A bancada religiosa representa um quinto do Congresso e se une para
conter o avanço de pautas como aborto, drogas, direitos das mulheres e de
homossexuais. Postura leva a questionamentos sobre real laicidade do Estado. (porém não confundir: Estado Laico não significa estado ateu, apenas um estado
sem religião oficial, mas que respeita todas as religiões).A controversa escolha do deputado federal Marco Feliciano para a presidência da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara não é um fato isolado. Ela expõe, segundo especialistas, a consolidação do poder político
das religiões no Brasil, sobretudo da evangélica, que cada vez mais direciona
forças para impor sua agenda.
Fato: os parlamentares ligados a
instituições religiosas já representam "Um Quinto do Congresso"!
(católicos e evangélicos)
Em 20 anos, o número de deputados federais e senadores evangélicos
mais que triplicou saltou de 23 em 1990 para 73 em 2010, perdendo hoje só para
a bancada ruralista. E, com isso, os embates com grupos de direitos civis, pró-liberalização
do aborto e das drogas, de direitos humanos e de defesa da laicização do Estado
se intensificaram - "Os católicos sempre foram hegemônicos no Brasil, você não
precisava nem dizer que pertencia a essa religião. Mas, com o crescimento dos
evangélicos, há um desequilíbrio nessa equação. A disputa foi para além dos
limites do campo religioso, porque estar na política é garantir espaços
privilegiados", destaca Christina Vital, professora de ciências sociais da
Universidade Federal Fluminense (UFF).Sob o pretexto de "proteger a família e a vida", os
parlamentares das bancadas católica (22 congressistas) e evangélica deixam as
diferenças de lado e chegam a trabalhar juntos para tentar conter o avanço de
pautas como aborto, casamento homossexual e liberalização das drogas.
Mas os atuais esforços de hoje se diferem da atuação após a
redemocratização, quando parte do segmento católico e evangélico foi importante
para o avanço dos direitos humanos e pautas da minoria, como temas ligados à
terra, melhoria das condições de trabalho e dos direitos cidadãos. Os assuntos,
no entanto, não afetavam a reprodução e a sexualidade. E as alianças formadas pelas bancadas religiosas têm grande poder de
ramificação. Como exemplo, a Frente Parlamentar em Defesa da Vida e Preservação
da Família, que une católicos, evangélicos e outros políticos de alguma forma
ligados a esses preceitos, conta com 192 parlamentares (40% do Congresso). "Não são somente eles que são conservadores. Eles vocalizam
boa parte do que a população brasileira pensa sobre aborto, direitos das
mulheres e de homossexuais", diz Vital. Frank Usarski, professor de ciências da religião da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), diz que, em comparação com a
Alemanha, por exemplo, o pluralismo das forças religiosas é menor no Brasil,
porém a influência da religião é maior. "O enraizamento das igrejas na
consciência e na realidade social dos brasileiros é maior", afirma o
especialista alemão.
Estado laico não é estado ateu!
Reza
o preâmbulo da constituição federal: “Nós, representantes do povo
brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um
Estado democrático (...) promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
Constituição da República Federativa do Brasil”. Em face deste preâmbulo,
formalmente constitucional e jurídico, uma vez que é parte integrante da
constituição federal, não há que se falar em Estado ateu ou propugnador do
laicismo absoluto, mesmo porque a própria Lex legum determina a
obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas públicas, com frequência
facultativa (Art. 210, § 1.º).E, dessa forma, as religiões ameaçam o Estado laico brasileiro,
como alerta o livro (Tendencioso e contra a religião)"Religião e política:
uma análise da atuação de parlamentares evangélicos sobre direitos das mulheres
e de LGBTs no Brasil". O estudo, de autoria dos pesquisadores Christina
Vital e Paulo Victor Leite Lopes, é fruto da parceria entre a Fundação Heinrich
Böll no Brasil e o Instituto de Estudos da Religião (Iser).Nele, os autores descrevem o avanço dos evangélicos na política na
década de 1980 e dizem que essa movimentação no campo político-religioso pelos
evangélicos "introduziu um empowerment de diferentes tradições
religiosas". Dessa forma, diz o texto, as igrejas passaram a reivindicar
um lugar para si a fim de ampliarem a influência de suas denominações, tradições
e valores.
Cerca de metade dos deputados pentecostais é composta por
pastores, cantores gospel e parentes de líderes de igrejas, tele-evangelistas e
donos de emissoras de rádio e TV. E, para serem eleitos, eles dependem do apoio
eleitoral de pastores e líderes das igrejas.Essa dependência reforça o caráter corporativista e
moralista de seus mandatos e seu compromisso de atuarem como despachantes de
igreja", opina Ricardo Mariano, professor de sociologia da PUC do Rio
Grande do Sul (PUC-RS), em artigo recentemente publicado pela Revista de História. Mas um equilibro das forças, mesmo que religiosas, é
bem visto no palco político nacional. "É bom que diminua o poder dos católicos,
mas que não se substitua um equívoco por outro que seria a luta de algumas
religiões evangélicas contra a predominância católica", destaca Ubirajara
Calmon, professor aposentado de ética e teologia da Universidade de Brasília
(UnB).
Fonte: O Povo on line
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