Como
Nossos Pais
(Elis Regina)
“Não quero lhe falar, meu
grande amor
De coisas que aprendi nos
discos
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa
boa
Mas também sei que
qualquer canto
É menor do que a vida
de qualquer pessoa
Por isso cuidado, meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram, e o sinal está
fechado pra nós
Que somos jovens
Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço
O seu lábio e a sua voz
Você me pergunta pela minha
paixão
Digo que estou encantada como
uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade, não
vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
cheiro de nova estação
Eu sinto tudo na ferida viva do
meu coração
Já faz tempo, eu vi você na rua
Cabelo ao vento, gente jovem
reunida
Na parede da memória
Essa lembrança é o quadro que
dói mais
Minha dor é perceber
Que apesar de termos
feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais
Nossos ídolos ainda são os
mesmos
E as aparências não enganam,
não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer que eu tô
por fora
Ou então que eu tô inventando
Mas é você que ama o passado e
que não vê
É você que ama o passado e que
não vê
Que o novo sempre vem
Hoje eu sei que quem me deu a
ideia
De uma nova consciência e
juventude
Está em casa guardado por Deus
Contando o vil metal...”
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Alguém já disse: “Quem dera
vivêssemos como os nossos pais! Essa é só mais uma poesia enganosa, um veneno
encoberto por uma linda melodia! A verdade é que o
mundo está cada vez mais desgraçado porque não vivemos como os nossos pais! Que
também, não viveram como nossos avós! O objetivo de algumas canções foi sempre incutir
na nossa cabeça de forma sutil a destruição da família.Qual a dor que poderia
causar viver como os nossos pais? Em suas tradições? Em seus ensinamentos?
É só olhar a letra toda!”
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Infelizmente (ou felizmente?), poesias não vem com notas de rodapé para explicar sua real intenção. O único poema no mundo que teve nota explicativa (aliás, um livro), foi o poema “A noite escura da alma” é um poema do frade carmelita João da Cruz, um dos maiores poetas quinhentistas espanhois.
Depois, para explicar o poema, de apenas oito estrofes, o autor escreveu todo um livro, que na verdade, só vai até a segunda estrofe, pois foi deixado inconcluso. De acordo com o autor, o poema é narrado pela alma, que, em plena noite escura, sai de casa (desapega de seus valores mundanos?) e vai ao encontro de seu amado (Deus).Apesar de ostensivamente sobre uma jornada cristã, o poema pode se aplicar a todo e qualquer caminho espiritual. Então, as demais estrofes deste poema de São João da Cruz fica exposto a interpretação ampla e aberta ao ponto de vista pessoal de cada um que o lê. Muitos também, veem este trecho desta poesia "Como Nossos Pais" de formas bastante variadas. Alguns a vem pelas questões dos valores, e então já disparam com todas suas razões, discordando, pois os valores mudaram e já não vivemos como nossos pais, o que em parte é verdade. Bom, eu particularmente, me dou ao direito de pensar e interpretar diferente, isto não quer dizer que seja o único e o verdadeiro, mas é apenas meu ponto de vista. Eu entendo e interpreto a partir de minha experiência pessoal como pai: Hoje olhando pra este trecho vejo o quanto fui injusto com minhas críticas aos meus pais, “pois APESAR de ter tido melhores condições que eles, me vejo como uma cópia muito mal feita dos mesmos”, e cometendo os mesmos erros, e ainda mais, acrescentando outros piores...por isso, de certa forma, o autor tem realmente razão ao afirmar que “ainda somos os mesmos, pois continuamos cometendo ainda os mesmos erros de nossos pais...”
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