As necessárias e duras operações policiais do BOPE, os policiais mais bem treinados para situações extrema, foram tratadas em Tropa de Elite, uma denúncia radical, que exibe o cheiro podre das relações entre política, polícia, estado corrompido e a miséria social no Brasil. Todos são acusados, do Governador do Estado ao funcionário público da polícia (sejam delegados, aumentando sua renda com práticas desumanas de exploração e morte, seja um simples policial pronto a cumprir ordens de matar também por alguns trocados em submissão aos superiores).
A impactante grosseria da realidade, a frieza dos assassinatos, a desumanização das relações sociais e as práticas políticas e políticas para lá de apodrecidas que sustentam este mundo, são tratadas esteticamente com a mesma matéria da violência com que se fabrica a realidade. Sem o impacto sonoro e visual turbulento, seja das armas pesadas, dos assassinatos frios e mecânicos, dos estupros desumanos, das jogatinas políticas cínicas e imorais, das relações pessoais à beira da destruição, demonstram sim esta dura realidade.
A história do filme é baseada no livro Elite da Tropa, escrito
por dois policiais do Bope e pelo antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário
de Segurança Pública do Rio de Janeiro e ex-secretário Nacional de Segurança
Pública do governo Lula. O diretor José Padilha, o mesmo do ótimo Ônibus 174, constrói a
história do capitão Nascimento, que, em crise com o nascimento do filho, quer
deixar o Bope. Antes, porém, se dedica a encontrar um substituto. A partir daí,
Padilha mostra a corrupção e a incompetência nas entranhas do ambiente Policial
no Brasil. Mostra também, as dificuldades que policiais
honestos e bem intencionados enfrentam para fazer cumprir a lei. Esses
policiais, depois de ver todo tipo de irregularidades na Polícia Militar,
conhecem o Bope, que acreditam ser a única saída para continuarem na corporação
sem se sujar. O filme mostra,
então, o treinamento desses policiais da tropa
de elite, que se preparam para enfrentar a guerra contra o crime e para
exterminar a bandidagem. Mostra
também, os policiais da elite em ação e os meios extremos, e quase sempre
ilegais, que usam no bom combate contra os bandidos e a criminalidade.
A impressão é de que a preocupação da crítica está direcionada a um grupo específico de espectador. Parecem temer do que alguns possa pensar sobre o filme. Por acreditarem que o filme faz uma apologia dos métodos truculentos da polícia, temem que as pessoas achem justificável esse tipo de comportamento.É uma ingenuidade, pois o diretor não toma partido ao narrar os fatos.
O filme despertou e desperta ainda, vários
tipos de reações:
1)-Há desde aqueles que vibram com cada ação do
capitão Nascimento e seus comandados.
2)-Há os que rejeitam esse modo de agir.
3)-E há também aqueles que ficam atônitos
depois do filme sem saber o que pensar.
É preciso ter em conta, também, que o filme é uma obra de ficção. Embora se apresente diante de nós como um filme sobre a realidade da polícia e do tráfico de drogas, o filme é realmente um obra de arte que marcou o cinema e a cultura nacional; tem um enredo e uma história muito bem construída. Nada no filme é aleatório. Cada cena ou fala tem um sentido. Um filme realmente de pura ficção está muito mais preocupado com os efeitos dramáticos e com a construção da trama, do que com a realidade sociológica. Porém, mais verdadeira que seja, a obra de arte é sempre uma abstração da realidade. O diretor, ao contar sua história, tem que lidar com o impacto das imagens. O próprio José Padilha, em entrevista para o programa Roda Viva da TV Cultura de São Paulo, disse que:
“O diretor é obrigado a
simplificar a realidade. Acabam sendo construídas verdadeiras caricaturas, ou,
como diria Weber, tipos ideais de atores sociais. São personagens que têm o
peso de representar um grupo social amplo e complexo”.
Os policias militares comuns no filme são vistos como extremamente corruptos e incompetentes; já os policiais do Bope são íntegros, porém violentos; e a elite cultural é bem intencionada, porém alienada e comprometida com o tráfico.Para efeitos dramáticos, essas características se encaixam perfeitamente na trama, mas não se pode dizer que sejam um espelho, ou recorte dos cidadãos reais.
Assim, a classe média com uma aparente consciência social progressista, é apresentada como um dos muitos vilões do filme. Os jovens de classe média no filme só se divertem e a polícia só serve para atrapalhar a diversão deles. Padilha engloba características de um grupo social diverso e fragmentado em um grupo de personagens. Os jovens no filme são a elite cultural, que participam de ONGs e eventualmente usam drogas. Porém, eles se enquadram em um grupo muito mais amplo que é a elite econômica do país que de fato é quem alimenta o tráfico, e são os mesmos que pedem paz e fazem carreatas pela paz. Mais grave é mostrar a relação harmoniosa entre o tráfico e as ONGs. É claro que ninguém pode fazer nada em favelas ocupadas por traficantes sem a sua autorização dos chefões do crime. Outro ponto importante a se destacar é que o narrador do filme é o capitão Nascimento.
Como narrador onisciente, ele tece juízos e está pronto para apontar o dedo a todos aqueles que, na opinião dele, são parte do problema. Com esta roupagem onisciente, ele julga saber em detalhes o que acontece no morro, o que acontece na Polícia Militar, o que acontece na faculdade e o que acontece nas ONGs, ele pinta a realidade com as cores que ele próprio escolhe.
E não é preciso ser um grande conhecedor da polícia para saber o que qualquer policial pensa sobre marginais, classe média liberal e direitos humanos.
O problema é saber até que ponto o que vemos no filme é a realidade ou a ótica, que por vezes pode ser distorcida, de Nascimento. A narração do capitão é mais o discurso de uma classe do que a realidade cristalina e isenta.
O Capitão Nascimento descobre-se, de repente, como apenas uma entre
outras peças de uma máquina de guerra sem controle e perde, por isso, sua
ilusão de agente criador da sociedade. Seu trabalho, que o
dignificava como peça importante da sociedade e como indivíduo, se revela o
contrário: ele é apenas um agente preparado para defender uma estrutura
corrupta e corruptora de poder. Depois dessa
descoberta, passa a agir com mais sapiência e dúvida em relação à própria
estrutura que defendia, abrindo os olhos para o complicador maior que é o
próprio Estado (que se revela, no filme, o grande criminoso da história).
O filme mostra novamente como paixões pessoais e sociais se interpenetram, pois é quando Capitão Nascimento vê sua família ameaçada que ele se move contra o corrupto "estado de coisas" de forma radical, usando as próprias armas do Estado de Direito para punir o Estado. Daí ele supera o ódio pessoal (inclusive, aliando-se ao Deputado que inicialmente era seu opositor na esfera sentimental, casando-se com sua ex-mulher, e social, por defender os direitos humanos de "bandidos") e, racionalmente, empreende uma vingança que mesmo que tenha um fundo pessoal, se alicerça em garantias ainda vigentes numa República com garantias Constitucionais.
CONCLUSÃO
Capitão Nascimento simboliza,
talvez, o espírito e o desejo de justiça incrustado em cada brasileiro que
sonha uma sociedade mais decente, livre dessa canalha política que nos governa
e gera, por tabela, os monstros que Tropa de Elite 1 e 2 exibiram de forma crua e sombria. Ao mostrar a
relação da polícia com o poder público a gente vê que esse filme rende muita
discussão. Tem tanto assunto que dá até para fazer um "Tropa 10". Eu costumo ser muito
cético em relação a essa coisa de o cinema causar uma transformação,
principalmente na política. "Tropa de Elite” é um filme de massa, e por
isso pode gerar debates na sociedade, e isto é bom e saudável. E debate é o
primeiro passo para a conscientização no processo de mudanças.
Toca o barco Capitão
!!!
BIBLIOGRAFIA
-SOARES, Luiz E.,
FERRAZ, Claudio, BATISTA, A., PIMENTEL, R.. Elite da Tropa. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2006.
-SOARES, Luiz E., FERRAZ, Claudio, BATISTA, A.,
PIMENTEL, R., Elite da Tropa II. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.
-BATISTA, A.; PIMENTEL,
R.; SOARES, L. E. Elite da tropa.
s/d. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.
-PADILHA, J. Tropa de Elite. Adaptação de Braulio
Mantovani Rio de Janeiro: Universal Pictures, 2007. 1 DVD (116 min.), 5.1 Dolby
Digital.
-BURKE, P. Prefácio à
edição brasileira. In: BURKE, P.; PORTER, R. (Org.); HATTNHER, A. L. (Trad.). Linguagem, indivíduo e
sociedade (História social da linguagem). 1.ed.
São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1993.
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