Estes
princípios não são regras a ser seguidas na política prática. São um conjunto de critérios de reconhecimento para você
distinguir, quando ouve um político, se está diante de um conservador, de um
revolucionário ou de um “liberal”, no sentido brasileiro do termo hoje
em dia (que é uma indecisa mistura dos dois anteriores).
1. Ninguém é dono do
futuro
“O futuro pertence a nós” é um verso do hino da Juventude Hitlerista. É a essência da mentalidade revolucionária. Um conservador fala em nome da experiência passada acumulada no presente. O revolucionário fala em nome de um futuro hipotético cuja autoridade de tribunal de última instância ele acredita representar no presente, mesmo quando nada sabe desse futuro e não consegue descrevê-lo senão por meio de louvores genéricos a algo que ele não tem a menor idéia do que seja.
Quando
o ex-presidente Lula dizia “Não sabemos qual tipo de socialismo queremos”, ele
presumia saber:
a)-Que o socialismo é o
futuro brilhante e inevitável da História, quando a experiência nos mostra que
é na verdade um passado sangrento com um legado de mais de cem milhões de
mortos.
b)-Que ele e seus cúmplices
têm o direito de nos conduzir a uma repetição dessa experiência, sem outra
garantia de que ela será menos mortífera do que a anterior exceto a promessa
verbal saída da boca de alguém que, ao mesmo tempo, confessa não saber para
onde nos leva. A mentalidade revolucionária é uma mistura de presunção psicótica e
irresponsabilidade criminosa.
2.
Cada geração tem o direito de escolher o que lhe convém
Isto implica que nenhuma
geração tem o direito de comprometer as subseqüentes em escolhas drásticas
cujos efeitos quase certamente maléficos não poderão ser revertidos jamais ou
só poderão sê-lo mediante o sacrifício de muitas gerações. O povo tem, por definição, o
direito de experimentar e de aprender com a experiência, mas, por isso mesmo,
não tem o direito de usar seus filhos e netos como cobaias de experiências
temerárias.
3.
Nenhum governo tem o direito de fazer algo que o governo seguinte não possa
desfazer
É um corolário incontornável
do princípio anterior. As eleições periódicas não fariam o menor
sentido se cada governo eleito não tivesse o direito e a possibilidade de
corrigir os erros dos governos anteriores. A democracia é, portanto,
essencialmente hostil a qualquer projeto de mudança profunda e irreversível da
ordem social, por pior que esta seja em determinado momento. Nenhuma
ordem social gerada pelo decurso dos séculos é tão ruim quanto uma nova ordem
imposta por uma elite iluminada que se crê, sem
razão, detentora do único futuro desejável. No curso dos três últimos séculos
não houve um só experimento revolucionário que não resultasse em destruição,
morticínio, guerras e miséria generalizada. Não se vê como os
experimentos futuros possam ser diferentes.
4. Nenhuma proposta
revolucionária é digna de ser debatida como alternativa respeitável num quadro
político democrático
A revogabilidade das medidas
de governo é um princípio incontornável da democracia, e toda proposta
revolucionária, por definição, nega esse princípio pela base. É
impossível colocar em prática qualquer proposta revolucionária sem a
concentração do poder e sem a exclusão, ostensiva ou camuflada, de toda proposta
alternativa. Não se pode discutir alternativas com base na proibição de
alternativas.
5.
A democracia é o oposto da política revolucionária
A democracia é o governo das
tentativas experimentais, sempre revogáveis e de curto prazo. A
proposta revolucionária é necessariamente irreversível e de longo prazo. A
rigor, toda proposta revolucionária visa a transformar, não somente uma
sociedade em particular, mas a Terra inteira e a própria natureza humana. É
impossível discutir democraticamente com alguém que não respeita sequer a
natureza do interlocutor, vendo nela somente a matéria provisória da humanidade
futura. É estúpido acreditar que comunistas, socialistas, fascistas,
eurasianos e tutti quanti possam integrar-se pacificamente na convivência
democrática com facções políticas infinitamente menos ambiciosas. Será sempre a
convivência democrática do lobo com o cordeiro.
6. A total erradicação da
mentalidade revolucionária é a condição essencial para a sobrevivência da
liberdade no mundo
A mentalidade revolucionária não é
um traço permanente da natureza humana. Teve uma origem histórica – por volta
do século XVIII – e terá quase certamente um fim. O período do seu apogeu, o
século XX, foi o mais violento, o mais homicida de toda a História humana,
superando, em número de vítimas inocentes, todas as guerras, epidemias,
terremotos e catástrofes naturais de toda ordem observadas desde o início dos
tempos. Não
há exagero nenhum em dizer que a mentalidade revolucionária é o maior flagelo
que já se abateu sobre a humanidade. É uma questão de números e não
de opinião. Recusar-se a enxergar isso é ser um monstro de insensibilidade.
Toda política que não se volte à completa erradicação da mentalidade
revolucionária, da maneira mais candente e explícita possível, é uma
desconversa criminosa e inaceitável, por mais que adorne sua omissão com belos
pretextos democráticos, libertários, religiosos, moralísticos, igualitários,
etc.
Por: Olavo de Carvalho - Diário
do Comércio, 27 de junho de 2011
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