Entenda o que é a PEC 241 e como ela pode
afetar sua vida?
São Paulo 12 OUT 2016 - CEST - GIL ALESSI)
(Com informações de
Ana Carolina Cortez)
Com o objetivo de congelar gastos públicos e contornar a crise
econômica, proposta divide especialistas. A Câmara dos Deputados passou em
primeira votação nesta segunda-feira a proposta de emenda constitucional que
cria uma teto para os gastos públicos, a PEC 241, que congela as despesas do
Governo Federal, com cifras corrigidas pela inflação, por até 20 anos. Com as
contas no vermelho, o presidente Michel Temer vê na medida, considerada umas
das maiores mudanças fiscais em décadas, uma saída para sinalizar a contenção
do rombo nas contas públicas e tentar superar a crise econômica. O mecanismo
enfrenta severas críticas da nova oposição, liderada pelo PT, pelo PSOL e pelo
PCdoB, mas também vindas de parte dos especialistas, que veem na fórmula um
freio no investimento em saúde e educação previstos na Constituição. O texto da
emenda, que precisa ser aprovado em uma segunda votação na Câmara e mais duas
no Senado, também modifica a regra de reajuste do salário mínimo oficial, que
se limitará à variação da inflação. Entenda o que é a proposta e suas principais
consequências.
O que é a PEC do teto de gastos?
A PEC (Proposta
de Emenda Constitucional), que é a iniciativa para modificar a
Constituição proposta pelo Governo, tem como objetivo frear a trajetória de
crescimento dos gastos públicos e tenta equilibrar as contas públicas. A
ideia é fixar por até 20 anos, podendo ser revisado depois dos primeiros dez
anos, um limite para as despesas: será o gasto realizado no ano
anterior corrigido pela inflação (na prática, em termos reais - na comparação
do que o dinheiro é capaz de comprar em dado momento - fica praticamente
congelado). Se entrar em vigor em 2017, portanto, o Orçamento disponível para
gastos será o mesmo de 2016, acrescido da inflação daquele ano. A
medida irá valer para os três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário.
Pela proposta atual, os limites em saúde e educação só começarão a valer em
2018.
Por que o Governo diz que ela é necessária?
O ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, diz que "não há possibilidade de prosseguir
economicamente no Brasil gastando muito mais do que a sociedade pode pagar! Este não é um plano meramente fiscal." Para a equipe econômica,
mesmo sem atacar frontalmente outros problemas crônicos das contas, como a
Previdência, o mecanismo vai ajudar "a recuperar a confiança do mercado, a
gerar emprego e renda" ao mesmo tempo em que conterá os gastos públicos,
que estão crescendo ano a ano, sem serem acompanhados pela arrecadação de
impostos. Para uma parte dos especialistas, pela primeira vez o Governo está
atacando os gastos, e não apenas pensando em aumentar as receitas. O Governo
Temer não cogita, no momento, lançar mão de outras estratégias, como aumento de
impostos ou mesmo uma reforma tributária, para ajudar a sanar o problema do
aumento de gasto público no tempo.
O que dizem os críticos (CONTRA) da PEC?
Do ponto de vista de
atacar o problema do aumento anual dos gastos públicos, uma das principais críticas é que
uma conta importante ficou de fora do pacote de congelamento: os gastos com a
Previdência. É um segmento que abocanha mais de 40% dos
gastos públicos obrigatórios. Logo, a PEC colocaria freios em pouco
mais de 50% do Orçamento, enquanto que o restante ficaria fora dos limites
impostos - só a regra sobre o salário mínimo tem consequências na questão da
Previdência. A Fazenda afirmou, de todo modo, que a questão da Previdência será
tratada de forma separada mais à frente. "Se não aprovar mudanças na
Previdência, um gasto que cresce acima da inflação todos os anos, vai ter de
cortar de outras áreas, como saúde e educação", diz Márcio
Holland, ex-secretário de política econômica da Fazenda. "Nesse sentido, a
PEC deixa para a sociedade, por meio do Congresso, escolher com o que quer
gastar", complementa. Há vários especialistas que dizem que, na prática, o
texto determina uma diminuição de investimento em áreas como saúde e educação,
para as quais há regras constitucionais. Os críticos argumentam que, na melhor
das hipóteses, o teto cria um horizonte de tempo grande demais (ao menos dez
anos) para tomar decisões sobre toda a forma de gasto do Estado brasileiro,
ainda mais para um Governo que chegou ao poder sem ratificação de seu programa
nas urnas. Eles dizem ainda que, mesmo que a economia volte a crescer, o Estado
já vai ter decidido congelar a aplicação de recursos em setores considerados
críticos e que já não atendem a população como deveriam e muito menos no nível
dos países desenvolvidos. Se a economia crescer, e o teto seguir corrigido
apenas de acordo com a inflação, na prática, o investido nestas áreas vai ser
menor em termos de porcentagem do PIB (toda a riqueza produzida pelo país). O
investimento em educação pública é tido como um dos motores para diminuir a
desigualdade brasileira.
Quando a PEC começa a valer?
Se aprovada na Câmara
e no Senado, começa a valer a partir de 2017. No caso das áreas de saúde e
educação, as mudanças só passariam a valer após 2018, quanto Temer não será
mais o presidente.
Qual o impacto da PEC no salário mínimo?
A proposta também
inclui congelamento do valor do salário mínimo, que seria reajustado apenas segundo a
inflação. A regra atual para o cálculo deste valor, válida até o ano de
2019, soma a inflação à variação (percentual de crescimento real) do PIB de
dois anos antes. Em outras palavras, a nova regra veta a possibilidade de
aumento real (acima da inflação), um fator que ajudou a reduzir o nível de
desigualdade dos últimos anos. Além de ser o piso dos rendimentos de um
trabalho formal regular no Brasil, o salário mínimo também está vinculado ao
pagamento de aposentadorias e benefícios como os, por lei, destinados a
deficientes físicos.
O que acontece se a PEC for aprovada e o teto
de gastos não for cumprido?
Algumas das sanções
previstas no texto da PEC para o não cumprimento dos limites inclui o veto à
realização de concursos públicos, à criação de novos cargos e à contratação de
pessoal. Em outras palavras, pretende ser uma trava muito mais ampla que a Lei
de Responsabilidade Fiscal, por exemplo, que cria um teto de gastos com pessoal
(vários Estados e outros entes a burlam atualmente).
A PEC do teto vale para os Estados também?
A PEC se aplicará
apenas aos gastos do Governo Federal. No entanto, a secretária do Tesouro
Nacional, Ana Paula Vescovi, já sinalizou que o Planalto deve encaminhar em
breve uma segunda PEC que limita os gastos estaduais. Por enquanto não há
consenso entre o Executivo Federal e os governadores sobre o assunto.
Quais impactos a PEC pode ter nas áreas de
educação e saúde?
Os críticos afirmam
que a PEC irá colocar limites em gastos que historicamente crescem todos os
anos em um ritmo acima da inflação, como educação e saúde. Além disso, gastos
com programas sociais também podem ser afetados pelo congelamento. Segundo
especialistas e entidades setoriais, esta medida prejudicaria o alcance e a
qualidade dos serviços públicos oferecidos. Especialistas apontam problemas
para cumprir mecanismos já em vigor, como os investimentos do Plano Nacional de
Educação. Aprovado em 2014, o PNE tem metas de universalização da educação e
cria um plano de carreira para professores da rede pública, uma das categorias
mais mal pagas do país. "A população brasileira está envelhecendo. Deixar
de investir na educação nos patamares necessários, como identificados no PNE,
nos vinte anos de vigência da emenda proposta – tempo de dois PNEs -, é
condenar as gerações que serão a população economicamente ativa daqui vinte
anos, a terem uma baixa qualificação", disse o consultor legislativo da
Câmara dos Deputados, Paulo Sena, ao site Anped, que reúne especialistas em
educação.
Já o ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que mais importante do que o valor
despendido com áreas como saúde, educação e segurança, é a qualidade desses
gastos. "Dados da educação e da saúde hoje mostram que a alocação de
recursos não é o problema. É preciso melhorar a qualidade do serviço prestado à
população", disse. "Teremos muito trabalho. O principal deles
será o de mostrar que a saúde e educação não terão cortes, como a oposição
tenta fazer a população acreditar", afirmou a líder do Governo no
Congresso, a senadora Rose de Freitas (PMDB-ES).
A PEC do teto atingirá de maneira igual ricos e
pobres?
A população mais
pobre, que depende do sistema público de saúde e educação, tende a ser mais
prejudicada com o congelamento dos gastos do Governo do que as classes mais
abastadas. A Associação Brasileira de Saúde Pública, por exemplo, divulgou
carta aberta criticando a PEC. No documento a entidade afirma que a proposta
pode sucatear o Sistema Único de Saúde, utilizado principalmente pela população
de baixa renda que não dispõe de plano de saúde. Além disso, de acordo com o
texto da proposta, o reajuste do salário mínimo só poderá ser feito com base na
inflação - e não pela fórmula antiga que somava a inflação ao percentual de
crescimento do PIB. Isso atingirá diretamente o bolso de quem tem o seu ganho
atrelado ao mínimo.
Por que a Procuradoria Geral da República diz
que é inconstitucional?
Em nota técnica
divulgada em 7 de outubro o órgão máximo do Ministério Público Federal afirmou
que a PEC é inconstitucional. De acordo com o documento, "as alterações
por ela pretendidas são flagrantemente inconstitucionais, por ofenderem a
independência e a autonomia dos Poderes Legislativo e Judiciário e por
ofenderem a autonomia do Ministério Público e demais instituições
constitucionais do Sistema de Justiça [...] e, por consequência, o princípio
constitucional da separação dos poderes, o que justifica seu
arquivamento". A crítica vem pela criação de regras de gastos para os demais Poderes.
Na nota, a procuradoria argumenta que, caso aprovada, a PEC irá prejudicar a
“atuação estatal no combate às demandas de que necessita a sociedade, entre as
quais: o combate à corrupção; o combate ao crime; a atuação na tutela coletiva;
e a defesa do interesse público". A Secretaria de Comunicação Social da
Presidência rebateu a PGR, afirmando que na proposta não existe “qualquer
tratamento discriminatório que possa configurar violação ao princípio da
separação dos poderes".
O que vem depois da PEC, se ela for aprovada
tal como está?
A PEC é a prioridade
da equipe econômica do Governo Temer, que vai pressionar por outras reformas
nos próximos meses, como a Reforma da Previdência e Reforma Trabalhista.
8 perguntas que você precisa saber
responder antes de sair por aí falando da PEC dos gastos!
(por Felippe Hermes)
Há exatos dois anos,
vitoriosa na eleição mais disputada no país desde a redemocratização, a
ex-presidente Dilma Rousseff recebeu de Lula apenas um conselho sobre o que
fazer com a economia em seu segundo mandato: colocar Henrique Meirelles no
Ministério da Fazenda. Parecia o plano perfeito! Meirelles tinha crédito de
sobra junto ao mercado e confiança junto à base política. Dilma, no
entanto, fez jogo duro. E ao recusar garantir autonomia à pasta, acabou
colaborando para que seu capital político entrasse em parafuso poucos meses
depois: fez Meirelles desistir da ideia. Em ao menos três
ocasiões, Lula tentou, sem sucesso, convencer sua sucessora a indicar Meirelles
ao cargo. Na última delas, em março deste ano, o ex-presidente já estava
convencido de que o ex-deputado federal faria parte do governo no instante
seguinte à sua nomeação como ministro-chefe da Casa Civil. Um novo tempo
surgiria e o ajuste fiscal tomaria seu rumo, com Lula no comando. Ainda seriam
necessários dois meses, porém, para o destino terminar de colocar o
ex-presidente do Banco Central no cargo mais alto da economia do país, já no
governo interino de Michel Temer. E quase dois anos desde a conversa entre Lula
e Dilma para que Meirelles garantisse sua primeira vitória como ministro:
aprovar a PEC dos gastos. Tamanha confiança detida por Lula de que Meirelles era a pessoa certa
para o cargo não nasceu do nada. Em seus oito anos no comando do Banco Central,
quando topou sair do PSDB para ocupar uma das posições mais importantes do
governo Lula, Meirelles foi um dos nomes responsáveis pela bem sucedida
política que permitiu ao país reduzir a taxa de juros de 26,5% em fevereiro de
2003 para 10,75% em dezembro de 2010!
Agora, à frente da área fiscal, Meirelles tem como
objetivo três tarefas nada fáceis!
1)- Impedir que a
dívida continue crescendo.
2)- Reverter o maior
déficit orçamentário do país nos últimos 19 anos.
3)- Fazer a economia
sair da maior recessão dos últimos 85 anos.
Tudo isso, claro, nos
escassos dois anos que possui de mandato. É um desafio e tanto! Em
outros tempos, a estratégia poderia ser simples – numa única canetada,
aumenta-se os impostos e joga-se a conta para a população. Quase duas
décadas de aumento de carga tributária e a certeza de que aumentar impostos em
meio a uma recessão apenas contribui para nos jogar mais ainda no fundo do
poço, no entanto, fizeram Meirelles apostar num novo plano. Se você já está se
coçando para gritar por corte de gastos, talvez seja interessante pegar uma
calculadora e analisar um pouco mais a fundo o problema. Para impedir que a
dívida cresça e leve os juros para cima (o que reduziria ainda mais a
capacidade de investimento das empresas, reduzindo a geração de emprego e
renda), o Brasil necessita voltar a economizar ao menos 2% do PIB, uma bagatela
de R$ 120 bilhões. Some a isso o que gastamos a mais do que arrecadamos hoje
(R$ 170,5 bilhões) e o resultado é uma conta que chega a quase R$ 300 bilhões. Encontrar
isso no orçamento, hoje, é impossível. Nem mesmo se o governo demitisse 100%
dos funcionários públicos. Se aumentar impostos não é uma boa ideia e apenas cortar gastos não
resolve o problema, qual seria então a solução? Para Meirelles, uma palavrinha
curta e simples: crescimento. Que tal se não
aumentássemos impostos e nem realizássemos cortes em investimentos e programas
sociais (como os 74% de verba para programas como o Minha Casa Minha Vida,
cortados ainda no governo Dilma) e em troca passássemos os próximos 10 ou 20 anos
gastando menos? Pois é exatamente disso que o governo quer lhe convencer.
AQUELAS PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR...
1) De onde surgiu esse papo de congelar os
gastos?
Sem topar ceder o
comando da economia a Meirelles, Dilma peregrinou o mercado em busca de um nome
que atendesse suas principais demandas: dividir com ela o comando da economia e
ter bom trânsito com o sistema financeiro. Seu primeiro nome, Luís Carlos
Trabuco, presidente do Bradesco, não topou, mas enviou um de seus melhores
executivos para a tarefa: Joaquim Levy. Muito antes de se tornar presidente de
uma das empresas do Bradesco, Levy marcou presença no bem sucedido ajuste
fiscal do primeiro mandato do governo Lula. Assim como boa parte da equipe
indicada por Lula para a Fazenda em 2003, Levy não possuía nenhuma proximidade com as
ideias petistas. Para economistas ligados ao PT, como Maria da
Conceição Tavares, a equipe montada por Lula era composta de débeis mentais! Com
um currículo que lhe garantia experiência e certa credibilidade, Levy montou
seu ajuste fiscal baseado em duas frentes: aumento de impostos e corte de
gastos. Com a recusa do Congresso em aumentar impostos, porém, seu ajuste ficou
capenga e os cortes, como vimos, se limitaram a reduzir investimento e
programas sociais.Tamanha tragédia foi
um recado claro para o próximo ministro da Fazenda a se aventurar no cargo. Assim
que assumiu o posto, pouco mais de 4 meses depois de Levy ter desistido da
tarefa, Meirelles apresentou suas cartas, ameaçou um aumento de impostos e fez
o Congresso topar uma estratégia de longo prazo.
2) Como essa PEC resolveria o nosso problema na
prática?
Pouco mais de cinco
anos de políticas voltadas para incentivar o setor produtivo deixaram sua
conta. Entre 2010 e 2015, o governo federal foi responsável por despejar mais
de R$ 450 bilhões em aportes para que bancos públicos realizassem empréstimos
com juros menores do que a inflação para grandes e médias empresas. Na outra
ponta,R$ 458 bilhões deixaram de ser arrecadados com as chamadas desonerações
fiscais. Em outras palavras: o governo topou aumentar os gastos e diminuir a
receita, na expectativa de que o crescimento da economia fizesse a conta
fechar. No final desta brincadeira, a dívida pública cresceu inacreditáveis R$ 2
trilhões, mais do que dobrando. Apenas entre 2013 e o início de 2016, a dívida
saltou pouco mais de 15 pontos do PIB, ou aproximadamente R$ 1 trilhão. Impedir
que isso continue é um dos objetivos da PEC.Para fechar a conta é necessário
cortar gastos, mas uma regra do nosso orçamento torna essa tarefa quase
impossível: quase R$ 2 em cada R$ 3 gastos pelo governo não podem ser mudados,
pois obedecem a limites mínimos estabelecidos na Constituição ou leis que
impedem que sejam reajustados abaixo, por exemplo, da inflação.Para fugir dessa regra, a PEC propõe que os valores sejam preservados
como estão hoje (ou sofram algum aumento no início e então sejam congelados,
como os gastos em saúde e educação). Em outras palavras, a ideia é que nós
possamos trocar os cortes de gastos que precisaríamos por um congelamento e
usar a arrecadação extra para cobrir a diferença.
3) O congelamento de gastos também atingirá o
salário dos políticos e do Judiciário?
16,4% do orçamento
brasileiro é gasto com os 45% mais pobres - E 83,6% do orçamento brasileiro é gasto
com os 55% mais ricos! Sim, você não leu
errado! Pegue todo o gasto em saúde e educação destinado à metade mais pobre da
população, some com os gastos do Bolsa Família e, no final, o número que você
chegará é exatamente este: 16,4%. A conta é do economista Marcos Lisboa. Poucos
temas são tão delicados quando falamos em congelar gastos quanto as áreas de
proteção social. Para boa parte das
pessoas, o governo existe essencialmente para proteger a camada mais pobre da
população e é para ela que se destinam os programas sociais e os gastos com
saúde e educação. Na prática, porém, o orçamento público serve hoje a outros
interesses. Como demonstra o economista Paes de Barros, nossa previdência
privilegia a camada de cima. Se aposentar antes dos 65 anos é um luxo ao qual
metade dos trabalhadores brasileiros não possui acesso, uma vez que, estando na
informalidade, não conseguem aposentar-se por tempo de contribuição e muito
menos receber mais do que um mísero salário mínimo. Some os gastos com saúde e
educação para os mais pobres, e o número que você encontrará não cobre sequer o
gasto do governo com o funcionalismo público. Como mostrou uma pesquisa do
IPEA, quase 1/3 da desigualdade do país tem origem nos salários e
aposentadorias dos funcionários públicos. Não é por acaso.Em outro estudo, o IPEA, que é um órgão público, revela que nos últimos
15 anos, o salário dos funcionários públicos cresceu nada menos do que 3 vezes
acima do salário médio de trabalhadores da iniciativa privada. Some desonerações
para grandes empresários, subsídio para grandes fazendeiros e aquela mãozinha
extra ao exportador e você descobrirá onde foi parar boa parte dos 83,6% restantes do orçamento: para os mais
ricos. E não pense que o Congresso e o Judiciário mais caros do planeta, também
não entram na conta! Todos eles, com a aprovação da PEC, passam a fazer parte do
congelamento. Este é também o motivo pelo qual Ministério Público é contra a
PEC. Para o MP, o governo pode congelar apenas os gastos do Executivo, não do
Judiciário. Pelo novo regime fiscal, a concessão de aumentos acima da inflação não
poderia ser aprovada sem que violasse a lei, uma vez que não é permitido um
aumento de gastos totais acima da inflação. Para que os políticos ou o
Judiciário aprovassem um aumento para si, teriam de diminuir recursos de outras
áreas, tornando muito mais difícil aprovar aumentos. Em outra palavras – com a
aprovação da PEC, o dinheiro deixa de ser infinito! E aqui, é importante
ressaltar por que essa é uma PEC. A revisão anual do salário do funcionalismo é
exigência da Constituição. Se fosse lei, não funcionaria.
4) O governo irá investir menos em saúde e
educação?
Apesar de responderem
por menos de R$ 1 em cada R$ 5 gastos pelo governo, os gastos em educação e
saúde tomaram conta da pauta. Motivo pra isso não falta. Ambos são a parte mais
visível dos serviços entregues à população pelo setor público e, para muitos, a
mais importante função de qualquer governo.Ainda assim, as
coisas por aqui não são tão simples como parecem. Há exceções da lei. Alguns tipos
de despesa não se sujeitarão ao teto. Entre elas, o FUNDEB, o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica. Para efeito de
comparação, o fundo tem um orçamento previsto em 2016 de R$ 138 bilhões, ou
quase 35% a mais do que todo o gasto do Ministério da Educação. Nada disso
seria alterado. Dentre os R$ 389
bilhões, ou 6,6% do PIB brasileiro gastos em educação no ano de 2015
(percentual que supera o de países como Islândia, Suécia e nova Zelândia),
apenas 21,81% disso foi gasto pelo governo federal. Todos os quase 80% restantes,
portanto, não entrariam na conta do congelamento, pois são de responsabilidade
de estados e municípios, que não serão afetados pelo teto.Ainda assim, o gasto federal em educação não necessariamente ficará
congelado como está hoje. Graças a uma nova regra, o valor de 2017 será
calculado com base no que for empenhado e não naquilo que for efetivamente
gasto em 2016. Com esta pequena mudança, o orçamento para 2017, será maior do
que em 2016, e depois disso será mantido igual, com reajuste pela inflação.Na prática, no
entanto, o que mais importa aqui é que, com a PEC, os cortes na área feitos em
2015 e 2016 se tornam proibidos.Ainda assim, se o Congresso quiser, poderá
ampliar o gasto com educação do país, desde que aponte de onde dos 80% do
orçamento que não dizem respeito à saúde ou educação o valor sairá.O mesmo ocorre com a
saúde, área na qual o governo federal é responsável direto também por apenas
uma fração daquilo que é aplicado no país, uma vez que boa parte dos gastos na
área são privados (56% do total), ou de responsabilidade de estados e
municípios (cerca de 25,5% do gasto total).Dos 19% dos gastos em saúde que
cabem ao governo federal, a PEC acarretará de fato numa perda. Determinar
quanto será perdido, porém, é quase impossível. Para o Conselho Nacional de
Secretários de Saúde, a nova regra implicaria em R$ 31 bilhões a menos para a
saúde em 2026, pouco menos de 5% do total que o país investirá neste ano.Infelizmente, não é
possível estimar como ficam os cálculos com base na mudança das regras para a
área, que antecipam a medida que eleva os gastos em saúde de 13,7% para 15% do
PIB. Com essa regra, em 2017 a área de saúde passa a ganhar R$ 10 bilhões a
mais já em 2017, bem acima do prejuízo de R$ 2,5 bilhões estimados no estudo. Em
nenhum dos estudos que apontam reduções, no entanto, a capacidade do governo de
gastar estes recursos é considerada.Em todos os casos, os estudos consideram que o governo sempre terá
dinheiro para gastar com essas áreas, ainda que a dívida chegue a 100% do PIB,
como deve ocorrer em 2024 caso a trajetória atual se mantenha.Como os governos
estaduais e os atrasos de salário deixam bastante claro, no entanto, a
possibilidade do dinheiro simplesmente acabar e o governo não poder gastar nada
no setor é real.Ambos os setores ainda serão inteiramente afetados pelas
mudanças demográficas pelas quais o Brasil passará. Na área de educação, por
exemplo, o país deixará de contar com 51 milhões para ter 42,5 milhões de
jovens em idade escolar, o que fará com que o valor per capita destinado aos
alunos aumente consideravelmente. Na parte da saúde, porém, este é um grande
problema. Nossa população irá envelhecer e os gastos permanecerão os mesmos de
hoje.Saúde e educação, no entanto, não serão congelados. Caberá ao Congresso
definir o momento e de que forma estes gastos poderão ser aumentamos acima do
mínimo. Para fazer isso, nossos políticos devem apontar de que outro lugar do
orçamento sairão os recursos.
5) Com a PEC 241, o governo irá pagar mais
juros da dívida?
Se o principal
objetivo do novo regime fiscal é limitar o gasto público e gerar um excedente
que controle a dívida pública, não é muito difícil imaginar que estes recursos
excedentes irão para o pagamento de juros da dívida não é?Em princípio, a
resposta é sim, mas isso não significa que o governo irá pagar mais juros, mas
menos. Explico. Essencialmente, existem duas maneiras do governo pagar os juros da
dívida e conseguir diminuí-la. Na primeira, que é o que fazemos hoje, emitimos
uma dívida nova e pagamos a antiga, gerando com isso uma bola de neve – afinal,
nunca diminuímos a quantidade de dívida efetiva, o que faz com que os juros
cobrados pelos emprestadores seja cada vez maior. No segundo cenário, criamos
um esforço para reduzir a dívida, chamado de superávit primário. Neste quesito,
ninguém fez mais do que Lula e Palocci. Nenhum governo na história economizou
tanto para pagar juros da dívida. E o resultado obtido foi justamente uma queda
na dívida, e consequentemente nos juros. Com a expectativa de que a dívida entre
em controle, os juros pagos ao final de dez anos serão menores, uma vez que a
dívida será menor. Sem a PEC, a expectativa é de que o Brasil pague R$ 1,7 trilhões em
juros da dívida em 2026. Caso a PEC seja aprovada, pagaríamos R$ 1,3 trilhão em
juros. Ou seja, controlando os gastos ao longo da próxima década, estaremos
pagando R$ 400 bilhões a menos em juros. Como a PEC será revista em dez anos, é
possível que o Congresso redefina para onde irão os valores excedentes gerados
e optemos por utilizar estes valores em saúde e educação, por exemplo, ou
continuar reduzindo a carga tributária.
6) E se a PEC tivesse sido aplicada em 2003 ou
2011, como seria?
Simulações com base em anos passados têm se tornado bastante comuns nos
últimos dias. Para algumas delas, caso a PEC tivesse sido aplicada em 2003 ou
2011, teríamos colocado algumas centenas de bilhões de reais a menos em
educação e saúde, ou estaríamos com um orçamento razoavelmente menor do que
hoje. Propor um exercício assim pode ser uma forma interessante de analisar a
situação, mas é preciso cautela. Primeiro, é necessário lembrar que nem saúde
nem educação são majoritariamente obrigações do governo federal. E em seguida,
é importante ressaltar que o objetivo da lei não pode ser medido no passado –
ou seja, não é possível saber como se comportaria a taxa de juros, a dívida
pública, os investimentos, a confiança do investidor e do consumidor, e assim
por diante.Esta PEC é uma forma
gradual de se fazer um ajuste fiscal. Aplicá-la em um momento onde a receita
crescia e não havia necessidade de congelar gastos para fazer ajuste torna nulo
seu objetivo. Ainda assim, a PEC poderia servir para mostrar que enquanto
sociedade poderíamos ter optado por escolhas mais inteligentes de como gastar
nosso dinheiro nos últimos anos. Poderíamos ter alocado mais recursos em
saneamento, que geram economia em saúde, em vez de concedermos aumentos ao
fundo partidário, por exemplo, que teve alta superior a 200%.Como medir os efeitos de uma carga tributária menor na
sociedade?Nenhum destes estudos
se preocupa com esta questão.Atualmente, o setor privado é responsável por
poupar cerca de 18,2% do PIB, enquanto o setor público poupa -2%. Reduzir a
carga teria aumentado a poupança privada? Tudo indica que sim. E quais os
efeitos práticos de uma alta na poupança? A resposta é tão simples quanto
parece: maior geração de emprego e renda.Tais efeitos são sempre desconsiderados
nestes estudos, mas são cruciais para apontarmos quanto deixou de ir para cada
área, uma vez que os novos investimentos possibilitados pela arrecadação menor
em nível federal gerariam maior arrecadação em nível de estados e municípios, o
que elevaria os gastos obrigatórios destes entes federados em saúde e educação.
Caso estivesse em vigor desde 2011, a lei poderia ainda ter um resultado
inusitado: impedir que os funcionários públicos tivessem perdas salariais no
governo Dilma. E o motivo disso é bastante claro. Desde este ano, a média de
aumentos salariais concedidos pelo governo ficou em 5,5%. Em nenhum ano, porém,
a inflação ficou abaixo de 6%. O que é o mesmo que dizer que a cada ano do
governo Dilma o funcionalismo ficou um pouco mais pobre.
7) Por que propor uma mesma regra por um prazo
de 20 anos não faz sentido?
Imaginar o Brasil em
um horizonte de duas décadas não é uma tarefa fácil. Nossa pirâmide demográfica
terá mudado completamente. Seremos um país com mais idosos e menos jovens.
Teremos mais gastos com a previdência e menos gastos com escolas. Teremos
enfim, outras prioridades. Ainda assim, a PEC como está posta hoje nos trata da
mesma maneira. Para a lei, somos irresponsáveis que precisam de um controle
presente – e precisaremos desse controle dentro de 20 anos. Não é absurdo supor
que demandaremos controles e devemos prezar por boas práticas. O tipo de
controle é o que deve ser revisto.Como mostra o
economista Raul Veloso, mantida a tendência de economia de recursos por 20
anos, em 2036 estaremos poupando quase 6,5% do PIB, ou duas vezes o resultado
mais positivo em toda a história das contas públicas brasileiras.Se, para
mantermos a dívida estável com um crescimento de 2,5%, é necessário pouparmos
2% do PIB, por que então devemos permitir uma economia de 6,5%?Em pontos como
este, a lei se mostra falha, uma vez que busca prever um horizonte quase
impossível de ser previsto e antecipado.Definir a forma como
o controle se dará no longo prazo é uma discussão que caberá ao Congresso após
passados os dez primeiros anos, quando a PEC puder ser revista. A PEC, no
entanto, não irá figurar solta no ar: irá se correlacionar com questões não
passíveis de previsão, como a macroeconomia mundial. É possível que o pais opte
por utilizar este excedente gerado pela lei para escapar de uma turbulência,
assim como pode-se optar por manter o congelamento por mais tempo, uma vez que
a redução da carga tributária tenha efeitos positivos sobre juros e poupança e
colabore para o crescimento da economia. Em todos os casos, a PEC abre a
possibilidade de o país discutir cenários mais confortáveis, algo que hoje, em
meio à crise, não podemos nos dar ao luxo.
8) Quais países do mundo aplicam medida
semelhante?
O rigor da lei, à
primeira vista, assusta. Afinal, estamos falando de uma lei do mesmo nível da
Lei de Responsabilidade Fiscal ou do Plano Real – algo que irá impactar e
definir os rumos do país por mais de duas décadas.Um olhar ao redor do mundo,
porém, ajuda a entender o que pode ocorrer com o Brasil nos próximos anos.No caso mais
emblemático, o da Suécia, não é difícil perceber que, em relação ao PIB, a
carga tributária deve cair. Depois de aprovada sua lei de teto de gastos, a
Suécia tornou-se o país do mundo com carga tributária em maior queda livre. Se
considerarmos nossos gastos não pagos pelos impostos (nosso déficit, portanto),
nossa carga tributária hoje deveria ser maior do que a sueca para comportar o
governo. Cobramos hoje pouco menos de 33% de impostos e temos um déficit
nominal de 10,2% do PIB. Na Suécia, os gastos públicos estão em 42,8% contra
50,3% de quando essa lei foi aprovada. Nada disso, porém, comprometeu os gastos
sociais do país. Este, no entanto, é apenas um exemplo do que pode ocorrer.Em países como os
Estados Unidos é comum que governos estaduais tenham também leis que limitam a
arrecadação. Ou seja: toda vez que a arrecadação crescer além do limite previsto, o
governo passa a devolver impostos à população. Recentemente, o estado
de Washington foi obrigado a realizar essa operação, uma vez que os impostos
obtidos com a venda de maconha legalizada fizeram os impostos crescerem acima
do esperado. Em outros casos
famosos, a Polônia aplicou a lei em 2011, o Peru em 2000 e a França em 1998.Definir se uma lei
fiscal é uma boa ideia ou não é algo que dependerá sempre dos valores e
prioridades de cada um. O que é importante destacar, porém, é que, independente
de qual prioridade você queira definir para o governo, ela só será possível com
uma condição: caso existam os recursos necessários para executar tal ação. Sem dinheiro em caixa, os direitos garantidos pela Constituição não
podem ser atendidos pelo governo e boa parte daquilo que você considera
obrigação do Estado simplesmente deixa de ser realizado. Há que se destacar,
entretanto, que na ocasião da aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal e no
lançamento do Plano Real não faltaram pessoas para se opor e disseminar a ideia
de que ambas as leis levariam o país à falência.Na prática, a PEC é uma
tentativa gradual de se evitar problemas por uma década.
PASMEM DILMA JÁ APROVOU A APLICAÇÃO DA PEC 241 NO PASSADO!
O jornalista Leonardo
Palhuca traz uma lembrança muito incomoda para a extrema-esquerda no blog
Terraço Econômico: a presidente Dilma Rousseff já defendeu a proposta de contenção
dos gastos púbicos, incluindo a PEC 241. A ideia veio à tona logo que Dilma
venceu as eleições de 2014. Na época a candidata gerou revolta popular justamente
por ter voltou atrás em seu discurso de campanha. Quando os adversários Aécio
Neves, Eduardo Jorge e Pastor Everaldo falaram em crise econômica, Dilma
afirmou que “o Brasil ia bem”. Bastou o Tribunal Superior Eleitoral anunciar
sua vitória que a presidente voltou atrás afirmando que a economia estava
quebrada e que o país deveria adotar medidas de ajuste fiscal! A agora
ex-presidente passou os últimos dias criticando a proposta que também já foi
defendida por Antonio Palocci (ministro nos governos Lula e Dilma) e Henrique
Meirelles (ministro de Lula e atual ministro de Michel Temer). Nem a presidente
nem a extrema-esquerda responderam aos questionamentos sobre a mudança de
postura com relação à PEC 241.Após sua reeleição, Dilma Rousseff pregava um ajuste
nas contas públicas para o Brasil sair da crise (internacional?) e retomar o
crescimento. Não conseguiu fazer, sofreu resistência e o resto é a história que
contaremos aos nossos filhos. Atualmente ela é uma crítica da PEC 241 que passou aprovada na Câmara dos Deputados. Mas achamos que no fundo, no
fundo, Dilma apoia a PEC pelos seus tweets passados! Confira comigo no replay
abaixo:
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