Somos todos pecadores porque já nascemos moralmente corrompidos pelo pecado original[1]. Um dos termos mais importantes que os teólogos usam para
descrever as profundezas da corrupção moral herdada pelo homem é a palavra
depravação. A palavra deriva do prefixo “de”, que comunica intensidade, e da
palavra em latim pravus, que significa torcido ou entortado. Dizer que algo é
depravado é dizer que seu estado ou forma original foi completamente
pervertido. Dizer que a raça humana é depravada significa dizer que ela
caiu de seu estado original de retidão e que todos os homens nascem pecadores
moralmente corruptos por natureza.
Para descrever a extensão dessa
corrupção moral, os teólogos frequentemente empregam vários termos que
comunicam a mesma verdade
Os mais comuns são:
-depravação total,
-morte espiritual,
-inabilidade moral.
A expressão depravação total foi empregada
há muito tempo pelos teólogos reformadores e por outros a fim de descrever a
condição decaída do homem. Embora o termo seja apropriado
quando adequadamente definido, as expressões depravação generalizada ou
depravação radical podem ser mais apropriadas.[2] Dizer que o ser humano
homem é depravado em sua atual natureza, não significa que eles sejam
totalmente maus, a ponto de nada restar da liberdade humana. Antes, significa
que a depravação, ou a corrupção moral, afetou seu ser por inteiro em todas as
suas faculdades: corpo, alma, inteligência, vontade e liberdade.
O que essa depravação significa e o
que ela não significa?
1)-Primeiro, depravação da natureza humana
causada pelo pecado original, não significa que a imagem de Deus no homem foi totalmente
perdida ou anulada. Em vários textos, a Escritura ainda
se refere ao homem como sendo feito “à imagem de Deus”.[3] Essa
depravação significa, sim, que a imagem de Deus no homem foi seriamente
deformada e desfigurada e que a corrupção moral polui a pessoa por inteiro,
afetando nossas faculdades: corpo, razão, emoções e vontade.[4]
2)-Segundo, essa depravação não significa
que o homem não tem conhecimento da pessoa ou da vontade de Deus. As Escrituras nos ensinam que todos os homens sabem o
suficiente sobre o verdadeiro Deus e sua vontade e que são indesculpáveis
diante dele no dia do julgamento.[5] O que significa, de fato, é que,
sem uma obra especial da graça, todos os homens rejeitam a verdade de Deus e
buscam suprimi-la para que não perturbe o que restou de suas consciências.[6]
Os homens conhecem suficientemente a verdade sobre Deus para odiá-lo e sobre a
vontade dele para resisti-la.
3)-Terceiro, essa depravação não significa
que o homem não possui consciência ou que seja totalmente insensível ao bem e
mal. As Escrituras ensinam que todos os homens possuem
uma consciência, a qual, se não estiver cauterizada, é capaz de levá-los a
admirar ações e caráter virtuosos.[7] O que, de fato, significa é que os
homens não são obedientes de todo coração às diretrizes de sua consciência. Um
homem não é reto porque conhece o que é bom ou denuncia o que é mal, mas porque
faz o bem que conhece.[8]
4)-Quarto, depravação total não significa
que o homem é incapaz de demonstrar virtude. Há homens que mesmo não tendo sidos
alcançados pelo evangelho, amam suas famílias, sacrificam suas próprias vidas
por outros, realizam seus deveres civis, não toleram o roubo, adultério e outras
mazelas morais e sociais; fazem boas obras em nome de sua religião, ou
convicções. Mas significa, de fato, que tal virtude não é motivada por um amor
genuíno a Deus ou por um desejo verdadeiro de obedecer seus mandamentos. As
Escrituras testificam que nenhum homem ama a Deus de maneira digna ou da forma
que a lei comanda, nem há um homem que glorifique a Deus em cada pensamento,
palavra ou ação.[9] Todos os homens preferem a si mesmo em vez de Deus e é o
amor próprio ou aos outros – e não o amor a Deus – que os move a agirem em atos
de altruísmo, heroísmo, dever civil e boa obra religiosa.[10]
5)- Quinto, essa depravação da nossa
natureza humana, não significa que todos os homens são
tão imorais quanto poderiam ser, ou que todos os homens são igualmente imorais
ou que todos os homens praticam todas as formas existentes de maldade. Nem
todos os homens são delinquentes, fornicadores ou assassinos. Mas
significa que todos os homens nascem com uma grande propensão, tendência, ou inclinação
para o mal e que todos os homens são capazes de praticar mesmo os crimes mais
horrendos e as perversões mais vergonhosas. Como um todo, toda a humanidade
está inclinada a uma corrupção moral cada vez maior e essa deterioração moral
seria incalculavelmente mais rápida se a graça comum de Deus não a
restringisse. O homem, em si mesmo, não pode se libertar ou recuperar-se dessa
espiral decadente e descendente.[11] como vemos muito bem demonstrada na "pirâmide invertida" no inferno de Dante.
Finalmente, a depravação da natureza humana
não significa que todos os homens indispõe das faculdades necessárias para
obedecer a Deus. O homem não é um robô programado para
o mal, mas é incapaz por si só, de corresponder a santíssima vontade de Deus por
causa de fatores além do seu controle, é aqui que entra o mérito da luta contra
o pecado [12]. Deus dotou o homem com intelecto, vontade e liberdade para
escolher. O homem, como um ser moral, é, portanto, responsável diante de Deus.
Essa depravação de nossa natureza, significa apenas o fato de que o homem não
pode mais como antes do pecado original se submeter a Deus sem empecilhos, ele
agora não o deseja por causa de sua própria hostilidade contra Deus presente na
sua natureza decaída[13].
REFERÊNCIAS:
[1] Salmo 51,5; 58,3; Gênesis 8,21
[2] O verbo “generalizar” significa torna
ou tornar-se geral; espalhar-se para todas as partes. Assim, a depravação se
relaciona com a raiz de quem somos por natureza; a depravação procede de nossas
almas como uma mancha viral, e se espalha para o nosso ser por inteiro.
[3] Gênesis 9,6; 1 Coríntios 11,7; Tiago 3,9
[4] Corpo (Romanos 6,6-12; 7,24; 8,10-13),
razão (Romanos 1,21; 2 Coríntios 3,14-15; 4,4; Efésios 4,17-19), emoções
(Romanos 1,26-27; Gálatas 5,24; 2 Timóteo 3,2-4) e vontade (Romanos 6,17; 7,14-15);
[5] Romanos 1,20
[6] Romanos 1,21-23; 1,18
[7] Romanos 2,15; 1 Timóteo 4,2
[8] Romanos 3,10-12; 2,13.17-23; Tiago 4,17
[9] Deuteronômio 6,4-5, Mateus 22,37; 1
Coríntios 10,31; Romanos 1,21
[10] 2 Timóteo 3,2-4
[11]
Jeremias 13,23;Romanos 7,23-24
[12] Filipenses 2,12-13
[13] Romanos 8,7-8
Francisco José
Barros Araújo – Bacharel em Teologia pela Faculdade Católica do RN, conforme
diploma Nº 31.636 do Processo Nº 003/17
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