Não podemos deixar morrer a utopia, porque a utopia não é de esquerda
nem de direita, mas faz parte do universo humano. A direita não tem que ficar
complexada pelo facto de a esquerda se crer utópica, nem a esquerda tem que
ficar complexada se a direita quiser ser utópica.
O Importante é que não
deixemos de perseguir a utopia na sociedade, na economia e na política, mas de
forma plural, porque só assim se foge ao populismo antissistema. A ausência de
pluralidade, não serve a democracia, não serve o Estado de direito, não serve a
Constituição e, sobretudo, não serve a humanidade que não é uniforme, mas
plural.
A insistente referência à palavra utopia prende-se a "Utopia",
de Thomas More. A distinção de direita e
esquerda existe objetivamente, e é estável o bastante para ser objeto de um
conceito científico, e ela não consiste em nada do que a direita ou a esquerda
dizem de si mesmas ou uma da outra. Consiste numa diferença entre duas
percepções da realidade, diferença que permanece constante ao longo de todas as
variações de significado dos termos respectivos e que, uma vez apreendida,
permite elucidar a unidade por baixo dessas variações e explicar como elas se
tornaram historicamente possíveis. A solução, em versão dramaticamente
resumida, é a seguinte: direita e esquerda, muito antes de serem diferenças
“ideológicas” ou de programa político, são duas maneiras diferentes de
vivenciar o tempo histórico.
Por meio dessa
distinção é possível captar a unidade entre diferentes tipos históricos de
direitismo e esquerdismo cuja variedade, ou uniformidade absoluta nos
desorientaria. Um adepto do capitalismo liberal clássico, portanto, podia ser
um esquerdista no século XVIII, porque apostava numa utopia de liberdade
econômica da qual não tinha experiência concreta num universo de mercantilismo
e estatismo monárquico. Mas é um conservador no século XXI porque fala em nome
da experiência adquirida de dois séculos de capitalismo moderno e já não
pretende chegar a um paraíso libertário e sim apenas conservar, prudentemente
intactos, os meios de ação comprovadamente capazes de fomentar a prosperidade
geral. Pode, no entanto, tornar-se um revolucionário no instante seguinte,
quando aposta que a expansão geral da economia de mercado produzirá a utopia
global de um mundo sem violência. Em cada etapa dessas transformações, o
coeficiente de esquerdismo e direitismo de sua posição pode ser medido com
precisão razoável.
É inevitável, também, que, pelo menos em certos momentos do processo,
esquerdistas e direitistas se equivoquem profundamente no julgamento de si
próprios ou de seus adversários.
Da parte dos
direitistas, tanto hoje como ao longo de todo o século XX, a grande ilusão é a
da equivalência. Como estão acostumados à idéia de que direita e esquerda
existem como dados mais ou menos estáveis da ordem democrática, acreditam que
essa ordem pode ser preservada intacta e que para isso é possível “educar” os
esquerdistas para que se afeiçoem às regras do jogo e não tentem mais destruir
a ordem vigente. Pelo lado esquerdista, porém, essa acomodação é impossível.
No mundo dos direitistas pode haver direitistas e esquerdistas, mas, no
mundo dos esquerdistas, só esquerdistas têm o direito de existir: o advento do
reino esquerdista consiste, essencialmente, na eliminação de todos os
direitistas, na erradicação completa da autoridade do antigo. Foi por essas
razões que os EUA retiraram pacificamente suas tropas dos países europeus
ocupados depois da II Guerra Mundial, acreditando que os russos iam fazer o
mesmo, quando os russos, ao contrário, tinham de ficar lá de qualquer modo,
porque, na perspectiva da revolução, o fim de uma guerra era apenas o começo de
outra e de outra e de outra, até à extinção final do capitalismo.
A sucessão quase inacreditável de fracassos estratégicos da direita no mundo deve-se, no fundo, a uma limitação estrutural do direitismo: eliminar a esquerda completamente seria uma utopia, mas a direita não pode tornar-se utópica sem deixar de ser o que é e transformar-se ela própria em revolucionária, absorvendo valores e símbolos da esquerda ao ponto de destruir a própria ordem estabelecida que desejava preservar.
O fascismo, como demonstrou Erik von Kuenhelt-Leddin no clássico
“Leftism: From De Sade and Marx to Hitler and Marcuse” (1974), nasce da
esquerda e arrebata a direita na ilusão suicida da revolução
contra-revolucionária.
O engajamento
político tem por gatilho fortes convicções morais e utopias – seja o indivíduo
de esquerda, seja ele de direita – demonstram estudos da Universidade de
Chicago, nos Estados Unidos. Pesquisadores realizaram dois levantamentos
diferentes, com 2.069 indivíduos, para estabelecer a relação. Outro ponto é que
as pessoas são mais intensamente inclinadas a ações políticas se ela visa a
“obter o bem”. Já a “prevenção do mal” não leva ao mesmo engajamento.A
pesquisa foi publicada online no Personality and Social Psychology Bulletin e
sugere que esquerda e direita são motivadas pela ideia de um futuro melhor – e
não para a prevenção de dias piores. Linda Skitka, professora de psicologia da
Universidade de Chicago, e uma das autoras do estudo diz que, com base nos
testes, os pesquisadores perceberam que aqueles que trataram os temas como
questões morais estavam mais inclinados a se engajarem politicamente.
O movimento político recente no
Brasil reacendeu debates sobre as motivações e diferenças entre direita e esquerda.
O que explica essa conexão entre as convicções morais e o envolvimento político
é a ideia de que benefícios podem ser alcançados se a causa apoiada se
concretizar – e não os danos percebidos se ela não for aprovada”, Pesquisadores
discutem algumas concepções do que seria “a moral”. Ela pode dizer respeito à
“intersecção de valores, práticas e mecanismos psicológicos que trabalham
juntos para suprimir o egoísmo”. Ou, na definição de outros autores, a moral
tem por base atos de “repulsa” ou “evitação” e teria se originado de atos
generalizados de “aversão”. Ainda, a moral pode estar ligada a um sentimento de
“dever”.
Segundo pesquisadores
essas teorias trabalham com a concepção de moral mais do ponto de vista
“reacionário”, com atos voltados para evitar que algo aconteça, do que
prescritivo, no sentido de a moral ser a
base para a luta direcionada para algo venha a acontecer.Mais recentemente, no
entanto, outras evidências indicam que a moral pode ter, na sua base, tanto uma
tendência a evitar que algo aconteça como o engajamento para que algo aconteça.
É o modelo defendido por autores como Janoff-Bulman e Cannes, numa concepção
que ficou conhecida como “theory of moral motives”.
Com essas definições, os cientistas, então, testaram se a moral política
tende a ser mais reativa ou prescritiva – e estabeleceram que, no sentido do
engajamento político, a moral tende a ser mais prescritiva. Ou seja, pessoas
que se engajam politicamente tendem a ser influenciadas por uma ideia de
mudança.
O pesquisadora Linda
contradiz o que outros estudos já relataram. Ela explica que outras pesquisas
estabeleceram que as pessoas são mais inclinadas pela “aversão à perda” do que
pela “busca de ganhos”. Esses estudos, no entanto, tinham por enfocavam mais as
perdas materiais e econômicas. O estudo poderá ser utilizado como um guia para
políticas públicas e partidos, diz a psicóloga. “As pessoas estarão mais
inclinadas a se voluntariar ou a votar se perceberem que aquela ação, de fato,
vai levar a algo que elas acreditam ser bom”, diz.
A moral da esquerda, por sua vez, como se apoia integralmente na imagem
móvel de um futuro hipotético, não pode julgar-se a si própria pelos padrões
atualmente existentes, condenados “a priori” como resíduos de um passado
abominável. Seu único compromisso é com o futuro, mas quem inventa esse futuro e
o modifica conforme as necessidades estratégicas e táticas do presente é ela
própria. Por fatalidade constitutiva do seu símbolo fundador, ela é sempre o
legislador que, não tendo autoridade acima de si, legisla em causa própria, faz
o que bem entende e, a seus olhos, tem razão em todas as circunstâncias,
embriagando-se na contemplação vaidosa de uma imagem de pureza e santidade
infinitas, mesmo quando chafurda num lamaçal de crimes e iniqüidades
incomparavelmente superiores a todos os males passados que prometia eliminar.
Ser esquerdista é viver num estado de desorientação moral profunda, estrutural
e incurável. É mergulhar as mãos em sangue e fezes jurando que as banha nas
águas lustrais de uma redenção divina.
Por isso não se deve
estranhar que o partido mais pervertido e perverso de toda a nossa História, amigo
de narcoguerrilheiros e ditadores genocidas, que aplaudia a liquidação de
dezenas de milhares de cubanos desarmados enquanto condenava com paroxismos de
indignação a de trezentos terroristas brasileiros, o partido que condena os
atentados a bomba quando acontecem na Espanha e aplaude os realizados no
Brasil, o partido que instituiu o suborno e a propina como sistema de governo,
seja também o partido que mais bate no peito alegando méritos e glórias
excelsos.
CONCLUSÃO
Direita e esquerda
são politizações de símbolos mitológicos cujo conteúdo originário se tornou
inalcançável na experiência comum. Elas existirão enquanto permanecermos no
ciclo moderno, cujo destino essencial, como bem viu Napoleão Bonaparte, é
politizar tudo e ignorar o que esteja acima da política. Não existirão para
sempre. Mas, quando cessarem de existir, a política terá perdido pelo menos boa
parte do espaço que usurpou de outras dimensões da existência.
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