O Adocionismo, algumas vezes chamado de "monarquianismo dinâmico", é uma visão teológica não trinitária do cristianismo primitivo, que professa que Jesus nasceu humano, tornando-se posteriormente divino por ocasião do seu batismo, ponto em que foi adotado como filho de Deus. O Adocionismo é uma das duas manifestações do monarquianismo; a outra é o modalismo (sabelianismo), que trata o "Pai" e o "Filho" como dois modos de uma mesma divindade. O adocionismo entende que Cristo, como Deus, foi feito Filho de Deus pela geração e pela natureza, mas Cristo, como homem, é o Filho de Deus apenas pela adoção e graça, dispensada no momento de seu batismo. Desse modo, nega a preexistência de Cristo e, embora afirme explicitamente sua divindade subsequente aos eventos de sua vida, muitos trinitaristas clássicos afirmam que a doutrina a nega implicitamente ao negar a constante união hipostática do Logos eterno com a natureza humana de Jesus.No adocionismo, Jesus é considerado divino, circunstância que ocorre após sua adoção no batismo.Os Adocionistas não consideram Jesus igual ao Pai baseados na passagem: "meu Pai é maior do que eu" (João 14,28) e, como tal, é uma espécie de subordinacionismo.
No Adocionismo havia, ao menos, duas concepções mais ou menos semelhantes (não necessariamente opostas):
1ª)-No pensamento judeu, o Messias é um ser humano eleito por Deus para levar adiante sua obra: tomar os hebreus (um povo até então derrotado várias vezes por inimigos poderosos) e elevá-los por sobre todas as nações em uma espetacular inversão da história. Neste sentido, o Messias não é Deus.
2ª)- Na tradição grega existiam heróis elevados à condição divina depois de extraordinárias proezas ou façanhas, por meio da apoteose. O mais importante exemplo disto é Héracles, que depois de ser queimado vivo, é tomado por seu pai, Zeus, para governar ao seu lado. Devido ao predomínio do Império Romano, cuja orientação cultural era predominantemente grega na época dos primeiros cristãos, alguns teólogos da libertação afirmam que o Cristianimso sofrera algum tipo de influência neste sentido.O Adocionismo era tentador nesta perspectiva para os mesmos cristãos, já que estes eram a princípio uma comunidade composta majoritariamente de pessoas simples, pobres e oprimidas, sendo assim fácil identificar-se com um herói como Jesus, um ser humano qualquer que é eleito ("adotado") por Deus, e que dava esperanças de salvação e libertação aos próprios cristãos.Um dos adocionistas mais famosos foi Teódoto, natural de Bizâncio, e que levou esta doutrina a Roma no ano de 190. Também durante o século II, Paulo de Samósata e os seguidores do monarquianismo expressaram visões semelhantes. A crença foi declarada herética pelo Papa Vítor I. No final do século VIII, surgiu na Espanha, uma segundo onda de adocionismo, liderada por Elipando, Arcebispo de Toledo; e Félix, Bispo de Urgel, que vivia nas planícies do sopé dos Pirenéus. O adocionismo hispânico declarava que Cristo como filho de Deus era gerado, mas como humano ele seria adotado. Alcuíno, líder intelectual da corte de Carlos Magno foi chamado a refutar ambos os bispos. Contra Félix, ele escreveu: “Como o nestorianismo impiedosamente dividiu Cristo em duas pessoas por causa das duas naturezas, o vosso desconhecimento temerariamente dividiu-O agora em dois filhos, um natural e um adotivo.” - O monge espanhol Beato de Liébana, junto o bispo Etério de Osma, combateram o adocionismo, fortemente defendido por Elipando. O credo foi novamente condenado pelo Segundo Concílio Ecumênico, em Niceia (em 787). Nos anos 794 e 799, os papas Adriano I e Leão III, confirmaram a condenação do adocionismo como heresia nos sínodos de Francoforte e Roma, respectivamente.(Fonte:wikipedia).
A "Consciência de Jesus" segundo Leonardo
Boff
Por *D.Fr. Boaventura Kloppenburg, O.F.M
Há alguns meses vi-me inesperadamente
envolvido num sério debate sobre a questão da consciência de Jesus acerca de
seu próprio ser e de sua missão. Surpreendeu-me a destreza com que um grupo de estudantes de Teologia manejava as obras de Frei Leonardo
Boff, O.F.M., e argumentava, triunfante, com o velho “Magister dixit”, para
apresentar uma realmente estranha figura de Jesus de Nazaré.Sentia dificuldades
em acreditar que tais concepções pudessem estar em obras teológicas católicas.
Tive que conceder que não havia lido os escritos cristológicos de meu famoso
confrade petropolitano. Prometi estudá-los, com atenção especial à questão da
consciência de Jesus. Baseia-se o estudo nestes dois livros de Leonardo Boff (=
LB):Jesus Cristo Libertador. Ensaio de Cristologia crítica para o nosso tempo.
9° edição. Editora Vozes, Petrópolis, 1983 (a primeira edição é de 1972). Será aqui citado abreviadamente: Libertador.Paixão
de Cristo – Paixão do Mundo. Os fatos, as interpretações e o significado ontem
e hoje. 2ª edição. Editora Vozes, Petrópolis, 1978 (a primeira edição é de
1977. Será aqui citado abreviadamente: Paixão.
1. O modo como LB concebe a consciência
que Jesus de Nazaré tinha de si mesmo e de sua missão se entende melhor a
partir de "sua particular doutrina sobre a divindade de Jesus":
LB se sente inteiramente à vontade para
dizer e repetir catolicamente que “Jesus é verdadeiramente Deus”. Eis, porém, como explica esta verdade de fé em Libertador: pensa LB que
todo ser humano tem por sua natureza uma abertura tal a Deus que o torna “capaz
do Infinito” (p. 221). Este princípio da
antropologia transcendental é então assim aplicado: “Jesus realizou de forma
absoluta e cabal esta capacidade humana, a tal ponto de poder identificar-se
com o Infinito. A Encarnação significa a realização exaustiva e total de uma
possibilidade que Deus colocou pela criação dentro da existência humana”.
Depois esclarece: “O homem pode, pelo amor, abrir-se de tal modo a Deus e aos
outros, que chega a esvaziar-se totalmente de si mesmo e plenificar-se na mesma
proporção pela realidade dos outros e de Deus. Ora, isso se deu exatamente com
Jesus Cristo” (Libertador p. 221).Daí
sua repetida exclamação (roubada de São Leão Magno); “Humano assim como Jesus
só poderia ser Deus mesmo!” (pp. 171, 193, 269). Tanto se entusiasmou por esta
formulação que a colocou como título do capítulo décimo de Libertador. Mas o que se realizou em Jesus de Nazaré poderia
ocorrer igualmente em cada ser humano: “Nós outros, irmãos de Jesus, temos
recebido de Deus e dele o mesmo desafio: de nos abrirmos mais e mais a tudo e a
todos, para podermos ser, à semelhança de Cristo, repletos da comunicação
divina e humana” (p. 221).
Na p. 269, LB explica o que entende por Encarnação: “Abrir-se a Deus de tal forma que (Jesus) pôde identificar-se com Ele":
"A encarnação designa exatamente a absoluta e exaustiva realização desta possibilidade contida dentro do horizonte da realidade humana, pela primeira vez concretizada por Jesus de Nazaré. Sua história pessoal revelou um tipo de ser-homem, uma forma de comportamento, de falar, de relacionar-se com Deus e com os outros que rompia os critérios comuns de interpretação religiosa. Sua profunda humanidade deixou transparecer estruturas antropológicas numa limpidez e transparência para o Divino que superaram tudo o que até então na história religiosa da humanidade havia surgido. Humano assim como Jesus só poderia ser Deus mesmo. Por causa de tudo isso Jesus de Nazaré foi designado com justa razão de Cristo”. Já que esta Encarnação pode ser repetida por todos os seres humanos, existe em todos eles uma estrutura crística, que é anterior ao Jesus histórico e dele independente, mas nele se manifestou de forma absoluta e exaustiva (p. 269). Tal “estrutura crística” não tem nenhuma referência especial ou necessária ao Mistério Pascal de Jesus, que é apenas seu grande modelo. “Todas as vezes que o homem se abre para Deus e para o outro (sem o auxílio da graça é pelagianismo), sempre que se realiza verdadeiro amor e superação do egoísmo, quando o homem busca justiça, solidariedade e perdão, aí se dá verdadeiro cristianismo e emerge dentro da história humana a estrutura crística” (p. 269s). Será, pois, sempre um processo de autorredenção mediante a estrutura crística virtualmente presente em cada ser humano. Eis o que de fato aconteceu com o homem de Nazaré: “Jesus em sua humanidade viveu com tal radical idade a estrutura crística que deve ser considerado como o melhor fruto da evolução humana… ; como aquele homem que já atingiu a meta do processo de humanização do homem” (p. 271).
Assim, LB pode estabelecer esta tese: “A plena hominização do homem supõe a hominização de Deus” (p. 272, título).
Daí a
doutrina: “O homem mais perfeito, completo, definitivo e acabado é aquele que
pôde identificar-se e ser-um com o Infinito. Ora, Jesus de Nazaré foi aquele
ser humano que realizou essa possibilidade humana até o extremo e assim logrou
chegar à meta da hominização. Porque foi de tal forma aberto a Deus a ponto de
ser totalmente repletado por Ele, é que deve ser chamado de Deus encarnado” (p.
272s).
Eis a Encarnação segundo a "ACHOLOGIA" DE LEONARDO BOFF!
Mas todos podem chegar a isso: “O homem, para tornar-se verdadeiramente ele mesmo, deve poder realizar as possibilidades inscritas em sua natureza, especialmente essa de poder ser um com Deus (sem o auxílio da graça?). Quando o homem chega a tal comunhão com Deus a ponto de formar com Ele uma unidade sem confusão, sem divisão e sem mutação, então atinge seu ponto máximo de hominização. Quando isso se verifica, Deus se humaniza e o homem se diviniza, e surge na história Jesus Cristo” (p. 273).Tomando tudo isso a sério, deve-se concluir que Jesus de Nazaré não era o Verbo encarnado desde sua conceição, mas foi divinizando-se pouco a pouco até ser “totalmente repleto”. É nesse lento processo de divinização ou plena hominização que devemos entender também a progressiva consciência que Jesus de Nazaré não era o Verbo encarnado desde sua conceição, mas foi divinizando-se pouco a pouco até ser “totalmente repleto”. É nesse lento processo de divinização ou plena hominização que (segundo a achologia de Boff) devemos entender também a progressiva consciência que Jesus foi adquirindo e que tinha de si mesmo.
2. Mas, para podermos conhecer a autoconsciência de Jesus, não podemos, segundo LB, recorrer às afirmações que os evangelistas lhe atribuem (devemos abraçar a infalível achologia de boff):
Pois, segundo LB, os Evangelhos foram
escritos numa mentalidade “pré-científica, mítica e acrítica’ (p. 46); são “o
resultado de um longo processo de reflexão, pregação e catequese que a
comunidade dos discípulos elaborou sobre Jesus” (p. 46); são “a cristalização
da dogmática da Igreja primitiva” (p. 46); “contêm POUCO do Jesus histórico,
assim como ele foi e viveu” (p. 47); “retratam as tradições e o desenvolvimento
dogmático da Igreja primitiva” (p. 48). Em suma, escreve LB em Paixão p. 73: “A
situação atual dos textos neotestamentários, como ter-se-á evidenciado nas
reflexões anteriores, vem cercada de tal forma por interpretações teológicas
que já não se permite a reconstrução histórica do caminho de Jesus. O Jesus
histórico só nos é acessível na mediação do Cristo de nossa fé. Em outras
palavras: entre o Jesus histórico e nós existem as interpretações interessadas
dos primeiros cristãos. Esta situação é objetiva e, em sua globalidade,
insuperável”.
Poderia ser uma citação (roubada) de Bultmann
Insistindo fortemente na distinção
entre um fato histórico e seu significado ou sua interpretação teológica
posterior, LB, dizendo-se constantemente apoiado em bons exegetas, recorre a um
expediente relativamente fácil para determinar o que é “histórico” e o que é
“teológico” ou interpretação à luz do plano divino. Quando nalgum texto
atribuído pelos evangelistas ao Jesus histórico se encontram elementos
“teológicos”, ele é declarado simplesmente “não-histórico” e creditado à reflexão
teológica posterior e não mais ao Jesus histórico (incapaz de ser teólogo).
Temos em LB um exemplo típico da aplicação conseqüente da hermenêutica bíblica
racionatista, que seria “científica”. Como Rudolf Bultmann, LB opina que
sabemos muito pouco sobre o Jesus histórico, mas, quando lhe convém, supõe,
conhecer tão bem seu pensamento que é capaz de afirmar serenamente que Jesus
tinha sobre tal ou tal ponto tal ou tal posição, que as comunidades
palestinenses ou helenísticas depois modificaram de tal ou tal maneira.
Eis alguns exemplos desta pulverização
dos evangelhos em seu livro Paixão:
– Na p. 42: todo o processo contra
Jesus era reflexão teológica posterior: “A historicidade de todos estes dados é
assaz discutida sem possibilidade de um consenso por causa da precariedade das
próprias fontes. Acresce ainda que não constam da parte dos evangelistas
testemunhos oculares do processo contra Jesus (apesar da relevância sinótica nos quatro evangelhos).O que os evangelistas referem, é
reflexão teológica com forte acento em textos do AT”.
– Na p. 45: a entrada de Jesus em
Jerusalém é um fato que “foi depois da ressurreição embelezado”. “Estamos,
pois, mais diante de teologia do que de história fatual”.
– Na p. 46: o texto da purificação do
templo, principalmente sobre o Filho do Homem que virá como juiz e libertador,
“já é reflexão pós-pascal”.
– Na p. 46s: a cena da última ceia é
colocada num “marco teológico e não histórico”. Os textos eucarísticos não são
de Jesus histórico (apesar do apostolo Paulo garantir a historicidade em I Cor 11,13). Mas sobre isso haverá depois informações mais detalhadas.
– Na p. 49s: a tentação do Getsêmani:
“O atual relato vem urdido de teologia em função das necessidades parenéticas
da Comunidade primitiva”. “As palavras da oração de Jesus parecem ser
elaboração da Comunidade primitiva” (p. 50). A recomendação de vigiar e orar “é
muito provavelmente um lógion parenético das primeiras comunidades”. Depois: “A
consciência da tentação de Jesus, de como suportou e venceu na oração, levou a
comunidade a elaborar a cena do Getsêmani (achologia de Boff sem fundamentação exegética de consenso entre teólogos).Seu conteúdo não se cinge a fatos
históricos concretos, nas concerne à reflexão cristológica sobre Jesus” (p.
51).
– Na p. 52, sobre todo o processo da
condenação de Jesus: “Historicamente certos são os fatos da crucificação, de
condenação por Pilatos e da inscrição no alto da cruz em três línguas
conhecidas dos judeus. Os demais fatos ou são urdidos de teologia ou constituem
pura teologia (como pescadores e homens simples poderiam elaborar essa suposta elevada teologia alegada por Boff?...), elaborada à luz da ressurreição e da reflexão sobre o AT”.
– Na p. 56: “As cenas de Herodes, de
Barrabás, do ecce Homo e do lavar das mãos, como sinal de inocência, "parecem"(?) estar a serviço de um motivo apologético da Igreja primitiva (falta fundamentação histórica e exegética da parte de Boff para tal negação). Devem mostrar que
o cristianismo não é perigoso ao Estado romano”.
– Não p. 58: as sete palavras de Jesus na cruz, com exceção da de Mc 15,34 (à qual voltaremos depois), “possuem valor histórico discutível” (ué...Boff decide pela sua "teologia infalível", o que é histórico e o que não é?...aqui Boff se assemelha a Lutero que dizia a seus seguidores: "minha teologia e a de Cristo é a mesma coisa, só que a minha é mais aperfeiçoada": Lutero, Tischredden, Conversas à Mesa, Nº 1472, edição de Weimar, Vol. II, p. 107, apud Franz Funck Brentano, Martim Lutero, Ed Vecchi Rio de Janeiro 1956).
– Na p. 58: “Os sinais que se seguem à
morte de Jesus constituem outros tantos procedimentos literários para recalcar
o significado e a importância do fato”. A informação sobre o véu do templo que
se rasgou de cima para baixo não refere um fato histórico, é um código
literário. A confissão da fé do centurião romano ao pé da cruz “é profissão de
fé do evangelista e de sua comunidade” (baseado em que Boff faz estas afirmações? apenas em seus presságios achológicos?).
– Na p. 62s: o texto de Mc 8,31 (sobre
a “necessidade” do sofrimento de Jesus) “é pregação da comunidade primitiva e
não palavra do Jesus histórico”.
– Na p. 65, sobre o texto de Mc 10,45 (“O Filho do Homem veio para dar sua vida em redenção de muitos”): “pertence ao código teológico de Marcos”. Particularmente o importante inciso: “dar a vida em resgate” é um acréscimo posterior “interpretando-se a vida e a morte de Jesus num sentido sacrifical” (p. 66).
– Na p. 67: Mc 14,6-8 (sobre a
consciência de Jesus acerca de seu sepultamento): é uma adição posterior (onde entra aqui o conceito de inspiração e revelação divina? Devemos agora acreditar na achologia de Boff ou no Documento do Concílio Vaticano II ? - Quantos santos a achologia de Boff produziu na Igreja? Quantos santos o Sagrado magistério produziu?).
3. "Com tanta teologia nos textos e tão poucos fatos históricos, já é evidente que não estamos em condições de saber grande coisa sobre a consciência de Jesus acerca de si mesmo e de sua obra..."(SERÁ?)
Tem-se a impressão de que Jesus, segundo LB, antes de sua ressurreição, era incapaz de conhecer a vontade do Pai a seu respeito. LB parece conceber uma teologia que os Apóstolos e discípulos de Jesus passaram por um profundo processo evolutivo na compreensão da natureza e da missão de seu Mestre. Para eles a gloriosa ressurreição do Senhor significou de fato uma total reviravolta em suas concepções. Os dois discípulos de Emaús, que, como os demais (cf. At. 1,6), tinham posto em Jesus suas ilusões messiânicas terrenas, receberam esta enérgica repreensão de Jesus Ressuscitado: “O insensatos e lentos de coração para crer tudo o que os profetas anunciaram! Não era preciso que o Cristo sofresse tudo isso e entrasse em sua glória?” E, continua a informação do evangelista, “começando por Moisés e por todos os Profetas, (Jesus) interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito” (Lc 24,25-27). E aos Apóstolos o Senhor Glorificado se dirigiu nestes termos: “São estas as palavras que eu vos falei, estando ainda convosco: era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos”. E continua o evangelista: “Então (Jesus) abriu-lhes a mente para que entendessem as Escrituras” (Lc 24, 44-45). Foi também para isso que Jesus lhes prometeu o Espírito Santo: “Ele vos conduzirá à verdade plena” (Jo 16,13); “sereis revestidos da força do Alto” (Lc 24,29; At 1,4-5). E no dia de Pentecostes Jesus “derramou” sobre eles a luz divina (At 2,33) e eles começaram a entender teologia. Mas é necessário distinguir claramente entre este processo evolutivo dos seguidores de Jesus e o tipo de conhecimento que o próprio Jesus foi adquirindo em sua vida terrestre antes de sua glorificação. LB supõe constantemente que Jesus, antes da ressurreição, estava sujeito às mesmas limitações dos Apóstolos e que até viveu profundamente afetado pelas falsas concepções de uma imaginada mentalidade escatológica e apocalíptica de seu ambiente e tempo. Não se pode igualar Jesus com os Apóstolos. A diferença é profunda e incomensurável.
Jesus histórico é de fato e historicamente “o Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14)
Não podemos simplesmente desconhecer a inaudita graça da “união hipostática” no Jesus histórico pré-pascal, que faz dele um ser totalmente diferente dos Apóstolos. A maneira como LB imagina a lenta “divinização” de Jesus ou, como ele prefere, sua “plena hominização” (cf. Libertador pp. 268-274), significa pura e simplesmente a negação do dogma da união hipostática. Nem devemos esquecer o que aconteceu com o Jesus histórico logo depois do batismo, “como Deus o ungiu com o Espírito Santo e com poder” (At 10,36; ct. Mt 3,16). Se os Apóstolos ou as primeiras comunidades cristãs, por terem testemunhado a Ressurreição e recebido o Espírito Santo, eram tão capazes de fazer teologia e interpretar os fatos da vida de Jesus à luz do plano eterno do Pai, por que não podemos admitir idêntica ou maior capacidade em Jesus, hipostaticamente unido ao Verbo, especialmente ungido pelo Espírito Santo e intimamente identificado com o Pai? Se o Paulo histórico podia ser “arrebatado até o paraíso, ouvir palavras inefáveis” e “receber revelações extraordinárias” (cf. 2Cr 12, 1-7), que motivos haveria para negar ao Jesus histórico conhecimentos verdadeiramente “teológicos” e “revelados”, sobretudo quando ele mesmo afirma que os recebeu? “Não falo por mim mesmo, mas o Pai, que me enviou, me prescreveu o que devo dizer e de que falar” (Jo 12,49). Se já antes da Ressurreição, o Pai revelava aos infantes os mistérios do Reino (cf. Mt. 11,25; 13,11), por que o divino Infante Jesus não podia receber revelações do Pai?
4. Em sua obra anterior Libertador (de 1972), na p. 128, LB examina os textos segundo os quais Jesus profetizou seus sofrimentos (Mc 8,31; 9,31; 10,32-34 par.) e assume a morte sobre si como sacrifício para a redenção dos homens (Mc 10,45; Lc 22,19s; Mt 26,26.28).
Já que tais profecias supõem um conhecimento bastante pormenorizado da paixão e ressurreição, conclui LB: “parece que, realmente, são vaticinia ex eventu, formuladas posteriormente com o fito de dar sentido ao problema teológico contido na pergunta: Se Deus se manifestou estar do lado de Cristo pela ressurreição, por que não manifestou isso antes?”(em Paixão p. 63 LB repete esta tese). LB insiste particularmente em Mc 10,45 (“… para dar a sua vida pela redenção de muitos”) e afirma que esta formulação “foi colocada na boca de Jesus pela comunidade” (por quem e por que? L.B. não tem as respostas), já que o texto paralelo de Lucas não possui caráter soteriológico. LB passa então aos importantes textos eucarísticos (1 Cr 11,27-26; Mc 14,22-25; Lc 22,15-20; Mt 26,26-29), para dizer que, “parece, supõem uma teologia e uma práxis eucarística da Igreja primitiva”. Admite como “jesuânicas” (vocábulo por ele usado para textos considerados autênticos do próprio Jesus histórico) apenas as palavras referidas por Lc 22,15-19a.29, por terem um caráter escatológico (e não soteriológico, conceito que para LB que não cabe no divino Salvador… ). E por isso, segundo o texto lucano, a última ceia tem um sentido escatológico para significar “a antecipação da festa no Reino de Deus que Cristo quis celebrar com seus amigos mais íntimos antes que irrompesse a nova ordem” (p.129). Pois, e isso, sim, é, para LB, histórico e autêntico: Jesus vivia no ambiente apocalíptico e escatológico da época e acreditava firmemente que o Reino iria irromper em sua vida (p. 129).Mas segundo LB a última ceia como momento da instituição da Eucaristia, com sentido soteriológico, de fato não aconteceu antes da morte de Jesus. Houve apenas uma ceia, como tantas tinha havido antes, mas que agora veio a ser a última, com sentido simbólico escatológico. O próprio Jesus, nesta última ceia, ainda não sabia que iria morrer ou que “devia” morrer. Ele ainda desconhecia o plano de Deus.
5. Para entender a consciência de Jesus, LB confere extrema importância às últimas palavras de Jesus moribundo registradas por Mc 15,34: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”
Aliás, seriam, segundo LB, as únicas palavras historicamente garantidas de Jesus na cruz (p. 58) e seu último grito. Ele chega a escrever: “A cristologia e o tema da consciência messiânica de Jesus e de seu caminho concreto deve, ao nosso modo de ver, ser pensado a partir de Mc 15,34” (Paixão p. 69).
Contava Jesus com a morte PROFETICAMENTE violenta?
Segundo LB em Libertador p. 129, Jesus tinha a consciência de ser o instrumento determinante para a vinda total do Reino. Embora intimamente unido à vontade do Pai, Jesus podia ser tentado “e não sabia exatamente que futuro lhe estaria reservado. No ambiente apocalíptico da época, dentro do qual Cristo mesmo se situa, acreditava-se que o Reino iria irromper após uma renhida luta entre as forças do mal e do bem”. Jesus quer cumprir a vontade do Pai, “que ele não conhece exatamente até o fim”. Ele “entrevia a possibilidade da morte, mas não tinha a certeza absoluta dela. O brado derradeiro, no alto da cruz: “Meu Deus, meu Deus por que me abandonaste?” (Mc 15,34) pressupõe a fé e a esperança inabaláveis de que Deus não iria deixá-la morrer, mas que, mesmo no último instante, iria enfim salvá-la. Agora, porém, na cruz, sabe com toda a certeza: Deus quer que ele seja fiel até o fim com a morte” (p. 130).
Em Paixão p. 68, LB comenta:
“Aqui estamos diante da máxima tentação suportada e vivida por Jesus; poderíamos formulá-la assim: Será que não terá sido em vão todo o meu compromisso? Será que o Reino não virá? Será que terá sido tudo uma doce ilusão? Não haverá um derradeiro sentido para o drama humano? Será que não sou eu o Messias? As representações que Jesus se fizera, homem que era, se desmantelaram completamente. Encontra-se nu, desarmado, totalmente vazio diante do Mistério”.
Depois, na p. 69, LB pergunta: “Como Jesus interpretou sua morte?”
E responde: “Como resultou dos textos referidos acima, nenhum deles goza de autenticidade jesuânica (afirmação baseada em quais evidências? Apenas na achologia Boffenta?) suficiente para nos abrir a porta da consciência e ciência prévia acerca da sua morte próxima. Somos da opinião que Jesus, somente no alto da cruz, deu-se conta de que seu fim realmente estava próximo e que podia realmente morrer. Então num grande grito externa seu profundo desamparo, quase diríamos decepção, e se entrega ao Meu Deus”: Depois da tentativa de reconstruir o caminho do Jesus histórico (aliás de valor “precário, hipotético e caduco”, como ele mesmo reconhece na p. 73), LB torna a interrogar na p. 82: “Que sentido Jesus deu à sua morte?” Já sabemos que o forte de Jesus não era a teologia. LB acaba respondendo com H. Kessler (apelando para a falácia do argumento da autoridade) que, garante LB, “diz com acerto”: “Com toda a probabilidade a pesquisa atual neo-testamentária pode dizer: Jesus não entendeu sua morte como sacrifício expiatório, nem como satisfação, nem como resgate. Nem estava em sua intenção precisamente mediante sua morte redimir os homens”.
Como velho professor de teologia dogmática só posso dar à teologia de Jesus (diga-se: achologia) imaginada por LB, a nota zero!
Em resumo: Jesus só tinha a consciência de ser o instrumento determinante para a irrupção iminente do Reino (“Jesus viveu a efervescência da irrupção iminente”, p. 71). Reino que ele, como vítima também ele das concepções escatológico-apocalípticas de seu tempo, imaginava que iria irromper em seus dias. Mas na cruz perdeu também esta consciência, aliás bem equivocada, que merece nota insuficiente. Esta insistência na equivocada expectativa do Jesus histórico de presenciar ele mesmo a irrupção escatológica ou apocalíptica do Reino, merece uma observação crítica.
Em 1979 o estudioso Jean Carmignac, altamente especializado principalmente nos manuscritos de Qumram, publicou sua interessante pesquisa Le Mirage de l’Eschatologie, com o subtítulo: “Royauté, Régne et Royaume de Dieu… sans Eschatologie” (Editora Letouzey et Ané, Paris).
Desde 1955 ele vem estudando esta temática. Sua bibliografia pesquisada abrange 466 obras!
-Na primeira parte (pp. 13-130) estuda um por um todos os textos neo-testamentários que se referem ao Reino de Deus, para ver exatamente em que sentido se emprega cada vez a palavra “basiléia”, que pode significar “realeza”, “reinado” e “reino”.Mostra a grande originalidade de Jesus.
-Na segunda parte (pp, 131-201) investiga a questão da “escatologia”. Depois de reunir “os delitos da escatologia” (cap. XV), estuda no cap. XVI “a formação de um erro: Reimarus, Strauss, Reuss, Renan”; no cap. XVII descreve “o sucesso de um erro: Johann Weiss e Loisy”; no cap. XVIII analisa “o triunfo de um erro: Albert Schweitzer”; no cap. XIX vem “a lógica de um erro: Rudolf Bultmann”; segue, então o cap. XX, “a volta de um erro: Charles-Harold Dodd”; no cap. XXI vem “a libertação de um erro: Karl. Barth”; para apresentar, no cap. XXII, “o balanço de um erro”; por fim, no cap. XXIII, considera “objeções e conclusões”. O resultado é verdadeiramente espetacular. O autor descobre que todo discurso teológico sobre a Escatologia, com o qual o próprio Jesus histórico estaria profundamente envolvido, não passa de uma verdadeira “miragem”. Mostra que nem o AT, nem os Padres da Igreja, nem os teólogos até o início do séc. XIX sentiram a necessidade deste funesto conceito. O termo “escatologia” foi cunhado em 1804 por K. S. Bretschneider. Lá por 1890 Loisy e Johann Weiss identificam o Reino de Deus e o Fim do Mundo, o que levou A. Schweitzer a confundir Reino de Deus com Escatologia.O “Messianismo”, que se relaciona com a vinda e a atividade do Messias, não tem nada a ver com o Fim do Mundo nem deve ser confundido com Escatologia. A “Apocalíptica” é simplesmente um gênero literário que descreve o futuro com a ajuda de revelações mais ou menos simbólicas, sem relação com a Escatologia. Um amálgama progressivo combina a noção da “basiléia touthéou” com a do Fim do Mundo, depois a noção do Fim do Mundo com a Escatologia, de modo que pouco a pouco se chegou a confundir Reinado ou Reino de Deus e a Escatologia e assim a adulterar completamente nas noções. Na p. 191 s escreve Jean Carmignac:
“Num século que se honra de ter desenvolvido o espírito critico, a Teologia deu um exemplo de verdadeiro espírito não-crítico. Pois as faltas de raciocínio acentuadas nesta obra, as deformações de textos, as petições de princípio ou os círculos viciosos, tudo isso é praticado em pleno dia pelos teólogos mais ilustres ou mais influentes… sem provocar enérgicas refutações. O mundo teológico se comportou, sobre este ponto, como se estivesse anestesiado por uma “moda” onipotente. No meu conhecimento, ninguém se assustou de ver evocar tão frequentemente uma Escatologia da qual o NT jamais fala; ninguém se inquietou para conhecer a data de nascimento deste conceito, nem para estudar suas diversas deformações. Se quiséssemos assinalar todos os autores que, de um ou outro modo, repetem “o Reinado de Deus é o Reino de Deus” ou “o Reino de Deus é o Reinado de Deus”, seria necessário citar quase todos, a começar por Harnack: “Das Reich Gottes ist Gottesherrschaft, gewiss”. Até mesmo os trabalhos mais meticulosos (os de Bultmann) foram realizados a partir de vagas noções correntes, sem séria verificação. Tudo isso é na mesma proporção mais assombroso considerando tantos cursos de universidades. Tantas teses de doutorado, tantos artigos de revistas consagrados à Escatologia! A Escatologia se transformou numa espécie de mito, que chegou a conquistar até os espíritos mais eminentes”.
Escatologia (do grego antigo εσχατος, "último", mais o sufixo -λόγια, "estudo")
É uma parte da teologia e filosofia que trata dos últimos eventos na história do mundo ou do destino final do gênero humano, comumente denominado como fim do mundo. Em muitas religiões, o fim do mundo é um evento futuro profetizado no texto sagrado ou na mitologia. De forma ampla, escatologia costuma relacionar-se com conceitos tais como Messias ou Era Messiânica, a pós-vida, e a alma. Jesus Cristo, conforme registrado nos Evangelhos de Mateus, capítulos 24 e 25, Marcos, capítulo 13 e Lucas, capítulo 21, teceu considerações extensas sobre aquilo que ensinou ser a sua próxima vinda ou "parúsia" bem como o "fim do mundo". No entanto, afirmou que mais ninguém além de Deus sabia quando isso viria a acontecer. As palavras gregas syntéleia e aión que dão origem à expressão fim do mundo em algumas traduções da Bíblia, são no entanto vertidas por outras expressões por diferentes tradutores. Tomando como exemplo o versículo de Mateus 24:3, Versão Corrigida e Fiel, reza: "E, estando assentado no Monte das Oliveiras, chegaram-se a ele os seus discípulos em particular, dizendo: Dize-nos, quando serão essas coisas, e que sinal haverá da tua vinda e do fim do mundo?" Assim, para muitos comentadores bíblicos, esta expressão permite conceber um fim definitivo para o planeta Terra, junto com todo o seu conteúdo. Em contraste, para vários outros, o que realmente chegará ao fim é uma "era" e não a terra literal e seus habitantes, visto que aión é diferente de kósmos, palavra que em geral designa o mundo da humanidade. Também, as palavras "conclusão", "consumação" ou "terminação" são traduções mais precisas da palavra grega syntéleia, que é diferente de telos, usualmente traduzida por fim ou fim completo. Alguns cristãos no Século I d.C. acreditavam que o fim do mundo ou das eras, como consequência da segunda vinda de Cristo, ocorreria durante as suas vidas. À base dos conselhos que o apóstolo Paulo deu aos cristãos em Tessalônica, percebe-se que alguns argumentavam que a volta de Jesus era iminente e que tais especuladores pregavam ativamente essa sua teoria. Parece que alguns até mesmo usavam isso como desculpa para não trabalhar para o seu próprio sustento. O apóstolo Paulo alertou então: "Agora, irmãos, quanto à vinda de nosso Senhor Jesus Cristo e ao nosso encontro com ele, pedimos a vocês o seguinte: não se deixem perturbar tão facilmente! Nem se assustem, como se o Dia do Senhor estivesse para chegar logo, mesmo que isso esteja sendo veiculado por alguma suposta inspiração, palavra, ou carta atribuída a nós." (II Tessalonicenses 2:1–2) - Bíblia Pastoral da Editora São Paulo, 1993 - No entanto, alguns anos mais tarde, a carta atribuída ao Apóstolo Pedro, continha o seguinte alerta: "Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo; em ambas, procuro despertar com lembranças a vossa mente esclarecida, para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos, tendo em conta, antes de tudo, que, nos últimos dias, virão escarnecedores com os seus escárnios, andando segundo as próprias paixões e dizendo: Onde está a promessa da sua vinda? Porque, desde que os pais dormiram, todas as coisas permanecem como desde o princípio da criação." (II Pedro 3:1–4), Versão Revista e Atualizada - As palavras concludentes do último livro da Bíblia, Revelação ou Apocalipse, expressam a esperança cristã da vinda de Cristo e da consequente consumação dos tempos, com as seguintes palavras: "Aquele que atesta essas coisas, diz: 'Sim! Venho muito em breve.' Amém! Vem, Senhor Jesus!" (Apocalipse 22:20) - Bíblia de Jerusalém, nova edição revista e ampliada, 2002. Com base nesta esperança do segundo advento de Jesus Cristo, várias denominações cristãs vieram a desenvolver os seus conceitos, sendo que alguns deles são divergentes, conforme se poderá observar na análise comparativa das suas doutrinas.
Existem pelo menos três grandes correntes de
interpretação das profecias bíblicas escatológicas dentro do
cristianismo:
1. Preterismo: as profecias se cumpriram no passado, tendo pouca ou nenhuma relevância na vida dos seres humanos.
2. Futurismo: o cumprimento se dará num futuro distante, sem que as pessoas saibam quando, como e o que realmente acontecerá.
3.Historicismo: os eventos proféticos, descritos literal ou simbolicamente, ocorrem com o passar do tempo e são históricos, podendo ser interpretados de expressões-chave contidas na profecia.
Em 130 d.C.
Justino, o Mártir, acreditava que Deus estaria a atrasar o fim do mundo porque
desejava que o Cristianismo se tornasse uma religião mundial
Por volta do Século III a maioria dos professos cristãos acreditava que o fim dos tempos ocorreria depois de suas mortes. Em 250 d.C. Cipriano, Bispo de Cartago, escreveu que os pecados dos cristãos eram um prelúdio e prova de que o fim dos tempos estava próximo. Alguns, recorrendo às Tradições Judaicas, fixaram o fim das eras na Sexta Idade do Mundo. Usando este sistema, o fim foi anunciado para 202 d.C. mas, quando esta data passou, foi fixada uma nova data. Na época de Clóvis I, considerado o fundador da França e que se converteu ao catolicismo após ser entronizado como rei em 481 d.C., alguns escritores católicos haviam apresentado a ideia de que o ano 500 d.C marcaria o fim do mundo. Depois de 500 d.C., a importância e a expectativa da vinda do fim do mundo ou das eras como parte dos fundamentos do Cristianismo foi marginalizada e gradualmente abandonada. Apesar disso, surgiu um temporário reavivamento dos temores relacionados com o fim dos tempos com a aproximação do milésimo ano do nascimento de Cristo. Muitos acreditavam na iminência do fim do mundo ao se aproximar o ano 1000. Segundo consta, as atividades artísticas e culturais nos mosteiros da Europa praticamente cessaram. Eric Russell observou no seu livro "Astrology and Prediction": "'Em vista da proximidade do fim do mundo’ era uma expressão muito comum nos testamentos validados durante a segunda metade do Século X." Para muitos católicos hoje em dia, expressões tais como "Juízo Final", "Dia do Juízo" ou "fim do mundo" suscitam visões dum ajuste de contas final e da destruição da Terra. Sob o cabeçalho "Fim do Mundo", o conceituado "Dictionnaire de Théologie Catholique" (Dicionário de Teologia Católica), declara: "A Igreja Católica crê e ensina que o mundo atual, assim como Deus o fez e assim como é, não durará para sempre. Todas as criaturas visíveis feitas por Deus no decorrer das eras[...] deixarão de existir e serão transformadas numa nova criação." Também, o católico "Dictionary of Biblical Theology" (Dicionário de Teologia Bíblica) exalta a criação como "a bondade de Deus", e, como "uma verdadeira obra de arte", mas prossegue descrevendo como os elementos literais, físicos, experimentarão uma "total inversão, mediante uma súbita volta ao caos". No entanto, muitos outros católicos rejeitam a idéia do "fim do mundo", sendo que para eles, a expressão apenas indica um estado de mudança das atuais condições do mundo para condições novas, tal como o mundo já teria sofrido outras metamorfoses no passado. Interpretam a passagem do Evangelho de João, no capítulo 14, versículo 12: "Em verdade, em verdade vos digo: aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas, porque vou para junto do Pai." como um sinal de constante desenvolvimento e aperfeiçoamento infinito do homem. O que diz o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica Ver artigo principal: Doutrina da Igreja Católica A escatologia preocupa-se mais com o fim do mundo e com o destino coletivo da humanidade do que com o destino individual das almas após a sua morte. Acerca disso, o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica (CCIC) ensina que ocorrerá um Juízo final nos últimos momentos que precedem ao fim do mundo, "do qual só Deus conhece o dia e a hora" - Mesmo antes disso, Jesus Cristo, que também "verdadeiramente ressuscitou dos mortos e vive para sempre", ressuscitará toda a humanidade, dando, mais concretamente, uma nova vida, mas desta vez imortal, para todos os corpos que pereceram. Neste momento, todas as almas, quer estejam no Céu, no Purgatório ou no Inferno, regressarão definitivamente aos seus novos corpos. Assim sendo, toda a humanidade reunir-se-á diante de Deus, mais concretamente de Jesus, que irá regressar triunfalmente à terra "como juiz dos vivos e dos mortos". Ele confirmará o julgamento realizado nos inúmeros juízos particulares e permitirá consequentemente que o corpo ressuscitado possa "participar na retribuição que a alma teve no juízo particular". Esta retribuição consiste na "vida bem-aventurada" e santa (para os que estão no Céu ou no Purgatório) ou "na condenação eterna" (para os que estão no Inferno).
Depois do juízo final, dá-se finalmente o fim do mundo. O antigo
mundo, que foi criado no início por Deus, é "libertado da escravidão"
do pecado e transformado nos "«novos céus e na nova terra» (2 Ped
3,13)".
Neste novo estado de coisas, é também "alcançada a plenitude do Reino de Deus, ou seja, a realização definitiva do desígnio salvífico de Deus de «recapitular em Cristo todas as coisas, as do céu e as da terra» (Ef 1,10)". Nesse misterioso Reino, onde o mal é inexistente, os santos (ou salvos) gozarão a sua felicidade eterna e "Deus será «tudo em todos» (1 Cor 15,28), na vida eterna", formando assim uma grande família e comunhão de amor. Os condenados ou ímpios (maus) viverão para sempre no "fogo eterno" e afastados do Reino de Deus.
Fonte:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Escatologia
6. Pela importância que têm os textos eucarísticos para a autoconsciência de Jesus, será necessário examinar o que a este respeito ensina LB em sua obra Paixão.
Ele se refere a estes textos nas pp. 47-49, 65 e 97-98:
a) Nas pp. 47-49, LB sustenta que: “tudo indica que o texto atual foi introduzido de fora para dentro do relato da paixão” (p. 46), elaborado independentemente deste relato e em ambiente helenístico. O fato de aparecer agora no contexto da paixão lhe dá um “marco teológico e não-histórico”. Como Jesus tomou muitas ceias com seus discípulos e outros, comendo pão e bebendo vinho, assim também a “última ceia” podia muito bem ser “como outra refeição qualquer”, mas que agora, de fato, seria a última, sem a intenção, porém, de relacioná-la com a ceia pascal judia (achologia que carece de fundamentação). De acordo com os textos que temos, nesta última ceia há dois elementos comuns: a idéia da aliança e a da entrega sacrifical. LB admite que a idéia da aliança se com pagina bem com a atuação do Jesus histórico (por causa do tema escatológico, com o. qual Jesus se identificara). Mas, insiste LB, “o tema sacrifical dificilmente pode ser atribuído a Jesus” (p. 48). O sentido fundamental da ação da entregar o pão e de estender o vinho é apenas este: “sinal simbólico da irrupção iminente do Reino”. Era esta, naquela noite, a obsessão de Jesus com sua “mentalidade escatológica”. O sentido sacrifical da última ceia é um acréscimo posterior feito pela comunidade. Pois o próprio Jesus nem sabia que sua morte teria um sentido de sacrifício pela redenção dos homens…(achologia que carece de fundamentação). Neste contexto afirma LB como bom católico: “Cristo institui a eucaristia como sacramento” (p. 49). Esta instituição, contudo, “deve ser compreendida no contexto de todo o ministério de Jesus Cristo; não pode ser reduzida apenas a gestos e a palavras do Jesus de Nazaré ao tempo em que vivia entre nós”. E depois assevera: “A eucaristia como sacramento nasce da totalidade do evento Jesus Cristo... nasce da atividade do Jesus ressuscitado e da ação de seu espírito que moveram os Apóstolos a refazerem sempre de novo a ceia do Senhor e a repetirem seus gestos e suas palavras, dando-lhes um sentido sacrifical, eclesiológico, sentido este inscrito dentro do contexto, de continuidade da história e da missão da Igreja missionária pelo mundo”. Portanto, conclui LB, “os textos eucarísticos haviam já elaborado esta teologia sacrifica!” e, por isso, foram depois inseridos nos relates da paixão (achologia que carece de fundamentação).
b) Na p. 65, LB comenta Mc 10,45: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em redenção de muitos (todos)”. Declara que este texto tem o seu Sitz im Leben num contexto eucarístico das comunidades primitivas, no qual “se elaborou a temática do sacrifício”. E como tal “não seria jesuânico” (achologia que carece de fundamentação).Foi a reflexão sobre Is 53 (do Servo Sofredor; na p. 79 informa: “não parece que Jesus se tenha considerado Servo sofredor”) que permitiu aos cristãos ler sacrificialmente a norte de Cristo. Foi nesta linha que eles interpretaram os gestos de Jesus na ceia de despedida, já que “após a morte e ressurreição entenderam que aquilo significava realmente um sacrifício a Deus”. Mas o próprio Jesus não sabia nada disso (?). Por esta razão as palavras atribuídas a Jesus em Mc 10,45 “não seriam palavras jesuânicas, mas teologia já bem elaborada das comunidades primitivas, em contexto eucarístico”.Jesus mesmo, pois, antes de sua glorificação, era, como os Apóstolos, incapaz de fazer reflexões “teológicas” sobre o verdadeira sentido de sua morte. Nem mesmo estava em condições de instituir a Eucaristia (achologia que carece de fundamentação).
c) Nas pp. 97-99, LB volta ao conjunto dos textos eucarísticos,incluindo agora Jo 6,51-58, que é “uma meditação posterior, por volta do ano 100”; e afirma: “Nenhuma destas versões parece provir do Jesus histórico”. Persiste em conceder que Jesus de fato celebrou uma ceia com os seus, mas repete que não podemos saber o que Jesus então disse, já que as palavras que lhe são atribuídas “surgiram pelo menos dez anos após a última ceia e a morte do Senhor”, refletindo as diferentes liturgias então celebradas nas várias comunidades (apesar da historicidade dos 4 evangelhos sinóticos?). Foi apenas então que as comunidades cristãs compreenderam o alcance soteriológico sacrifical da vida e dos gestos de Jesus.
7. Estamos, na verdade, diante de concepções peregrinas que não soam como doutrina católica. Suas afirmações causam estranheza até mesmo em teólogos protestantes, como Harvie Conn e Richard Sturz, que acabam de publicar uma obra, Teologia da Libertação (Editora Mundo Cristão, São Paulo 1984), na qual criticam fortemente as posições de LB. Na p. 90 escrevem: “Mais que tudo, parece que Boff sofre a influência do protestantismo contemporâneo. Nomes e conceitos como os de Bultmann, Tillich, Barth, Moltmann e Pannenberg, junto com Kaesemann e Bonhoefter aparecem com frequência nos seus escritos. Há uma porção de influências em termos filosóficos sobre Boff que vem dos protestantes: o liberalismo moderno de Harnack, o existencialismo de Barth e Tillich, o conceito de esperança e história de Pannenberg e Moltmann e, sobreutdo, a evolução hegeliana de Teilhard de Chardin”. Nem é de estranhar que os conceitos de LB causassem inquietações no ambiente católico. Em fins de dezembro de 1979, os jornais noticiaram amplamente o “caso Boff” e o “processo” que então lhe moviam por parte da Congregação para a Doutrina da Fé sobre sua cristologia. O próprio LB escreveu depois um artigo (“Aclarações acerca de alguns temas da Teologia”) publicado na revista Grande Sinal, de junho de 1982, pp. 357-369. Depois ficamos sabendo que se tratava de “aclarações” feitas a pedido da Santa Sé. Neste artigo de consenso, LB se refere também às questões relacionadas com a Eucaristia. Releva que a dimensão histórica da instituição da Eucaristia não tem muita importância já que – escreve agora LB no citado artigo – os textos eucarísticos “possuem um caráter historicamente fidedigno”, por causa de seu caráter tradicional acentuado por 1 Cr 11,23 (“recebi do Senhor o que vos transmiti: na noite em que foi entregue, o Senhor Jesus… “).LB recorda ainda que tanto os Sinóticos como Paulo “indicam com toda certeza a ocasião histórica em que Jesus pronunciou as palavras eucarísticas”. E esclarece que, “apesar de seu caráter litúrgico-cultural, o valor histórico dos textos não pode ser negado” (como ele negara), pois, “fundamenta-se em sua procedência de testemunhas qualificadas, a saber, dos próprios participantes da última Ceia de Jesus antes de sua morte” (p. 367). Aqui o tom e a argumentação são radicalmente diferentes dos modos de falar e da maneira de argumentar que encontramos nos dois livros que estamos estudando. Neste artigo, LB chega a sustentar que, apesar de serem conservadas em duas tradições litúrgicas diferentes (a de Jerusalém e a de Antioquia), “as diferenças existentes são mínimas”. E afirma categoricamente: “O cerne essencial se reporta ao Jesus histórico” (p. 367). Excelente!O artigo, porém, está escondido numa revista de secundária importância, num fascículo inteiramente dedicado à louvação do “mais fecundo e completo teólogo” (veja o título do artigo que começa na p. 331. Entrementes, os dois citados livros continuam à venda em todo o Brasil (sem as correções de LB supra citadas). A obra Jesus Cristo Libertador já está na 9ª edição, publicada um ano depois da “retractatio”, sem nenhuma correção, incutindo em nossos seminaristas e agentes de pastoral a convicção de que o Jesus histórico, na última ceia, apenas quis antecipar com seus amigos a festa do Reino de Deus e que os textos eucarísticos não são “jesuânicos” (passe o horrível neologismo), mas uma produção da comunidade cristã primitiva. Sem falar do livro Paixão, de Cristo – Paixão do Mundo, que continua inalterado nas mãos de seminaristas e recomendado por professores de Teologia. E protegido por poderosos anjos da guarda.
*D.Fr. Boaventura Kloppenburg, O.F.M - Doutor em Teologia, exerceu até 1971 intensa atividade de magistério em Petrópolis (Convento do Sagrado Coração de Jesus e sede do Teologado Franciscano) e de pregação no Brasil inteiro. Dedicou-se especialmente, na área pastoral, ao esclarecimento do público a respeito do espiritismo e da maçonaria; resultaram destas campanhas obras notáveis referentes ao espiritismo, à reencarnação e à maçonaria. Dom Boaventura foi também perito teólogo do Concílio do Vaticano II, cuja história minuciosamente documentada ele publicou em cinco volumes. Desde 1971, foi Reitor do Instituto Teológico Pastoral do CELAM em Medellin (Colômbia), onde exerceu o magistério e escreveu obras teológicas. Em 1982 foi nomeado Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Salvador (BA). (N. da R.)
Adaptação de: Revista Communio - Vol. IV, ano
IV, N°19, jan./fev.1985.p.5-24
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