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O que o santo papa Paulo VI quis dizer sobre o "culto do homem"?

Written By Beraká - o blog da família on domingo, 27 de agosto de 2023 | 20:09

 

 


 


Por *Francisco José Barros Araújo




Não existe frase mais deturpada e mais mal interpretada que esta do papa Paulo VI: "Vós, humanistas do nosso tempo, que negais as verdades transcendentes, dai ao Concílio ao menos este louvor e reconhecei este nosso humanismo novo: também nós —  e nós mais do que ninguém somos cultores do homem!" -  Em que contexto ele a falou e como entendê-la? Os protestantes e inimigos da igreja interpretaram como se o papa estivesse introduzindo a idolatria do homem. Os progressistas e ateus interpretaram de forma exacerbadamente positiva e revolucionária, porém, também equivocada, como se o papa estivesse querendo  exaltar o "super homem" do filósofo Friedrich Nietzsche, decretando a morte de Deus. Já os Rad Trad e Ultraconservadores, interpretaram como a sistematização do antropocentrismo no lugar do teocentrismo. Nada melhor do que revisitar os próprios discursos do santo padre papa Paulo VI, para entender, contextualizar, e explica-la corretamente aos homens desse tempo que se chama hoje!











DISCURSO DO PAPA PAULO VI NA ÚLTIMA SESSÃO PÚBLICA DO CONCÍLIO VATICANO II



Terça-feira, 7 de Dezembro de 1965

 


Veneráveis Irmãos



Concluímos hoje o Concílio Ecuménico Vaticano II e concluímo-lo na plenitude do seu vigor e da sua eficiência. A vossa presença tão numerosa demonstra-o, a ordenada estruturação desta assembleia atesta-o, o legítimo epílogo dos trabalhos conciliares confirma-o, e a harmonia de sentimentos e propósitos proclama-o. Se não poucas questões, postas no decorrer do Concílio, ainda aguardam uma solução conveniente, isto indica sem dúvida que o Concílio não conclui os seus trabalhos no meio do esgotamento de forças mas antes no meio do entusiasmo que despertou; no período pós-conciliar, se Deus quiser, ele voltar-se-á de novo para estas questões com todo o empenho. Este nosso Concílio deixará à posteridade a imagem da Igreja que esta Aula representa, assim repleta de Pastores que professam a mesma fé, e respiram a mesma caridade; que estão unidos pela comunhão de oração, de disciplina, de entusiasmo; como isto é maravilhoso — todos desejarem uma só coisa: oferecer-se como Cristo, nosso mestre e Senhor, pela vida da Igreja e pela salvação do mundo. O Concílio, porém, não deixa apenas à posteridade a imagem da Igreja, mas também o património da sua doutrina e dos seus mandamentos, isto é, o depósito que Cristo lhe confiou; depósito que no decurso dos tempos os homens sempre meditaram, transformaram, por assim dizer, no próprio sangue e exprimiram de algum modo no seu viver; depósito que agora, aclarado em muitos pontos, foi estabelecido e ordenado na sua integridade. Este depósito, vivo pela divina virtude da verdade e da força que o constituem, deve ser considerado apto para vivificar todo o homem que o acate piedosamente e dele alimente a sua própria vida.O que foi este Concílio, e o que fez, seria o tema desta nossa meditação final. Mas isso pediria demasiada atenção e tempo, e não ousamos nesta hora última e solene fazer uma síntese de tão importante matéria. Preferimos perguntar a nós mesmos qual foi a importância religiosa do nosso Concílio. Com esta expressão, entendemos significar as nossas relações com. Deus, que bem declaram a existência da Igreja, a sua fé, a sua esperança, o seu amor, o que ela é, o que ela faz. Podemos confessar que demos glória a Deus, que buscámos o seu conhecimento e o seu amor, que adiantámos no esforço da sua contemplação, na ânsia da sua celebração, na arte de o dar a conhecer aos homens que nos olham como Pastores e mestres dos caminhos do Senhor? Acreditamos sinceramente que sim, até porque foi esta a intenção inicial e fundamental donde nasceu o propósito de celebrar o Concílio. Ressoam ainda, nesta Basílica de S. Pedro, as palavras pronunciadas no discurso inaugural do mesmo Concílio, pelo nosso predecessor de feliz memória, João XXIII, em quem, com toda a razão, podemos ver o autor deste Concílio Ecuménico. Dizia então aquele Pontífice: 




«O que mais importa ao Concílio Ecuménico é o seguinte: que o depósito sagrado da doutrina cristã seja guardado e ensinado de forma mais eficaz... O Senhor disse: «Procurai primeiro o reino de Deus e a sua justiça». Esta palavra «primeiro» exprime, antes de mais, em que direção devem mover-se os nossos pensamentos e as nossas forças» (1).









E o acontecimento correspondeu exatamente àquela ideia. Para o apreciarmos devidamente, é necessário recordar o tempo em que se levou a cabo este acontecimento: foi num tempo em que, como todos reconhecem, os homens estão voltados mais para a conquista da terra do que para o reino de Deus; foi num tempo em que o esquecimento de Deus se torna habitual, como se os progressos da ciência o aconselhassem; foi num tempo em que o ato fundamental da pessoa humana, mais consciente de si e da sua liberdade, tende a exigir uma liberdade total, livre de todas as leis que transcendam a ordem natural das coisas; foi num tempo em que os princípios do laicismo aparecem como a consequência legítima do pensamento moderno e são tidos quase como norma sapientíssima segundo a qual a sociedade humana deve ser ordenada; foi num tempo em que a razão humana pretende exprimir o que é absurdo e tira toda a esperança; foi num tempo, finalmente, em que as religiões étnicas estão sujeitas a perturbações e transformações jamais experimentadas. Foi neste tempo que se celebrou o nosso Concílio para glória de Deus, em nome de Cristo, com a inspiração do Espírito Santo que «tudo perscruta» e que continua a ser a alma da Igreja, «para que conheçamos os dons de Deus», (2) quer dizer, fazendo com que a Igreja conheça profundamente sob todos os aspectos a vida humana e o mundo. 




Mercê deste Concílio, a doutrina teocêntrica e teológica sobre a natureza humana e sobre o mundo atrai a si a atenção dos homens, como se desafiasse aqueles que a julgam anacrónica e estranha; e tais coisas se arroga que o mundo qualificará, de início, como absurdas, mas que depois, assim o esperamos, reconhecerá espontâneamente como humanas, como prudentes e salutares, a saber: Deus existe! Sim, Deus existe; realmente existe; vive; é pessoal; é providente, dotado de infinita bondade, não só bom em si mesmo mas imensamente bom para nós; é o nosso criador, a nossa verdade, a nossa felicidade, de tal modo que o homem, quando procura fixar em Deus a sua mente e o seu coração, entregando-se à contemplação, realiza o ato que deve ser considerado o mais alto e mais perfeito; ato, que mesmo hoje pode e deve hierarquizar a imensa pirâmide da atividade humana.



Dirá alguém que o Concílio, mais do que das verdades divinas, se ocupou principalmente da Igreja, da sua natureza, da sua estrutura, da sua vocação ecuménica, da sua atividade apostólica e missionária. Esta secular sociedade religiosa que é a Igreja esforçou-se por pensar sobre si mesma, para melhor se conhecer, melhor se definir e, consequentemente, melhor dispor os seus sentimentos e os seus preceitos. Isto é verdade. Mas esta introspecção não foi o único fim que teve em vista, não foi uma ostentação de pura cultura terrena. A Igreja, com efeito, entrando em si mesma, penetrou no íntimo da sua consciência não para se comprazer em eruditas análises sobre a psicologia religiosa ou a história das suas coisas, ou para intencionalmente reafirmar os seus direitos ou formular as suas leis; fez isto para encontrar em si a palavra de Cristo, viva e operante no Espírito Santo, e para sondar mais profundamente o mistério, ou seja, o desígnio e a presença de Deus fora e dentro de si, e para reavivar em si o fogo da fé, que é o segredo da sua segurança e da sua sabedoria, e reavivar o fogo do amor, que a obriga a cantar sem descanso os louvores de Deus, porque, como diz Santo Agostinho: «Cantar é próprio do amante» (3). Os documentos conciliares, principalmente os que tratam da Revelação divina, da liturgia, da Igreja, dos sacerdotes, dos religiosos, dos leigos, permitem ver directamente esta primordial intenção religiosa e demonstram quão límpida, fresca e rica é a veia espiritual que o vivo contacto com Deus vivo faz brotar no seio da Igreja e correr sobre as áridas glebas da nossa terra. 




 

 

 

Mas não é lícito omitir algo que é da maior importância quando examinarmos o significado religioso deste Concílio: isto teve ele a peito perscrutar o mundo deste nosso tempo. Nunca talvez como no tempo deste Concílio a Igreja se sentiu na necessidade de conhecer, avizinhar, julgar retamente, penetrar, servir e transmitir a mensagem evangélica, e, por assim dizer, atingir a sociedade humana que a rodeia, seguindo-a na sua rápida e contínua mudança. Esta atitude, nascida pelo fato de a Igreja, no passado e sobretudo neste século, ter estado ausente e afastada da civilização profana, esta atitude, sempre inspirada pela essencial missão salvadora da Igreja, esteve presente eficaz e continuamente no Concílio. Por isso é que alguns suspeitaram que nos homens e nos atos do Concílio tinha dominado mais do que era justo e com demasiada indulgência a doutrina do relativismo que se encontra no mundo externo, nas coisas que passam fugazmente, nas novas modas, nas necessidades contingentes, nos pensamentos dos outros; e isto à custa da fidelidade devida à doutrina tradicional e com prejuízo da orientação religiosa que necessariamente é própria dum Concílio. 

 



Julgamos que não lhe deve ser atribuída esta atitude perniciosa, se bem atendermos às suas verdadeiras e misteriosas intenções e às suas autênticas manifestações. Desejamos antes notar que a religião do nosso Concílio foi, antes de mais, a caridade; por esta sua declarada intenção, o Concílio não poderá ser acusado por ninguém de irreligiosidade, de infidelidade ao Evangelho, se nos lembrarmos que o próprio Cristo nos ensina que todos conhecerão que somos seus discípulos, se nos amarmos mutuamente (4); se deixarmos igualmente que estas palavras do Apóstolo se façam ouvir dentro das nossas almas: « A religião pura e imaculada junto de Deus Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e conservar-se imaculado neste mundo» (5); e mais estas: «Quem... não ama o seu irmão, a quem vê, como pode amar alguém que não vê? (6) 




Na verdade, a Igreja, reunida em Concílio, entendeu sobretudo fazer a consideração sobre si mesma e sobre a relação que a une a Deus; e também sobre o homem, o homem tal qual ele se mostra realmente no nosso tempo: o homem que vive; o homem que se esforça por cuidar só de si; o homem que não só se julga digno de ser como que o centro dos outros, mas também não se envergonha de afirmar que é o princípio e a razão de ser de tudo. Todo o homem fenomênico —  para usarmos o termo moderno —  revestido dos seus inúmeros hábitos, com os quais se revelou e se apresentou diante dos Padres conciliares, que são também homens, todos Pastores e irmãos, e por isso atentos e cheios de amor; o homem que lamenta corajosamente os seus próprios dramas; o homem que não só no passado mas também agora julga os outros inferiores, e, por isso, é frágil e falso, egoísta e feroz; o homem que vive descontente de si mesmo, que ri e chora; o homem versátil, sempre pronto a representar; o homem rígido, que cultiva apenas a realidade científica; o homem que como tal pensa, ama, trabalha, sempre espera alguma coisa, à semelhança do «filius accrescens» (7); o homem sagrado pela inocência da sua infância, pelo mistério da sua pobreza, pela piedade da sua dor; o homem individualista, dum lado, e o homem social, do outro; o homem « laudator temporis acti», e o homem que sonha com o futuro; o homem por um lado sujeito a faltas, e por outro adornado de santos costumes; e assim por diante. O humanismo laico e profano apareceu, finalmente, em toda a sua terrível estatura, e por assim dizer desafiou o Concílio para a luta. 

 

 


A religião, que é o culto de Deus que quis ser homem, e a religião — porque o é — que é o culto do homem que quer ser Deus, encontraram-se. Que aconteceu? Combate, luta, anátema? Tudo isto poderia ter-se dado, mas de facto não se deu. Aquela antiga história do bom samaritano foi exemplo e norma segundo os quais se orientou o nosso Concílio. Com efeito, um imenso amor para com os homens penetrou totalmente o Concílio. A descoberta e a consideração renovada das necessidades humanas — que são tanto mais molestas quanto mais se levanta o filho desta terra — absorveram toda a atenção deste Concílio. 










"Vós, humanistas do nosso tempo, que negais as verdades transcendentes, dai ao Concílio ao menos este louvor e reconhecei este nosso humanismo novo: também nós —  e nós mais do que ninguém somos cultores do homem!"

 



Que há visto na humanidade este augusto senado? que se propôs ele estudar à luz da divindade? Quis considerar profundamente a sua dupla fisionomia: a miséria e a grandeza do homem, o seu mal profundo, mal sem dúvida incurável, e o seu bem, que permanece, sempre marcado de misteriosa beleza e singular poder. Precisamos de reconhecer que este nosso Concílio deteve-se mais nos aspectos felizes do homem que nos desditosos. Nisto ele tomou uma. atitude claramente optimista. Uma corrente de interesse e de admiração saiu do Concílio sobre o mundo atual. Rejeitaram-se os erros, como a própria caridade e verdade exigiam, mas os homens, salvaguardado sempre o preceito do respeito e do amor, foram apenas advertidos do erro. Assim se fez, para que em vez de diagnósticos desalentadores, se dessem remédios cheios de esperança; para que o Concílio falasse ao mundo atual não com presságios funestos mas com mensagens de esperança e palavras de confiança. Não só respeitou mas também honrou os valores humanos, apoiou todas as suas iniciativas, e depois de os purificar, aprovou todos os seus esforços. Vede por exemplo: como inumeráveis línguas foram admitidas para exprimir liturgicamente a palavra dos homens a Deus e a palavra de Deus aos homens; como foi reconhecida ao homem enquanto homem a sua vocação fundamental a tantos direitos e a um destino transcendente; como as suas supremas aspirações à vida, à dignidade da pessoa, à honrada liberdade, à cultura, à renovação da ordem social, à justiça, à paz, foram purificadas e estimuladas; como a todos os homens foi dirigido o convite pastoral e missionário para receberem em si a luz do Evangelho. 




Tocamos muito de corrida tantos e tão complicados problemas relativos ao bem-estar humano, de que o Concílio se ocupou; nem o Concílio pretendeu resolver todas as questões mais urgentes da vida atual; algumas ficaram reservadas para estudos mais profundos, que a Igreja levará depois a cabo; muitas outras foram tratadas em termos demasiado breves e gerais, e por isso admitem explicações mais profundas e aplicações diversas.











Mas convém notar uma coisa: o magistério da Igreja, embora não tenha querido pronunciar-se com sentenças dogmáticas extraordinárias sobre nenhum capítulo doutrinal, propôs, todavia, o seu ensinamento autorizado acerca de muitas questões que hoje comprometem a consciência e a atividade do homem. Por assim dizer, a Igreja baixou a dialogar com o homem; e conservando sempre a sua autoridade e a sua virtude, adoptou a maneira de falar acessível e amiga que é própria da caridade pastoral. Quis ser ouvida e entendida pelos homens. Por isso, não se preocupou só com falar à inteligência do homem, mas exprimiu-se no modo hoje usado na conversação corrente, em que o recurso à experiência da vida e o emprego dos sentimentos cordiais dão mais força para atrair e para convencer. Isto é, a Igreja falou aos homens de hoje, tais quais eles são.

 











Uma outra coisa julgamos digna de consideração: toda esta riqueza doutrinal orienta-se apenas a isto: servir o homem, em todas as circunstâncias da sua vida, em todas as suas fraquezas, em todas as suas necessidades. A Igreja declarou-se quase a escrava da humanidade, precisamente no momento em que tanto o seu magistério eclesiástico como o seu governo pastoral adquiriram maior esplendor e vigor devido à solenidade conciliar; a ideia de serviço ocupou o lugar central. Tudo isto e tudo o mais que poderíamos ainda dizer acerca do Concílio, terá porventura desviado a Igreja em Concílio para a cultura atual que toda é antropocêntrica? Desviado, não; voltado, sim. Mas quem observa honestamente este interesse prevalente do Concílio pelos valores humanos e temporais, não pode negar que tal interesse se deve ao carácter pastoral que o Concílio escolheu como programa, e deverá reconhecer que esse mesmo interesse jamais está separado do interesse religioso mais autêntico, devido à caridade que é a única a inspirá-lo (e onde está a caridade, aí está Deus), ou à união dos valores humanos e temporais com os especificamente espirituais, religiosos e eternos, afirmada e promovida sempre pelo Concílio; este debruça-se sobre o homem e sobre a terra, mas eleva-se ao reino de Deus.










A mentalidade moderna, habituada a julgar todas as coisas sob o aspecto do valor, isto é, da utilidade, deverá admitir que o valor do Concílio é grande ao menos por isso: todo ele se orientou à utilidade humana. Portanto, ninguém chame inútil a uma religião como a católica, que, ao exprimir a forma mais consciente e mais eficaz da sua ação, isto é, ao celebrar um Concílio Ecuménico, se declara toda em favor e em serviço do homem. A religião católica e a vida humana reafirmam assim a sua aliança, a sua convergência para um só bem humano, a saber: a religião católica é para a humanidade, é, por assim dizer, a vida da humanidade. É a vida da humanidade, pela doutrina sublime e de todo perfeita que oferece a respeito do homem (não é, porventura, o homem, deixado a si mesmo, um mistério para si mesmo?); e oferece-a precisamente em virtude da sua ciência a respeito de Deus: para conhecer o homem, o homem verdadeiro, o homem integral, é necessário conhecer a Deus; para o provar, basta-nos por agora recordar as palavras inflamadas de S. Catarina de Sena: «Na tua natureza, ó Deus eterno, conhecerei a minha natureza». A religião católica é a vida da humanidade, porque descreve a natureza e o destino do homem, e dá-lhe o seu verdadeiro sentido. É a vida da humanidade, finalmente, porque constitui a lei suprema da vida, e à vida infunde a misteriosa energia que faz dela uma vida verdadeiramente divina. E se recordamos, veneráveis Irmãos e amados Filhos, todos vós que estais aqui presentes, como no rosto de todo o homem, sobretudo se se tornou transparente pelas lágrimas ou pelas dores, devemos descobrir o rosto de Cristo (8), o Filho do Homem; e se no rosto de Cristo devemos descobrir o rosto do Pai celestial, segundo aquela palavra: «quem me vê a mim, vê também o Pai» (9), o nosso humanismo muda-se em cristianismo, e o nosso cristianismo faz-se teocêntrico, de tal modo que podemos afirmar: para conhecer a Deus, é necessário conhecer o homem.












Estaria, então, destinado este Concílio, que dedicou ao homem a sua principal e esforçada atenção, a propor de novo ao mundo moderno a libertação e a consolação a que gradualmente pode subir? Não será, em resumo, um modo simples, novo e solene de ensinar a amar o homem para amar a Deus? Amar o homem, dizemos, não como instrumento, mas como que primeiro fim, que nos leva ao supremo fim transcendente. Por isso, todo este Concílio se resume no seu significado religioso, não sendo outra coisa senão um veemente e amistoso convite em que a humanidade é chamada a encontrar, pelo caminho do amor fraterno, aquele Deus «de quem afastar-se é cair, a quem dirigir-se é levantar-se, em quem permanecer é estar firme, a quem voltar é renascer, em quem habitar é viver» (10).Assim Nós o esperamos, no final deste Concílio Ecuménico Vaticano II, e no início da renovação humana e religiosa que ele se propôs estudar e promover; assim o esperamos para Nós, Irmãos e Padres do Concílio; assim o esperamos para a humanidade inteira, que aqui aprendemos a amar mais e a servir melhor. E enquanto para tal invocamos de novo a intercessão dos santos João Baptista e José, padroeiros do Concílio Ecuménico, dos santos Apóstolos Pedro e Paulo, fundamentos e colunas da santa Igreja, e com eles a de S. Ambrósio, Bispo, cuja festa hoje celebramos, como que juntando por meio dele a Igreja do Oriente e do Ocidente, imploramos igualmente de todo o coração a protecção da bem-aventurada Virgem Maria, mãe de Cristo, por Nós chamada também mãe da Igreja, e com uma só voz, um só coração, damos graças e glorificamos a Deus vivo e verdadeiro, a Deus único e sumo, ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. Amém (11).

 



Notas




1. AAS 54 (1962), p. 790.

2. Cfr. 1 Cor. 2, 10-12.

3. Serm. 336: PL 38, 1472.

4. Cfr. Jo. 13,35.

5. Tia. 1,27.

6. 1 Jo. 4,20.

7. Gén. 49,22.

8. Cfr. Mt. 25,40. 9 Jo. 14,9.

10. S. Agostinho, Sol. 1, 1,3: PL 32, 870.

11. AAS 58 (1966), p. 51-59.

 




 







30 DE JUNHO DE 1968. DISCURSO E "PROFISSÃO DE FÉ" NA PRAÇA DE SÃO PEDRO




Por esta liturgia solene, terminamos a celebração do 19 centenário do martírio dos santos apóstolos Pedro e Paulo. Damos assim conclusão ao "Ano da Fé". Nós o tínhamos dedicado à comemoração dos santos apóstolos, para testemunhar de nossa inabalável vontade de ser fiel ao depósito da fé (1Tim 6,20), que eles nos transmitiram e para fortificar nosso desejo de viver desta fé, na conjuntura histórica em que se encontra a Igreja peregrinante no meio do mundo. Sentimos o dever de agradecer publicamente a todos aqueles que responderam a nosso convite, contribuindo para que o "Ano da Fé" chegasse à magnífica plenitude, pelo aprofundamento da adesão pessoal à palavra de Deus, e pela renovação em diversas comunidades da profissão de fé e pelo testemunho de vida cristã. A nossos irmãos no episcopado, mui especialmente, e a todos os fiéis da santa Igreja católica, exprimimos nossa gratidão e estendemos a eles nossa bênção. Parece-nos igualmente ser um dever que desempenhemos o mandato confiado por Cristo a Pedro, do qual somos sucessor, o último por mérito, o mandato de confirmar na fé os irmãos (Lc 22,32). Consciente, é certo, de nossa fraqueza humana, mas com toda a firmeza que tal mandato imprime em nosso espírito, iremos fazer uma profissão de fé, pronunciar um Credo que, sem constituir uma definição dogmática, propriamente dita, repete em substância, com algumas achegas reclamadas pelas condições espirituais de nosso tempo, o Credo de Nicéia, o Credo da imortal tradição da santa Igreja de Deus. Fazendo-o, estamos consciente da inquietude que agita certos meios modernos em relação à fé. Não escapam à influência de um mundo em profunda mutação, no qual tantas certezas são postas em contestação e discussão. Vemos até católicos se deixarem prender pela paixão da mudança e da novidade. É, certo que a Igreja tem sempre o dever de seguir seu esforço no aprofundamento das verdades e apresentar de maneira sempre mais bem adaptada às gerações que se revezam, os mistérios insondáveis de Deus, ricos para todos em frutos de salvação. Mas é preciso o máximo cuidado  sem se descurar do dever de pesquisa, para que não se atinja os ensinamentos da doutrina cristã. Porque seria então criar a revolta, como se verifica em nossos dias, e a perplexidade em muitas almas fiéis. Cumpre neste sentido lembrar que além do sensível cientificamente verificado, a inteligência que Deus nos deu atinge aquilo que é, e não só a expressão subjetiva das estruturas e da evolução da consciência. De outro ponto de vista, a tarefa da interpretação - da hermenêutica é de procurar compreender e libertar, com respeito à palavra proferida, o sentido de que um texto é prenhe, e não de recriar de certo modo o sentido à revelia de hipóteses arbitrárias. Entretanto acima de tudo colocamos nossa confiança inquebrantável no Espírito Santo, alma da Igreja, e na fé teologal sobre que repousa a vida do corpo místico. Sabemos que as almas esperam a palavra do Vigário de Cristo. Respondemos a esta expectativa pelas instruções que proporcionamos regularmente. Hoje, porém, apresenta-se-nos a ocasião de pronunciar uma palavra mais solene. Neste dia destacado para o encerramento do Ano da Fé, nesta festa dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo, quisemos oferecer a Deus que vive a homenagem de uma profissão de fé. Como outrora em Cesaréia de Filipe, o apóstolo Pedro tomou a palavra em nome dos doze para confessar, acima das opiniões humanas, o Cristo Filho do Deus que vive, assim hoje seu modesto sucessor, pastor da Igreja universal, eleva também sua voz para prestar, em nome de todo o Povo de Deus, um firme testemunho à verdade divina, confiada à Igreja que a proclame a todas as nações. Quisemos, outrossim, que nossa profissão de fé fosse completa e bastante explícita para responder de maneira apropriada à necessidade de esclarecimento sentido por inúmeras almas fiéis e por todos aqueles que no mundo estão em busca da verdade, seja qual for a família religiosa a que pertençam. Para a glória do Deus Santíssimo e de nosso Senhor Jesus Cristo, confiante na ajuda da Santíssima Virgem Maria e dos bemaventurados apóstolos Pedro e Paulo, para utilidade e edificação da Igreja, em nome de todos os pastores e de todos os fiéis, nós pronunciamos agora esta profissão de fé, em plena comunhão  espiritual com todos vós, caros irmãos e filhos: 









Cremos em um só Deus, Pai, Filho, Espírito Santo, criador das coisas visíveis como este mundo onde se esvai nossa vida efêmera, das coisas invisíveis como os simples espíritos que são chamados também anjos, e criador em cada homem de sua alma espiritual e imortal. Cremos que este Deus único é absolutamente um em sua essência infinitamente santa, como em todas as suas perfeições, em seu poder imenso, em sua ciência infinita, na sua providência, na sua vontade e no seu amor. Ele é Aquele-que-é, como se revelou a Moisés (Ex 2,14). É o Autor como o apóstolo João nos ensina (1 Jo 4,8): de sorte que estes dois nomes Ser e Amor, exprimem indizivelmente a mesma realidade divina daquele que desejou fazerse conhecer a nós e, "habitando na luz inacessível", é em si mesmo estando acima de todo nome, de todas as coisas e de toda a inteligência criada. Deus só pode dar-nos o conhecimento justo e perfeito de si mesmo, revelando-se como Pai, Filho e Espírito Santo, de cuja vida somos chamados a participar pela graça, aqui na terra, na obscuridade da fé, e além da morte na luz eterna. Os laços mútuos que constituem as três pessoas, que são cada uma o mesmo e único ser divino, são a bem-aventurada vida íntima do Deus três vezes santo, infinitamente acima de tudo o que podemos conceber na condição humana. Rendemos graça, contudo, à bondade divina pelo fato de que um número sem conta de crentes, possa atestar conosco diante dos homens, a unidade de Deus, ainda que não conheçam o mistério da Santíssima Trindade. Cremos, portanto, no Pai que gera eternamente o Filho, no Filho, verbo de Deus, que é eternamente gerado, no Espírito Santo, pessoa incriada que procede do Pai e do Filho, como seu eterno Amor. Assim nas três pessoas divinas, coaeternae sibi et coaequales, afluem em grande riqueza e se consomem, na sobreexcelência e glória próprias do ser incriado, a vida e a beatitude de Deus perfeitamente uno, e sempre "deve ser venerada a Unidade na Trindade e a Trindade na Unidade". Cremos em nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus. É o Verbo eterno, nascido do Pai antes dos séculos e consubstancial ao Pai homoousios to Patri, e por ele tudo foi feito. Encarnou-se por intervenção do Espírito no seio da Virgem Maria e se fez humano: igual ao Pai na divindade, mas inferior a ele na humanidade, e uno em si mesmo, não por uma impossível confusão de naturezas, mas pela unidade da pessoa. Habitou entre nós, cheio de graça e de verdade. Anunciou e instaurou o reino de Deus e fez-nos conhecer o Pai por seu intermédio. Deu-nos um mandamento novo que é de nos amar uns aos outros como ele nos amou. Ensinou-nos o caminho das bemaventuranças do Evangelho: pobreza de espírito, bondade, sofrimento suportado com paciência, sede de justiça, misericórdia, pureza de coração, vontade de paz, perseguição suportada por amor à justiça. Sofreu no governo de Pôncio Pilatos, Cordeiro de Deus carregando os pecados do mundo, morreu por nós na cruz salvandonos por seu sangue redentor. Foi sepultado, e com suas próprias forças ressuscitou depois de três dias, conferindo-nos pela sua ressurreição a participação na vida divina, que é a vida da graça. Subiu ao céu, e voltará cheio de glória desta vez, para julgar os vivos e os mortos: cada um conforme seus méritos: os que corresponderam ao amor e à misericórdia de Deus irão para a vida eterna, os que recusaram até o fim entrarão para o fogo que não se apaga nunca. Seu reinado não terá fim Cremos no Espírito Santo, que é Senhor e dá a vida. É adorado e glorificado com o Pai e o Filho. Falou-nos pelos profetas. Foi-nos mandado pelo Cristo depois de sua ressurreição e ascenção ao Pai. Ele esclarece, dá vida, protege e conduz a Igreja. Purifica seus membros se estes não se furtam à graça. Sua ação, penetrando no mais íntimo da alma, torna o homem capaz de responder ao chamamento de Jesus: "Sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito" (Mt 5,48). Cremos que Maria é a mãe, que permaneceu sempre virgem, do Verbo encarnado, nosso Deus e Salvador Jesus Cristo. Em virtude desta escolha singular, e em consideração aos méritos de seu Filho, ela foi remida de maneira mais eminente, preservada de toda a mácula do pecado original, e acumulada com o dom da graça acima de todas as demais criaturas. Associada por uma relação estreita e indissolúvel aos mistérios da Encarnação e da Redenção, a Virgem Maria, a Imaculada, foi no fim de sua vida terrestre assumida à glória celeste em corpo e alma, configurada a seu Filho ressuscitado em antecipação à sorte futura dos justos. Cremos que a Virgem Mãe de Deus, nova Eva e Mãe da Igreja , continua no céu sua tarefa de mãe em relação aos membros do Cristo, cooperando no nascimento e desenvolvimento da vida divina nas almas dos resgatados. Cremos que em Adão todos pecaram, o que quer dizer que a falta original cometida por ele atingiu a natureza humana comum a todos os homens, neste estado em que suporta as conseqüências da falta, o qual não é o mesmo em que se encontrava antes, em nossos primeiros pais, estabelecidos na santidade e na justiça, em que o homem não conhecia nem o mal nem a morte. Esta natureza humana, assim decaída, espoliada da graça que a revestia, prejudicada em suas próprias faculdades naturais e submissa ao império da morte, é transmitida a todos os homens e neste sentido cada homem nasce no pecado. Sustentamos, portanto, com o Concílio de Trento, que o pecado original é transmitido com a natureza humana, "não por imitação, mas por propagação", e que é assim "próprio a cada um". Cremos que nosso Senhor Jesus Cristo pelo sacrifício da cruz nos resgatou do pecado original, e de todos os pecados pessoais cometidos por cada um de nós, de forma que, de acordo com a palavra do Apóstolo, "lá onde afluiu o pecado, constatou-se um maior afluxo da graça". Cremos num só batismo instituído por nosso Senhor Jesus Cristo, para a remissão dos pecados. O batismo deve ser administrado até mesmo às crianças que ainda não se tornaram culpáveis de algum pecado pessoal, a fim de que, nascidas sem a graça sobrenatural, renasçam "pela água e pelo Espírito Santo" para a vida divina no Cristo Jesus. Cremos na Igreja única, santa, católica e apostólica, edificada por Cristo sobre esta pedra que é Pedro. Ela é o Corpo místico do Cristo, ao mesmo tempo sociedade visível instituída com os órgãos hierárquicos, e comunidade espiritual, a Igreja terrestre. É o Povo de Deus que passa peregrinando aqui, e Igreja cumulada de bens celestes. É a semente e as primícias do reino de Deus, pela qual continuam ao longo da história a tarefa e os sofrimentos da Redenção, aspira. No transcorrer do tempo, o Senhor Jesus forma sua Igreja pelos sacramentos que se derivam de sua plenitude. Por meio destes ela habilita seus membros para participarem do mistério da morte e da ressurreição do Cristo, na graça do Espírito Santo que lhe dá vida e ação. É, portanto, santa, embora compreendendo em seu seio pecadores, porque não tem em si outra vida senão a da graça: é vivendo desta sua vida que os membros se santificam, e furtando-se a ela que eles caem no pecado e nos desregramentos que impedem a irradiação da santidade. Por isso ela sofre e faz penitência por suas faltas, das quais pode libertar e curar seus filhos pelo sangue do Cristo e pelo dom do Espírito Santo. Herdeira das promessas divinas e filha de Abraão segundo o Espírito, por este Israel cujas Escrituras guarda com amor, e cujos patriarcas e profetas venera, fundada sobre os apóstolos e transmitindo de século em século sua palavra que sempre é viva e seus poderes de pastores aos sucessores de Pedro e aos bispos em comunhão com ele, perpetuamente assistida pelo Espírito Santo - ela tem como tarefa guardar, explicar, ensinar e propagar a verdade que Deus revelou de maneira ainda velada pelos profetas, e de modo perfeito pelo Senhor Jesus. Nós cremos todos naquilo que contém a palavra de Deus escrita ou transmitida, que a Igreja propõe a crer como divinamente revelada, seja por um juízo solene, seja pelo magistério ordinário e universal. Cremos na infalibilidade de que goza o sucessor de Pedro quando ensina ex cathedra como pastor e doutor de todos os fiéis, e de que é garantido o corpo dos bispos quando exerce com o papa o magistério supremo. Cremos que a Igreja fundada por Jesus Cristo, e pela qual pediu, é indefectivelmente única na fé, no culto e no vínculo de comunhão hierárquica. No seio desta Igreja, a rica variedade dos ritos litúrgicos e a legítima diversidade dos patrimônios teológicos e espirituais, e das disciplinas particulares, longe de prejudicarem sua unidade, ainda mais a manifestam. Reconhecendo a existência também fora da Igreja de inumeráveis elementos de verdade e dc santificação, que lhe pertencem como próprios e tendem à unidade católica, e crendo na ação do Espírito Santo que suscita no coração dos discípulos o anseio a esta unidade, nós temos a esperança de que os cristãos que ainda não  estão em plena comunhão com a Igreja única, se reunirão um dia num só rebanho com um só pastor. Cremos que a Igreja é necessária à salvação, porque o Cristo, o único mediador para alcançar a salvação, se torna presente para nós em seu Corpo que é a Igreja. Mas o desígnio divino da salvação abrange a todos os homens. Todos aqueles que sem falta própria ignoram o Evangelho do Cristo e sua Igreja, mas procuram a Deus sinceramente e sob o influxo da graça se esforçam por cumprir sua vontade, reconhecida pelas prescrições de sua consciência, aqueles, em número que só Deus conhece, podem obter a salvação. Cremos que a missa celebrada pelo sacerdote, representante da pessoa do Cristo em virtude do poder recebido pelo sacramento da ordem, é oferecida por ele em nome do Cristo e dos membros de seu Corpo místico, é o sacrifício do Calvário, tornado presente em nossos altares. Cremos que o pão e o vinho consagrados pelo Senhor na santa Ceia foram transformados em seu corpo e em seu sangue, que seriam oferecidos por nós na cruz, assim como o pão e o vinho consagrados pelo sacerdote são mudados no corpo e no sangue do Cr isto glorioso reinante no céu. Cremos que a misteriosa presença do Senhor, sob o que continua a ter a nossos olhos a mesma aparência que antes, é uma presença verdadeira, real e substancial. O Cristo não pode estar presente neste sacramento, senão pela transformação em seu corpo da própria realidade do pão e pela transformação em seu sangue da própria realidade do vinho, permanecendo apenas inalteráveis as propriedades do pão e do vinho que nossos sentidos percebem. Esta mudança misteriosa, a Igreja denomina de maneira muito apropriada de transubstanciação. Toda explicação teológica, que procure alguma inteligência deste mistério, deve, para concordar com a fé católica, sustentar que na sua própria realidade independente de nosso espírito, o pão e o vinho cessaram de existir depois da consagração, de forma que é o corpo e o sangue adoráveis do Senhor Jesus que desde então se apresentam diante de nós sob as aparências sacramentais do pão e do vinho, como quis o Senhor, para se dar a nós em alimento e para nos associar à unidade de seu Corpo místico. A única e indivisível existência do Senhor no céu não é multiplicada, mas é tornada presente pelo sacramento nos múltiplos lugares da terra depois do sacrifício no Santíssimo Sacramento, que é no tabernáculo o coração vivo de cada uma de nossas igrejas. É para nós um dever suave honrar e adorar na santa hóstia que nossos olhos vêem, o Verbo encarnado que não vêem, o qual sem deixar o céu se torna presente diante de nós. Confessamos que o reino de Deus, começado aqui na Igreja do Cristo não é deste mundo, cuja figura passa, e que seu crescimento próprio não pode confundir-se com o progresso da civilização, da ciência ou da técnica humanas, mas consiste em conhecer cada vez mais profundamente as insondáveis riquezas do Cristo, em esperar sempre mais intensamente os bens eternos, em responder cada vez mais ansiosamente ao amor de Deus, em distribuir sempre mais generosamente a graça e a santidade entre os homens. Mas é este mesmo amor que leva a Igreja a se preocupar constantemente com o verdadeiro bem temporal dos homens. Sem deixar de lembrar a seus filhos que não possuem aqui morada permanente, ela os incentiva também a contribuir cada um conforme sua vocação e seus meios para o bem-estar da cidade terrestre, a promover a justiça, a paz e a fraternidade entre os homens, a proporcionar ajuda a seus irmãos, especialmente aos mais pobres e infelizes. A intensa solicitude da Igreja, esposa do Cristo, pelas necessidades dos homens, suas alegrias e esperanças, suas penas e esforços, não é outra senão seu grande anseio de estar presente entre eles para iluminá-los com a luz do Cristo e reuní-los todos em torno dele, único Salvador. Jamais poderá dar a entender que se conforma com as coisas deste mundo, nem que diminua a ardorosa expectativa do Senhor e do seu reino eterno. Cremos na vida eterna. Cremos que as almas de todos aqueles que morreram na graça do Cristo, seja seja que tenha de ser purificadas no purgatório, seja que no mesmo instante da morte Jesus as leve ao paraíso como fez com o Bom Ladrão, são o Povo de Deus na região para além da morte, que será definitivamente vencida no dia da ressurreição quando estas almas serão reunidas a seus corpos. Cremos que a multidão daqueles que estão reunidos em torno de Jesus e de Maria no paraíso forma a Igreja do céu, onde na eterna beatitude vêem a Deus tal qual é (1 Jo 8,2) e onde são também, em diversos graus, associados com os santos anjos no governo divino exercido pelo Cristo glorioso, intercedendo por nós e nos ajudando em nossa fraqueza por sua solicitude fraternal.  Cremos na comunhão de todos os fiéis no Cristo, daqueles que são peregrinos na terra, dos mortos que completam sua purificação, dos bem-aventurados do céu, todos juntos formando uma só Igreja. Cremos que nesta comunhão o amor misericordioso de Deus e de seus santos está à escuta de nossas preces, como nos disse Jesus: "Pedi e recebereis" (Lc 10,9-10; Jo 16,24). Assim é com fé e na esperança que aguardamos a ressurreição dos mortos e a vida do mundo futuro. Bendito seja o Deus três vezes santo! Amém!"





Paulo VI ALOCUÇÕES SOBRE A IGREJA1967 – 1972 (10 DE JULHO DE 1968 – AUDIÊNCIA)











Digamos uma palavra, uma só e de passagem sobre um fenômeno que se observa nos meios que se dizem religiosos e cristãos: o da religião antropocêntrica, isto é, de uma religião orientada para o homem como principal centro de interesse, ao passo que a religião deve ser, pela sua natureza mesma, teocêntrica, orientada para Deus primeiro, como seu princípio e seu fim último. Secundariamente, voltada para o homem, procurado e amado em função de sua origem divina e por conseqüência em função de relações e deveres que disso resultam. Falou-se então de religião vertical e de religião horizontal. É a segunda de caráter filantrópico e social, que se impõe entre os que não têm uma visão soberana da ordem ontológica, isto é, do real e do objetivo, da religião. Será que desejamos negar a importância que a fé católica liga ao interesse devido ao homem? Certamente que não. Nem queremos atenuar este interesse, que nos obriga, a nós cristãos, sobremaneira e sem cessar. Não esqueçamos que seremos julgados sobre o amor efetivo que tivermos comunicado a nosso próximo e em particular àquele que se acha em necessidade, àquele que sofre e ao decaído. Sobre este ponto não fazemos nenhuma reserva injustificada, mas devemos nos lembrar sempre de que o princípio do amor do próximo é o amor de Deus. Aquele que esquecesse a razão pela qual nós nos proclamamos irmãos uns dos outros isto é, que Deus é nosso pai, de todos nós aquele poderia também esquecer num dado momento os grandes deveres de tal fraternidade e não ver mais no seu semelhante um verdadeiro irmão, mas um estranho, um rival ou inimigo. Se na religião se dá prioridade à corrente humanitária, corre-se o risco de transformar a teologia em sociologia e de esquecer a hierarquia fundamental dos seres e dos valores. "Sou o Senhor, teu Deus, não terás outro deus além de mim", é o que lemos no Antigo Testamento (Êx 20,1) e em o Novo, quando o Cristo ordena: "Amar a Deus ... é o maior mandamento. O segundo lhe é semelhante: Amarás teu próximo como a ti mesmo" (Mt 22,37-39). Faz-se mister não esquecer que a preponderância dada ao aspecto sociológico sobre o aspecto teológico propriamente dito, pode criar outro perigo: o de submeter a doutrina da Igreja a critérios humanos, relegando-se a segundo plano os critérios intangíveis da Revelação e do magistério oficial da Igreja. Que se tomem em consideração no exercício do ministério pastoral, as necessidades humanas, muitas vezes graves e urgentes, pode-se admitir evidentemente e mesmo promover, sob condição, porém, que tal consideração não implique a depreciação da prioridade e autenticidade da ortodoxia teológica. A fé aceita e posta em prática não implica a negação dos deveres de caridade e das graves e prementes necessidades de ordem social. Ao contrário, proporciona inspiração e força para isso. É ao mesmo tempo também proteção, apoio, primeiro contra a tentação de que o homem caia no "temporalismo", a saber, a tendência de dar o primeiro lugar aos interesses temporais -tentação de que a religião deve se defender, hoje mais do que nunca- em seguida contra a tentação mais grave ainda, a de querer instaurar nova ordem social, não somente sem a caridade, mas, o que é pior, com a violência, substituindo um poder todo-poderoso e egoísta a outros, tido como superado, frustrado e injusto. Moral sem Deus, religião sem Cristo e sem Igreja, humanismo sem noção autêntica do homem, não podem conduzir a bom porto. Que nossa fé nos preserve destes erros fatais e que em nossa busca de perfeição pessoal e social esta fé continue a nos ser sempre luz e guia. 





Paulo VIALOCUÇÕES SOBRE A IGREJA1967 - 1972 (24 DE JULHO DE 1968. AUDIÊNCIA GERAL):








O homem está em busca de si mesmo. Quer tomar consciência de si. Quer dar à existência uma expressão sua, que sempre denomina de nova, e por vezes de livre, integral, poderosa, original, pessoal, autêntica... Falou-se de super-homem e de vida heróica. Outros o definiram de preferência sob o aspecto biológico e zoológico. A antropologia está em discussão em todos os níveis. É agora o tema principal da discussão científica, filosófica, social, política e até religiosa. Que é o homem? Que tipo de homem podemos considerar ideal? Volta a antiga pergunta de Sócrates: "Eu te pergunto: que é um santo?" Em simples conversa como esta apresentemos apenas a questão, não decerto para tratar dela e resolvê-la, mas só para chamar nossa atenção para esse tema central da problemática contemporânea. E para por em evidência hoje uma dificuldade proveniente de nossa qualidade de cristãos. Não nos referimos agora àquela dificuldade já mencionada, do teocentrismo, isto é, da posição central que Deus ocupa no conceito da vida cristã, em confronto à auto-idolatria moderna, com o antropocentrismo. Não nos referimos agora ao conceito humanístico e profano que coloca o homem no centro de tudo. Falamos antes na atividade penitencial que se acha no limiar da participação ao "reino dos céus" (Mt 3,2) e que se chama metánoia, conversão, a saber, mudança profunda e atuante dos pensamentos, dos sentimentos, da conduta, a qual obriga a certa abnegação de si mesmo, e que acompanha tanto o aprendizado como a observância das normas cristãs. Esta atitude requer renúncias por vezes muito pesadas, como os votos religiosos. Infunde no fiel com seu grande, mas salutar sacrifício, o senso do pecado. Exige vigilância quanto aos perigos e tentações que espreitam o curso da vida a cada passo. Traça como caminho do homem a via estreita, como sendo a única que conduz à salvação (Mt 7,13-14). Requer uma imitação do Cristo nada fácil, e impele até à exaltação de sua cruz, e a certa participação no seu sacrifício. A vida cristã tem em grande conta a abnegação, a mortificação, a penitência. 




"O cristianismo não confia no humanismo naturalista. Sabe que o  homem é um ser ferido desde sua origem, que traz na complexa riqueza de suas faculdades, desequilíbrios extremamente perigosos, necessitando de austera e permanente disciplina. Para viver bem o cristianismo, são necessárias constantes reparações, reformas periódicas repetidas renovações. A vida cristã não é mole nem fácil, não é cômoda e formalista, não é cegamente otimista, moralmente acomodante e abúlica, é alegre, mas não gozadora. É este o aspecto que se opõe mais à mentalidade moderna, que aspira a uma vida plena, cômoda, espontânea, gozadora."




Considera o cristão como um ser inibido e escrupuloso, fora das experiências mais fortes, que costumam ser as das paixões livres, estranho às correntes impetuosas da moda, despida de preconceitos tanto no pensamento como na conduta. Segundo esse difundido modo de pensar, o cristianismo pode ser apreciável sob o aspecto humanístico, pela interioridade de suas raízes operativas, ou pela simpatia para com o sofrimento inerme e angustiado do homem, ou pelo espírito de iniciativa, a que dá origem em favor da igualdade e da fraternidade humana, mas não, por seus dogmas religiosos e muito menos por seu caráter penitencial. O homem moderno é orientado para a vida sem renúncia e sem dor, para a vida sadia, higiênica, gozadora e feliz. Filhos caríssimos, aceitemos esse contraste, especialmente na irredutível oposição de seus princípios. Não podemos esquecer a palavra do Mestre, quando comentava uma desgraça acontecida, a queda da torre de Siloé, com a morte de dezoito pessoas: "Se não fizerdes penitência, perecereis todos do mesmo modo" (Lc 13,4-5). Em todo o Evangelho ressoa este estribilho da abnegação de si mesmo, da contribuição, da correção de certas tendências pessoais, desordenadas, da penitência e da expiação. Abre ao cristianismo suas primeiras conquistas (At 2,38; 11,18; 17,30). Ressoa fortemente e por vezes de modo bem lúgubre, em certas expressões do cristianismo medieval. Chega até nossos tempos especialmente com certas observâncias do jejum quaresmal. O Concílio lhe faz eco. Perde seus tons mais rigorosos e formais na recente Constituição Poenitemini, mas para reafirmar-se em indulgentes expressões consoante às condições da vida moderna, não menos exigentes em seu espírito e em algumas formas hoje mais práticas, mas sempre sensíveis e sinceras. 




"A necessidade de orientar resolutamente a própria vida para Deus e para sua vontade, a necessidade do domínio de si e da purificação da própria vida, a razão de ser de uma escolha fundamental que dê norma e valor moral à própria conduta, a íntima e premente exigência de reparar as próprias faltas, a secreta atração por aproximar-se da cruz de Cristo, e completar na própria carne seus sofrimentos (Col 1,24), dão ainda hoje, onde quer que o Evangelho seja compreendido e vivido, um lugar insubstituível à penitência na imagem ideal do homem novo, do homem verdadeiro, do homem em busca de perfeição." 




Não deve ser impossível nem mesmo difícil ao homem moderno compreender esta necessidade. O homem esportivo, por exemplo, oferece a são Paulo um argumento que do campo físico passa ao espiritual, e que, por conseguinte, pode refluir do campo espiritual ao campo prático da vida corrente: "Todos os atletas se impõem rigorosa abstinência" (1 Cor 9,24-27). As coisas fortes, as coisas grandes, as coisas belas, as coisas perfeitas são difíceis e exigem renúncia, esforço, engajamento, paciência, sacrifício. A penitência cristã é para o homem novo e perfeito. Ela exerce um papel importante. É funcional. Não é fim para si mesma. Não diminui o homem. É uma arte para que restaure sua primeira fisionomia original, aquela que reflete a imagem de Deus, como Deus havia concebido o homem ao criá-lo (Gen 1,26-27). Seu fim é imprimir na face humana, depois da aflição da penitência, o esplendor pascal de Cristo ressuscitado. Este é o nosso humanismo. Parece paradoxal. Mas nosso humanismo vence a grotesca deformação da beleza humana procurada na "dolce vita". Cicatriza as feridas e enxuga as lágrimas com que a dor regou a face do homem. Dá novamente à nossa vida a segurança, que ela mais reclama e que mais lhe falta a da perfeição da imortalidade. "Quem tiver ouvido para ouvir, que ouça", diz o Senhor (Mc 4,23; Mt 19,12). 





Paulo VIALOCUÇÕES SOBRE A IGREJA1967 - 1972: (4 DE AGOSTO DE 1968. AO ÂNGELUS EM CASTEL GANDOLFO)










O ensinamento de nossa encíclica Humanae Vitae teve numerosos ecos, e a nosso conhecimento, nunca tantos como nesta ocasião chegaram ao papa, provenientes de todas as partes do mundo, e de todos os meios, tantas mensagens de agradecimento e de aprovação pela publicação de semelhante documento. Se afirmamos, isto é para agradecer cordialmente a todos aqueles que acolheram nossa encíclica e nos testemunharam sua adesão. Que o Senhor os abençoe! 




"Sabemos também que numerosos são aqueles que não apreciaram nosso ensinamento, muitos mesmo lhe são hostis. Em certo sentido podemos compreender esta incompreensão e hostilidade. Nosso ensinamento não é fácil e vai de encontro a um costume que se difunde, hoje, como cômodo e aparentemente favorável ao amor e equilíbrio na família. Queremos ainda lembrar que a lei que reafirmamos não é nossa, mas é aquela das estruturas da vida, do amor e da dignidade humana. Isto significa que ela deriva da lei de Deus. Não é uma lei que ignora as condições sociológicas e demográficas de nosso tempo. Não é em si, como alguns parecem supor, contrária a uma limitação razoável da natalidade. Nem às pesquisas científicas e aos tratamentos terapêuticos e ainda menos à paternidade realmente responsável, muito menos à paz e harmonias familiares. É apenas uma lei moral exigente e severa, sempre válida hoje, que proíbe o uso de meios cujo fim é impedir a procriação, degradando assim a pureza do amor e missão da vida conjugal."

 




Falamos em virtude de nosso cargo e por caridade pastoral. Dirigimos uma saudação paternal a todos os esposos e a todas as famílias que procuram e encontram na ordem querida por Deus sua força moral e sua verdadeira felicidade. De todo o coração lhes damos nossa bênção e a vós todos, ao mesmo tempo, como uma sociedade fundada sobre costumes cristãos. 




Paulo VIALOCUÇÕES SOBRE A IGREJA1967 - 1972 (23 DE AGOSTO DE 1968 - DISCURSO PRONUNCIADO EM BOGOTÁ):












É às categorias mais numerosas e mais representativas que compõem esta assembléia, que dirigimos algumas palavras para responder à objeção possível de ser suscitada no espírito de todos: 



 

 

"Será que basta só a caridade? Será o amor capaz e suficiente para soerguer o mundo, para triunfar das dificuldades inúmeras e multiformes que se opõem ao desenvolvimento de transformação e regeneração da sociedade, tal qual se nos é apresentada hoje pela história, pela etnografia, a economia, a política e a organização do poder público? Em face ao mito atual da eficiência do temporal, estamos realmente seguros de que a caridade não é uma ilusão ou uma alienação? Devemos responder sim e não. Sim, a caridade é necessária e suficiente como princípio de propulsão do grande fenômeno de renovação do mundo defeituoso em que vivemos. Não, a caridade não basta, se não passa de pura teoria, verbal e sentimental, se não leva após si outros valores, em primeiro lugar a justiça que é o mínimo de caridade e outros coeficientes, que tornem prática, eficaz e concreta a ação inspirada e mantida pela caridade, no domínio tão diversamente especifico das realidades humanas e temporais."




Sabemos bem que no momento em que o papa visita pela primeira vez este continente, essas realidades passam por uma crise profunda aqui na América Latina, verdadeiramente histórica, revestindo muitos e até excessivos aspectos inquietantes e aflitivos. 





"Pode o papa ignorar tal inquietude? Não seria falha uma das metas de sua viagem, se voltasse a Roma sem ter tocado seriamente no ponto central do problema que suscita esta angústia? Muitos, especialmente entre os jovens, insistem sobre a necessidade de mudar sem tardança as estruturas sociais, que segundo eles se opõem à instauração de condições realmente justas para os indivíduos e para as comunidades. Alguns concluem até que o problema capital da América Latina não pode ser resolvido senão pela violência. Com a mesma lealdade que nos obriga a reconhecer que tais teorias e tais práticas encontram muitas vezes sua motivação última em nobres impulsos de justiça e de solidariedade, devemos dizer e reafirmar, entretanto, que a violência não é evangélica nem cristã e que as mudanças bruscas e violentas de estruturas seriam ilusórias, ineficazes mesmo, e não conforme à dignidade do povo."






 



Esta dignidade exige, com efeito, que transformações necessárias se realizem a partir de dentro, graça a uma tomada de consciência, a uma preparação adequada, e à participação efetiva de todos, participação esta que as condições atuais de vida, muitas vezes desumana, e a ignorância, impedem de efetivar. 





"Por conseguinte, a nosso critério, o fecho de abóboda neste problema fundamental da América Latina se acha num esforço duplo, simultâneo, conjugado e reciprocamente benéfico: de uma parte, certo, proceder à reforma das estruturas sociais, mas a uma reforma gradativa, possível de ser assimilada por todos, de outra parte, que aliás irá de par, impõe a necessidade de empreender uma ação vasta e paciente, tendente a favorecer a "maneira de ser homens" para a grande maioria dos que vivem na América Latina. Ajudar a cada um a tomar consciência plena de sua própria dignidade, a desenvolver sua personalidade na comunidade de que é membro, a ser pessoa consciente de seus direitos e deveres, a tornar-se livremente elemento válido para o progresso econômico, cívico e moral da sociedade, eis a grande tarefa prioritária que se impõe e sem a qual toda mudança brutal das estruturas sociais seria um subterfúgio inútil, efêmero e perigoso. Essa tarefa, bem o sabeis, se traduz concretamente em toda atividade, suscetível de favorecer a promoção integral do homem, e sua integração efetiva na comunidade: alfabetização, educação de base, educação permanente, formação profissional, formação da consciência cívica e política, organização metódica dos serviços materiais, indispensáveis ao desenvolvimento normal da vida individual e coletiva na época moderna."

 



Podemos esperar que estes graves problemas sejam meditados e apreciados em seu justo valor, à luz do mistério de caridade que estamos celebrando? Caros filhos da América Latina, podemos esperar que sereis capazes de haurir deste mistério a força necessária e eficaz, para que cada um de vós apresente sua justa e urgente contribuição para solucionar estes problemas? O papa espera isso. O papa confia em vós. De nossa parte, queremos repetir diante de vós que representais todas as classes sociais da América Latina, a nossa resolução que é de perseguir, com novo impulso e com todos os meios possíveis, o esforço para atingir os objetivos que acabamos de enumerar e que tínhamos já proclamado ao mundo na encíclica Populorum Progressio.


 


 

Paulo VI ALOCUÇÕES SOBRE A IGREJA 1967 - 1972 (23 DE DEZEMBRO DE 1967. ALOCUÇÃO AOS MEMBROS DO SACRO COLÉGIO E DA PRELATURA ROMANA)










Para descrever a face atual da Igreja duas grandes linhas se impõem, provenientes do Concílio, que são manifestamente reconfortantes:




"A primeira é a de sua renovação moral e espiritual, a da procura de sua autenticidade na fé e na caridade, no seguimento e mesmo na presença do próprio Cristo, seu fundador, mestre e redentor. Esta primeira linha é, por conseguinte, sua vitalidade, santidade, no penoso cumprimento de sua missão, e na expectativa amorosa de sua consumação escatológica no feliz encontro com o muito amado Senhor Jesus. A segunda linha característica é a de um novo contato com o mundo atual, contato mais estreito, mais exemplar, mais benéfico, mais apostólico, ao mesmo tempo mais discreto e espiritual. Vemos o esforço de uma aproximação apostólica, que se estende desde os irmãos, que tentamos conduzir à reconciliação e à comunhão, até todos os homens de nosso tempo, seja quais forem, vizinhos ou afastados, pequenos ou grandes."





Uns, entusiasmados pelo seu domínio crescente sobre o mundo exterior, outros, desiludidos ou desesperados por não serem senhores de si mesmos, e por não poderem possuir a vida em toda sua verdade e plenitude. Os primeiros, absorvidos pelos trabalhos e ingentes problemas sociais, que derivam desta busca constante. Os outros, esmagados pelos sofrimentos e tentações da existência humana. 




"Todos hoje, graças a um novo desejo de amar e de servir, estão no coração aberto e vivo da Igreja, bem consciente de seus limites, mas não menos certa dei saia vocação para a salvação de toda a humanidade. Não podemos defender-nos, diante de tal visão, de uma impressão inebriante e entusiasta de beleza: a Igreja católica, esta Igreja à qual temos a honra e a sorte de pertencer e o devei- de servir, esta Igreja que, precisamente pelo motivo de estar consagrada a uma perfeição inatingível pelas forças humanas, é hoje e de toda a parte objeto de toda a espécie de críticas, desconfianças e aversão, esta Igreja estruturada historicamente e canonicamente como é, nos revela hoje mais do que nunca algo de sua beleza espiritual."




Os sinais, os frêmitos, os dons do Espírito Santo, são ainda visíveis na sua face humana, para aqueles que observam esta face sempre sulcada de rugas, banhada de suor, de lágrimas de sangue, mas radiante de graça e de verdade, e nos deixam entrever como será um dia sua beleza total, na claridade e na santidade. Convidam-nos a celebrar nossa muito querida Igreja, como a humanidade nova, que o Cristo fundou em seu nascimento.

 

 




27 DE DEZEMBRO DE 1967 (AUDIÊNCIA GERAL)











É bom que lembremos o grande princípio, reafirmado pelo Concílio e já enunciado - não nos esquecemos - por nosso grande predecessor Pio XI, de venerável memória: 





"Por natureza, a vocação cristã é igualmente vocação ao apostolado". No corpo do Cristo, que é a Igreja - diz o Concílio - "todo o corpo trabalha pelo seu crescimento, conforme a tarefa de cada membro" (Ef 4,16). Importante princípio, cuja aplicação deve provocar a renovação e expansão da Igreja. Verdade belíssima, mas arriscada, em particular para vós, os leigos, que vos vedes honrados, ao sentir assim reafirmado este critério constitucional da Igreja. Ninguém é inútil, ninguém poderá ficar absolutamente passivo, ninguém poderá permanecer inativo e insensível à vida da Igreja." 




Todos e cada um devem fazer algo por ela, em função da dupla finalidade pela qual foi instituída: 



"A salvação das almas (sendo a glória de Deus sua primeira meta) e o bem, mesmo temporal da sociedade, sempre em harmonia com os princípios cristãos. Trata-se ao mesmo tempo de um dever e de um direito: todo leigo católico, todo filho fiel da Igreja pode e deve ser ativo no seio dela. Refleti bem nisso." 




Este princípio do apostolado dos leigos, de todos os leigos fiéis à Igreja, pode ter importantes conseqüências em cada alma, nas comunidades paroquais, na sociedade, no mundo. Entre muitas pessoas, até entre os que "vão à Igreja", está enraizada a idéia de que não têm nenhuma responsabilidade para com a Igreja. "Isto não é meu trabalho", dizem muitos. "Não quero cuidados nem obrigações. Procuro manter minhas idéias e ficar livre em meus atos". Não é verdade!

 

 

 

Fonte: Vatican.va





CONCLUSÃO:











Como vimos nas próprias palavras do Santo padre Papa Paulo VI, contrariando muitos aqueles que dizem que "o Catolicismo após o Concílio vaticano II, está substituindo a religião de Deus pela religião do Homem", propondo conciliar a cidade dos homens com a de Deus, e que o teocentrismo foi sistematicamente substituído pelo antropocentrismo, simplesmente porque  Paulo VI ao encerrar o Vaticano II  declarou: "Nós também temos o culto do homem" . Que dedução mais simplória e leviana por parte daqueles que querem uma "igreja museu", presa e engessada ao passado, preocupada apenas com ritos e proibições tipo: não bater palmas durante a celebração, se  o padre deve ficar de costas ou de frente para a assembleia, se a comunhão deve ser recebida na boca, de pé ou de joelhos, se celebra em latim ou na língua vernácula, revelações particulares (vejam no que deu uma revelação particular não reconhecida pela igreja como foi "Palmar de Tróya" na Espanha, onde vários absurdos se justificavam pelo mito fundante da igreja: quatro meninas afirmaram ter presenciado a aparição da Virgem Maria na propriedade “La Alcaparrosa”, em 1968), trechos escolhidos cirurgicamente da tradição e magistério...como se a nossa salvação e missão da igreja se resumisse exclusivamente a isso. Na verdade, são tentações demoníacas que nos levam ao tentação do imobilismo: dado que «se fez sempre assim» (Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium, 33) – esta afirmação do gênero: “fez-se sempre assim” é um veneno na vida da Igreja – Bradam a todos pulmões: é melhor não mudar! Quem se move neste horizonte, mesmo sem se dar conta, cai no erro de não levar a sério o tempo que vivemos! O risco é que, no fim, se adotem soluções velhas para problemas novos: um remendo de pano cru, que acaba por criar um rasgão ainda maior (cf. Mt 9, 16). São João nos recorda que: “Deus é amor” (1 Jo 4,16); “porque Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16); “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1); “nós amamos, porque Ele nos amou primeiro” (1 Jo 4,19). Tendo presente a fundamentação bíblica, inaugurou o Bem aventurado Paulo VI uma expressão muito importante: "a civilização do amor". No dia 17 de maio de 1970, na festa de Pentecostes, disse que a Igreja nascia com a Festa da descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos nos quais receberam a vivificação do Espírito de Deus e o seu corpo místico que é a Igreja. 










O pensamento volta-se ao fenômeno histórico, social e misterioso que é a Igreja de Cristo Jesus. Ele dizia também que aquela festa interessava a todas as pessoas porque Pentecostes é a superação das divisões, dos conflitos entre as pessoas e povos porque o Espírito Santo une as pessoas na sua diversidade em Cristo, com o Pai. Ele reforça o milagre da diversidade das línguas pelo Espírito Santo, compreensíveis a todos. Desse modo o Bem aventurado Papa Paulo VI falou da civilização do amor: Pentecostes inaugurou a civilização do amor e da paz. A civilização possui um significado de um progresso de estado de vida para outro, mais evoluído, de respeito, de dedicação, de doação e de amor. Todas as instituições deveriam evoluir para algo melhor, surgindo novos pensamentos, novas culturas em vista de uma convivência fraterna, de amor. Por isso houve esta expressão inaugurada pelo bem-aventurado Papa Paulo VI da civilização do amor, desejando que todas as pessoas superem as divisões, os conflitos de guerra, de convivência humana para uma civilização do amor. Pentecostes trouxe uma civilização do amor, porque todos se entenderam pelo fenômeno da diversidade das línguas, e todos compreenderam a mensagem evangélica do amor de Deus em Jesus Cristo e na sua Igreja. Naquela ocasião houve a constituição da única família dos filhos e das filhas de Deus, livres e irmãos e irmãs entre si e com todos. É preciso construir esta civilização do amor que o bem-aventurado Paulo VI tanto desejou para o povo de Deus de seu tempo e a todos nós. Não! O santo padre Papa Paulo VI não quis idolatrar o homem, mas, confiar a esse homem como obra prima da Criação, a missar de restaurar tudo em cristo no amor, não o amor Eros, mas o verdadeiro amor Ágape, que se doa pela salvação e libertação do próximo, esse é o verdadeiro culto do novo homem!











*Francisco José Barros Araújo – Bacharel em Teologia pela Faculdade Católica do RN, conforme diploma Nº 31.636 do Processo Nº  003/17








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Neste Apostolado APOLOGÉTICO (de defesa da fé, conforme 1 Ped.3,15) promovemos a “EVANGELIZAÇÃO ANÔNIMA", pois neste serviço somos apenas o Jumentinho que leva Jesus e sua verdade aos Povos. Portanto toda honra e Glória é para Ele.Cristo disse-nos:Eu sou o caminho, a verdade e a vida e “ NINGUEM” vem ao Pai senão por mim" (João14, 6).Defendemos as verdade da fé contra os erros que, de fato, são sempre contra Deus.Cristo não tinha opiniões, tinha a verdade, a qual confiou a sua Igreja, ( Coluna e sustentáculo da verdade – Conf. I Tim 3,15) que deve zelar por ela até que Ele volte(1Tim 6,14).Deus é amor, e quem ama corrige, e a verdade é um exercício da caridade. Este Deus adocicado, meloso, ingênuo, e sentimentalóide, é invenção dos homens tementes da verdade, não é o Deus revelado por seu filho: Jesus Cristo.Por fim: “Não se opor ao erro é aprová-lo, não defender a verdade é nega-la” - ( Sto. Tomás de Aquino).Este apostolado tem interesse especial em Teologia, Política e Economia. A Economia e a Política são filhas da Filosofia que por sua vez é filha da Teologia que é a mãe de todas as ciências. “Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao vosso nome dai glória...” (Salmo 115,1)

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