O professor da Universidade de Michigan diz que dar empréstimo é perda de tempo. Para ele, os pobres não ficam ricos apenas com um empurrão
São Paulo - Aneel karnani, professor de economia da universidade de michigan, é o autor do recém-lançado Fighting Poverty Together (“A luta conjunta contra a pobreza”, numa tradução livre), livro que causou controvérsia ao criticar as políticas de microcrédito.
Karnani (Foto), nascido na Índia e criado no Sudão, falou a EXAME numa recente visita a São Paulo.
1) EXAME - Por que o senhor é contra o microcrédito?
Aneel Karnani - O grande problema do microcrédito é romantizar a pobreza. É comum ouvir que o pobre pode se transformar em rico com apenas um pequeno empurrão. Não é verdade.
O mundo empreendedor é para os criativos, ambiciosos e persistentes. Os pobres são empreendedores por necessidade, não por escolha. Mais de 90% das pessoas querem um trabalho assalariado. Dar um empréstimo de 200 dólares e esperar que a pessoa se torne rico? É perda de tempo.
2) EXAME - Quais são as evidências de que o microcrédito não funciona?
Aneel Karnani - Em geral, 80% dos empréstimos nos programas de microcrédito são usados para o consumo, como comprar uma televisão. Se você pega um dinheiro emprestado e gasta, o futuro será pior, não melhor.
3) EXAME - Como explicar, então, que a maior parte das pessoas acaba pagando os empréstimos?
Aneel Karnani - Medir a eficiência desses programas pelo pagamento é válido. Porém, mais importante do que isso é saber se as pessoas saíram da linha de pobreza.
O índice de pagamento é muito alto porque há uma enorme pressão social. De modo geral, o empréstimo é dado a um grupo de pessoas. Quando uma não paga, as outras são prejudicadas.
O pagamento pode até ser alto, mas o problema é que as pessoas continuam pobres. Os dois países que mais utilizam o microcrédito são Bangladesh e Bolívia. Isso responde à sua pergunta?
4) EXAME - O que funciona, então?
Aneel Karnani - A China é o país que mais reduziu a pobreza nas últimas três décadas. Como fez isso? Com a criação de empregos. Muitos desses postos de trabalho são nas indústrias têxtil, de calçados e de brinquedos. Trabalhos terríveis, é verdade. Muitas pessoas de vários países ao redor do mundo não querem essas atividades. Mas foi assim que milhões de chineses deixaram de ser pobres.
5) EXAME - Esse mesmo modelo vai funcionar na Índia?
Aneel Karnani - A economia indiana está crescendo, mas não cria postos de trabalho na medida necessária. O grande problema na Índia é que o crescimento está centrado em setores que exigem mão de obra mais especializada, como o de tecnologia.
6) EXAME - E o caso brasileiro?
Aneel Karnani - Na última década, muitos países cresceram com níveis altos de concentração de riqueza. O Brasil, felizmente, conseguiu evitar isso. O Bolsa Família combateu a pobreza e colocou as crianças na escola. Por outro lado, houve a criação de milhares de postos de trabalho.
7) EXAME - Com a crise, a Europa tem como escapar do aumento da desigualdade social?
Aneel Karnani - É difícil. Para os padrões europeus, a pobreza já está aumentando, o que cria muitas tensões. Os jovens foram educados por longos anos e agora querem um trabalho. Mas vagas de emprego se tornaram raras nos últimos anos. E as perspectivas não são nada boas.
Fonte: Revista Exame – Novembro-2011
Postar um comentário
Todos os comentários publicados não significam a adesão às ideias nelas contidas por parte deste apostolado, nem a garantia da ortodoxia de seus conteúdos. Conforme a lei o blog oferece o DIREITO DE RESPOSTA a quem se sentir ofendido(a), desde que a resposta não contenha palavrões e ofensas de cunho pessoal e generalizados. Os comentários serão analisados criteriosamente e poderão ser ignorados e ou, excluídos.