Por: Raimundo Antonio de
Souza Lopes (Jornal De Fato-Mossoró-RN)
Assistindo,
recentemente, a uma palestra no Centro de Evangelização do Shalom, cujo tema
era “O Senhorio do Senhor”, eu ouvi do missionário a frase colocada aí no
título desta crônica.
Inicialmente, eu fiquei
um pouco sem querer entender o real significado ou a profunda reflexão que o
palestrante nos convidou a fazer, pois sofrer, no sentido literal da palavra
não é, e nunca será, algo que possamos compreender como sendo bom para a nossa
vida. Basta apreendermos que “sofrer” em sua etimologia deriva do latim, sufferre, termo pelo qual os velhos
romanos designavam quem estava "sob ferros", acorrentado, submetido à
força (fosse escravo ou prisioneiro). Ou seja, a origem do nosso popular
"sofrimento": palavra que melhor traduz, em português, a infelicidade
contínua e intensa e, no momento em que ocorre, irremediável, é justamente o
vocábulo que designava a opressão, a submissão, a situação da criatura
submetida ao poder de outrem que, como coisa, ou "ferramenta", padece
de todos os infortúnios capazes de lhe "ferir" (machucar) corpo e
alma (Conf. dicionarioetimologico.com.br/sofrer).
Com a continuidade de
sua fala, passei a compreender a lógica para o sentido da palavra sofrimento,
quando esta é aplicada ao nosso cotidiano, seja material ou espiritual. E, de
cara, veio-me a frase de Santa Teresa D’Ávila, que disse: “O mérito consiste em sofrer e
amar”.
Embora vivamos em um
mundo em que se busca, a todo custo, o ter, o poder e o prazer como fontes de
felicidade, admitir que o sofrimento faz parte do nosso cotidiano,
independentemente de cor, fé ou status social, é a mesma coisa de dizer que é
infeliz permanentemente. Não é verdade. O segredo, de fato, é dar sentido ao
seu sofrimento, fazer dele um aliado. É compreender que o seu
sofrimento não é diferente do sofrimento de quem está do seu lado. Se eu ajudar
ao meu irmão a suportar o seu sofrimento, eu estou dando sentido ao meu
sofrimento também, com isso estou minimizando minhas dores e, consequentemente,
estou extraindo prazer, e felicidade, de algo negativo em minha vida.
É primordial que
aprendamos a sofrer. É fundamental que possamos dar sentido aos nossos
sofrimentos. Por exemplo: uma mulher que vai dar à luz uma criança sofre, mas
ela não pensa nas suas dores, ela só pensa no filho que carregará nos braços e
verá crescer. Ou seja, ela está dando sentido ao seu sofrimento ao entender que
a alegria que virá depois será muito maior que o sofrimento pelo qual está
passando naquele momento. São Francisco de Assis já dizia: “É tão grande o bem que
espero, que todo o sofrimento me é um grande prazer”.
Trazendo para um exemplo
bem comum entre os humanos: o amor. Tem coisa mais pura, linda e melhor que o
amor? Todos nós vivemos para encontrar o amor de nossa vida e dar sentido ao
ser coletivo que somos. Mas, o amor que é sublime é, também, o que mais nos faz
sofrer. Por que, então, esse paradoxo tão sem sentido? Será que o fato de
estarmos amando nos faz pressupor que esse amor pode acabar e, com isso,
passamos a querer, a todo custo, eternizá-lo, atrelando, portanto, tudo o que
nos faz sofrer?
Outro dia eu ouvi, com
relação a isso, algo que me chamou a atenção. Alguém perguntou ao poeta por que
o amor nos faz sofrer tanto. E ele, na sua simplicidade encantadora, disse: não
é o amor que nos faz sofrer, mas a pessoa que estamos amando. Faz sentido.
E, puxando um pouco para
o pessoal, eu lembrei uma passagem de minha juventude, quando servia ao glorioso
Exército Brasileiro – 17º Grupo de Artilharia –, numa prova noturna de
resistência extrema, porém chamada de “maneabilidade” (possível de ser feita),
quando fomos colocados num terreno onde cresciam muitos pés de urtiga. No
escuro, rastejando, para não ser visto pelo “inimigo”, íamos – eu e os meus
colegas do curso de Cabo – passando por cima das urtigas, e elas iam nos
atacando, queimando a nossa pele, ao ponto de provocar uma coceira e uma dor
quase insuportável. Pois bem, em determinado momento, eu com o corpo todo coçando e ferido,
sem querer, passei a mão pelo rosto e, imediatamente, meus olhos, boca, nariz e
orelhas passaram, também, a coçar. Num ato de desespero, comecei a chorar
baixinho, e pensei em desistir da prova, o que me eliminaria do curso; mas,
olhando para os lados, vi que os outros estavam na mesma situação.
Então, engoli o choro, respirei fundo e continuei a prova, sempre com o
pensamento voltado para o sofrimento do outro, não para o meu. Ou
seja, sem querer eu dei sentido ao meu sofrimento – embora naquele caso
específico “o dar sentido ao meu sofrimento” tenha sido mensurar o que estava
sentindo e transferi-lo para o meu próximo, pois se ele estava suportando as
mesmas privações que eu, com certeza eu tinha a capacidade de suportar também –
e vi que não há máscara possível de encobrir a dor que causa o sofrimento: o
nosso e o alheio. É nele
que encontramos a nós mesmos e encontramos os outros, sem enfeites e sem
enganos.
Publicação concedida
pelo autor ao Apostolado Berakash
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