Doutrina
da Fé: publicada a declaração "Fiducia supplicans"
Desde agosto
de 2000, o antigo Santo Ofício não publicava um documento de alto valor
doutrinário
Da
redação, com Vatican News
A declaração “Fiducia supplicans”, do Dicastério para a Doutrina da Fé – e aprovada pelo Papa, foi divulgada nesta segunda-feira, 18. O documento aprofunda o tema das bênçãos, distinguindo entre as bênçãos rituais e litúrgicas e as bênçãos espontâneas, que se assemelham mais a gestos de devoção popular. Mas sem que esse gesto de proximidade pastoral contenha elementos minimamente semelhantes a um rito matrimonial. Desde agosto de 2000, o antigo Santo Ofício não publicava uma declaração (a última foi a “Dominus Jesus”) de alto valor doutrinário. “Fiducia supplicans” começa com uma introdução do prefeito, Cardeal Victor Fernandez, que aprofunda o “significado pastoral das bênçãos”, permitindo que “sua compreensão clássica seja ampliada e enriquecida” por meio de uma reflexão teológica “baseada na visão pastoral do Papa Francisco”, sem modificar de qualquer forma o ensino perene da Igreja sobre o casamento”.
Resumo dos "principais pontos" do Documento
Após os primeiros parágrafos (1-3), em que o pronunciamento anterior de 2021 é lembrado e agora ampliado, a declaração apresenta a bênção no sacramento do matrimônio (parágrafos 4-6), declarando “inadmissíveis ritos e orações que possam criar confusão entre o que é constitutivo do matrimônio” e “o que o contradiz”, a fim de evitar reconhecer de alguma forma “como matrimônio algo que não é”. Reitera-se que, de acordo com a “doutrina católica perene”, somente as relações sexuais dentro do casamento entre um homem e uma mulher são consideradas lícitas. Um segundo grande capítulo do documento (parágrafos 7-30) analisa o significado das várias bênçãos, que têm como destino pessoas, objetos de devoção, lugares de vida. O documento lembra que, “de um ponto de vista estritamente litúrgico”, a bênção exige que o que é abençoado “esteja em conformidade com a vontade de Deus expressa nos ensinamentos da Igreja”. Quando, com um rito litúrgico específico, “se invoca uma bênção sobre certas relações humanas”, é necessário que “o que é abençoado possa corresponder aos desígnios de Deus inscritos na Criação” (11). Portanto, a Igreja não tem o poder de conferir uma bênção litúrgica a casais irregulares ou do mesmo sexo. Mas é preciso evitar o risco de reduzir o significado das bênçãos apenas a esse ponto de vista, exigindo para uma simples bênção “as mesmas condições morais que são exigidas para a recepção dos sacramentos” (12). Depois de analisar as bênçãos nas Escrituras, a declaração oferece um entendimento teológico-pastoral. Quem pede uma bênção “se mostra necessitado da presença salvadora de Deus em sua história”, porque expressa “um pedido de ajuda de Deus, uma súplica por uma vida melhor” (21). Esse pedido deve ser acolhido e valorizado “fora de uma estrutura litúrgica”, quando se encontra “em uma esfera de maior espontaneidade e liberdade” (23). Olhando para elas da perspectiva da piedade popular, “as bênçãos devem ser valorizadas como atos de devoção”.
Discernimento
Aprofundando essa distinção, com base na resposta do Papa Francisco às dubia dos cardeais publicada em outubro passado, que pedia um discernimento sobre a possibilidade de “formas de bênção, solicitadas por uma ou mais pessoas, que não transmitam uma concepção errônea do matrimônio” (26), o documento afirma que esse tipo de bênção “é oferecido a todos, sem pedir nada, fazendo com que as pessoas sintam que continuam abençoadas apesar de seus erros e que “o Pai celeste continua a querer o seu bem e a esperar que elas finalmente se abram ao bem” (27). Existem “várias ocasiões em que as pessoas vêm espontaneamente pedir uma bênção, seja em peregrinações, em santuários, ou mesmo na rua quando encontram um sacerdote”, e tais bênçãos “são dirigidas a todos, ninguém pode ser excluído” (28).
ATENÇÃO! Portanto,
permanecendo proibido de ativar “procedimentos ou ritos” para esses casos, o
ministro ordenado pode unir-se à oração daquelas pessoas que “embora em uma
união que de modo algum pode ser comparada ao matrimônio, desejam confiar-se ao
Senhor e à sua misericórdia, invocar a sua ajuda, ser guiados a uma maior
compreensão do seu plano de amor e de verdade” (30).
O terceiro capítulo da declaração (parágrafos 31-41), portanto, abre a possibilidade dessas bênçãos, que representam um gesto para aqueles que:
“reconhecendo-se
indigentes e necessitados de sua ajuda, não reivindicam a legitimidade de seu
próprio status, mas imploram que tudo o que é verdadeiro, bom e humanamente
válido em suas vidas e relacionamentos seja investido, curado e elevado pela
presença do Espírito Santo” (31).
Essas
bênçãos não devem ser normalizadas, mas
confiadas ao “discernimento prático em uma situação particular” (37). Embora o
casal seja abençoado, mas não a união, a declaração inclui entre o que é
abençoado o relacionamento legítimo entre as duas pessoas: na “breve oração que
pode preceder essa bênção espontânea, o ministro ordenado pode pedir paz,
saúde, espírito de paciência, diálogo e ajuda mútua, bem como a luz e a força
de Deus para poder cumprir plenamente a sua vontade” (38).
ATENÇÃO! Também é esclarecido que, para evitar “qualquer forma de confusão
e escândalo”, quando um casal irregular ou do mesmo sexo pede uma bênção, “ela
nunca será realizada ao mesmo tempo que os ritos civis de união ou mesmo em
conexão com eles. Nem mesmo com as roupas, os gestos ou as palavras próprias de
um casamento” (39).
Esse tipo de bênção “pode encontrar seu lugar em outros contextos, como uma visita a um santuário, um encontro com um sacerdote, uma oração recitada em um grupo ou durante uma peregrinação” (40). Por fim, o quarto capítulo (parágrafos 42-45) nos lembra que “mesmo quando o relacionamento com Deus está obscurecido pelo pecado, sempre é possível pedir uma bênção, estendendo a mão a Ele” e desejá-la “pode ser o melhor possível em algumas situações” (43).
Declaração “Fiducia supplicans” sobre o significado pastoral das
bênçãos do Dicastério para a Doutrina da Fé, 18.12.2023
Declaração "Suplicantes de confiança" sobre o significado pastoral das bênçãos
Apresentação
Esta Declaração leva em consideração diversas questões recebidas por este Dicastério tanto nos últimos anos como em tempos mais recentes. Para a sua redação, como é habitual, foram consultados especialistas, foi iniciado um processo de redação adequado e o projeto foi discutido no Congresso da Seção Doutrinária do Dicastério. Durante este período de elaboração do documento não faltaram discussões com o Santo Padre. A Declaração foi finalmente submetida ao exame do Santo Padre, que a aprovou com a sua assinatura. Durante o estudo do tema abordado neste documento, foi dada a conhecer a resposta do Santo Padre às Dubia de alguns Cardeais, que forneceu esclarecimentos importantes para a reflexão aqui oferecida e que representa um elemento decisivo para o trabalho do Dicastério. Dado que «a Cúria Romana é antes de tudo um instrumento de serviço ao sucessor de Pedro» (Constituição Apostólica Praedicate Evangelium, II, 1), o nosso trabalho deve favorecer, juntamente com a compreensão da doutrina perene da Igreja, o acolhimento do ensinamento do Santo Padre. Tal como na já mencionada resposta do Santo Padre às Dubia de dois Cardeais, esta Declaração permanece firme na doutrina tradicional da Igreja em relação ao casamento, não admitindo qualquer tipo de rito litúrgico ou bênçãos semelhantes a um rito litúrgico que possa criar confusão. O valor deste documento, porém, é oferecer uma contribuição específica e inovadora ao significado pastoral das bênçãos, que nos permite ampliar e enriquecer a compreensão clássica estritamente ligada a uma perspectiva litúrgica. Esta reflexão teológica, baseada na visão pastoral do Papa Francisco, implica um desenvolvimento real em relação ao que foi dito sobre as bênçãos no Magistério e nos textos oficiais da Igreja. Isto explica o fato de o texto ter assumido a tipologia de “Declaração”. E é precisamente neste contexto que podemos compreender a possibilidade de abençoar os casais em situação irregular e os casais do mesmo sexo, sem validar oficialmente o seu estatuto ou modificar de forma alguma o ensinamento perene da Igreja sobre o matrimónio. Esta Declaração pretende ser também uma homenagem ao Povo fiel de Deus, que adora o Senhor com muitos gestos de profunda confiança na sua misericórdia e que com esta atitude vem constantemente pedir uma bênção à Mãe Igreja.
Víctor
Manuel Card. FERNÁNDEZ
Prefeito
Introdução
1. A
confiança suplicante do Povo fiel de Deus recebe o dom da bênção que brota do
coração de Cristo através da sua Igreja. Como nos recorda prontamente o Papa
Francisco: «A grande bênção de Deus é Jesus Cristo, é o grande dom de Deus, seu
Filho. É uma bênção para toda a humanidade, é uma bênção que salvou a todos
nós. Ele é o Verbo eterno com o qual o Pai nos abençoou «quando éramos ainda
pecadores» (Rm 5, 8), diz São Paulo: Verbo feito carne e oferecido por nós na
cruz».[1]
2.
Apoiado por uma verdade tão grande e consoladora, este Dicastério levou em
consideração diversas questões, tanto formais como informais, sobre a
possibilidade de abençoar os casais do mesmo sexo e sobre a possibilidade de
oferecer novos esclarecimentos, à luz dos princípios paternos e pastorais do
Papa Francisco, sobre o Responsum ad dubium[2] formulado pela então Congregação
para a Doutrina da Fé e publicado em 22 de fevereiro de 2021.
3. O
referido Responsum suscitou reações muito diversas: alguns acolheram
favoravelmente a clareza deste documento e a sua coerência com o ensinamento
constante da Igreja; outros não concordaram com a resposta negativa à questão
ou não a consideraram suficientemente clara na sua formulação e na
fundamentação apresentada na Nota Explicativa anexa. Para responder a estes
últimos, com caridade fraterna, parece oportuno retomar o tema e oferecer uma
visão que reúna os aspectos doutrinários em coerência com os pastorais, porque
«todo ensino da doutrina deve situar-se na atitude evangelizadora que desperta
a adesão do coração à proximidade, ao amor e ao testemunho».[3]
I. A bênção no sacramento do matrimónio
4. A recente resposta do Santo Padre Francisco à segunda das cinco
questões colocadas por dois Cardeais[4] oferece a possibilidade de aprofundar a
questão, especialmente nas suas implicações pastorais. Trata-se de evitar “algo que possa está sendo reconhecido como
casamento”.[5] Portanto, são inadmissíveis ritos e orações que possam criar
confusão entre o que é constitutivo do matrimónio, como «união exclusiva,
estável e indissolúvel entre um homem e uma mulher, naturalmente aberta à
geração de filhos»,[6] e o que o contradiz. Esta crença baseia-se na perene
doutrina católica do casamento. Só
neste contexto as relações sexuais encontram o seu significado natural,
adequado e plenamente humano. A doutrina da Igreja neste ponto permanece imutável.
5. Esta é também a compreensão do matrimónio oferecida pelo
Evangelho. Por esta razão, no que diz
respeito às bênçãos, a Igreja tem o direito e o dever de evitar qualquer tipo
de rito que possa contradizer esta crença ou levar a qualquer confusão. Este é também o objetivo do Responsum da então Congregação
para a Doutrina da Fé, onde afirma que "a Igreja não tem o poder de
conceder bênçãos às uniões entre pessoas do mesmo sexo".
6.
Deve-se sublinhar que, precisamente no caso do rito do sacramento do
matrimónio, não se trata de uma bênção qualquer, mas do gesto reservado ao
ministro ordenado. Neste caso, a bênção do ministro ordenado está diretamente
ligada à união específica de um homem e uma mulher que com o seu consentimento
estabelecem uma aliança exclusiva e indissolúvel. Isto permite-nos evidenciar
melhor o risco de confundir uma bênção, dada a qualquer outra união, com o rito
do sacramento do matrimónio.
II. O
significado das diferentes bênçãos
7. A
resposta do Santo Padre acima mencionada, por outro lado, convida-nos a fazer "um esforço para ampliar e enriquecer o significado das bênçãos".
8. As
bênçãos podem ser consideradas entre os sacramentais mais difundidos e em
constante evolução. Com efeito, levam-nos a captar a presença de Deus em todos
os acontecimentos da vida e recordam-nos que, mesmo no uso das coisas criadas,
o ser humano é convidado a procurar Deus, a amá-lo e a servi-lo fielmente.[7]
Por esta razão, as bênçãos são dirigidas às pessoas, aos objetos de culto e
devoção, às imagens sagradas, aos locais de vida, de trabalho e de sofrimento,
aos frutos da terra e do trabalho humano, e a todas as realidades criadas que
se referem ao Criador, aquele que, com sua beleza, louvem-no e abençoem-no.
O significado litúrgico dos ritos de bênção
9. Do
ponto de vista estritamente litúrgico, a bênção
exige que o que é abençoado esteja em conformidade com a vontade de Deus expressa
nos ensinamentos da Igreja.
10. Com efeito, as bênçãos são celebradas em virtude da fé e visam
o louvor de Deus e o proveito espiritual do seu povo. Como explica o Ritual Romano, “para que este propósito seja mais
evidente, segundo a tradição antiga as fórmulas de bênção têm sobretudo o
objetivo de dar glória a Deus pelos seus dons, pedir os seus favores e derrotar
o poder do maligno no mundo".[8] Portanto, quem invoca a bênção de Deus
através da Igreja é convidado a intensificar «as suas disposições, deixando-se
guiar por aquela fé na qual tudo é possível» e a confiar «naquele amor que nos
impele a observar os mandamentos de Deus». [9] Por isso, se por um lado «é oferecida sempre e em todo o lado a
oportunidade de louvar, invocar e agradecer a Deus através de Cristo, no
Espírito Santo», por outro a preocupação é que «não se trate de coisas, de
lugares ou de contingências», que estão em conflito com a lei ou com o espírito
do Evangelho».[10] Esta é uma compreensão litúrgica das bênçãos, pois elas se
tornam ritos propostos oficialmente pela Igreja.
11. Com base
nestas considerações, a nota explicativa do referido
Responsum da então Congregação para a Doutrina da Fé recorda que quando, com um
rito litúrgico específico, se invoca uma bênção sobre algumas relações humanas,
é necessário que aquilo que é abençoado é capaz de corresponder aos planos de
Deus inscritos na Criação e plenamente revelados por Cristo Senhor. Por esta
razão, dado que a Igreja sempre considerou moralmente lícitas apenas as
relações sexuais vividas no âmbito do casamento, não tem o poder de conferir a
sua bênção litúrgica quando esta, de alguma forma, pode oferecer uma forma de
legitimidade moral a um união que presuma ser casamento ou a prática sexual
extraconjugal. A substância deste pronunciamento
foi reiterada pelo Santo Padre nas suas Respostas às Dubia de dois Cardeais.
12.
Devemos também evitar o risco de reduzir o significado das bênçãos apenas a
este ponto de vista, porque isso nos levaria a exigir, para uma simples bênção,
as mesmas condições morais que são solicitadas para a recepção dos sacramentos.
Este risco exige que esta perspectiva seja ainda mais alargada. De facto, existe
o perigo de que um gesto pastoral, tão amado e difundido, esteja sujeito a
demasiados pré-requisitos morais, que, com a pretensão de controle, poderiam
ofuscar a força incondicional do amor de Deus sobre a qual funda o gesto de
bênção.
13.
Precisamente a este respeito, o Papa Francisco exortou-nos a não «perder a
caridade pastoral, que deve permear todas as nossas decisões e atitudes» e a
evitar «ser juízes que apenas negam, rejeitam, excluem».[11] Vamos então
responder à sua proposta desenvolvendo uma compreensão mais ampla das bênçãos.
Bênçãos
nas Sagradas Escrituras
14.
Para refletir sobre as bênçãos, reunindo diferentes pontos de vista, precisamos
deixar-nos iluminar antes de tudo pela voz da Sagrada Escritura.
15.
«Que o Senhor te abençoe e te guarde. Que o Senhor faça resplandecer o seu
rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti. Que o Senhor volte sobre ti o seu
rosto e te conceda a paz” (Nm 6, 24-26). Esta “bênção sacerdotal” que
encontramos no Antigo Testamento, precisamente no livro dos Números, tem um
carácter “descendente”, pois representa a invocação da bênção que desce de Deus
sobre o homem: constitui um dos mais antigos textos da divina bênção. Depois há
um segundo tipo de bênção que encontramos nas páginas bíblicas, aquela que
"sobe" da terra ao céu, em direção a Deus. A bênção equivale,
portanto, a louvar, a celebrar, a agradecer a Deus pela sua misericórdia e
fidelidade, pelas maravilhas ele criou e por tudo o que aconteceu por sua
vontade: “Bendize ao Senhor, minha alma; que tudo o que há em mim bendiga o seu
santo nome” (Sl 103, 1).
16. A
Deus que abençoa, também respondemos com bênção. Melquisedeque, rei de Salém,
abençoa Abraão (ver Gn 14,19); Rebeca é abençoada por sua família, pouco antes
de se tornar noiva de Isaque (cf. Gn 24, 60), que, por sua vez, abençoa seu
filho Jacó (cf. Gn 27, 27). Jacó abençoa Faraó (ver Gn 47, 10), seus sobrinhos
Efraim e Manassés (ver Gn 48, 20) e todos os seus doze filhos (ver Gn 49, 28).
Moisés e Arão abençoam a comunidade (ver Êx 39, 43; Lv 9, 22). Os chefes de
família abençoam os filhos por ocasião dos casamentos, antes de embarcarem em
viagem, na iminência da morte. Estas bênçãos parecem, portanto, ser uma dádiva
superabundante e incondicional.
17. A
bênção presente no Novo Testamento mantém essencialmente o mesmo significado do
Antigo Testamento. Encontramos o dom divino que “desce”, o agradecimento do
homem que “sobe” e a bênção concedida pelo homem que “se estende” aos seus
semelhantes. Zacarias, depois de recuperar o uso da fala, abençoa o Senhor por suas
obras maravilhosas (ver Lucas 1:64). O idoso Simeão, enquanto segura nos braços
o recém-nascido Jesus, bendiz a Deus por lhe ter concedido a graça de
contemplar o Messias salvador e, portanto, abençoa os próprios pais Maria e
José (cf. Lc 2,34). Jesus abençoa o Pai, no famoso hino de louvor e de júbilo
que lhe é dirigido: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra” (Mt 11, 25).
18. Em
continuidade com o Antigo Testamento, também em Jesus a bênção não é apenas
ascendente, em referência ao Pai, mas também descendente, derramada sobre os
outros como gesto de graça, proteção e bondade. O próprio Jesus implementou e
promoveu esta prática. Por exemplo, ele abençoa as crianças: «E tomando-as nos
braços, abençoou-as, impondo-lhes as mãos» (Mc 10, 16). E a vida terrena de
Jesus terminará com uma bênção final reservada aos Onze, pouco antes de
ascender ao Pai: «E levantando as mãos, abençoou-os. Enquanto os abençoava,
separou-se deles e foi elevado ao céu” (Lc 24, 50-51). A última imagem de Jesus
na terra são as mãos levantadas, no ato de abençoar.
19. No
seu mistério de amor, através de Cristo, Deus comunica à sua Igreja o poder de
abençoar. Concedida por Deus aos seres humanos e por eles concedida aos outros,
a bênção se transforma em inclusão, solidariedade e pacificação. É uma mensagem
positiva de conforto, cuidado e encorajamento. A bênção expressa o abraço
misericordioso de Deus e a maternidade da Igreja que convida os fiéis a terem
os mesmos sentimentos de Deus para com os seus irmãos e irmãs.
Uma
compreensão teológico-pastoral das bênçãos
20.
Quem pede uma bênção mostra-se necessitado da presença salvífica de Deus na sua
história e quem pede uma bênção à Igreja reconhece esta como o sacramento da
salvação que Deus oferece. Buscar a bênção na Igreja é admitir que a vida
eclesial brota do ventre da misericórdia de Deus e nos ajuda a seguir em
frente, a viver melhor, a responder à vontade do Senhor.
21.
Para nos ajudar a compreender o valor de uma abordagem mais pastoral das
bênçãos, o Papa Francisco exortou-nos a contemplar, com uma atitude de fé e de
misericórdia paterna, o fato de que «quando você pede uma bênção, você está
expressando um pedido de ajuda a Deus, um apelo para podermos viver melhor, uma
confiança num Pai que nos pode ajudar a viver melhor».[12] Este pedido deve
ser, de qualquer forma, valorizado, acompanhado e recebido com gratidão. As
pessoas que vêm espontaneamente pedir uma bênção mostram com este pedido a sua
sincera abertura à transcendência, a confiança do seu coração que não depende
apenas das suas próprias forças, a sua necessidade de Deus e o desejo de
escapar às medidas estreitas deste fechado mundo dentro dos seus limites.
22.
Como nos ensina Santa Teresa do Menino Jesus, além desta confiança «não há
outro caminho a seguir para ser conduzido ao Amor que tudo dá. Com confiança, a
fonte da graça transborda em nossas vidas […]. A atitude mais adequada é
colocar a confiança do coração fora de nós mesmos: na misericórdia infinita de
um Deus que ama sem limites [...]. O pecado do mundo é imenso, mas não é
infinito. Pelo contrário, o amor misericordioso do Redentor, sim, é
infinito».[13]
23.
Quando estas expressões de fé são consideradas fora do quadro litúrgico,
encontramo-nos num espaço de maior espontaneidade e liberdade, mas «a
opcionalidade dos exercícios piedosos não deve, portanto, significar pouca
consideração ou desprezo por eles. O caminho a seguir é valorizar correta e
sabiamente as múltiplas riquezas da piedade popular, o potencial que ela
possui».[14] As bênçãos tornam-se assim um recurso pastoral a ser explorado e
não um risco ou um problema.
24.
Consideradas do ponto de vista da pastoral popular, as bênçãos devem ser
avaliadas como atos de devoção que «encontram o seu espaço fora da celebração
da Eucaristia e dos outros sacramentos […]. A linguagem, o ritmo, a progressão,
os acentos teológicos da piedade popular diferem dos correspondentes às ações
litúrgicas”. Pela mesma razão «devemos evitar introduzir métodos de “celebração
litúrgica” nos exercícios piedosos, que devem conservar o seu estilo, a sua
simplicidade, a sua linguagem própria».[15]
25.
Além disso, a Igreja deve evitar basear a sua prática pastoral na fixidez de
certos esquemas doutrinais ou disciplinares, especialmente quando eles «dão
origem a um elitismo narcisista e autoritário, onde em vez de evangelizar
outros, outros são analisados e classificados, e em vez de facilitando o acesso
à graça, desperdiça-se energia no controle».[16] Portanto, quando as pessoas
pedem uma bênção, uma análise moral exaustiva não deve ser uma condição prévia
para concedê-la. Não devemos exigir deles perfeição moral prévia.
26.
Nesta perspectiva, as Respostas do Santo Padre ajudam a explorar melhor, do
ponto de vista pastoral, o pronunciamento formulado pela então Congregação para
a Doutrina da Fé em 2021, pois efetivamente convidam ao discernimento em
relação à possibilidade de «formas de bênção, solicitadas por uma ou mais
pessoas, que não transmitam uma concepção errónea do matrimónio»[17] e que
tenham também em conta o facto de que, em situações moralmente inaceitáveis do
ponto de vista objectivo, «a pastoral da caridade exige que não tratemos
simplesmente como «pecadores» outras pessoas cuja culpa ou responsabilidade
pode ser atenuada por vários fatores que influenciam a imputabilidade
subjetiva».[18]
27. Na
catequese citada no início desta Declaração, o Papa Francisco propôs uma
descrição deste tipo de bênçãos que são oferecidas a todos, sem pedir nada.
Vale a pena ler estas palavras com o coração aberto, pois elas nos ajudam a
compreender o significado pastoral das bênçãos oferecidas sem condições: «É
Deus quem abençoa. Nas primeiras páginas da Bíblia há uma repetição contínua de
bênçãos. Deus abençoa, mas os homens também abençoam, e logo se descobre que a
bênção possui uma força especial, que acompanha quem a recebe ao longo da vida,
e dispõe o coração humano a deixar-se mudar por Deus [...]. Então somos mais
importantes para Deus do que todos os pecados que podemos cometer, porque Ele é
pai, é mãe, é puro amor, Ele nos abençoou para sempre. E ele nunca deixará de
nos abençoar. Uma experiência forte é a de ler estes textos bíblicos de bênção
numa prisão ou numa comunidade de recuperação. Fazei com que aquelas pessoas
que permanecem bem-aventuradas, apesar dos seus graves erros, sintam que o Pai
celeste continua a querer o seu bem e a esperar que finalmente se abram ao bem.
Se até os parentes mais próximos os abandonaram, porque agora os consideram
irrecuperáveis, para Deus ainda são crianças».[19]
28. São
diversas as ocasiões em que as pessoas se aproximam espontaneamente para pedir
uma bênção, tanto nas peregrinações, como nos santuários, e até na rua, quando
encontram um sacerdote. A título de exemplo, podemos referir o livro litúrgico
De Benedictionibus que oferece uma série de ritos de bênção para as pessoas: os
idosos, os doentes, os participantes na catequese ou num encontro de oração, os
peregrinos, os que empreendem uma viagem, os grupos e associações de
voluntários, etc Estas bênçãos são dirigidas a todos, ninguém pode ser excluído
delas. Nas premissas do Rito de Bênção dos Idosos, por exemplo, afirma-se que o
objetivo da bênção «é expressar aos idosos um testemunho fraterno de respeito e
gratidão, e agradecer ao Senhor junto com eles pelos benefícios dele e pelas
boas obras que realizaram com a sua ajuda».[20] Neste caso o objeto da bênção é
a pessoa do idoso, por quem e com quem se dão graças a Deus pelo bem que fez e
pelos benefícios recebidos. Ninguém pode ser impedido de dar graças e todos,
mesmo que vivam em situações não ordenadas pelo desígnio do Criador, têm
elementos positivos pelos quais louvar o Senhor.
29. Do
ponto de vista da dimensão ascendente, quando se toma consciência dos dons do
Senhor e do seu amor incondicional, mesmo em situações de pecado, particularmente
quando uma oração é ouvida, o coração do crente eleva o seu louvor a Deus e o
abençoa. Esta forma de bênção não é vedada a ninguém. Todos – individualmente
ou em união com outros – podem elevar o seu louvor e gratidão a Deus.
30. Mas o sentido popular de bênção também inclui o valor da
bênção descendente. «não convém a uma Diocese, a uma Conferência Episcopal
ou a qualquer outra estrutura eclesial ativar constante e oficialmente
procedimentos ou ritos para todo o tipo de questões»,[21] a prudência e a
sabedoria pastoral podem sugerir que, evitando formas graves de escândalo ou
confusão entre os fiéis, o ministro ordenado une-se à oração daquelas pessoas
que, mesmo numa união que em nada se compara ao casamento, desejam confiar-se
ao Senhor e à sua misericórdia, invocar a sua ajuda, ser guiados para maiores
compreensão do seu plano de amor e de verdade.
III. As bênçãos dos casais em situação irregular e dos casais do
mesmo sexo
31. No
horizonte aqui traçado reside a possibilidade de bênçãos de casais em situação
irregular e de casais do mesmo sexo, cuja forma não deve encontrar qualquer
fixação ritual por parte das autoridades eclesiais, para não produzir confusão
com a bênção própria de o sacramento do casamento. Nestes casos, concede-se uma
bênção que não só tem um valor ascendente, mas que é também a invocação de uma
bênção descendente do próprio Deus sobre aqueles que, reconhecendo-se
desamparados e necessitados da sua ajuda, não reivindicam a legitimação do próprio status, mas imploram que tudo o que é verdadeiramente bom e
humanamente válido, que está presente em suas vidas e relacionamentos, seja
investido, curado e elevado pela presença do Espírito Santo. Estas formas de
bênção exprimem uma súplica a Deus para que conceda aquelas ajudas que provêm
dos impulsos do seu Espírito - que a teologia clássica chama de "graças
reais" - para que as relações humanas possam amadurecer e crescer na
fidelidade à mensagem do Evangelho, libertando-se das suas imperfeições e fragilidades
e exprimem-se na dimensão cada vez maior do amor divino.
32. A
graça de Deus, de facto, actua na vida daqueles que não se dizem justos, mas se
reconhecem humildemente como pecadores como todos os outros. Ela é capaz de
orientar tudo segundo os planos misteriosos e imprevisíveis de Deus. Por isso,
com sabedoria e maternidade incansáveis, a Igreja acolhe todos aqueles que se
aproximam de Deus com um coração humilde, acompanhando-os com aquelas ajudas
espirituais que permitem a todos compreender, e compreender plenamente. realizar
a vontade de Deus em sua existência.[22]
33.
Trata-se de uma bênção que, embora não incluída num rito litúrgico,[23] une a
oração de intercessão à invocação da ajuda de Deus por parte daqueles que
humildemente se dirigem a Ele. Deus nunca rejeita ninguém que se aproxima dele!
Em última análise, a bênção oferece às pessoas um meio para aumentar a sua
confiança em Deus. O pedido de bênção expressa e alimenta a abertura à
transcendência, a piedade, a proximidade de Deus em mil circunstâncias
concretas da vida, e isso não é pouca coisa no mundo. É uma semente
do Espírito Santo que deve ser cuidada e não impedida.
34. A
própria liturgia da Igreja convida-nos a esta atitude confiante, mesmo no meio
dos nossos pecados, falta de mérito, fraquezas e confusões, como evidencia esta
bela oração recolhida extraída do Missal Romano: «Deus todo-poderoso e eterno,
que concedes as orações do teu povo além de todo desejo e de todo mérito,
derrama sobre nós a tua misericórdia: perdoa o que a consciência teme e
acrescenta o que a oração não ousa esperar” (XXVII Domingo do Tempo Comum).
Quantas vezes, de facto, através de uma simples bênção do pastor, que neste
gesto não pretende sancionar nem legitimar nada, as pessoas podem experimentar
a proximidade do Pai “tudo além do desejo e de todo mérito”.
35.
Portanto, a sensibilidade pastoral dos ministros ordenados também deve ser
educada para não realizar espontaneamente bênçãos que não se encontram na Benção.
36.
Neste sentido, é essencial compreender a preocupação do Papa, para que estas
bênçãos não ritualizadas não deixem de ser um simples gesto que constitui um
meio eficaz para aumentar a confiança em Deus por parte das pessoas que as
pedem, impedindo que se tornem um ato litúrgico ou semilitúrgico, semelhante
a um sacramento. Isto constituiria um grave empobrecimento, porque submeteria
um gesto de grande valor na piedade popular a um controlo excessivo, que
privaria os ministros da liberdade e da espontaneidade no acompanhamento
pastoral da vida das pessoas.
37. A
este respeito, vêm à mente as seguintes palavras do Santo Padre, já
parcialmente citadas: «As decisões que, em certas circunstâncias, podem fazer
parte da prudência pastoral não devem necessariamente tornar-se uma norma. Ou
seja, não convém que uma Diocese, uma Conferência Episcopal ou qualquer outra
estrutura eclesial ative constante e oficialmente procedimentos ou ritos para todo
tipo de questões [...]. O Direito Canónico não deve e não pode abranger tudo,
nem as Conferências Episcopais devem pretender fazê-lo com os seus diversos
documentos e protocolos, porque a vida da Igreja passa por muitos canais, além
dos normativos».[24] Assim, o Papa Francisco recordou que: "tudo que faz parte
de um discernimento prático numa situação particular, não pode ser elevado à
categoria de norma, porque isso daria origem a uma casuística
insuportável".[25]
38. Por esta razão, não deve ser promovido nem previsto um ritual de bênção de casais em situação irregular, mas também não deve ser evitada ou proibida a proximidade da Igreja a qualquer situação em que se procure a ajuda de Deus através de uma situação irregular. Na breve oração que pode preceder esta bênção espontânea, o ministro ordenado poderá pedir-lhes paz, saúde, espírito de paciência, diálogo e ajuda mútua, mas também a luz e a força de Deus para poder cumprir plenamente a sua vontade.
39. Em todo o caso, precisamente para evitar qualquer forma de
confusão ou escândalo, quando a "oração de
bênção", embora expressa fora dos ritos previstos nos livros litúrgicos, for
solicitada por um casal em situação irregular, esta bênção nunca será realizada
ao mesmo tempo que os ritos de união civil e nem mesmo em relação a eles. Nem com roupas, gestos ou palavras típicas de um casamento.
O mesmo se aplica quando a bênção é solicitada por um casal do mesmo sexo.
40.
Esta bênção pode, pelo contrário, encontrar o seu lugar noutros contextos, como
uma visita a um santuário, um encontro com um sacerdote, uma oração recitada em
grupo ou durante uma peregrinação. De facto, através destas bênçãos que são
concedidas não através das formas rituais da liturgia, mas antes como expressão
do coração materno da Igreja, semelhantes àquelas que em última análise emanam
das entranhas da piedade popular, a intenção não é legitimar tudo, mas abrir a
vida a Deus, pedir a sua ajuda para viver melhor, e também invocar o Espírito
Santo para que os valores do Evangelho possam ser vividos com maior fidelidade.
41. O que foi dito nesta Declaração sobre as bênçãos dos casais do
mesmo sexo é suficiente para orientar o discernimento prudente e paternal dos
ministros ordenados a este respeito. Além das indicações anteriores, não devemos, portanto, esperar por
outras respostas sobre possíveis formas de regular detalhes ou aspectos
práticos relativos a bênçãos deste tipo.[26]
4. A Igreja é o "sacramento do amor infinito" de Deus
42. A
Igreja continua a elevar aquelas orações e súplicas que o próprio Cristo, com
grandes gritos e lágrimas, ofereceu nos dias da sua vida terrena (cf. Hb 5, 7)
e que por isso mesmo gozam de particular eficácia. Desta forma, «não só com a
caridade, com o exemplo e com as obras de penitência, mas também com a oração,
a comunidade eclesial exerce a sua função materna de levar as almas a
Cristo».[27]
43. A
Igreja é, portanto, sacramento do amor infinito de Deus: por isso, mesmo quando
a relação com Deus está obscurecida pelo pecado, pode-se sempre pedir uma
bênção, estendendo-lhe a mão, como fez Pedro na tempestade, quando chorou a
Jesus: «Senhor, salva-me!» (Mt 14, 30). Desejar e receber uma bênção pode ser a
melhor coisa possível em algumas situações. O Papa Francisco recorda-nos que
«um pequeno passo, no meio de grandes limitações humanas, pode agradar mais a
Deus do que a vida exteriormente correta de quem passa os seus dias sem
enfrentar grandes dificuldades».[28] Desta forma, «o que brilha é a beleza do
amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo, morto e ressuscitado».[29]
44.
Qualquer bênção será uma oportunidade para um renovado anúncio do querigma, um
convite a aproximar-nos cada vez mais do amor de Cristo. O Papa Bento XVI
ensinou: «Como Maria, a Igreja é mediadora da bênção de Deus para o mundo:
recebe-a acolhendo Jesus e transmite-a trazendo Jesus. Ele é a misericórdia e a
paz que o mundo não pode dar a si mesmo e da qual não pode dar-se, e sempre
precisou dele, como e mais do que pão".[30]
45.
Tendo em conta o que foi dito acima, seguindo o ensinamento autorizado do Santo
Padre Francisco, este Dicastério pretende finalmente recordar que «esta é a
raiz da mansidão cristã, a capacidade de se sentir bem-aventurado e a
capacidade de abençoar [...]. Este mundo precisa de bênçãos e podemos dar e receber
bênçãos. O Pai ama-nos e só nos resta a alegria de o abençoar e a alegria de
lhe agradecer e de aprender dele a abençoar».[31] Assim, cada irmão e irmã
poderá sempre sentir-se peregrino na Igreja, sempre mendigo, sempre amado e,
apesar de tudo, sempre abençoado.
Víctor
Manuel Card. FERNÁNDEZ
Prefeito
Monsenhor
Armando MATTEO
Secretário
da Seção Doutrinária
Ex
Audientia morre em 18 de dezembro de 2023
Francisco
REFERÊNCIAS:
[1]
Francisco, Catequese sobre a oração: a bênção (2 de dezembro de 2020),
L'Osservatore Romano, 2 de dezembro de 2020, p. 8.
[2] Ver
Congregatio pro Doctrina Fidei, «Responsum» ad «dubium» de benedictione
Unioneem Personarum eiusdem sexus et Nota Explicativa, AAS 113 (2021), 431-434.
[3]
Francisco, Exortação. Ap. Evangelii gaudium (24 de novembro de 2013), n. 42,
AAS 105 (2013), 1037-1038.
[4] Ver
Francisco, Respostas a los Dubia propuestos por dos Cardenales (11 de julho de
2023).
[5]
Ibidem, ad dubium 2, c.
[6]
Ibidem, ad dubium 2, a.
[7] Ver
Rituale Romanum ex decreto Sacrosancti Oecumenici Concilii Vaticano II
instauratum auctoritate Ioannis Pauli PP. II promulgatum, De Benedictionibus,
Editio typica, Praenotanda, Typis Polyglottis Vaticanis, Civitate Vaticana
1985, n. 12.
[8]
Ibid., n. 11: «Quo autem clarius hoc pateat, antiqua extraditione, formulas
benedictionum eo spectant ut imprimis Deum pro eius donis glorificent eiusque
impetrent beneficia atque maligni potestatem in mundo compescant».
[9]
Ibid., n. 15: «Quare illi qui benedictionem Dei per Ecclesiam expostulant,
dispositiones suas ea fide confirment, cui omnia sunt possibilia; spe
innitantur, quae não confundit; caritate praesertim vivificentur, quae mandata
Dei servinda urget».
[11]
Francisco, Respostas às Dubia propostas pelos Cardenales, ad dubium 2, d.
[12]Ibidem,
ad dubium 2, e.
[13]
Francisco, Exortação. Ap. C'est la confiance (15 de outubro de 2023), nos. 2,
20, 29.
[14]
Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Diretório sobre
piedade popular e liturgia. Princípios e diretrizes, Libreria Editrice
Vaticana, Cidade do Vaticano 2002, n. 12.
[15]Ibidem,
n. 13.
[16]
Francisco, Exortação. Ap. Evangelii gaudium (24 de novembro de 2013), n. 94,
AAS 105 (2013), 1060.
[17]
Francisco, Respostas às Dubia propostas pelos Cardenales, ad dubium 2, e.
[18]
Ibidem, ad dubium 2, f.
[19]
Francisco, Catequese sobre a oração: a bênção (2 de dezembro de 2020),
L'Osservatore Romano, 2 de dezembro de 2020, p. 8.
[20] De
Benedictionibus, n. 258: «Haec benedictio ad hoc tendit ut ipsi senes a
fratribus testimonium accipiant reverentiae grataeque mentis, dum simul cum
ipsis Domino gratias reddimus pro beneficiis ab eo acceptis et pro bonis
operibus e o adjuvant peractis».
[21]
Francisco, Respostas às Dubia propostas pelos Cardenales, ad dubium 2, g.
[22]
Ver Francisco, Exortação. Ap. Amoris laetitia pós-sinodal (19 de março de
2016), n. 250, AAS 108 (2016), 412-413.
[23]
Cf. Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Diretório
sobre piedade popular e liturgia, n. 13: «A diferença objetiva entre os
exercícios piedosos e as práticas de devoção no que diz respeito à Liturgia
deve encontrar visibilidade na expressão cúltica […] os atos de piedade e de
devoção encontram o seu espaço fora da celebração da Eucaristia e de outros
sacramentos».
[24]
Francisco, Respostas às Dubia propostas pelos Cardenales, ad dubium 2, g.
[25]
Francisco, Exortação. Ap. Amoris laetitia pós-sinodal (19 de março de 2016), n.
304, AAS 108 (2016), 436.
[26]
Ver ibid.
[27] Officium
Divinum ex decreto Sacrosancti Oecumenici Concilii Vaticano II instauratum
auctoritate Pauli PP. VI promulgatum, Liturgia Horarum iuxta Ritum Romanum,
Institutio Generalis de Liturgia Horarum, Editio typica alte, Libreria Editrice
Vaticana, Cidade do Vaticano 1985, n. 17: «Itaque non-off caritate, exemplo et
paenitentiae operibus, sed etiam oratione ecclesialis communitas verum erga
animas ad Christum aducendas maternum munus exercet».
[28]
Francisco, Exortação. Ap. Evangelii Gaudium (24 de novembro de 2013), n. 44,
AAS 105 (2013), 1038-1039.
[29]
Ibidem, n. 36, AAS 105 (2013), 1035.
[30]
Bento XVI, Homilia da Santa Missa na Solenidade de Maria Santíssima Mãe de
Deus, XLV Dia Mundial da Paz, Basílica Vaticana (1 de janeiro de 2012),
Ensinanças VIII, 1 (2012), 3.
[31]
Francisco, Catequese sobre a oração: a bênção (2 de dezembro de 2020),
L'Osservatore Romano, 2 de dezembro de 2020, p. 8.
Texto traduzido direto do original em italiano do Vatican.va
Reações a Fiducia supplicans e comunicado
do Dicastério para a Doutrina da Fé
"Nota de imprensa assinada pelo cardeal
prefeito Fernández e pelo secretário monsenhor Matteo: a doutrina sobre o
matrimônio não muda, os bispos podem discernir sua aplicação de acordo com o
contexto, as bênçãos pastorais não são comparáveis às bênçãos litúrgicas e
ritualizadas" (nota do Vatican News).
Escrevemos este
Comunicado à imprensa para ajudar a esclarecer a recepção de Fiducia
supplicans, recomendando ao mesmo tempo uma leitura completa e atenta da citada
Declaração para compreender melhor o significado de sua proposta.
1. Doutrina
Os compreensíveis
pronunciamentos de algumas Conferências Episcopais sobre o documento Fiducia
supplicans têm o valor de evidenciar a necessidade de um período mais longo de
reflexão pastoral. Quanto foi expresso por essas Conferências Episcopais não
pode ser intrepretado como uma oposição doutrinal, porque o documento é claro e
clássico a respeito do matrimônio e da sexualidade. Existem diversas frases
fortes na Declaração que não deixam dúvidas:
«A presente Declaração permanece firme quanto à doutrina
tradicional da Igreja sobre o matrimônio, não admitindo nenhum tipo de rito
litúrgico ou de bênçãos semelhantes a um rito litúrgico que possam criar confusão».
Age-se diante de casais em situação irregular «sem convalidar oficialmente o
seu status ou modificar de algum modo o ensinamento perene da Igreja sobre o
matrimônio» (Apresentação).
«São inadmissíveis ritos e orações que possam criar
confusão entre aquilo que é constitutivo do matrimônio, como “união exclusiva,
estável e indissolúvel entre um homem e uma mulher, naturalmente aberta à
geração de filhos” e aquilo que o contradiz. Esta convicção é fundada sobre a
perene doutrina católica do matrimônio. Somente neste contexto as relações
sexuais encontram o seu sentido natural, adequado e plenamente humano. A
doutrina da Igreja sobre este ponto permanece firme» (4).
«Tal é também o sentido do Responsum da então
Congregação para a Doutrina da Fé, onde se afirma que a Igreja não tem o poder
de conceder a bênção a uniões entre pessoas do mesmo sexo» (5).
«Dado que a Igreja desde sempre considerou moralmente
lícitas somente aquelas relações sexuais que são vividas ao interno
do matrimônio, ela não tem o poder de conferir a sua bênção litúrgica quando
esta, de qualquer modo, possa oferecer uma forma de legitimação moral a uma
união que presuma ser um matrimônio ou a uma prática sexual extra-matrimonial»
(11).
Evidentemente, não há espaço para se tomar distância doutrinal desta Declaração
ou para considerá-la herética, contrária à Tradição da Igreja ou blasfema.
2. Recepção prática
Alguns Bispos, todavia, exprimem-se em modo particular a respeito de um aspecto prático: as possíveis bênçãos de casais em situação irregular. A Declaração contém a proposta de breves e simples bênçãos pastorais (não litúrgicas, nem ritualizadas) de casais irregulares (não das uniões), sublinhando que se trata de bênçãos sem forma litúrgica, que não aprovam nem justificam a situação em que se encontram essas pessoas. Os documentos do Dicastério para a Dourina da Fé, como Fiducia supplicans, podem requerer, nos seus aspectos práticos, mais ou menos tempo para a sua aplicação, segundo os contextos locais e o discernimento de cada Bispo diocesano com a sua Diocese. Em alguns lugares não existem dificuldades para uma aplicação imediata, em outros há a necessidade de não inovar nada enquanto se toma todo o tempo necessário para a leitura e a interpretação. Alguns Bispos, por exemplo, estabeleceram que cada sacerdote deve realizar o discernimento, mas poderá dar essas bênçãos apenas de modo privado. Nada disso é problemático, se é expresso com o devido respeito por um texto assinado e aprovado pelo próprio Sumo Pontífice, buscando de algum modo acolher a reflexão nele contida. Cada Bispo local, em virtude do próprio ministério, tem sempre o poder do discernimento in loco, isto é, naquele lugar concreto que ele melhor que outros conhece, porque é o seu rebanho. A prudência e a atenção ao contexto eclesial e à cultura local poderiam admitir diversas modalidades de aplicação, mas não uma negação total ou definitiva deste caminho que é proposto aos sacerdotes.
3. A situação delicada de alguns países
O caso de algumas Conferências Episcopais deve ser compreendido no próprio contexto. Em diversos países existem fortes questões culturais e até mesmo legais que requerem tempo e estratégias pastorais a longo prazo. Se existem legislações que condenam à prisão e, em alguns lugares, à tortura e até à morte o simples fato de declarar-se homossexual, entende-se que seria imprudente uma bênção. É evidente que os Bispos não queiram expor as pessoas homossexuais à violência. Permanece importante, porém, que estas Conferências Episcopais não sustentem uma doutrina diferente daquela da Declaração aprovada pelo Papa, enquanto é a doutrina de sempre, mas sobretudo que proponham a necessidade do estudo e do discernimento para agir com prudência pastoral em um tal contexto. Na verdade, não são poucos os países que em diversa medida condenam, proíbem e criminalizam a homossexualidade. Nestes casos, além da questão das bênçãos, existe uma tarefa pastoral de grande amplitude, que inclui formação, defesa da dignidade humana, ensinamento da Doutrina Social da Igreja e diversas estratégias que não admitem pressa.
4. A verdadeira novidade do documento
A verdadeira novidade desta Declaração, que requer um generoso esforço de recepção, do qual ninguém deveria declarar-se excluído, não é a possibilidade de abençoar casais irregulares. É o convite a distinguir duas formas diferentes de bênção: “litúrgicas ou ritualizadas” e “espontâneas ou pastorais”. Na Apresentação é explicado claramente que «o valor deste documento é […] aquele de oferecer uma contribuição específica e inovativa ao significado pastoral das bênçãos, que permite ampliar e enriquecer sua compreensão clássica, estreitamente ligada a uma perspectiva litúrgica». Esta «reflexão teológica, baseada sobre a visão pastoral de Papa Francisco, implica um verdadeiro desenvolvimento a respeito de quanto foi dito sobre as bênçãos no Magistério e nos textos oficiais da Igreja». Como pano de fundo, encontra-se a avaliação positiva da “pastoral popular” que aparece em muitos textos do Santo Padre. Neste contexto, o Santo Padre nos convida a valorizar a fé do Povo de Deus, que mesmo em meio aos seus pecados sai da imanência e abre o seu coração para pedir a ajuda de Deus. Por esta razão, mais que pela bênção a casais irregulares, o texto do Dicastério adotou a elevada forma de uma “Declaração”, que representa muito mais que um responsum ou que uma carta. O tema central, que convida particularmente a um aprofundamento que enriqueça a prática pastoral, é a compreensão mais ampla das bênçãos e a proposta de aumentar as bênçãos pastorais, que não exigem as mesmas condições daquelas realizadas num contexto litúrgico ou ritual. Em consequência, para além da polêmica, o texto requer um esforço de reflexão serena, feita com coração de pastor, livre de toda ideologia. Mesmo que algum Bispo considere prudente para o momento não dar estas bênçãos, permanece verdadeiro que todos necessitamos crescer na convicção de que as bênçãos não ritualizadas não são uma consagração da pessoa ou do casal que as recebe, não justificam todas as suas ações, não ratificam a vida que leva. Quando o Papa nos pediu para crescer na compreensão mais ampla das bênçãos pastorais, ele nos propôs pensar um modo de abençoar que não implique tantas condições para realizar este gesto simples de proximidade pastoral, que é um meio para promover a abertura a Deus em meio às mais diversas circunstâncias.
5. Como se apresentam
concretamente estas “bênçãos pastorais”?
Para distinguir-se claramente das bênçãos litúrgicas ou ritualizadas, as “bênçãos pastorais” devem ser sobretudo muito breves (cfr. n. 28). Trata-se de bênçãos de poucos segundos, sem uso do Ritual de Bênçãos. Se se aproximam juntas duas pessoas para pedi-la, simplesmente implora-se ao Senhor paz, saúde e outros bens para estas duas pessoas que as pedem. Ao mesmo tempo, implora-se que possam viver o Evangelho de Cristo em plena fidelidade e que o Espírito Santo as livre de tudo que não corresponde à vontade divina e de tudo que requer purificação. Esta forma de bênção não ritualizada, com a simplicidade e a brevidade de sua forma, não pretende justificar algo que não seja moralmente aceitável. Obviamente, não é um matrimônio, nem mesmo uma “aprovação”, nem a ratificação de coisa alguma. É unicamente a resposta de um pastor a duas pessoas que pedem a ajuda de Deus. Por isso, neste caso, o pastor não põe condições e não quer conhecer a vida íntima dessas pessoas.
Dado que alguns manifestaram dúvidas sobre como poderiam ser estas bênçãos, vejamos um exemplo concreto: imaginemos que em meio a uma grande peregrinação um casal de divorciados em nova união diga ao sacerdote: “Por favor, nos dê uma bênção, não conseguimos encontrar trabalho, ele está muito doente, não temos uma casa, a vida está se tornando muito pesada: que Deus nos ajude!”. Neste caso, o sacerdote pode recitar uma simples oração como esta: «Senhor, olha estes teus filhos, concede-lhes saúde, trabalho, paz e ajuda recíproca. Livra-os de tudo aquilo que contradiz o teu Evangelho e concede-lhes viver segundo a tua vontade. Amém». E conclui com o sinal da cruz sobre cada um deles. Trata-se de 10 ou 15 segundos. Faz sentido negar este tipo de bênção a essas duas pessoas que a imploram?
Não é o caso de sustentar a sua fé, pouca ou muita que seja; de ajudar a sua fraqueza com a bênção divina e de dar um canal a esta abertura à transcendência, que poderia conduzi-las a ser mais fiéis ao Evangelho?
Para afastar equívocos, a Declaração acrescenta que,
quando a bênção é pedida por um casal em situação irregular, «ainda que
expressa fora dos ritos previstos pelos livros litúrgicos […] esta bênção
jamais será realizada conjuntamente a ritos civis de união e nem mesmo em
relação a estes. Nem sequer com as roupas, gestos ou palavras próprios de um
matrimônio. O mesmo vale quando a bênção é pedida por um casal do mesmo sexo»
(39).
É claro, portanto, que ela não deve acontecer num lugar importante do edifício sacro ou diante do altar, porque isto causaria confusão. Por esta razão, cada Bispo na sua Diocese é autorizado pela Declaração Fiducia supplicans a ativar este tipo de bênçãos simples, com todas as recomendações de prudência e de atenção, mas em nenhum modo é autorizado a propor ou a ativar bênçãos que possam assemelhar-se a um rito litúrgico.
6. Catequese
Em alguns lugares, talvez será necessária uma catequese
que ajude a todos a entender que este tipo de bênção não é uma ratificação da
vida que levam aqueles que a imploram. Menos ainda é uma absolvição, enquanto
estes gestos estão longe de ser um sacramento ou um rito.
São simples expressão de proximidade pastoral que não propõem as mesmas exigências de um sacramento nem de um rito formal. Deveremos habituar-nos todos a aceitar o fato que, se um sacerdote dá este tipo de bênçãos simples, não é um herético, não ratifica nada, não está negando a doutrina católica.
Podemos ajudar o Povo de Deus a descobrir que este tipo de bênção é um simples canal pastoral que ajuda as pessoas a manifestar a própria fé, ainda que sejam grandes pecadores. Por isso, ao dar esta bênção a duas pessoas que juntas se aproximam para implorá-la espontaneamente, não as estamos consagrando, nem nos estamos congratulando com elas, nem estamos aprovando o seu modo de união. Na verdade, o mesmo acontece quando abençoamos as pessoas individualmente, no sentido de que o indivíduo que pede uma bênção – não a absolvição – poderia ser um grande pecador, mas não por isso negamos este gesto paterno em meio à sua luta para sobreviver. Se isto é esclarecido graças a uma boa catequese, podemos livrar-nos do medo de que nossas bênçãos exprimam algo de inadequado.
Podemos ser ministros mais livres e talvez mais próximos e fecundos, com um ministério pleno de gestos de paternidade e de proximidade, sem medo de ser mal-interpretados. Peçamos ao Senhor recém-nascido que derrame sobre todos uma generosa e graciosa bênção, para podermos viver um santo e feliz 2024.
Víctor Manuel
Card. FERNÁNDEZ
Prefeito
Mons. Armando
MATTEO
Secretário para a
Seção Doutrinal
Fonte:https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_ddf_doc_20240104_comunicato-fiducia-supplicans_po.html
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Realmente, Jean Willys leu todo o documento e entendeu muito melhor que muitas pessoas da igreja, que só sabem criticar o papa e não se permite fazer uma análise racional do documento como fez o Jean Willys, e percebeu as reais intenções que muito o desagradou, apesar de também, eu ter minhas ressalvas ao Jean. Parabéns ao blog por esse árduo, duro e solitário trabalho. Contem com minhas orações!
Eduardo Teixeira - MG
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