(Paraisópoles) |
Não há livro didático
ou reportagem sobre concentração de renda que não exiba a foto da favela de
Paraisópolis ao lado de um prédio de apartamentos de luxo no Morumbi, em São
Paulo. A foto ilustra, como nenhuma outra, o fato de tantos terem tão pouco e
tão poucos terem tanto. Mas esconde, na verdade, uma excelente notícia.Quando
jornalistas ou autores de provas do ENEM escolhem a foto de Paraisópolis para
retratar a desigualdade social, costumar comparar a riqueza dos apartamentos
com a miséria da favela. No entanto, a comparação mais adequada é a dos
moradores da favela hoje e no passado, antes de se mudarem para a metrópole.
Não foram os moradores dos apartamentos do Morumbi que criaram a miséria de
Paraisópolis — pelo contrário, eles ajudaram a diminuí-la, e muitos deles
próprios,moradores da favela, são netos ou bisnetos de gente ainda mais paupérrima.
Que o Brasil é um dos países com uma
das maiores desigualdades sociais todo mundo, já se sabe. Passamos a juventude
ouvindo isso do professor de geografia ou durante a propaganda eleitoral na TV.
O que pouco se discute é por que o país
é assim? Qual a origem de tanta concentração de renda no Brasil?
A resposta a essa
pergunta costuma vir em tom moralizante. Culpamos a nós mesmos — a nossa
história, a nossa sociedade — por irmos tão mal no ranking da igualdade. "A
opressão das “zilitis” patriarcais, a manutenção de terríveis arcaísmos, os
baixos salários pagos pelas grandes empresas, a colonização, a escravidão, etc,
etc.”são explicações que atribuem a algum inimigo imaginário —
geralmente os ricos — a culpa pela má situação dos pobres, mas será que é só única
e exclusivamente, isto mesmo?
Na verdade, as origens
da desigualdade de renda no Brasil estão muito longe das "crueldades"
do capitalismo ou das maldades de uma classe social. Nem todos os motores de
concentração de renda no Brasil são evitáveis, e dois deles, ao contrário do
que muitos sociólogos presos a jargões de militâncias dizem, são até mesmo
motivo de orgulho para os brasileiros:
1)-O Brasil é desigual por causa do Livre Mercado
Se você perguntar a um sociólogo ou economista da Unicamp quais são as causas da desigualdade no Brasil, ele vai despejar automaticamente frases sobre a "a ação do livre mercado, e a exclusão causada pelo capital". Essa visão, na verdade, está correta, porém, não está completa. É claro que o capitalismo e o mercado causam desigualdades.
O
que os economistas chamam de mercado nada mais é do que a reunião de pessoas
interessadas em trocar bens entre si. E as pessoas têm interesses, preferências
e necessidades diferentes. Essa diversidade de preferências faz a renda se
concentrar.
Isso fica claro num
exercício de imaginação:Suponha que, de repente, todo o dinheiro do Brasil
seja dividido igualmente entre todos os brasileiros. Numa parceria entre governo e empresários, acabam por dar um emprego ou fonte de
renda a todos que precisam, uma casa quitada,um meio de transporte, liquidam-se todas suas
dívidas e de quebra, o Banco Central faz uma transferência de verba direta para estes cidadãos, depositando uma quantia igual na Conta Poupança de todos.De um
dia para o outro, nos tornamos um país mais igualitário que a Noruega; o
coeficiente de Gini cai a zero.O banqueiro Joseph Safra e o cobrador de
ônibus acordam com um mesmo patrimônio.
Agora imagine que, no dia seguinte
a essa revolução igualitária, surge na internet um canal de humor. Os
humoristas escrevem roteiros geniais. Os
vídeos que eles lançam logo geram comentários e milhões de visualizações. Ao
clicarem várias vezes neste link de humor os brasileiros dão mais dinheiro a
esse grupo de humoristas que a outros, criando a desigualdade no mercado de
humor pela internet.
O Canal de humor ficaria
com a maior parte da verba destinada a canais de comédia do YouTube, sem falar
nos anunciantes que, por vontade própria, decidirão usar sua parte da renda
dividida igualmente entre os brasileiros para contratá-los como
garotos-propaganda. E neste caso meramente exemplar, a situação inicial, em que
todos os brasileiros tinham a mesma renda, terá desaparecido, concorda? Os
humoristas fizeram apenas o seu trabalho, não oprimiram ninguém ao aumentar
esta desigualdade. Pelo contrário, eles tornaram a vida mais divertida e foram
remunerados justamente por seu talento.
Deveriam
os brasileiros, para preservar a igualdade nacional, serem proibidos de
assistir aos vídeos deste canal de humor? e obrigados a assistir a alguns sem
graça apenas para manter a igualdade? Não, os brasileiros são livres para
assistir ao que quiserem, e essa liberdade gera concentração e acúmulo de renda.
Do mesmo modo, o mais
comunista dos fãs de Música Popular Brasileira está disposto a pagar um bom
punhado de reais para assistir a um show do Chico Buarque. Mas não iria a um show
musical de outro ícone da esquerda como Jessié Souza com os arranjos de Frei
Betto, cantando os grandes sucessos de Kelly Key, mas nem que lhe pagassem a entrada
para isso. Ao escolher pagar a uns artistas mais que a outros, o mais comunista
dos apreciadores de MPB está aumentando a desigualdade no mercado da música.
Deveríamos proibi-lo de tomar essa decisão? Deveria o governo obrigar o rapaz a
pagar por um show do Chico Buarque o mesmo que pagaria a qualquer nome da esquerda,mesmo sem talento para música, tentando cantar
"Baba, baby, baba"? Muitos talvez até até quereriam, mas isso seria injusto. As
pessoas são livres para tomar decisões que aumentam a desigualdade.
Nesses exemplos acima,
eu peguei emprestado o "argumento Wilt Chamberlain" que o filósofo
Robert Nozick formulou no livro Anarquia, Estado e Utopia, de 1974.(Nova Iorque, 16 de
novembro de 1938 — 23 de janeiro de 2002) que foi um proeminente filósofo
norte-americano e professor da Universidade Harvard. Ele elaborou uma análise
inovadora em matéria de filosofia política, recebendo por isso o National Book
Award, dentre inúmeros prêmios. Nozick contestou as teses políticas
sociais liberais, socialistas e conservadoras, e expôs uma nova teoria sobre
justiça distributiva, um modelo utópico de Estado que se presta à
experimentação sob o novo conceito de Estado mínimo, assim como uma proposta de
integração entre ética, filosofia e economia. Nozick questionou os atos e a legitimidade do Estado moderno, que
utiliza seu aparato coercitivo-jurídico para forçar o indivíduo e violar seus
direitos. Não poupou críticas ao governo
liberal nem ao socialista ou ao conservador, que disse desrespeitarem o
contrato social de que são parte em detrimento das liberdades inerentes ao
homem.Ele desenvolveu ainda outros trabalhos, menos influentes, nas
áreas de epistemologia e teoria da decisão. A sua obra “Anarquia, Estado e
Utopia”, de 1974, foi uma resposta libertária à Uma Teoria da Justiça de
John Rawls, publicada em 1971, na qual utiliza o
artifício da “situação inicial” ou “posição original” como base para construir
sua ideia de justiça equitativa. Esses
dois termos servem de alusão ao estado de natureza que a teoria contratualista
esboça. No entanto, ele almeja uma finalidade distinta da qual, geralmente, as
teorias do contrato social pretendem. Utilizando o artifício da “posição
original”, Rawls não pretende delinear como a sociedade ou o estado foram
estabelecidos, mas, especular como os princípios de justiça são escolhidos
nessa situação inicial hipotética da sociedade. Esses princípios servem
justamente como estrutura básica das instituições políticas, eles operam como
ordenadores dos acordos subsequentes. A posição original aqui serve como uma
situação hipotética que é caracterizada de modo a acarretar em uma determinada
concepção de justiça. Sendo assim, Rawls nos convida a imaginar a situação onde
os indivíduos entram em cooperação social. Desse modo, num único ato
conjunto, devem decidir os princípios, tal qual expomos acima. Para garantir que os sujeitos forneçam princípios para uma
justiça equitativa, o filósofo coloca os indivíduos sob o que ele chama de véu
da ignorância, característica essencial que todos nessa circunstância possuem. Isso significa dizer que eles não sabem e nem podem
saber nada sobre as situações que teriam vantagem ou desvantagem. O que Rawls quer dizer é que, sob o véu da ignorância os
indivíduos não tem informação alguma sobre sua riqueza, sobre sua cor, seu
sexo, suas capacidades biológicas ou mentais, sob a situação que vai nascer, ou
a religião e preferenciais morais que vai possuir, etc. Sendo assim, os
indivíduos não escolheriam princípios de modo parcial, que favorecessem apenas
seus interesses individuais. Nesses termos, Rawls estabelece uma
situação equitativa entre os indivíduos. Tendo feito isso, os princípios que
serão selecionados nesse contexto também, serão equitativos.
O caso é o similar:
O caso é o similar:
Imagine que todo o dinheiro do país
é dividido igualmente entre os cidadãos, e imagine que o jogador de basquete
Wilt Chamberlain assina um contrato para jogar numa partida cobrando mais que
os outros jogadores. Como Wilt Chamberlain é um gênio do basquete, muitas
pessoas exerceriam seu livre direito de escolha e aceitariam pagar mais para
assisti-lo ao vivo. A situação inicial, de igualdade total entre os cidadãos,
não seria estável numa sociedade livre, pois, como Nozick arrematou, liberty
upsets patterns. A liberdade perturba padrões.
A livre-iniciativa
torna o Brasil e todos os países do mundo desiguais, mas ela sozinha não é suficiente
para explicar por que somos campeões mundiais nessa modalidade. A concentração
de renda tem causas além das forças do mercado.
2)-O Brasil é desigual porque é "diverso e multiétnico"
A história do livro A
Jangada de Pedra gira em torno de um episódio descomunal:
"O
território de Portugal e Espanha se separa do resto da Europa e passa a vagar
pelo oceano Atlântico. A Península Ibérica se afastou de repente, toda por
inteiro e por igual...abriram-se os Pireneus de cima a baixo como se um machado
invisível tivesse descido das alturas", conta José Saramago.
É interessante imaginar
uma continuação desse estranho fenômeno. Digamos que a Península Ibérica,
pairando sobre o Atlântico, comece a atrair o território de outros países. A
Dinamarca é o primeiro. A ponte que liga Copenhague à Suécia de repente se
rompe; o território dinamarquês se desprende também do norte da Alemanha,
atravessa o mar do Norte e encontra portugueses e espanhóis no Atlântico. Na
costa oriental da África, Quênia e Tanzânia têm o mesmo destino. Os dois países
se desprendem da África, contornam o cabo da Boa Esperança, sobem o Atlântico e
se fundem aos três outros separatistas. Teríamos assim um novo país, que
agruparia no mesmo território mais de 150 milhões de habitantes da Dinamarca,
Espanha, Portugal, Quênia e Tanzânia.
Se os dinamarqueses,
sempre atentos à concentração de renda, começassem a medi-la nesse novo país,
constatariam estar vivendo numa sociedade muito mais desigual. Não
apenas teriam, entre seus conterrâneos, quenianos e tanzanianos, alguns dos
cidadãos mais pobres do mundo, como também 400 mil novos milionários espanhóis
e portugueses, bem mais endinheirados que o dinamarquês médio. A taxa
de desigualdade iria às alturas, ainda que fosse meio injusto lamentar esse
efeito estatístico, pois sociedades obviamente diferentes haviam sido agrupadas
de supetão no mesmo território. No meio desse novo país, um grupo só dos
dinamarqueses continuaria tão igualitário quanto antes. E as cidades que
concentrassem todos os tipos de moradores seriam as mais desiguais.
Um
fenômeno como esse — não o movimento acelerado de placas tectônicas, mas a
mistura de povos diversos num grande país — explica boa parte da desigualdade
de renda do Brasil. Uma causa importante da desigualdade brasileira é uma das
qualidades que nos dá orgulho: a mistura de povos e culturas.
O fato de tribos indígenas
e imigrantes suíços donos do Burger King conviverem dentro das mesmas linhas
imaginárias empurra a estatística para cima. Se eu estiver certo, preciso
provar que há uma Dinamarca incrustada no território brasileiro. Pois ela
existe, fica no Rio Grande do Sul. Das quinze cidades mais igualitárias do
Brasil, doze são gaúchas de origem alemã.
AS CIDADES MAIS IGUALITÁRIAS DO BRASIL
1. São José do
Hortêncio (RS) 0,28
2. Botuverá (SC) 0,28
3. Alto Feliz (RS) 0,29
4. São Vendelino (RS)
0,29
5. Vale Real (RS) 0,29
6. Santa Maria do
Herval (RS) 0,30
7. Tupandi (RS) 0,31
8. Campestre da Serra
(RS) 0,31
9. Nova Pádua (RS) 0,32
10. Córrego Fundo (MG)
0,32
11. Santa Rosa de Lima
(SC) 0,32
12. Picada Café (RS)
0,32
13. Presidente Lucena
(RS) 0,32
14. Vila Flores (RS)
0,32
15. Morro Reuter (RS)
0,32
A
cidade com a renda mais distribuída do país, São José do Hortêncio, tem um
índice de Gini de 0,28, abaixo dos 0,29 da Dinamarca.
Não houve nessas
cidades nenhuma política pública de redução de desigualdade, nenhum imposto
sobre fortunas ou coisa parecida. O que explica a igualdade por lá é
simplesmente a semelhança entre os cidadãos. A semelhança entre os moradores
explica a igualdade escandinava. Assim como os dinamarqueses, quase todos ali
têm a mesma origem cultural, o mesmo nível de educação. E muitos têm
origem luterana, como os dinamarqueses, o que historicamente contribuiu para a
igualdade.
"Comunidades
protestantes trabalharam para difundir educação que garantiria que todos
pudessem ler a Bíblia, o que tanto aumentou o nível de educação quanto diminuiu
sua variação", diz o economista Edward Glaeser.
Portanto, se você procura igualdade, pense em locais onde a
população é homogênea:
Cidades habitadas
somente por sertanejos pobres ou somente por descendentes de alemães. Pessoas
com a mesma origem e cultura. Caatiba, na Bahia, é tão igualitária quanto
Portugal ou o Japão (Gini 0,39), pois Caatiba reúne só um tipo de moradores –
famílias pobres de pequenos criadores de gado.
Em
contrapartida, para achar os locais com maior desigualdade de renda, é preciso
mirar nas cidades em que grupos bem diferentes moram juntos.
É o caso das capitais,
que atraem tanto o João Paulo Diniz, herdeiro da rede de supermercados Pão de
Açúcar, quanto o ex-boia-fria que sonha em ganhar mil reais por mês como jardineiro
do João Paulo Diniz. Mesmo Florianópolis e Curitiba, as duas
capitais mais igualitárias do Brasil, estão acima da média nacional de
desigualdade. No entanto, por causa da classe média expressiva, as
capitais não são as campeãs nesse quesito. As cidades mais desiguais são aquelas que
reúnem um pedaço da Dinamarca, outro do Quênia e só. É o caso de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, a cidade
brasileira mais desigual. Com um
índice de Gini de 0,80, ela supera de longe Seychelles, o país com renda mais
concentrada no mundo (0,65).
O motivo?
Em São Gabriel da
Cachoeira há apenas dois tipos de moradores: mais de
400 tribos indígenas, que formam 74% da população e não têm renda formal, e
militares, médicos e outros agentes federais muito bem pagos. De fronteira com a Venezuela e a Colômbia, São
Gabriel da Cachoeira é sede de batalhões e órgãos federais de vigilância. A
cidade prova, como nenhuma outra, o impacto da diversidade cultural sobre a
desigualdade econômica.
"Em
países particularmente igualitários, como os da Escandinávia, a população tem
geralmente um bom nível educacional escolar, e a distribuição de qualificação
bem compacta, afirma o economista Edward Glaeser. Já países particularmente
desiguais e em desenvolvimento, como o Brasil, são enormemente heterogêneos nos
níveis de qualificação entre elites urbanas bem-educadas e trabalhadores do
campo com pouca ou quase nenhuma formação escolar”
Talvez a miscigenação
atue ainda de outra maneira. Provavelmente por vantagens evolutivas da
lealdade de grupo, as pessoas tendem a contribuir mais com quem se parece com
elas ou pertence à mesma identidade coletiva. Palmeirenses ficam mais
contrariados com o dinheiro público gasto no Itaquerão que os corintianos. O
economista Erzo Luttmer mostrou, em 2001, que, nos Estados Unidos, o valor dos
programas de redistribuição de renda é menor nos estados onde a população é
mais diversa.
"Se
indivíduos preferem contribuir para sua própria raça, etnia ou grupo religioso,
eles optam por menos redistribuição quando membros de seu grupo constituem uma
parte menor dos beneficiários, diz Luttmer. Com o
aumento da diversidade, a porção de beneficiários que pertencem a um grupo
diminui em média. Então o apoio médio para redistribuição cai se a
diversidade aumenta."
Isso leva a uma conclusão
impressionante. Não foi o estado de bem-estar social que possibilitou a
igualdade da Dinamarca, mas o contrário: a semelhança entre os
cidadãos escandinavos possibilitou o estado de bem-estar social. Quem
quer um Brasil com um índice escandinavo de igualdade precisa torcer para que
algum fenômeno a la Saramago divida o país em diversos territórios.
Uma
alternativa é deixar de ligar tanto para a estatística de desigualdade — e
desfrutar a diversidade e a miscigenação que definem o Brasil.
3)-O Brasil é desigual porque as famílias pobres tem muito
mais filhos que as ricas
Não queremos propor
esterilização dos pobres, mas é preciso educar para a paternidade responsável,
pois um motor importante (e pouco lembrado) da desigualdade e da miséria no
Brasil é a demografia. O fato de, por um longo período, mulheres
pobres terem tido mais filhos que mulheres ricas elevou a estatística da
desigualdade. Nos anos 1970, a diferença era enorme: cada mulher pouco
escolarizada tinha, em média, 4,5 filhos a mais que as escolarizadas. Em 2005,
o motor tem uma potência menor (diferença de 1,6), mas continua ligado.
"Os
pobres não apenas têm menores salários que os ricos, mas
também, dividem esse salário entre mais indivíduos, resultando em maior desigualdade
de renda per capita, dizem os economistas Ricardo Hausmann e Miguel
Székely em um estudo sobre fecundidade e desigualdade na América Latina”.
Trata-se de simples aritmética:
A renda per capita, como diz o
nome, é calculada pelo número de cabeças.
Um casal que ganha 1.400 reais e tem três filhos resulta numa renda per capita
de 280 reais. Se o mesmo casal tivesse cinco filhos, a renda per capita
cairia para 200 reais. Isso, é claro, se o casal continuar ganhando 1.400
reais. Infelizmente, há muitas chances de a renda diminuir com o aumento da
família.
Filhos exigem tempo, e tempo
que os pais poderiam gastar trabalhando. Mais filhos significam menos chances
(sobretudo entre as mães) para trabalhar e ganhar dinheiro. Esse efeito
é maior em mulheres com salário baixo, que têm menor custo de oportunidade (ou
seja, perdem pouco se decidirem largar o trabalho para ficar em casa cuidando
das crianças).
Além disso, mais filhos
significam mais gastos — e menos dinheiro para investir na educação de cada um.
"O
número de filhos que um casal decide ter possui forte relação com o nível de
educação que os pais conseguirão fornecer aos filhos", dizem Hausmann e
Szekely. Cada criança começará a vida com uma parte menor da renda dos
pais e com menor escolaridade. Um estudo de 2014 mostra que até 40% da queda da
desigualdade de renda são explicados pela queda na desigualdade de
escolaridade. Fica ainda pior. Crianças com pouca escolaridade, quando crescerem, vão
concorrer no mercado por vagas de pouca qualificação, aumentando a oferta de
trabalhadores não qualificados. Uma
vez que salários, assim como qualquer preço, são definidos pela oferta e
procura, o salário de pessoas não qualificadas vai cair,
aumentando a diferença de renda entre pouco e muito qualificadas. O maior número de filhos ainda resulta em uma
poupança menor — e um país com menos economias tem menos capacidade de
investimento.
Por outro lado, se você
tem menos filhos, pode investir mais na educação de cada um deles, quem sabe
pagar um intercâmbio para a Inglaterra quando o rapaz chegar à adolescência. Se
menos jovens bem qualificados aparecem no mercado, cai a oferta de empregados
para vagas mais qualificadas; devido à oferta e à procura, o salário nessas
áreas sobe. Em 1973, o economista Carlos Langoni mostrou
que, se a economia cresce muito rápido, a baixa educação dos cidadãos se torna
um motor potente de desigualdade. Com
muitas empresas à procura de funcionários, os poucos candidatos qualificados
viram uma mercadoria tão escassa quanto casa de praia durante a temporada. O
salário deles sobe muito mais que o dos menos educados, aumentando a
desigualdade.
Resumindo: pobres, em
geral, dividem a renda com mais indivíduos e educam menos os filhos,
contribuindo para oferta maior (e menores salários) de trabalhadores pouco
qualificados; ricos dividem a renda com menos filhos e conseguem dar uma melhor
educação a eles, contribuindo para não aumentar a oferta (e garantindo maiores
salários) de pessoas bem qualificadas.
O
poder dessa máquina de desigualdade já foi calculado. Em 2010, 45,2% dos
brasileiros eram donos de apenas 10% da renda do país, enquanto 5,9% dos
brasileiros ficavam com 40% da renda.
Como seriam esses
números se a fecundidade de 1980 tivesse permanecido estável até 2010? Teríamos
mais pobres dividindo os mesmos 10% e menos ricos desfrutando os 40% da renda
nacional. "Se a natalidade não tivesse caído, as proporções comparáveis
seriam de 62% e 4,1%, respectivamente", diz a pesquisadora Ana
Amélia Camarano, do Ipea.
O demógrafo Jerônimo
Muniz, da UFMG, tem estudos similares. Ele calculou o que aconteceria com a
desigualdade social no Brasil entre 1990 e 2000 se todas as variáveis, com
exceção da demografia, ficassem constantes. Em 1990, a diferença de fecundidade
entre mulheres pobres e ricas era bem menor que nas décadas anteriores, mas ainda
existia. "Se a demografia fosse o único componente do cálculo, a proporção
de pobres aumentaria 28% entre 1990 e 2000. Isso corresponderia a 42% da
população. Já a desigualdade seria até 40% maior", diz Muniz.
Por
causa da estabilidade da moeda e o crescimento (ainda que pequeno) da economia,
houve um movimento modesto na direção contrária: a pobreza caiu 9% entre 1990 e
2000.
Estaria eu culpando a vítima ao dizer que as mulheres de
classe baixa são responsáveis pela alta desigualdade do Brasil?
Nunca me esqueço de uma
vizinha da minha mãe que pagava menos de um salário mínimo para a empregada e não
se cansava de dizer que os pobres eram pobres porque nada faziam além de ter
filhos. Não: culpa não é um conceito que funciona bem em economia. Os
pobres provavelmente ficaram presos numa armadilha: sem dinheiro e informação,
tiveram muitos filhos, o que os deixou com ainda menos dinheiro e informação.
Não é correto culpar os pobres nem os ricos pela
desigualdade !
Basta entender que é a demografia, e não tanto a opressão das grandes empresas e
do capitalismo, que explica boa parte da concentração de renda
no Brasil.
4)-O Brasil é desigual porque o estado esculhamba o país
Uma opinião comum nas
discussões sobre economia é que, se o governo deixar, as grandes corporações
vão avançar sobre os pequenos empresários e os ricos concentrarão toda a renda
do país.
Não, pasme! é o contrário!!!
Grandes empresas
recorrem a políticos para se tornarem monopólios. Empresários já estabelecidos em
um negócio pressionam o governo para aumentar regras e exigências, dificultando
a vida de possíveis concorrentes. Leis urbanísticas protegem o
patrimônio dos ricos contra a desvalorização. E os brasileiros de classe A são
quem mais recebe dinheiro público.
Quem diz isso é um cara
de esquerda, o economista Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de 2001. No livro O
Preço da Desigualdade, Stiglitz dedica todo um capítulo sobre ações do governo
que deixam os pobres mais pobres e os ricos mais ricos. Seu principal alvo é o
rent-seeking — a arte de conseguir benefícios e privilégios não pelo mercado,
mas pela política.
O “rent-seeking” tem várias formas:
a)-Transferências
ocultas ou abertas de subsídios do governo,
b)-Leis que tornam o
mercado menos competitivo,
c)-Leniência com as
leis de proteção da competição,
d)-Regras que permitem
às corporações tirar vantagem dos outros ou transferir custos para a sociedade.
Stiglitz diz que a
América Latina é rica em privilégio a grandes empresas — e ele está certíssimo.
Dos casos recentes da política brasileira, o exemplo mais bem-acabado é o da
Braskem, a maior petroquímica brasileira. A Braskem é a única fabricante
nacional de diversas resinas plásticas usadas na fabricação de brinquedos,
embalagens, cadeiras de plástico, carpetes, seringas, peças de carros e
eletrodomésticos, tubos, canos — enfim, de quase tudo. Na média mundial, o imposto de
importação de resinas é de 7%. No Brasil, era de 14%, mas em 2012 a presidente
Dilma elevou a taxa para 20%. Na época, o aumento causou revolta, pois
reverberaria em toda a cadeia de produtos plásticos made in Brazil.
"A
iniciativa beneficiará somente um monopólio instalado no país, o da Braskem,
prejudicando toda uma cadeia produtiva e, o que é mais grave, os consumidores
pagarão a conta", escreveu José Ricardo Roriz Coelho, então presidente da
Associação Brasileira da Indústria do Plástico.
Com os concorrentes
estrangeiros fora do páreo, a Braskem pôde cobrar mais pelas resinas que vendia
a 12 mil fábricas brasileiras. Entre janeiro de 2013 e fevereiro de 2014, o
aumento dos produtos da empresa foi de 27,6%. Agora, adivinha quem controla a
Braskem? Nada menos que a Odebrecht, empresa envolvida até a alma em escândalos
de corrupção e propinas para o partido no poder. Durante a operação
Lava Jato, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto
Yousseff disseram que a Braskem pagava propina em troca maiores lucros em
contratos com a Petrobras.
5)-Outros motores estatais de desigualdade não são tão
fáceis de perceber
As leis urbanísticas,
por exemplo. Em muitas cidades brasileiras, a prefeitura impõe um limite de
área construída em relação à área do terreno. É por isso que o Brasil não tem
prédios com mais de cem andares, como em qualquer lugar civilizado. A regulação
urbanística cria uma escassez artificial de espaço urbano, empurrando o preço
para cima.
Esse
fenômeno não é exclusividade do Brasil. Leis que dificultam a construção de
prédios aumentam o preço dos imóveis em 800% na cidade de Londres e em 300% nas
metrópoles Paris e Milão.
A principal tese do
francês Thomas Piketty, autor de O Capital no Século 21, é que o retorno sobre
o capital vem crescendo em relação ao retorno sobre o trabalho. Está
valendo mais a pena viver de renda que do trabalho. Por que isso
acontece? Para o norte-americano Matthew Rognlie, estudante de economia de 26
anos que virou o anti-Piketty, as leis de zoneamento são um dos motivos.
"Quem
está preocupado com a distribuição de renda precisa ficar atento aos custos de
moradia", escreveu ele. Com a escassez artificial
de espaço, quem tem imóveis fica ainda mais rico, enquanto os que estão lutando
para comprar um imóvel precisam contrair uma dívida maior para realizar o sonho
da casa própria. O de cima sobe e o de baixo desce, como dizia aquele
axé da banda As Meninas.
Há ainda a inflação.
Quando as notas de real se desvalorizam, ricos correm para aplicações bancárias
atreladas ao reajuste dos preços. Quanto mais dinheiro, melhor a proteção, já
que investimentos de grande volume costumam ser remunerados com taxas melhores.
Já os pobres não conseguem se proteger tão bem. Alguns não se protegem
nada: 55 milhões de brasileiros nem sequer têm uma simples caderneta de
poupança. Quando o governo descuida da estabilidade da
moeda, atinge em cheio os mais pobres.
O leitor já deve estar
assustado com o poder do governo de concentrar a renda — e olha que ainda nem
chegamos ao principal motor de desigualdade do Brasil. É este aqui:
A
aposentadoria integral de funcionários públicos e as pensões especiais.
Um estudo recente e
enfático sobre isso é "Gasto Público, Tributos e Desigualdade de Renda no
Brasil", de Marcelo Medeiros e Pedro Souza, pesquisadores do Ipea. Eles
analisaram todas as movimentações financeiras do governo brasileiro e
calcularam o impacto de cada tipo de transação no coeficiente de Gini
brasileiro. A conclusão é de assustar:
Cerca
de um terço da desigualdade total pode ser diretamente
relacionado às transferências de renda e aos pagamentos feitos pelo Estado aos
indivíduos e às famílias, mesmo depois de considerarmos os efeitos
progressivos dos tributos diretos e das contribuições.
Como é possível o
estado aumentar a desigualdade se toda hora vemos na TV o Bolsa Família e
outras ações públicas de assistência aos pobres?
A
resposta é que, ao mesmo tempo em que propagandeia a
transferência de dinheiro para os pobres, o governo brasileiro mantém Bolsas
Famílias ao contrário: programas que tiram dos pobres para dar aos ricos
e ao governo.
"A
pobreza urbana não deveria ser comparada à riqueza urbana", diz o economista
Edward Glaeser, professor de Harvard e o mais celebrado especialista em
economia das cidades.
"As
favelas do Rio de Janeiro parecem terríveis se comparadas a bairros prósperos
de Chicago, mas os índices de pobreza no Rio são bem menores que no interior do
Nordeste brasileiro."
Quem mora em
Paraisópolis vive muito melhor do que se houvesse permanecido no sertão nordestino,
nas lavouras de boias-frias do Paraná ou entre os escombros do Haiti.
Não importa se a miséria está mais aparente ou mais próxima; o principal é que,
para os miseráveis, ela tenha diminuído. Como arremata o economista Glaeser:
"A
pobreza urbana não deveria envergonhar as cidades. As cidades não criam pobres.
Elas atraem pobres. Elas atraem pobres justamente porque fornecem o que eles
mais precisam — oportunidade econômica."
6)-Estamos falando de desigualdade ou de pobreza?
Com frequência, esses
dois problemas se confundem nesse tipo de discussão:
1)-Pobreza diz respeito às
condições absolutas em que alguém se encontra. Tem comida? Acesso a água
potável? Habitação? Trabalho? Seus filhos podem frequentar uma escola ou se
veem forçados a trabalhar? Os critérios são muitos.
2)-Já desigualdade é
uma variável relativa, que nada diz sobre as condições absolutas de vida. Para saber se um país
é desigual, é preciso comparar seus habitantes mais ricos e mais pobres e ver a
distância entre eles. Um país que tenha uma pequena parcela de milionários e o
restante da população passe fome é muito desigual. Já um onde todos passem fome é
igualitário. A condição objetiva dos pobres em ambos, contudo, é a
mesma.
Para
entender melhor o conceito de desigualdade: se os mais pobres viverem como
milionários, e os mais ricos sejam uma pequena parcela de trilionários, a
desigualdade também, é grande.
As duas coisas, pobreza
e desigualdade, se confundem facilmente, de modo que muita gente que se
preocupa com a pobreza (com quem não tem, por exemplo, acesso a saneamento
básico ou a educação) acaba falando de desigualdade: da diferença
entre os mais ricos e os mais pobres. E essa confusão muda a maneira de
pensar: pobreza e desigualdade acabam se tornando a mesma coisa, de modo que o
melhor remédio contra a pobreza seria a redução da desigualdade, o que
via de regra significa tirar de quem tem mais e dar para quem tem menos. Consequentemente,
aqueles que se dizem preocupados com a desigualdade frequentemente começam a
discorrer sobre como a situação está ruim para os mais pobres.
Aparentemente,
tais pessoas presumem que uma desigualdade crescente deve significar que os
ricos estão enriquecendo e os pobres, empobrecendo, é jargão, mas não
corresponde a realidade.
Mais especificamente,
alguns parecem acreditar que os pobres estão mais pobres porque os ricos estão
mais ricos. Isto é, eles supõem que a economia seja um jogo de soma-zero, de
modo que:
Se
alguns estão mais ricos, esta opulência só pode ter vindo dos pobres, isto
seria plausível se o número populacional tivesse permanecido estático e as mudanças
tivessem sido somente na ordem de valores distribuídos entre este mesmo número
populacional de pobres e ricos.
Sendo assim, limpe o
terreno, esclareça os termos e eleve o nível da conversa. Certifique-se de que
todos estejam falando a mesma coisa. Porque se estivermos
discutindo a pobreza, a evidência esmagadora é a de que, globalmente, a miséria
se reduziu dramaticamente nos últimos 25 anos, mesmo quadruplicando a
população. O capitalismo que gerou essa desigualdade é o mesmo
que hoje permite com que boa parte do mundo possa viver com uma qualidade de
vida muito melhor que a dos reis de antigamente. Hoje vivemos em condições melhores do que
praticamente qualquer pessoa do século XVIII. Sobre os pobres terem ficado mais
pobres, esta é uma conclusão que, como já dito, simplesmente não se sustenta.
Os pobres melhoraram seu padrão de vida nos últimos anos. Em outras palavras,
as pessoas e famílias que abrangem "os ricos" muda ano a ano. E o
mesmo ocorre para os 20% mais pobres.
Uma
fácil comprovação disso é você olhar a lista de bilionários da Forbes,
publicada anualmente. Praticamente todas as pessoas que figuravam na lista em
1987 — primeira vez em que ela foi publicada — não mais estão nela hoje. Isto
quer dizer que na realidade não aumentou a riqueza dos mesmos ricos, mas um
maior número de pessoas ficaram ricas.
Há um grande e controverso
debate entre economistas sobre quão fácil ou difícil é para uma pessoa que é
pobre em um dado ano ter maiores fluxos de renda nos anos seguintes. Este é o
debate. Que a mobilidade de renda realmente existe, isso não mais está em
questão. A conclusão é que você não pode falar sobre desigualdade sem, ao
menos, discutir o grau de mobilidade. Se o que incomoda as pessoas no que diz
respeito à desigualdade é a suposição de que os pobres estão estagnados ou
empobrecendo, então, explorar o grau em que isso é realmente verdade é
essencial à discussão.
7)- Estamos falando de desigualdade de renda, de riqueza ou
de consumo?
Aqueles preocupados com
desigualdade costumam confundir renda e riqueza nessas discussões. Salário é
renda, não riqueza:
a)-Riqueza se refere à soma de nossos ativos (dinheiro, imóveis,
terras, carros e outros bens) menos passivos (dívidas em geral e contas a
pagar). A riqueza é um estoque.
b)-Já renda é a variação líquida de nossa riqueza em um
dado período de tempo,
seja porque ganhamos um salário, um dividendo de uma ação, juros de uma
aplicação, ou aluguel do inquilino. A renda é um fluxo.
É
possível ter uma grande riqueza, mas uma renda baixa, como uma pessoa idosa que
vive só de sua magra pensão ou dos juros de sua poupança, mas que tem uma casa
totalmente quitada. Inversamente, alguém pode ter alta
renda e baixa riqueza financeira. Por exemplo, alguém que tem um alto
salário, mas gasta imediatamente tudo em bens de consumo.
Os dados serão
diferentes dependendo de estarmos falando de riqueza ou de renda.
8)-Desigualdade de consumo é uma outra possibilidade.
Trata-se da diferença
entre o que ricos e pobres podem consumir. As evidências disponíveis sugerem
que a desigualdade de consumo é muito menor que a de renda ou riqueza,
principalmente nos países mais desenvolvidos. Os lares dos americanos pobres
possuem quase todas as coisas que os lares ricos médios, ainda que de qualidade
mais baixa. E a distância entre ricos e pobres neste quesito se estreitou nas
últimas décadas. Uma vez que, em última análise, é o que consumimos o
que interessa, essa é uma questão que tem de ser deixada clara em eventuais
discussões.
9)-As vezes as Políticas de protecionismo Governamental
mais atrapalham que ajudam aos pobres
Por fim, mesmo aqueles
que são céticos em relação aos argumentos de que a desigualdade seja
problemática, podem concordar que tem havido alguma redistribuição de riqueza
do pobre para o rico nas últimas décadas. Isso se dá,
majoritariamente, por causa das políticas do governo que favorecem quem
já está próximo ao poder, seja devido aos exorbitantes salários que funcionários
públicos de alto escalão recebem, seja por causa de sua política de expansão de
crédito subsidiado para grandes empresas, seja por causa de suas políticas
protecionistas que protegem as grandes indústrias criando uma reserva de
mercado e impedindo os pobres de comprar bens mais baratos do estrangeiro,
seja por causa de sua política fiscal que, ao incorrer em déficits
orçamentários, aumenta a riqueza dos compradores dos títulos públicos.
Não
nos esqueçamos também da exigência de licenças profissionais e dos encargos
sociais e trabalhistas que dificultam a obtenção de trabalho pelos mais pobres,
que costumam ser menos qualificados e não justificam o preço exigido como
mínimo a ser pago por sua mão-de-obra.
Há, ainda, tentativas
governamentais de regular e até mesmo banir o Uber, o Lyft, o AirBnB e todas
essas empresas da chamada "economia compartilhada". Essas são, justamente, as melhores alternativas para alguém
que não está encontrando oportunidades conseguir uma fonte de renda,
já que é a área da economia menos controlada pelo governo que se conhece. Por
fim, vale ressaltar que é o estado quem impede que os moradores de favelas
obtenham títulos de propriedade, os quais poderiam ser utilizados como garantia
para a obtenção de crédito, com o qual poderiam abrir pequenas empresas e se
integrar ao sistema produtivo. Todas essas políticas são problemáticas
justamente porque aumentam a desigualdade e a pobreza de forma artificial. Com
efeito, uma discussão muito mais interessante incluiria qual o papel dessas
políticas estatais na criação das desigualdades artificiais em oposição às
desigualdades naturais, que são aquelas que surgem espontaneamente no mercado
em decorrência da maior aptidão de cada indivíduo.
10)-Muito mais relevante, no caso dos dois países, é a
presença da escravidão e diversidade regional na qualidade das instituições.
Tanto no Brasil quanto
nos EUA, encontramos políticas de colonização variadas, com efeitos enormes e
duradouros sobre a qualidade local das instituições e a delimitação de direitos
de propriedade, como mostraram brilhantemente Acemoglu, Johnson e Robinson. O
sul dos EUA esteve muito abaixo do norte em termos de produtividade (e,
consequentemente, riqueza) porque teve um conjunto extrativo de instituições
que negava à parcela negra da população acesso a educação de qualidade e
ingresso em um mercado de trabalho e de crédito saudável. No caso brasileiro,
como mostraram Claudio Ferraz, Rudi Rocha e Rodrigo Soares, os programas de
imigração patrocinada para cidades do interior sulista e paulista contribuíram
de maneira persistente para o estoque de capital humano dessas regiões. Graças
a isso, os destinos de imigrantes possuem menor desigualdade e renda média
maior.
“Querer,
como pretendem os progressistas, que haja uma sociedade miscigenada e
multicultural, e que, ao mesmo tempo, ela apresente uma igualdade nórdica, é
querer a quadratura do círculo. E isso é empiricamente comprovado.”
Simplesmente não é
verdade que seja empiricamente comprovado. A evidência aponta que homogeneidade
étnica pouco tem a ver com desigualdade. Há países etnicamente heterogêneos com
baixa desigualdade e vice-versa.A Bolívia é um país muito mais heterogêneo que
o Chile, mas tão desigual quanto. Canadá e Austrália são sociedades de
imigrantes do todos os cantos do mundo e pouco desiguais, quase tanto quanto os
países nórdicos. Os próprios países nórdicos não são tão homogêneos. Noruega e
Suécia têm cerca de 15% da população composta de imigrantes. Para fins de
comparação, no Brasil, imigrantes são pouco mais de 2% da população. Sob o
critério de agrupar etnias diferentes com base no tom de pele, podemos pensar
na Botsuana. É um dos países mais desiguais do mundo e é etnicamente homogêneo.
O
que causa essa desigualdade é obviamente a qualidade institucional adversa em
cada país.
CONCLUSÃO
É inegável que nossa
desigualdade é fruto do acesso desigual à educação e da falta ou precariedade de politicas de inclusões sociais, bem como inexistência, ou, deficiência de acesso a estes meios. Países nórdicos não tem baixa desigualdade por serem
etnicamente homogêneos. Em grande medida, o acesso à educação é quase
irrestrito há um bom tempo, seja qual for sua origem. O Brasil não é
terrivelmente desigual porque sua população é mestiça. Nosso mal vem de décadas
de políticas econômicas meramente paliativas, dos nossos astronômicos salários da elite
do funcionalismo público, de leis trabalhistas excludentes e da abismal disparidade no acesso à educação. Afirmar o contrário não é
politicamente incorreto, nem corajoso. É apenas incorreto.
Fonte: Mises Brasil
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