O assunto não é novo, tanto que
duas Propostas de Emenda à Constituição. É a PEC-51 criada pelo senador
Lindbergh Farias, do PT. Essa PEC visa a desmilitarização da Polícia Militar, tramitam
no Congresso Nacional sobre o tema. Para entender melhor os prós e contras de
se adotar a postura, o Repórter Brasil, da TV Brasil, promoveu um debate na
última semana sobre o tema. Ernani Lucena, vice-presidente Federação dos
Policiais Civis do DF, e Alexandre Ciconello, advogado especialista em direitos
humanos, analisaram a formação policial brasileira. Entre manifestantes e
grupos da sociedade civil organizada a discussão é ainda mais profunda e tem
como foco a desmilitarização da Polícia Militar e a unificação com a Polícia
Civil. Os participantes defenderam a desmilitarização como forma de aproximação
da Polícia Militar com a sociedade civil. Eles divergiram, no entanto, a
respeito de uma unificação simplificada entre as polícias – defendida pelas propostas de modificação da
legislação em tramitação – e das mudanças de formação necessárias para os
grupos. “A militarização significa que a
Polícia Militar é treinada para enfrentar um inimigo, uma batalha”, destacou o
advogado Alexandre Ciconello. Já Ernani Lucena enumerou resquícios
considerados oriundos do período da Ditadura Militar na formação atual da PM
brasileira. “Tem um resquício de seu treinamento e de como ela foi concebida. A
PM hoje é um reduto de proteção dos governos estaduais, está calcada na
obediência. O comandante determina e os subalternos são obrigados a obedecer.
Ela não está sendo ponderada, como também a Polícia Civil tem seus problemas”,
disse. “Há aproximadamente 60 cargos dentro da Polícia Civil em todos os
estados”, complementou.
i - Argumentos "a favor de desmilitarizar e
unificar" a polícia
Por Túlio Vianna
A Polícia Militar brasileira é um modelo
anacrônico de segurança pública que favorece abordagens policiais violentas,
com desrespeito aos direitos fundamentais do cidadão. Uma das heranças mais malditas
que a Contra Revolução Comunista dos militares no Brasil nos deixou é a
dificuldade que os brasileiros têm de distinguir entre as funções das nossas
Forças de Segurança (polícias) e as das nossas Forças Armadas (exército,
marinha, aeronáutica). A diferença é muito simples: as Forças de Segurança
garantem a segurança interna do Estado, enquanto as Forças Armadas garantem a
segurança externa. Polícias reprimem criminosos e forças armadas
combatem exércitos estrangeiros nos casos de guerra. Diante das
desmensuradas diferenças de funções existentes entre as Forças de Segurança e
as Forças Armadas, é natural que seus membros recebam treinamento completamente
diferente.
Os integrantes das Forças Armadas são treinados para enfrentar um inimigo
externo em casos de guerra. Nessas circunstâncias, tudo que se espera dos
militares é que matem os inimigos e protejam o território nacional. Na
guerra, os prisioneiros são uma exceção e a morte é a regra.As polícias, por
outro lado, só deveriam matar nos casos extremos de legítima defesa própria ou
de terceiro. Seu treinamento não é para combater um inimigo, mas para
neutralizar ações criminosas praticadas por cidadãos brasileiros (ou por
estrangeiros que estejam por aqui), que deverão ser julgados por um poder
próprio da República: o Judiciário. Em suma: enquanto os exércitos são treinados
para matar o inimigo, polícias são treinadas para prender cidadãos. Diferença
nada sutil, mas que precisa sempre ser lembrada, pois muitas vezes é esquecida
ou simplesmente ignorada, como na intervenção no Complexo do Alemão na cidade
do Rio de Janeiro ou em tantas outras operações na qual o exército tem sido
convocado para combater civis brasileiros. O militarismo se
justifica pelas circunstâncias extremas de uma guerra, quando a disciplina e a
hierarquia militares são essenciais para manter a coesão da tropa. O
foco do treinamento militar é centrado na obediência e na submissão, pois só
com estas se convence um ser humano a enfrentar um exército inimigo, mesmo em
circunstâncias adversas, sem abandonar o campo de batalha. Os recrutas
são submetidos a constrangimentos e humilhações que acabam por destituí-los de
seus próprios direitos fundamentais. E se o treinamento militar é capaz de
convencer um soldado a se deixar tratar como um objeto na mão de seu
comandante, é natural também que esse soldado trate seus inimigos como objetos
cujas vidas podem ser sacrificadas impunemente em nome da sua bandeira. A sociedade reclama
do tratamento brutal da polícia, mas insiste em dar treinamento militar aos
policiais, reforçando neles, a todo momento, os valores de disciplina e
hierarquia, quando deveria ensiná-los a importância do respeito ao Direito e à
cidadania.
Se um policial militar foi condicionado a respeitar seus superiores sem
contestá-los, como exigir dele que não prenda por “desacato à autoridade” um
civil que “ousou” exigir seus direitos durante uma abordagem policial? Se
queremos uma polícia que trate suspeitos e criminosos como cidadãos, é preciso
que o policial também seja treinado e tratado como civil (que, ao pé da letra,
significa justamente ser cidadão). O treinamento
militarizado da polícia brasileira se reflete em seu número de homicídios. A
Polícia Militar de São Paulo mata quase nove vezes mais do que todas as
polícias dos EUA, que são formadas exclusivamente por civis. Segundo
levantamento do jornal Folha de S. Paulo divulgado em julho deste ano, “de 2006
a 2010, 2.262 pessoas foram mortas após supostos confrontos com PMs paulistas.
Nos EUA, no mesmo período, conforme dados do FBI, foram 1.963 ‘homicídios
justificados’, o equivalente às resistências seguidas de morte registradas no
estado de São Paulo”.Neste estado, são 5,51 mortos pela polícia a cada 100 mil
habitantes, enquanto o índice dos EUA é de 0,63 . Uma diferença bastante
significativa, mas que, obviamente, não pode ser explicada exclusivamente pela
militarização da nossa polícia. Não obstante outros fatores que precisam ser
levados em conta, é certo, porém, que o treinamento e a filosofia militar da PM
brasileira são responsáveis por boa parte desses homicídios. Nossa Polícia Militar
é uma distorção dos principais modelos de polícia do mundo. Muitos países
europeus possuem gendarmarias, que são forças militares com funções de polícia
no âmbito da população civil, como a Gendarmerie Nationale na França, os
Carabinieri na Itália, a Guardia Civil na Espanha e a Guarda Nacional
Republicana em Portugal. As gendarmarias, porém, são bem diferentes
da nossa Polícia Militar, a começar pelo fato de serem nacionais, e não
estaduais. Em geral, as atribuições de policiamento das gendarmarias
europeias se restringem a áreas rurais, cabendo às polícias civis o
policiamento, tanto ostensivo como investigativo, das áreas urbanas, o que
restringe bastante o âmbito de atuação dos militares. As gendarmarias europeias
também são polícias de ciclo completo, isto é, realizam não só o policiamento
ostensivo, mas também são responsáveis pela investigação policial. No Brasil, a
Constituição da República estabeleceu no seu artigo 144 uma excêntrica divisão
de tarefas, na qual cabe à Polícia Militar realizar o policiamento ostensivo,
enquanto resta à Polícia Civil a investigação policial. Esta existência de duas polícias,
por óbvio, não só aumenta em muito os custos para os cofres públicos que
precisam manter uma dupla infraestrutura policial, mas também cria uma rivalidade
desnecessária entre os colegas policiais que seguem duas carreiras
completamente distintas. O jovem que deseja se tornar policial hoje
precisa optar de antemão entre seguir a carreira de policial ostensivo
(militar) ou investigativo (civil), criando um abismo entre cargos que seriam
visivelmente de uma mesma carreira. Nos EUA, na
Inglaterra e em outros países que adotam o sistema anglo-saxão, as polícias são
compostas exclusivamente por civis e são de ciclo completo, isto é, o policial
ingressa na carreira para realizar funções de policiamento ostensivo e, com o
passar do tempo, pode optar pela progressão para os setores de investigação na
mesma polícia.
Para que se tenha uma ideia de como esse sistema funciona, um policial no
Departamento de Polícia de Nova York (NYPD) ingressa na carreira como agente
policial (police officer) para exercer atividades de polícia ostensiva
(uniformizado), tais como responder chamadas, patrulhar, perseguir criminosos
etc. Depois
de alguns anos, esse agente policial pode postular sua progressão na carreira
para o cargo de detetive (detective) no qual passará a exercer funções
investigativas e não mais usará uniformes. A carreira segue com os
cargos de sargento (sergeant), que chefia outros policiais; de tenente
(lieutenant), que coordena os sargentos; e de capitão (captain), que comanda o
que chamaríamos de delegacia. Apesar do que a
semelhança dos nomes poderia sugerir, não se trata de patentes, mas de cargos,
pois todos são funcionários públicos civis. Cada policial está subordinado
apenas a seus superiores hierárquicos em linha direta, assim como um escrivão
judicial brasileiro está subordinado ao juiz com o qual trabalha. Um
agente policial estadunidense não está subordinado de qualquer forma às ordens
de um capitão de uma unidade policial que não é a sua, assim como o escrivão
judicial brasileiro não deve qualquer obediência a juízes de outras varas. Para
se ter uma ideia da importância dessa diferença, basta imaginar a situação
difícil em que fica um policial militar brasileiro ao parar, em uma blitz, um
capitão a quem, para início de conversa, tem o dever de prestar continência.
A hierarquia militar acaba funcionando, em casos como esse, como uma blindagem
para os oficiais, em um nítido prejuízo para o princípio republicano da
igualdade de tratamento nos serviços públicos. As vantagens de uma
polícia exclusivamente civil são muitas e, se somadas, a unificação das
polícias ostensiva e investigativa em uma única corporação de ciclo completo só
traz benefícios para os policiais, em termos de uma carreira mais atrativa, e
aos cidadãos, com um policiamento único e mais funcional. No Brasil, tramita no Senado da
República a Proposta de Emenda à Constituição nº 102/2011, de autoria do senador
Blairo Maggi (PR/MT), que, se aprovada, permitirá aos estados unificarem suas
polícias em uma única corporação civil de âmbito estadual, representando um
avanço imensurável na política de segurança pública brasileira, além de uma
melhor aplicação do dinheiro público, que não mais terá que sustentar duas
infraestruturas policiais distintas e, algumas vezes, até mesmo concorrentes.A unificação das
polícias também possibilitaria uma carreira policial bem mais racional do que a
que temos hoje. O policiamento ostensivo é bastante desgastante e é comum que, à medida
que o policial militar envelhece, ele acabe sendo designado para atividades que
exijam menor vigor físico. Como atualmente existem duas polícias e, portanto,
duas carreiras policiais distintas, os policiais militares acabam sendo
designados para tarefas internas, típicas de auxiliar administrativo, mas
permanecem recebendo a mesma remuneração de seus colegas que arriscam suas
vidas nas ruas. Com a unificação, ocorreria o que acontece na maioria
das polícias do mundo: ele seria promovido para o cargo de detetive e sua
experiência como policial ostensivo seria muito bem aproveitada na fase de
investigação. Para suprir os cargos administrativos meramente burocráticos,
bastaria fazer concursos para auxiliares administrativos que requerem vocação,
habilidades e treinamento bem mais simples daqueles exigidos de um policial. Por outro lado, os
policiais civis que realizam o trabalho de investigação atualmente são
recrutados por meio de concursos públicos e começam a exercer suas atividades
investigativas sem nunca terem tido experiência policial nas ruas. Com a unificação da
polícia, o ingresso se daria sempre para o cargo de policiamento ostensivo, no
qual o policial ganharia experiência e só então poderia ascender na carreira
para os cargos de investigação. Um modelo que privilegia a experiência prática,
e não o conhecimento técnico normalmente exigido em provas de concursos. Finalmente,
a unificação das polícias acabaria também com os julgamentos de policiais pela
Justiça Militar. Pelo atual sistema, os crimes praticados por policiais
militares em serviço (exceto crimes dolosos contra a vida de civis) são
julgados não pelo juiz criminal comum, mas pela Justiça Militar, em uma clara
violação do princípio republicano da isonomia. É como se as universidades
federais tivessem uma Justiça Universitária para julgar os crimes praticados
por professores durante as aulas; ou as indústrias tivessem uma Justiça
Industrial para julgar os crimes praticados por metalúrgicos em serviço.
Uma espécie de universo paralelo jurídico que só se explica pela força política
dos militares quando da promulgação da Constituição de 1988.Desmilitarizar e
unificar as polícias estaduais brasileiras é uma necessidade urgente para que haja
avanços reais na nossa política de segurança pública. Vê-se muito destaque na mídia
para projetos legislativos que demagogicamente propõem o aumento de penas e
outras alterações nos nossos códigos Penal e de Processo Penal como panaceia
para o problema da criminalidade. Muito pouco se vê, porém, quanto a propostas
que visem a repensar a polícia brasileira. De nada adianta mudar a lei penal e
processual penal se não se alterar a cultura militarista dos seus principais
aplicadores. Treinem a polícia como militares e eles
tratarão todo e qualquer suspeito como um militar inimigo. Treinem a polícia
como cidadãos e eles reconhecerão o suspeito não como “o outro”, mas como
alguém com os seus mesmos direitos e deveres. Nossa polícia só será
verdadeiramente cidadã quando reconhecer e tratar seus próprios policiais como
civis dotados dos mesmos direitos e deveres do povo para o qual trabalha.
Fonte: http://www.revistaforum.com.br/2013/01/09/desmilitarizar-e-unificar-a-policia/
II - ARGUMENTOS
"CONTRA" A PEC 51 DE DESMILITARIZAÇÃO DAS PM'S
Por Bruno Fontenele
Cabral - Delegado da Polícia Federal
1)- O primeiro
argumento contra a aprovação da PEC 51 é que a desmilitarização da Polícia
Militar geraria um cenário de falta de controle, de desordem pública, o que permitiria
a práticas de inúmeros excessos por parte de uma polícia ostensiva sem as
amarras de controle do Código Penal Militar. Assim, a
desmilitarização da Polícia Militar ocasionaria uma forte instabilidade
institucional, uma vez que haveria o enfraquecimento da hierarquia e disciplina
do aparato repressivo do Estado. Ora, a polícia ostensiva fardada existe em
todos os países democráticos do mundo. Ou seja, mesmo nas democracias mais
avançadas, há a necessidade de existir uma polícia ostensiva, responsável pelo
controle dos cidadãos, uma vez que apenas o Estado detém o monopólio do uso
legítimo da violência e da força coercitiva.
2)- O segundo
argumento contra a aprovação da PEC 51 é que a unificação entre a Polícia Civil
e a Polícia Militar é totalmente inviável do ponto de vista prático. As
carreiras da Polícia Civil e da Polícia Militar são tão diferentes entre si que
seria praticamente impossível estabelecer a união das duas instituições
completamente distintas numa única só. Por exemplo, a carreira da Polícia Civil é
formada pelo cargo de Delegado de Polícia, Agente de Polícia, Escrivão de
Polícia, Papiloscopista e Perito Criminal, entre outros. Já a carreira da
Polícia Militar é organizada em patentes nos moldes das Forças Armadas, com a
existência de cargos de oficiais e não oficiais.
3)- O terceiro
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51 é que
proposta é incoerente, uma vez que propõe a unificação entre a polícia civil e
a polícia militar. No entanto, no âmbito federal, mantém a existência da
Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Ferroviária
Federal. Ou seja, a proposta é casuística para atender a interesses exclusivos
das carreiras de suboficiais e de agentes de polícia. É interessante destacar
que a PEC 51/2013 prevê a manutenção da praticamente inexistente Polícia
Ferroviária Federal, ao invés de regulamentar a Força Nacional de Segurança,
que funciona ao arrepio da CF/88.
4)- O quarto
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51 é que
ela traz embutida um conceito completamente errôneo e equivocado de “ciclo
completo de polícia”. Ora, num estado democrático de direito, é
inclusive recomendável a existência de múltiplas instituições policiais, de
forma a não se concentrar todo o aparato de repressão estatal nas mãos de um
único órgão. Assim, o denominado “ciclo completo” não passa de uma ficção
jurídica que não existe em nenhuma moderna organização policial e não policial
do mundo. Ora, todas as áreas do conhecimento são caracterizadas pela
especialização de conhecimento e pela existência de cargos de diferentes níveis
de complexidade. Por exemplo, num hospital, há os cargos de nível básico, os
cargos de nível intermediário e os cargos de nível superior. Assim,
um enfermeiro, possuidor de diploma de nível superior, por mais experiente e
capaz que seja, nunca será promovido para ocupar o cargo de médico. Em
suma, a exigência de concurso público e a formação profissional específica são
essenciais para que os profissionais atinjam o ápice de qualquer instituição,
seja ela de caráter público ou privado. Isso porque a Constituição Federal de 1988
decidiu valorizar a meritocracia, ao invés da subjetiva “experiência
profissional”, para combater justamente os denominados “concursos internos para
contratação da apadrinhados”.
5)- O quinto
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51 é que a
proposta não prevê, em nenhuma hipótese, a possibilidade da chamada “entrada
lateral” na carreira policial. Dessa forma, ao propor que todos os novos
policiais ingressem sempre no nível mais baixo e de menor remuneração da
carreira, inevitavelmente haverá enorme prejuízo para a instituição policial na
busca e na contratação de quadros mais qualificados. Isso ocorre porque as
pessoas mais qualificadas não se sujeitarão a ingressar em um cargo baixo e de
menor remuneração. Dessa maneira, as pessoas mais qualificadas farão
concursos para outras carreiras jurídicas, tais como Promotor de Justiça, Juiz
de Direito, Procuradores e Defensores Públicos, ao invés de se direcionar para
a área de investigação policial, em razão do baixo salário para a futura
entrada na carreira policial, caso a PEC 51/2013 fosse aprovada.
6)- O sexto argumento
contra a aprovação da PEC 51/2013 é que a proposta viola o princípio da isonomia e
do concurso público, ao prever o ressurgimento de vetustos institutos do
passado, banidos pela Constituição Federal de 1988, tais como os famigerados
“concursos internos para provimento derivado de cargos” e a chamada “ascensão
funcional”. A instituição da progressão vertical entre os diversos
cargos do Departamento de Polícia Federal sem a realização de concurso público
violaria a jurisprudência consolidada e pacificada pelo STF desde a
Constituição Federal de 1988 no sentido da proibição da progressão derivada
vertical sem a realização de concurso público.
7)- O sétimo
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013 é
que a proposta não inclui o Ministério Público. Ora, com o crescente movimento
do Ministério Público no sentido de realizar investigações criminais, mesmo que
ao arrepio do art. 144, §1º, IV, da CF/88, não seria lógico que, se o
Ministério Público pode investigar, ele não deveria ser o ápice da carreira de
investigação criminal?.
8)- O oitavo
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013 é
que a ideia de “carreira única”, ou melhor, as ideias de “cargo único” e a
ideia de “ciclo completo” sugeridas pela PEC nº 51/2013 seriam uma construção
inédita nas modernas organizações policiais do mundo e genuinamente brasileira,
assim com a jaboticaba e a caipirinha.
9)- O nono argumento
contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51 é que a proposta
propõe a criação da Polícia Municipal. Aqui fica evidente o caráter nocivo da
proposta, pois prevê a criação de uma polícia para ser chefiada por prefeitos(?) e
que funcionaria, na prática, como uma “polícia de cabos eleitorais”.
10)- O décimo
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013 é
que a proposta é injusta com os candidatos que se esforçaram a lograr êxito na
aprovação nas carreiras de oficiais da Polícia Militar e nas carreiras de
Delegado de Polícia Federal, instituindo-se uma espécie de comunismo nas
instituições policiais, com a extinção dos referidos cargos.
11)- O décimo
primeiro argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constituicional nº
51/2013 é que ela pretende a criação de uma inútil e cara “Ouvidoria Externa”,
constituída no âmbito de cada órgão policial previsto nos arts. 144 e 144-A,
para realizar o controle externo da atuação do órgão policial. Essa sugestão
tétrica pretende a criação de um órgão externo dentro de cada órgão policial
(não passaria a ser um órgão interno?) para executar o controle externo da
atividade policial a ser exercido paralelamente ao Ministério Público.Ora, para
que é necessária a criação de uma inútil ouvidoria externa para controlar a
atividade policial? Não seria melhor que o controle externo continuasse a ser
executado pelo Ministério Público em caráter exclusivo? Essa ouvidoria seria um
órgão totalmente inútil e caro que somente repassaria as informações recebidas
de violações e abusos ao Ministério Público.
12)- O décimo segundo
argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013 é
que o art. 8º da referida proposta estabelece que: “Os servidores integrantes
dos órgãos que forem objeto da exigência de carreira única, prevista na
presente Emenda à Constituição, poderão ingressar na referida carreira,
mediante concurso interno de provas e títulos, na forma da lei”. Esse art. 8º
da PEC 51/2013, caso fosse aprovado, instituiria o caos na segurança pública.
Assim, de acordo com o texto da PEC 51/2013, os atuais servidores integrantes
dos órgãos policiais poderiam se recusar a participar da nova carreira.Ou seja,
ao invés de transformar os cargos da antiga carreira em cargos de uma nova
carreira, respeitando-se a hierarquia, a PEC 51/2013, caso fosse aprovada,
obrigaria que todos os policiais fizessem um novo concurso, agora interno, para
ingressar a nova carreira. De acordo com a proposta, um coronel da PM, para
ingressar na nova carreira, deveria fazer um concurso interno para ser soldado?
Além disso, de acordo com o texto da PEC 51, um Delegado de Polícia Federal de
último nível da carreira da Polícia Federal deveria fazer um “concurso interno
de provas e títulos” para participar da nova carreira policial, ingressando no
cargo mais baixo e no nível mais baixo da nova hierarquia? Ou seja, a ideia da
PEC 51/2013 é claramente subverter a hierarquia das instituições policiais, com
a instalação do caos administrativo.
13)- O décimo
terceiro argumento contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº
51/2013, é que ela não ataca a raiz dos problemas relacionados à segurança
pública no país. Uma reforma do art. 144 da CF/88 deveria passar
necessariamente pela concessão de autonomia financeira e orçamentária às
instituições policiais, pela criação de um piso nacional para os policiais,
pela transformação dos atuais órgãos policiais em agências, nos moldes do FBI.
Além disso, a alteração do art. 144 da CF/88 deveria prever a autonomia
investigativa ao Delegado de Polícia.
Por que sou contra a PEC 51/2013? (conhecida
como “PEC do trem da alegria”)
Por Bruno Fontenele
Cabral
A PEC 51/2013, que
propõe unificar as polícias, não visa melhorar a segurança pública do país, mas
apenas atender a interesses sindicais e políticos, criando-se um estado de guerra
e pandemônio nas instituições policiais. Esta proposta de Emenda Constitucional
conhecida informalmente com “PEC do Trem da Alegria”, tem o propósito de
unificar as polícias civis e militares do Brasil, partindo-se da premissa
equivocada de que os oficiais da Polícia Militar e os Delegados de Polícia são
os grandes culpados pelo crescimento da violência no Brasil. Dessa
forma, a PEC 51/2013 propõe a subversão da hierarquia e disciplina nas
instituições policiais, inovando-se no mundo jurídico, ao se pretender, por
meio de institutos novos, tais como “carreira única” e “ciclo completo”,
ressuscitar os velhos, arcaicos e vetustos institutos do “concurso interno”,
“ascensão funcional”, “trem da alegria”. Para melhor compreensão do presente tema, é importante a
leitura do texto original da Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013, que
assim estabelece:
PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 51, DE
SETEMBRO DE 2013
Altera os arts. 21,
24 e 144 da Constituição; acrescenta os arts. 143-A, 144-A e 144-B, reestrutura
o modelo de segurança pública a partir da desmilitarização do modelo policial.
As Mesas da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da
Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:
Art. 1º O art. 21 da
Constituição passa a vigorar acrescido dos seguintes incisos XXVI e XXVII; o
inciso XVI do art. 24 passa a vigorar com a seguinte redação, acrescendo-se o
inciso XVII:
“Art.21.........................................................................................................................................................................................................................................
XXVI – estabelecer
princípios e diretrizes para a segurança pública, inclusive quanto à produção
de dados criminais e prisionais, à gestão do conhecimento e à formação dos
profissionais, e para a criação e o funcionamento, nos órgãos de
segurança pública, de mecanismos de participação social e promoção da
transparência; e
XXVII – apoiar os
Estados e municípios na provisão da segurança pública”.
“Art.24........................................................................................................................................................................................................................................
XVI – organização dos
órgãos de segurança pública; e
XVII – garantias,
direitos e deveres dos servidores da segurança pública” (NR).
Art. 2º A
Constituição passa a vigorar acrescida do seguinte art. 143-A, ao Capítulo III
– Da Segurança Pública:
CAPÍTULO III - DA SEGURANÇA PÚBLICA
Art. 143-A. A
segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é
exercida para a preservação da ordem pública democrática e para a garantia dos direitos
dos cidadãos, inclusive a incolumidade das pessoas e do patrimônio,
observados os seguintes princípios:
I - atuação isonômica
em relação a todos os cidadãos, inclusive quanto à distribuição espacial da
provisão de segurança pública;
II - valorização de
estratégias de prevenção do crime e da violência;
III - valorização dos
profissionais da segurança pública;
IV – garantia de
funcionamento de mecanismos controle social e de promoção da transparência; e
V – prevenção e
fiscalização efetivas de abusos e ilícitos cometidos por profissionais de
segurança pública.
Parágrafo único. A
fim de prover segurança pública, o Estado deverá organizar polícias, órgãos de
natureza civil, cuja função é garantir os direitos dos cidadãos, e que
poderão recorrer ao uso comedido da força, segundo a proporcionalidade e a
razoabilidade, devendo atuar ostensiva e preventivamente, investigando e realizando
a persecução criminal.
Art. 3º O Art. 144 da
Constituição passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 144. A segurança
pública será provida, no âmbito da União, por meio dos seguintes órgãos, além
daqueles previstos em lei:
I - polícia federal;
II - polícia
rodoviária federal;
III - polícia
ferroviária federal.
§ 1º A polícia
federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela
União e estruturado em carreira única, destina-se a:
......................................................................................................................
§ 2º A polícia
rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira única, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
ostensivo das rodovias federais.
§ 3º A polícia
ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira única, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
ostensivo das ferrovias federais.
§ 4º A lei
disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela
segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.
§ 5º A remuneração
dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo e nos
arts. 144-A e 144-B será fixada na forma do § 4º do art. 39.
§ 6º No exercício da
atribuição prevista no art. 21, XXVI, a União deverá avaliar e autorizar o funcionamento
e estabelecer parâmetros para instituições de ensino que realizem a formação de
profissionais de segurança pública” (NR).
Art. 4º A
Constituição passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 144-A e 144-B:
“Art. 144-A. A
segurança pública será provida, no âmbito dos Estados e Distrito Federal e dos
municípios, por meio de polícias e corpos de bombeiros.
§ 1º Todo órgão
policial deverá se organizar em ciclo completo, responsabilizando-se
cumulativamente pelas tarefas ostensivas, preventivas, investigativas e de
persecução criminal.
§ 2º Todo órgão
policial deverá se organizar por carreira única.
§ 3º Os Estados e o
Distrito Federal terão autonomia para estruturar seus órgãos de segurança
pública, inclusive quanto à definição da responsabilidade do município,
observado o disposto nesta Constituição, podendo organizar suas polícias a
partir da definição de responsabilidades sobre territórios ou sobre infrações
penais.
§ 4º Conforme o caso,
as polícias estaduais, os corpos de bombeiros, as polícias metropolitanas e as
polícias regionais subordinam-se aos Governadores dos Estados, do Distrito
Federal e dos Territórios; as polícias municipais e as polícias submunicipais
subordinam-se ao Prefeito do município.
§ 5º Aos corpos de
bombeiros, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de
atividades de defesa civil”.
“Art. 144-B. O
controle externo da atividade policial será exercido, paralelamente ao disposto
no art. 129, VII, por meio de Ouvidoria Externa, constituída no âmbito de cada
órgão policial previsto nos arts. 144 e 144-A, dotada de autonomia orçamentária
e funcional, incumbida do controle da atuação do órgão policial e do
cumprimento dos deveres funcionais de seus profissionais e das seguintes
atribuições, além daquelas previstas em lei:
I – requisitar
esclarecimentos do órgão policial e dos demais órgãos de segurança pública;
II – avaliar a
atuação do órgão policial, propondo providências administrativas ou medidas
necessárias ao aperfeiçoamento de suas atividades;
III – zelar pela integração
e compartilhamento de informações entre os órgãos de segurança pública e pela
ênfase no caráter preventivo da atividade policial;
IV – suspender a
prática, pelo órgão policial, de procedimentos comprovadamente incompatíveis
com uma atuação humanizada e democrática dos órgãos policiais;
V – receber e
conhecer das reclamações contra profissionais integrantes do órgão policial,
sem prejuízo da competência disciplinar e correcional das instâncias internas,
podendo aplicar sanções administrativas, inclusive a remoção, a disponibilidade
ou a demissão do cargo, assegurada ampla defesa;
VI – representar ao
Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso
de autoridade; e
VII – elaborar
anualmente relatório sobre a situação da segurança pública em sua região, a
atuação do órgão policial de sua competência e dos demais órgãos de segurança
pública, bem como sobre as atividades que desenvolver, incluindo as denúncias
recebidas e as decisões proferidas.
Parágrafo único. A
Ouvidoria Externa será dirigida por Ouvidor-Geral, nomeado, entre cidadãos de
reputação ilibada e notória atuação na área de segurança pública, não
integrante de carreira policial, para mandato de 02 (dois) anos, vedada
qualquer recondução, pelo Governador do Estado ou do Distrito Federal, ou pelo
Prefeito do município, conforme o caso, a partir de consulta pública, garantida
a participação da sociedade civil inclusive na apresentação de candidaturas,
nos termos da lei.
Art. 5º Ficam
preservados todos os direitos, inclusive aqueles de caráter remuneratório e
previdenciário, dos profissionais de segurança pública, civis ou militares,
integrantes dos órgãos de segurança pública objeto da presente Emenda à
Constituição à época de sua promulgação.
Art. 6º O município
poderá, observado o disposto no art. 144-A da Constituição, converter sua
guarda municipal, constituída até a data de promulgação da presente Emenda à
Constituição, em polícia municipal, mediante ampla reestruturação e adequado
processo de qualificação de seus profissionais, conforme parâmetros
estabelecidos em lei.
Art. 7º O Estado ou
Distrito Federal poderá, na estruturação de que trata o § 3º do art. 144-A da
Constituição, definir a responsabilidade das polícias:
I – sobre o
território, considerando a divisão de atribuições pelo conjunto do Estado,
regiões metropolitanas, outras regiões do Estado, municípios ou áreas
submunicipais; e
II – sobre grupos de
infração penal, tais como infrações de menor potencial ofensivo ou crimes
praticados por organizações criminosas, sendo vedada a repetição de infrações
penais entre as polícias.
Art. 8º Os servidores
integrantes dos órgãos que forem objeto da exigência de carreira única,
prevista na presente Emenda à Constituição, poderão ingressar na referida
carreira, mediante concurso interno de provas e títulos, na forma da lei.
Art. 9º A União, os
Estados e o Distrito Federal e os municípios terão o prazo de máximo de seis
anos para implementar o disposto na presente Emenda à Constituição.
Art. 10 Esta Emenda à
Constituição entra em vigor na data de sua publicação”
A falácia da desmilitarização da polícia
Por José Maria e Silva
Criar um “SUS” da
segurança pública, unificar as polícias e despir a PM de sua farda – eis as
propostas que prometem revolucionar a segurança pública no País. Praticamente
unânimes entre os acadêmicos especializados na área, essas ideias conquistam
cada vez mais adeptos em Brasília. É o que se percebe nas discussões da
Comissão Especial de Segurança Pública do Senado, instalada em 2 de outubro
deste ano com o objetivo de debater e propor soluções para o financiamento da
segurança pública no Brasil. Criada por iniciativa do presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a comissão é presidida pelo senador Vital do
Rêgo (PMDB-PB) e tem como relator o senador Pedro Taques (PDT-MT).O sistema de segurança pública no
Brasil está absolutamente falido” – com essa declaração, proferida numa
audiência pública realizada no dia 13 de novembro último, o senador Pedro
Taques resumiu um sentimento das ruas que hoje encontra guarida até nos
quartéis. Cada vez mais estão surgindo
depoimentos de policiais militares colocando em descrédito a própria corporação
a que pertencem. É o caso do livro O Guardião da Cidade (Editora
Escrituras, 2013, 256 páginas), do tenente-coronel Adilson Paes de Souza, fruto
de sua dissertação de mestrado “A Educação em Direitos Humanos na Polícia
Militar”, defendida na Faculdade de Direito da USP em 2012, sob a orientação do
cientista político Celso Lafer.Nesse trabalho
acadêmico, festejado por toda a imprensa, o tenente-coronel da PM paulista
defende a ampliação da carga horária do estudo de direitos humanos na formação
dos oficiais da Polícia Militar, como forma de combater a tortura. Em artigo
anterior, procurei demonstrar que se trata de uma falácia. O Curso de Formação
de Oficiais é praticamente um curso completo de Direito e, como se sabe, é
impossível estudar qualquer disciplina do Direito sem tratar dos direitos
humanos, uma vez que a Constituição de 88, base legal de todas as disciplinas
jurídicas, é alicerçada, de ponta a ponta, nos direitos da pessoa humana.
Sobrevivendo na Gestapo brasileira!
Em vários momentos do
livro, influenciado por pensadores de esquerda, que vêm na polícia um braço
armado do sistema capitalista, Paes de Souza, de modo quase indisfarçável,
compara a Polícia Militar brasileira com a Gestapo de Adolf Hitler. Chega a descrever o
produto das ações da PM como um novo campo de concentração nazista. Com base em
artigo da psicóloga e psicanalista Maria Auxiliadora de Almeida Cunha Arantes,
sintomaticamente intitulado “Violência, Massacre, Execuções Sumárias e Tortura”,
o tenente-coronel cita como exemplo desses casos, os 111 mortos do Carandiru,
em 1992, os 493 mortos quando dos ataques do PCC em 2006 e a Operação
Castelinho em 2002, “que constituiu uma emboscada”, com 12 mortos – todos
bandidos do PCC, acrescente-se, já que o coronel não o faz em sua tese. Para a psicóloga
Maria Auxiliadora Arantes, citada no livro O Guardião da Cidade, tais
acontecimentos “são crimes filhotes de um Estado que deixou intacto um aparelho
de matar e que não puniu os que o montaram”. O tenente-coronel Adilson Paes de
Souza corrobora literalmente suas palavras, tanto que acrescenta a elas a
seguinte frase: “De fato, Auschwitz faz-se presente”. Reparem: Paes de Souza está
comparando o trabalho da Polícia Militar – instituição em que atuou durante 28
anos, chegando a tenente-coronel – com a violência das forças nazistas nos
campos de concentração de Hitler. Justamente num momento em que a PM está sob o
fogo cerrado dos formadores de opinião.O cientista político
Celso Lafer, responsável pela dissertação de mestrado de Adilson Paes de Souza
na USP, deveria ter-lhe feito uma pergunta singela antes de aceitar a
orientação de seu trabalho:“Onde o senhor estava, na condição de tenente-coronel da Polícia
Militar, quando seus subordinados de farda se tornaram exemplos atuais da
Gestapo de Hitler, torturando e executando pessoas?”.Antes de pontificar
sobre os problemas da Polícia Militar, apresentando soluções mirabolantes do
conforto de uma cátedra universitária, o tenente-coronel deveria ter respondido
para si mesmo essa pergunta. Na condição de tenente-coronel da Gestapo
brasileira (a se crer nos seus próprios conceitos), ou Paes de Souza foi
cúmplice do holocausto que denuncia ou foi omisso diante dessa carnificina que
imputa à PM. Em qualquer dos casos, deveria refletir com mais profundidade
sobre o assunto, antes de se arvorar a defender tese, escrever livro e
contribuir, ainda que involuntariamente, para a difamação sistemática de que a PM é
vítima na imprensa e nas universidades. Não é possível
sobreviver durante 28 anos num aterro sanitário moral e dele sair com a alma
cheirando a talco, como canta Gilberto Gil. Em seu livro, citando o economista
Albert Hirschman, Paes de Souza fala que os membros de uma instituição podem
abandoná-la ou criticá-la quando se sentem descontentes. O autor não diz, mas,
no caso da Polícia Militar, a via mais frequente é a omissão: o policial se
esconde numa carreira burocrática, evitando o confronto das ruas e, com isso,
pode pontificar sobre direitos humanos sem correr riscos. O tenente-coronel
sobreviveu ao horror que denuncia foi por essa terceira via? Sem essa
explicação, suas reflexões e denúncias sobre a PM perdem muito da autoridade
que poderiam ter.
Depoimentos de PM homicidas(?) - Para exemplificar as
críticas que faz à polícia, Adilson Paes de Souza colheu o depoimento de dois
policiais militares condenados por homicídio, e se valeu também, de dois
depoimentos colhidos pelo jornalista Bruno Paes Manso, do jornal O Estado de S.
Paulo:
Em junho de 2012, Manso defendeu no Departamento de Ciências Políticas
da USP a tese de doutorado “Crescimento e Queda dos Homicídios em São Paulo
entre 1960 e 2010”, em que faz uma “análise dos mecanismos da escolha homicida
e das carreiras no crime”. Essa tese de Manso já havia lhe rendido o livro O
Homem X: Uma Reportagem sobre a Alma do Assassino em São Paulo (Editora Record,
2005), no qual o tenente-coronel buscou os dois depoimentos. Os policiais ouvidos
por Paes de Souza ganharam os apelidos de “Steve” e “Mike”, geralmente dados
aos policiais que trabalham nas ruas. O policial Steve foi condenado a mais de
20 anos de reclusão por um homicídio a tiros e facadas. “No auge da prática do ato, senti
que estava cheio de ódio e acabei descarregando tudo sobre o corpo da vítima.
Tinha um sentimento de ódio generalizado de tudo”, afirma o policial. De origem
nordestina, ele contou que seu pai era PM aposentado e costumava conversar com
toda a família na hora do jantar sobre o sentimento de honra que envolvia a
profissão. Inspirando-se no pai, Steve, ao completar 18 anos, ingressou na
polícia, por meio de concurso público. “Fui designado para trabalhar numa
unidade da Polícia Militar na periferia da cidade de São Paulo. Comecei a ver
uma realidade que não conhecia: favelas, meninas estupradas, pessoas pobres
vítimas de roubo, o que causou revolta”, conta Steve. Movido por essa revolta,
diz que começou a trabalhar além do horário normal, prendendo o máximo possível
de bandidos, na esperança de acabar com a criminalidade na região. O PM conta
que, numa ocasião, prendeu em flagrante dois ladrões que tinham roubado um
supermercado, mas na noite do mesmo dia viu os dois na rua. Quando os abordou,
soube que fizeram um acordo com o delegado, inclusive deixando na delegacia uma
parte da propina para o policial. “Nesse momento, percebi que a corrupção
existente nos distritos policiais da área onde trabalhava gerava a impunidade
dos delinquentes”, afirma Steve, que passou a frequentar velórios de policiais
mortos em serviço, alimentando ainda mais sua revolta com a impunidade dos
bandidos. Foi aí que decidiu fazer justiça com a própria farda: “Eu era juiz,
promotor e advogado. Levava a vítima para um matagal, concedia-lhe um minuto
para oração e a sentenciava a morte”. Essa vida de justiceiro fardado destruiu
sua família. Sua mulher chegou a tentar o suicídio. E, na cadeia, sofreu
maus-tratos e não teve a solidariedade dos colegas: os policiais que o
visitavam estavam mais preocupados em sondá-lo para saber se não seriam delatados,
em virtude de outras ocorrências. Um dos entrevistados
pelo repórter Bruno Paes Manso, citado na dissertação do tenente-coronel Paes
de Souza, também relata que: “Se via em guerra contra os
criminosos e, movido pelo ideal de resolver o problema da criminalidade,
trabalhava praticamente o dobro: as oito horas regulamentares pagas pelo Estado
somadas às oito em que combatia o crime de graça, por sua própria conta e
risco. Esse policial contou ter deparado com vários casos graves, que só via em
filmes. Certa vez, atendeu a uma ocorrência em que uma criança de quatro anos
foi estuprada e ele, junto com outros policiais militares, evitou o linchamento
do estuprador. “Nesse momento, achou um contrassenso ter que proteger quem
havia praticado uma monstruosidade contra uma menina. Sentiu revolta”, relata
Paes de Souza.”
Esse é praticamente o padrão dos depoimentos de policiais
militares condenados por homicídio:
1) imersão idealista
do policial no combate ao crime;
2) revolta com a
impunidade dos criminosos;
3) justiça com a
própria farda;
4) prisão,
arrependimento e transferência da culpa para a corporação militar.
O livro Sangue Azul
(Editora Geração Editorial, 2009), baseado no depoimento de um soldado da PM do
Rio de Janeiro ao documentarista Leonardo Gudel, também segue esse padrão. E,
de acordo com as entrevistas concedidas pelo autor, parece que o recém-lançado
Como Nascem os Monstros (Editora Topbooks, 2013, 606 páginas), romance do
policial carioca Rodrigo Nogueira, condenado e preso por homicídio, também não
foge à regra.
Um sargento preso por homicídio e ouvido por Bruno Paes
Manso explica que:
“O assassinato é uma importante ferramenta no
cotidiano perigoso do policial militar que trabalha na rua”, e acrescenta que
“se os policiais fossem proibidos de matar seria melhor que parassem de
trabalhar”. Esse mesmo policial diz ainda: “Sem contar que a bandidagem está
cada vez ficando mais ousada, mais armada e respeita cada vez menos a polícia.
Isso é explicado dessa forma, isso não foi a polícia que motivou. Hoje tem
muito mais reação, o pessoal enfrenta, por isso tem mais morte”. O
tenente-coronel Paes de Souza, do alto de sua tese da USP, classifica essa fala
do sargento como simplista, por afirmar que mais criminalidade significa mais
confronto e, consequentemente, mais mortes.” - Ora, simplista é o
modo como o tenente-coronel, desprezando seus 28 anos de experiência como
policial, deixa-se seduzir pela inútil retórica da academia e utiliza esses
depoimentos para corroborar teses injuriosas a respeito da Polícia Militar, que
a acusam de ser uma máquina assassina, nazista, semelhante a Auschwitz. Quando
atribuem à Polícia Militar o suposto “genocídio da juventude negra”, calúnia
que já foi corroborada até por membros do Poder Judiciário, os acadêmicos
escondem dois detalhes cruciais:
1)- primeiro, muitos
jovens negros das periferias são recrutados pelo narcotráfico e matar ou morrer
são verbos que conjugam diariamente; segundo, a Polícia Militar emprega muito
mais negros do que as universidades que a criticam. Então, a ser verdade o que
diz a academia, esses policiais não seriam genocidas, mas suicidas: estariam
matando deliberadamente seus próprios familiares.
2)- O tenente-coronel
e os demais acadêmicos que escrevem teses sobre segurança pública acreditam que
basta perorar sobre direitos humanos no ouvido de um soldado para que ele saia
à rua com flores na boca do fuzil, ajudando velhinhas no semáforo e pegando
crianças no colo, até que surja um marginal armado e esse policial, consciente
de seus deveres, saque da farda um exemplar da Constituição e atire no rosto do
bandido seus direitos humanos, para que o criminoso estenda os pulsos com
cidadania e seja algemado com dignidade. É óbvio que a terrível complexidade da
segurança pública não se rende a golpes de retórica sobre direitos humanos!
Policial só se equipara a médico!
Uma análise
verdadeiramente profunda dos depoimentos dos homicidas da PM revela a complexa
natureza do trabalho policial, que, em qualquer tempo e lugar, é
inevitavelmente insalubre para a alma. O policial é como o médico: sem uma dose sobre-humana de frieza, ele não
será capaz de proteger vida nenhuma, pois o medo do sangue, da mutilação, do
cadáver, irá acovardá-lo diante do dever a ser cumprido. Por isso, ser policial
não é para qualquer um. Os policiais homicidas tentam enganar a própria
consciência quando dizem que a corporação os transformou em violentos. O potencial de
violência já estava presente neles ou não teriam sonhado em ser policial, uma
profissão que, em algum momento, há de exigir violência para que as leis sejam
cumpridas, pois se bandido ouvisse conselho, não entraria no crime. Polícia não é assistência social a bandido, é contenção da criminalidade
e desordem. Ela é chamada justamente quando as normas da cultura e os
mandamentos da lei já não são suficientes para manter o indivíduo, ou o
coletivo no bom caminho e alguém precisa contê-los. Por isso, a polícia tem de
ser viril. A testosterona que faz o bandido violento é a mesma que faz o
policial corajoso, porém, os fins são completamente antagônicos. Daí a
importância de se separar ontologicamente o policial do criminoso. O policial de rua é obrigado
a enfrentar o crime de arma em punho e não de uma sala de debates refrigerada
de universidade, é como um médico num campo de refugiados ou em meio a uma
epidemia letal: se trabalhar só pelo dinheiro, ele voltará para casa na hora,
pois não há salário que pague sua própria vida, permanentemente em risco. Para
compensar os riscos da profissão, o policial precisa ser tratado como herói.
Especialmente num país como o Brasil em que a criminalidade soma cerca de 63
mil homicídios por ano (de acordo com estudos do Ipea). O policial precisa ter
a certeza de que, ao tombar no campo de batalha, sua morte não foi em vão, mas
por uma boa causa, e a sociedade deverá cultuá-lo como herói diante de sua
família enlutada, e o bandido que o matou será severamente punido, não colocado
como vítima inocente. No Brasil, ocorre justamente o contrário: enquanto a morte
de bandidos é cercada de atenção pelas ONGs dos direitos humanos e gera
violentos protestos de rua em São Paulo e Rio, a morte de um policial não passa
de uma efêmera nota de rodapé no noticiário e, em muitos casos, sua família não
recebe nem mesmo a visita das autoridades da própria segurança pública,
temerosas do que possam pensar os formadores de opinião. Já em países como os
Estados Unidos, um bandido reluta em matar um policial, pois sabe que o
assassinato será motivo de comoção pública e a pena que o aguarda será à altura
dessa indignação cívica com a morte de um agente da lei.
Completa inversão de valores!
O ser humano é um ser
relativo, em um constante vir a ser, ou seja, um sujeito inacabado, e não
consegue julgar perfeitamente e completamente nada em absoluto, mas somente por
meio de comparação. Por isso, ao mesmo tempo em que se enaltece o policial corajoso e
honesto, é preciso punir verdadeiramente o criminoso, para marcar a diferença
entre ambos, do contrário iremos criar uma cultura de criminalidade e
desonestidade militante, com seus respectivos gurus. O policial se revolta
ao proteger de linchamento o estuprador de uma criança ou ao levar para o
hospital o bandido ferido que tentou matá-lo porque sabe que seu trabalho
heroico e humanitário foi inútil: logo, esses bandidos serão postos na rua para
cometer novos homicídios e estupros. Mesmo o estuprador de uma criança ou o
homicida que queima viva sua vítima têm direito a todas as regalias da
legislação penal, travestidas de direitos humanos. Até criminosos que matam ou
estupram mulheres gozam de benefícios absurdos, como a famigerada visita
íntima (que deveria se fazer por merecer!). A Resolução CNPCP Nº 4, de 29 de junho de 2011, do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, instituiu de vez a visita íntima como um
direito do preso qualquer que seja a gravidade do seu crime. No seu artigo 4º,
a resolução deixa claro que “a visita íntima não deve ser proibida ou suspensa
a título de sanção disciplinar”; ou seja, mesmo se o preso promover rebeliões e
mortes na cadeia, a visita íntima continuará sendo assegurada a ele como um
direito sagrado, à custa da segurança da sociedade. É óbvio que a mulher que se
presta a lhe servir de repasto sexual também há de lhe fazer outros favores
associados diretamente ao crime, como passar recados para seus comparsas que
estão fora das grades, quando não, transporta clandestinamente para dentro dos
presídios: drogas, armas e celulares. É por isso que quando
uma patrulha da PM leva um criminoso ferido para o hospital, muitas vezes junto
com um policial também ferido na troca de tiros, os policias que assim agem
precisam ser tratados como heróis. É sua única recompensa. Não há salário que
pague esse gesto.
Não é fácil para nenhum ser humano salvar a vida de seu próprio algoz sabendo
que aquele criminoso que tentou matá-lo não será punido como merece, pois, na
cadeia, continuará comandando o crime, com direito a saídas temporárias,
visitas íntimas e outras regalias. A legislação penal é tão moralmente hedionda
que um dos assassinos do jornalista Tim Lopes, depois de preso, jogou água
quente em sua companheira dentro da própria cela! E esse novo crime
bárbaro só foi possível porque o Estado brasileiro – cúmplice contumaz de
bandidos – garante a famigerada visita íntima até para um monstro dessa
espécie.
E ainda tem as "Feminazis" contra a polícia!
Mas, por incrível que
pareça, até as feministas – que criticam violentamente a polícia – defendem as
visitas íntimas para presos, consideradas uma extensão dos direitos humanos e
classificadas como “direitos sexuais”. Ora, direito sexual é como o direito de
expressão: toda pessoa tem o direito de falar, mas não tem o direito de obrigar
o outro a ouvi-la. O preso não pode ser impedido de sonhar com uma mulher ou
até de satisfazer solitariamente sua libido. Mas isso não significa que ele tem
o direito de manter relações sexuais dentro da cadeia, mesmo que seja com sua
esposa. E a razão é simples: seu desejo sexual não pode ser posto acima da
segurança da sociedade! É óbvio que, durante a visita íntima, não há
meio de controlar o preso. Ele pode usar a visita – e sempre usa – para
transmitir recados aos comparsas fora da cadeia, daí o comando que o cárcere
continua tendo sobre o crime organizado. Praticamente todas as centrais
telefônicas do PCC são administradas por mulheres de presidiários. E mulher de
preso inevitavelmente o obedece, sob pena de ser morta. O mesmo se dá com a alimentação
do preso. Não deixar um latrocida morrer de fome e sede na cadeia é
garantir-lhe um direito humano básico, mas permitir que ele escolha o cardápio,
por meio de rebeliões, como ocorre com muita frequência nos presídios
brasileiros, não passa de um abuso com o dinheiro de suas vítimas, e de toda
sociedade. Hoje, até o criminoso que queima sua vítima viva tem direito a
remissão de pena não por dias trabalhados, por horas de estudo e, pasmem, até
pela simples leitura de romances na cadeia. Ou seja, o que os acadêmicos chamam
de “direitos humanos” são, na verdade, privilégios civis, que deveriam ser
privativos do cidadão que respeita as leis e não do bandido que fere o contrato
social e, por isso, tem de ser excluído da esfera da cidadania enquanto cumpre
sua pena.Hoje, a inversão de valores é tanta que, oficialmente, por meio das
políticas públicas do governo federal, o policial militar se tornou o inimigo
público número um, enquanto se concede ao criminoso o monopólio dos direitos
humanos. A Resolução nº 8, de
21 de dezembro de 2012, da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da
República, sob o comando da ministra Maria do Rosário, estabelece em seu artigo
1º que: “quando um bandido morre em confronto com a polícia, na descrição de sua
morte nos registros oficiais não deve mais ser usada a expressão “resistência
seguida de morte” e, sim, “homicídio decorrente de intervenção policial”. A alegação é que os
policiais utilizam o chamado “auto de resistência” para esconder execuções.
Ora, nos casos em que isso ocorre, não vai ser mudando as palavras que o crime
deixará de ser praticado. Mais do que a nomenclatura, o que importa em qualquer
crime é a investigação. E essa não deixará de ser feita caso um auto de
resistência levante suspeitas, a não ser que as autoridades responsáveis pelo
controle externo da polícia se omitam. Prova disso é que dezenas de policiais
militares são expulsos da corporação em todo o País. Classificar esse tipo de
ocorrência como “resistência seguida de morte” é uma questão de respeito com o
policial. É um absurdo que, após uma troca de tiros com assaltantes de
bancos armados de fuzil, o policial tenha de descrever a morte de um dos
bandidos como “homicídio decorrente de intervenção policial”.
Criminoso é “reeducando”, MAS O policial é “homicida”? (tem algo errado)!
A sociedade honesta e
trabalhadora, que não se acumplicia com bandidos, não pode aceitar essa calúnia
legalizada contra a polícia, tachando previamente de “homicida” o policial que
mata para proteger a sociedade, cumprindo seu dever constitucional. Se
numa investigação sobre um auto de resistência ficar provado que não houve
confronto, mas execução sumária, então que o policial seja punido. O que
não se pode aceitar é que o policial seja antecipadamente tachado de homicida
mesmo quando é obrigado a matar para proteger vidas, incluindo a sua própria. Na prática, é essa
a mancha que o policial terá de carregar em sua imagem, caso seja obrigado a
registrar a morte de um bandido em confronto como “homicídio”. Isso é ainda
mais grave quando se compara o tratamento de “homicida” que querem dar ao policial
com o tratamento de “reeducando” que a Justiça dá a latrocidas e estupradores
nas cadeias. Atentem para esta
fórmula de inversão dos valores: policial que mata um sequestrador é
“homicida”, até que prove o contrário; já o sequestrador que mata o refém vira
“reeducando” quando é preso e condenado pela Justiça. Como se pode notar, há
uma completa inversão dos valores morais: o policial é culpado até que prove sua inocência; já o bandido é
inocente como uma criança de escola (“reeducando”), justamente quando sua culpa
foi provada e sentenciada nos tribunais. Esses fatos mostram
que os acadêmicos que criticam a Polícia Militar não estão preocupados com a
segurança da população honesta e trabalhadora – querem é atacar a sociedade
capitalista, como se não fossem justamente os mais pobres os que mais perdem
com o enfraquecimento da polícia? Os ricos podem contratar segurança privada. E
os pobres? E a classe média? O que será deles sem a polícia? A grande verdade é
que a Polícia Militar não é necessariamente pior do que as demais instituições
humanas. Convém relembrar uma máxima do economista Albert Hirschman não
aproveitada na tese do tenente-coronel Paes de Souza: “Sob qualquer sistema econômico, social ou político, indivíduos, firmas
e organizações, em geral estão sujeitas a falhas de eficiência, racionalidade,
legalidade, ética ou outros tipos de comportamento funcional. Não importa quão
bem estabelecidas as instituições básicas de uma sociedade; alguns agentes, ao
tentarem assumir o comportamento que deles se espera, estão fadados ao
fracasso, ainda que por razões acidentais de quaisquer tipos”. Ou seja, todas as
demais instituições indispensáveis à Justiça, como o Judiciário, o Ministério
Público, a OAB, a Polícia Federal e a Polícia Civil, para citar as principais,
estão sujeitas a gravíssimas falhas por parte de seus membros. Um juiz que mata um inofensivo e desarmado vigilante de supermercado,
como já ocorreu no Brasil, é infinitamente mais criminoso do que um policial
desesperado, que, depois de escapar por pouco das balas de um assaltante,
resolve terminar de matá-lo ao se dar conta de que ele está ferido. É errada
essa atitude do policial? Sem dúvida. Mas é compreensível, tanto que a maioria
da população, equivocadamente, a aprova. E a única forma de
inibir essa justiça vicária, feita com a própria farda é dar ao policial a
certeza de que ele pode entregar o bandido aos tribunais, que a sociedade
estará protegida de sua posterior delinquência. É bom lembrar que leis mais
duras serviriam inclusive para punir os maus policiais, que também existem, e
que hoje, acabam ingressando no crime organizado ao serem expulsos da
corporação, completamente abandonados destes mesmos direitos humanos. Infelizmente a
maldade humana está relativamente bem distribuída em todas as instituições. Por
isso, é tolice creditar os problemas da segurança pública à Polícia Militar,
como insistem em fazer os acadêmicos e até policiais influenciados por eles.
Tortura, corrupção e truculência não são privativas da PM. E a injustiça com a
PM é ainda mais grave quando se leva em conta o contexto em que a corporação
atua – a miséria moral dos mais ferozes criminosos, que não têm o menor
respeito pela vida humana. Por isso, é tolice
achar que, desmilitarizando a PM, se resolvem todos os problemas da segurança
pública. Mesmo se isso fosse verdade, seria um desatino desmilitarizar a
polícia justamente quando os bandidos andam com fuzis nas ruas e transformaram
até as cadeias em quartéis do crime.
Texto publicado no
Jornal Opção e reproduzido no Mídia Sem Máscara
CONCLUSÃO:
Por todo o exposto, sem a menor pretensão de esgotar o presente tema, verifica-se, salvo melhor juízo, que a Proposta de Emenda Constitucional nº 51/2013 (PEC TREM DA ALEGRIA), ao defender os vetustos institutos da “ascensão funcional” e do “concurso interno de seleção” vai de encontro ao princípio constitucional da isonomia e da igualdade disposto no art. 37, II, da Constituição Federal de 1988, que assim estabelece:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.
Além disso, a PEC 51/2013 não visa, em nenhum momento, melhorar a segurança pública do país, mas sim apenas o atendimento de interesses sindicais e políticos, criando-se um estado de guerra e pandemônio nas instituições policiais, caso fosse aprovada, gerando um cenário futuro de caos na segurança pública do país.
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