A crítica comum: "a República brasileira não nasceu de ideais elevados, nem de vontade popular. Nasceu de um golpe militar, articulado por oficiais insatisfeitos, elites econômicas magoadas e grupos positivistas que sonhavam com uma “ditadura modernizante”, isso mesmo, uma ditadura conduzida por uma elite supostamente superior, inspirada por Auguste Comte. A monarquia não caiu por pressão do povo, mas por vaidade, ressentimento e disputas internas. O povo não foi consultado, não participou e sequer compreendeu o que estava acontecendo. A verdade é simples e dura: o Brasil trocou um regime estável por uma república improvisada, construída sem plano, sem legitimidade popular e sem responsabilidade histórica. E pagamos o preço dessa escolha até hoje."
República: O Caminho Histórico da Democracia Brasileira
Por que, apesar de suas imperfeições, a República é superior
ao regime monárquico — e essencial para a liberdade, a cidadania e a soberania
do povo brasileiro.
É verdade que a Proclamação da República, em 1889, não foi
um movimento popular grandioso, tampouco inaugurou um regime perfeito. Mas
reduzir a República brasileira a um “golpe improvisado” e, simultaneamente,
idealizar a monarquia como a expressão máxima da ordem e da estabilidade é um
anacronismo histórico que ignora os avanços civilizatórios possibilitados pela
democracia republicana.
Podemos — e devemos — ter gratidão por personagens do
Império, como D. Pedro II, José Bonifácio ou a Princesa Isabel, reconhecendo
seus méritos e relevância. Ainda assim, isso não nos obriga a romantizar uma
estrutura política hereditária, restritiva e excludente, que jamais poderia ter
conduzido o Brasil à plena cidadania.
A República não nasceu perfeita, mas nasceu aberta a corrigir-se! E é essa abertura que transformou o país em uma nação de cidadãos, e não de súditos.
A Monarquia Brasileira: Estabilidade com Exclusão
Embora frequentemente lembrada como um período de aparente
estabilidade, a monarquia brasileira era, na prática, um regime essencialmente
oligárquico:
-Poder
concentrado em uma única família, sem alternância real.
-Voto
censitário, restrito aos mais ricos e instruídos.
-Ausência
de participação popular: pobres, mulheres, analfabetos e recém-libertos não
tinham qualquer voz política.
Falar de “legitimidade popular” da monarquia é, portanto,
historicamente incorreto: o povo não governava.
A Herança Escravocrata: A Monarquia e a Exclusão
Estrutural
A monarquia brasileira foi o regime que sustentou a
escravidão até seu último momento:
-A abolição aconteceu tardiamente, em 1888 por pressão internacional e não por iniciativa da Monarquia.
-Foi realizada sem políticas de integração social. Deixou milhões de libertos à própria sorte, gerando desigualdades duradouras que perduram até hoje.
Ignorar esse fato para exaltar a suposta “estabilidade
imperial” é ignorar a base social que sustentou tal estabilidade.
A República: Abertura Política e Caminho para a
Democracia
Mesmo com limitações em sua origem, a República trouxe
conquistas impossíveis no Império:
-Alternância
de poder.
-Caminho
para o voto universal.
-Liberdade
de imprensa.
-Instituições
independentes.
-Participação
política crescente da sociedade civil.
-Possibilidade
real de qualquer brasileiro ascender ao poder, sem depender de linhagem.
A República instituiu o princípio democrático fundamental:
"Ninguém governa por direito hereditário, mas por
legitimidade popular."
A República como Processo, Não como Evento
O 15 de Novembro não foi o fim, mas o início de um processo:
-Houve
crises, rupturas e períodos autoritários.
-Houve
reconstruções democráticas e avanços constantes.
-A
sociedade civil assumiu papel decisivo na defesa das liberdades.
A República é, por natureza, um projeto em permanente
aperfeiçoamento.
Conclusão
Valorizar a República não significa apagar ou desmerecer o
legado de grandes personagens do Império, muitos dos quais contribuíram para a
formação do Estado brasileiro. Mas reconhecer esses méritos não implica
romantizar um regime que concentrava poder em uma dinastia, restringia a
participação política e sustentou a escravidão até seu último dia.
A República não nasceu perfeita; nasceu possível.E é justamente nessa possibilidade — de transformação, de inclusão, de revisão e de reinvenção — que reside sua superioridade.
Enquanto a monarquia se apoiava na continuidade hereditária,
a República se fundamenta na legitimidade popular, na alternância de
lideranças, na abertura ao debate e na ideia de que o destino político de um
país não deve ser determinado pelo berço, mas pela vontade do povo.
É na República que o Brasil encontrou:
-Espaço participativo para ampliar direitos civis e políticos;
-Condições
para expandir a educação e a cidadania;
-Instrumentos
para responsabilizar governantes e corrigir rumos;
-A compreensão de que o país pertence a todos, não a uma família de perfeitos e iluminados.
Defender a República é defender a liberdade, a igualdade de
oportunidades e a dignidade humana. É assumir que aprendemos com a história e
que queremos construir um futuro em que o poder não deriva de sobrenome, mas de
legitimidade democrática.
A República é o regime que permite autocrítica, evolução, renovação e reconstrução.E sempre que o país se desviou desse caminho, foi a própria lógica republicana — apoiada pela sociedade civil — que restaurou a democracia.
Por isso, afirmar a superioridade da República não é negar o passado: é escolher o futuro.É reafirmar que o Brasil pertence ao povo soberano.E que somente a República — com todos os seus desafios — pode garantir que cada brasileiro seja verdadeiramente parte do destino da nação.
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