicas
possíveis para ocultar a verdade e, assim, conseguir o apoio da população.Na
verdade, foi sempre essa a cantiga daqueles que cobiçam para si o estado
absoluto: ser de todo interesse da cidade que os seus assuntos sejam tratados
em segredo e outras coisas do gênero, as quais, quanto mais se ocultam sob a
máscara da utilidade, mais funesta é a escravidão a que arrastam.” (TP VII 29)
A democracia é o mais natural dos regimes porque melhor preserva a
liberdade natural, a liberdade de corpo e mente dos seus cidadãos. Mesmo que a
cidade deva ser um corpo organizado como se fosse uma só mente, a liberdade de
pensar e a liberdade dos homens de dizerem o que pensam, diz Espinosa, “não
representa nenhuma ameaça em relação à paz” (TTP XX p.246. Edição brasileira
p.309).
Por isso não faz sentido, numa democracia, “estarem escondidos dos
cidadãos os perversos segredos dos seus governates (…) Que o silêncio
seja muitas vezes útil ao estado ninguém pode negar; mas que sem ele o mesmo
estado não possa subsistir, ninguém poderá jamais provar.” (TP VII 29).
Como a democracia preserva melhor a liberdade dos cidadãos do que
uma monarquia ou uma aristocracia? E em que sentido podemos dizer que, embora
não instituído pela razão, um Estado democrático é sempre racional?
Em qualquer regime, desde que visando à paz, a multidão é portadora da
soberania, mas nem sempre é a detentora da
soberania. O direito do Estado é a potência da multidão unificada (Cf. TP III,
2); por isso, o portador da soberania é sempre a multidão; o
governante (seja ele a multidão, um rei ou uma assembléia) é o detentor da
soberania enquanto a multidão assim quiser.
Apenas na democracia, portanto, o portador e o detentor da
soberania coincidem. O direito natural vale igualmente para todos. Cada um abre
mão de seu direito natural individual apenas na medida em que se tem agora um
direito da multidão unificada, mais amplo do que um direito natural individual,
visto que o direito se define como potência e a potência de um Estado é mais
ampla do que a de um indivíduo.
Não se trata, portanto de ter um Estado com plena liberdade
individual de cada um de seus membros, no qual todos e cada um usam maximamente
de sua liberdade individual e de sua razão, trata-se de liberdade política. Não
importa se cada cidadão se conduz individualmente pela razão ou pelos afetos,
desde que todos tenham direitos iguais, às mesmas coisas – sem que haja uma
classe dirigente privilegiada, seja na figura de um só governante, ou ditador.
“O homem, tanto no estado
natural como no civil, age segundo as leis da sua natureza e atende ao seu
interesse. O homem, sublinho, em ambos os estados, é pela esperança ou pelo
medo que é conduzido a fazer ou a omitir isto ou aquilo. A principal diferença
entre um e outro estado é que no estado civil todos temem as mesmas coisas e é
idêntica para todos a causa da segurança e a regra de vida, o que certamente
não retira a faculdade de julgar de cada um.” (TP III, 3)
Cada um decide por que seguir a regra de vida da cidade – se é
porque teme as consequências de desrespeitar as leis, ou porque busca a
tranquilidade, ou porque, sabendo-se parte da natureza, sabe que o homem é útil
ao homem e junto com os outros é mais forte do que sozinho, não importa. Não é
preciso que todos tenham uma compreensão racional sobre sua situação e decidam
racionalmente submeter-se à vontade da maioria. Não é preciso, e tampouco é
possível.
“Dado que os homens, como dissemos, se conduzem mais pelo afeto
que pela razão, segue-se que não é por condução da razão, mas por algum afeto
comum que uma multidão se põe naturalmente de acordo e quer ser conduzida como
que por uma só mente, ou seja (como dissemos no art. 9, cap III), por uma
esperança ou medo comuns, ou pelo desejo de vingar algum dano comum.” (TP VI,
1)
Os homens “desejam por natureza o estado civil” (TP VI, 1), por
causa do medo da solidão e porque precisa dos outros para viver. O Estado não
está fundado nas exigências da razão, mas na natureza passional[1] dos homens, e está
sujeito inclusive à flutuação do ânimo[2] da multidão – motivo pelo
qual os estados democráticos são frágeis, ou duram pouco.
Se há Estado que
poderia ser eterno, seria“aquele cujos direitos, uma vez corretamente
instituídos, permanecessem inviolados. (…) Os direitos, contudo, não podem ser
invencíveis a não ser que sejam defendidos não só pela razão, mas também pelo
afeto comum dos homens; de outra forma, se estão apoiados só no auxílio da
razão, sem dúvida são fracos, e vencem-se facilmente.” (TP X, 9).
O Estado deve ser instituído de maneira que governantes e
governados façam o que deve ser feito segundo o que prescreve a razão, de modo
que a multidão seja conduzida espontaneamente ou por necessidade “a viver
segundo o que prescreve a razão” (TP VI, 3) visando o interesse coletivo e a
concórdia.
As leis da razão humana, com efeito, visam apenas o que é
verdadeiramente útil para os homens (TTP XVI, p.190-191 (Ed. bras. p.236)).
Nada é mais útil ao homem que o próprio homem e nada é mais vantajoso do que
homens vivendo em concórdia. Mais sso não significa que o Estado assim
instituído seja um Estado em que a multidão esclarecida governa-se pela razão.
Por isso, o Estado
democrático é o mais natural dos regimes, porque o portador da soberania e o
detentor são idênticos, de maneira que estão garantidas a liberdade política, a
liberdade de pensamento e as condições para que os homens busquem sua liberdade
individual. Realiza-se, no Estado democrático, o verdadeiro fim do Estado, a
liberdade (Cf. TTP XX p.241 (Ed. bras. p.302)).
“Que coisa pior pode imaginar-se para um Estado que serem mandados
para o exílio como indesejáveis homens honestos, só porque pensam de maneira
diferente e não sabem dissimular? Haverá algo mais pernicioso, repito, do que
considerar inimigos e condenar à morte homens que não praticaram outro crime ou
ação criticável senão pensar livremente, e fazer assim do cadafalso (…) um
palco belíssimo em que se exibe, para vergonha do soberano, o mais sublime
exemplo de tolerância e virtude? (…) os que sabem que são honestos (…)
recusam-se a considerar castigo e morrer por uma causa justa e têm por glória
dar a vida pela liberdade. Que exemplo poderá então ter ficado da morte de
pessoas assim, cujo ideal é incompreendido pelos fracos e moralmente
impotentes, odiado pelos revoltosos e amado pelos homens de bem? Ninguém,
certamente, aí colhe exemplo algum, a não ser para os imitar ou, pelo menos
admirar.” (TTP XX, p.245 (Ed. bras. p.307).
“A vitória da razão só
pode ser a vitória das pessoas razoáveis. Ao contrário da verdade a razão não
existe por si mesma, mas pela condução das pessoas, da ação. Se as pessoas
razoáveis não vencem, a razão não prevalece” - (Bertold Brecht).
Abreviações dos textos de Espinosa: TP – Tratado
político; TTP – Tratado teológico político; E – Ética (seguido
do número romano indicando a parte e quando seguido de P – proposição).
FONTE:zagaiaemrevista.com.br/razao-e-verdade-na-politica-de-espinosa/#sthash.N4zGlrZD.dpuf
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