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#Schopenhauer - um filósofo pessimista ou realista ?

Written By Beraká - o blog da família on sábado, 29 de janeiro de 2011 | 18:20








A vida é bela em Schopenhauer!





A filosofia pessimista, atribuída ao filósofo alemão, talvez não passe de um preconceito ou de um mal-entendido, quando analisada com outros olhos e comparada à vida e à mensagem de outros homens excelsos da humanidade, como Platão, Epicuro, Nietzsche, Buda e até a Jesus.






Por *Jaya Hari Das 





O pessimismo pressupõe uma "desesperança no futuro, uma previsão ruim daquilo que sobrevirá, ou, como encontrado nos melhores dicionários de nossa língua, uma tendência para encarar as coisas pelo lado negativo". Mas o que dizer destas palavras: 





"A história nos mostra a vida dos povos, e nada encontra a não ser guerras e rebeliões para nos relatar; os anos de paz nos parecem apenas curtas pausas, entreatos, uma vez aqui e ali, e de igual maneira a vida do indivíduo é uma luta contínua, porém não somente metafórica, com a necessidade ou o tédio, mas também realmente com outros. Por toda parte ele encontra opositor, vive em constante luta e morre de armas em punho"? 








O que temos aí: extremo pessimismo ou puro realismo? 







Quem dentre nós poderá ser tão otimista ao ponto de negar a realidade que perpassa a história da humanidade e que pode ser encontrada, sem grandes dificuldades, em qualquer cena urbana ou privada, veiculada pelos meios da comunicação ou testemunhada na porta de nossas casas? O nome Schopenhauer tornou-se quase sinônimo de "pessimismo" ao longo da história da filosofia. A tendência didática de rotular ou categorizar pensadores e correntes de pensamento estigmatizou um filósofo que teve como único e máximo pecado ser honesto para com sua filosofia, que concebe a vida, assim com todos os eventos da existência, como expressões diferentes da Vontade - uma força que apenas quer existir, se evidenciar num mundo que não passa de sua representação. Os quase dois séculos que nos separam de Arthur Schopenhauer, entretanto, talvez ainda não se constituam um obstáculo para uma defesa justa de suas ideias e para o vislumbramento de aspectos extremamente positivos de sua filosofia.
A época em que Schopenhauer viveu, na Europa do final do século 18 e início do século 19, tem algumas características peculiares, que podem muito bem dizer do Zeitgeist de então.Will Durant, em seu A história da filosofia, tenta encontrar razões para uma espécie de pessimismo comum àquele período. Diz ele:  "Por que será que a primeira metade do século 19 levantou, como vozes da época, um grupo de poetas pessimistas - Byron na Inglaterra, De Musset na França, Heine na Alemanha, Leopardi na Itália [...] e, acima de tudo, um filósofo profundamente pessimista, Arthur Schopenhauer?", e acrescenta como resposta: "[...] Era bem difícil acreditar que um planeta tão lamentável quanto aquele que os homens viam em 1818 estivesse seguro nas mãos de um Deus inteligente e benevolente. Mefistófeles havia triunfado e todos os Faustos estavam desesperados". Durant também é loquaz ao dizer que "o pessimismo é o dia seguinte do otimismo". Todo homem, ilustre ou não, é fruto de seu tempo, e também vê o mundo à sua volta como a representação de si mesmo, assim como sentenciado por um antigo filósofo grego: 






"O homem é a medida de todas as coisas"?





Schopenhauer vê as coisas do seu tempo, mas, acima de tudo, abrange com seu olhar filosófico, quiçá com sua intuição (como talvez ele próprio preferisse dizer), o passado (constituído de suas incursões pelas escrituras hindus e budistas), o presente (imposto a ele frente a frente) e o futuro (projetado por sua invejável capacidade intelectual). Assim, sua filosofia traz, evidentemente, a sabedoria oriental, que inspira aqueles que buscam respostas para seu sofrimento nos ensinamentos religiosos; a compreensão do aqui-agora existencial, que une todos os povos e todos os indivíduos como uma única nação de aflitos; e a visão profética, que, relendo os eventos da vida, vaticina para todos, sem exceção, uma espécie de eterno retorno - um retorno ao nada existencial, como último consolo à existência sofrida.

















Arthur Schopenhauer teve como pai, Heinrich Schopenhauer, um rico comerciante que, além de ser um homem rígido, era um marido rude, e que tem ainda contra si a forte suspeita de ter cometido suicídio atirando-se no canal de Hamburgo. A mãe, Johanna Troisener, era uma romântica, oprimida pelo marido, que só conheceu o bom da vida após a morte dele. Apesar do pai ter feito tudo para que o jovem Arthur se interessasse pelos negócios da família, não viveu o suficiente para decepcionar-se com o filho filósofo, enquanto a relação deste com a mãe foi uma das piores. Schopenhauer viveu grande parte de sua vida viajando pela Europa à custa do dinheiro herdado do pai. Foi um solitário, tinha um cachorro, ao qual deu o nome de Atman (termo hindu para alma), e pouquíssimos amigos. Para si mesmo, considerava sua vida como a ideal - a relação com os humanos não era nada fácil, portanto, preferia a solidão. No entanto, essa vida reclusa é rotulada por alguns autores como "uma vida infeliz", o que fornece um ótimo ingrediente para fomentar a denominação que darão a ele de "filósofo do pessimismo".
Sua obra prima, "O mundo como vontade e representação" (1819), só conquistou leitores após sua morte, e Parerga e Paralipomena (1851) trouxe- lhe o tão desejado reconhecimento, mas ele não viveu o suficiente para usufruir dele, pois morreu nove anos depois, no dia 21 de setembro de 1860, solitário como viveu.






A Vida como ela é !





Enxergar as coisas tais como elas são pode ser uma tarefa amarga, mas também pode trazer recompensas surpreendentes para aqueles que antes suspeitam de tudo que é doce demais. É, provavelmente, por essa razão que o filósofo de Danzig impôs a si uma vida de retiro e solidão, tentando ao máximo evitar dissabores provenientes das frágeis e vulneráveis relações humanas, percebendo que esses bípedes (como ele chamava os humanos) ainda não estão preparados para amor e amizade verdadeiros. Pensemos:Quantas pessoas mundo afora já não se desiludiram no amor e na amizade, e como gostariam de jamais terem se apaixonado ou se dedicado fervorosamente a alguém?  O pensamento schopenhaueriano é, sem dúvida, um antídoto para péssimos exemplos de relacionamento humano, ou até mesmo uma espécie de cura para males intrínsecos à própria condição humana.A frase "Nenhuma relação é perfeita porque as pessoas são imperfeitas", que abre o sétimo capítulo de Mais Platão, Menos Prozac (atualmente, uma espécie de manual do chamado aconselhamento filosófico), de Lou Marinoff, tem tudo a ver com o pensamento de Schopenhauer, colocando-o no páreo com os pensadores utilizados nos consultórios dessa prática filosófica e outras abordagens terapêuticas que exploram as mais inovadoras técnicas psicofilosóficas. Devido à sua extraordinária filosofia, a essência do pensamento desse filósofo orbita tranquilamente entre as máximas de Platão e Epicuro, de Buda e Kant, de Jesus e Nietzsche, sem comprometer o teor e a substância delas, nem o valor e a autenticidade de seus autores. Se o tédio, a angústia, a depressão e a tristeza podem ser vencidas com máximas filosóficas, aliadas a uma abordagem mais ampla e mais fidedigna (nem tanto racional) do mundo, o pensamento de Schopenhauer certamente pode desencadear a desilusão positiva, a desconstrução daquela ilusão criada pelo próprio indivíduo, em face de um mundo caótico, de uma vida infeliz e de uma realidade estressante.



 

A filosofia de Schopenhauer explica que "a natureza interessa-se menos pelo indivíduo e mais pela sua espécie"







Portanto, tenta preservar essa personalidade que chamamos de "eu" será sempre perda de tempo e acréscimo de sofrimento, pois esse "eu" não pertence a si mesmo, mas é parte de algo bem maior, um "nós", que é sua espécie. Se não há consolo em saber que essa personalidade desaparece no oceano existencial - para só então retornar infinitas vezes, como milhões de outras personalidades inconscientes de quantas pessoas já foram, quantas vidas viveram, o quanto amaram, foram amadas ou sofreram - não é culpa do filósofo que assim seja, ele é apenas o decifrador de um código da natureza, que a despeito de nosso apego e romantismo pela vida, do alto de sua sabedoria não racional, não enxerga aqui na Terra homens, mulheres, crianças, pais, filhos, amantes ou rivais, como fomos condicionados a ver aqui embaixo. Ele enxerga apenas a família, a espécie humana, que, num ato de pura vontade e necessidade, mantém a roda existencial girando indefinidamente. 
É Will Durant que nos vai lembrar que a filosofia de Schopenhauer semelha muito os ensinamentos do Cristo (e, é claro, os de Buda). Diz o historiador: 



"O cristianismo é uma profunda filosofia do pessimismo. O poder através do qual o cristianismo conseguiu vencer primeiro o judaísmo e depois o paganismo da Grécia e de Roma está unicamente no seu pessimismo, na confissão de que nosso estado é excessivamente deplorável e pecaminoso, enquanto o judaísmo e o paganismo eram otimistas". 






Nós, com facilidade, podemos encontrar passagens bíblicas que levam a considerações desse tipo, mas que, vistas por um outro prisma, apresentam a morte como uma valorização da vida. Vale lembrar que, proferidas por Jesus, essas considerações em favor da morte tomam ares de inspiradora fé no verdadeiro significado da própria vida: 






"Aquele que tentar salvar sua vida, perdê-la-á. Aquele que a perder, por minha causa, reencontrála- á", disse o Nazareno.





Schopenhauer, ao tratar da renúncia das riquezas, cita Siddhartha Gautama e São Francisco de Assis. Sobre este último, ele relata um evento em que, estando o nobre e jovem Francisco num baile em que se apresentavam as belas filhas dos notáveis da época, foi perguntado: "Então, senhor Francisco, não ireis brevemente eleger uma entre estas belas?", ao que teria respondido: "Elegi para mim uma muito mais bela! La povertá". O filósofo vê o apego à individualidade como "egoísmo", uma insensatez para com a qual a natureza não se permite compactuar.  Ser um e, ao mesmo tempo, ser todos, ou pelo menos muitas possibilidades de ser muitos outros, é mais próprio e adequado ao fluir existencial, à vontade da Natureza, ou, se preferirmos, à vontade de Deus. Alguns podem até achar falta de modéstia em Schopenhauer, mas, observando criteriosamente seus escritos, pode-se encontrar os créditos que ele declara a seus colaboradores, como quando diz:  "Reconheço que o melhor de meu desenvolvimento próprio deve-se, ao lado da impressão do mundo intuitivo, tanto à da obra de Kant, como à dos sagrados hindus e à de Platão".  Como homem culto que foi, fez um estudo aprofundado das religiões orientais, assim como do cristianismo e do judaísmo, e sua ética pode ser comparada tanto com a budista quanto com a cristã, conforme ele mesmo declara: "A todas as éticas da filosofia europeia, a minha se dispõe na relação do Novo Testamento ao Antigo, conforme o conceito bíblico desta relação. [...] Minha ética [...] possui fundamento metafísico, utilidade e objetivo: em primeiro lugar mostra teoricamente o fundamento metafísico da justiça e do amor humanos, e em seguida também aponta o objetivo a que estes, quando realizados com perfeição, devem conduzir. [...] Poder-se-ia denominar minha doutrina a filosofia propriamente cristã; por mais paradoxal que possa parecer àqueles que não atingem o cerne das coisas, mas permanecem em sua superfície".Revoltado com a insistente perseguição a sua filosofia, Arthur Schopenhauer lança seu grande desabafo contra as forças dominantes do pensamento filosófico de então, para colocar cada um em seu lugar:






"Agora terei de ouvir novamente que minha filosofia é desesperada somente porque me expresso conforme a verdade, mas as pessoas querem que se lhes diga que o Senhor Deus tenha feito tudo do melhor modo. Dirijam-se à igreja, e deixem em paz os filósofos. Ao menos não exijam que estes exponham suas doutrinas conforme seus ensinamentos: isto, fazem-no os trapaceiros; os filosofastros: a estes, podem encomendar doutrinas à vontade".






Durant tece seus elogios ao filósofo de Danzig da seguinte forma: 




"Devemos a Schopenhauer o fato de nos ter revelado nossos corações secretos, de nos ter mostrado que nossos desejos são os axiomas de nossas filosofias e de ter aberto caminho para uma compreensão do pensamento não como um simples cálculo abstrato de eventos impessoais, mas como um inflexível instrumento de ação e de desejo".





A função da filosofia é, sem dúvida, promover o melhoramento da qualidade cultural e intelectual do ser humano, para que a humanidade, como um todo, seja favorecida e possa caminhar a passos largos para melhores dias, deixando escrito nas páginas invisíveis da história os relatos de lutas e glórias que perfazem a existência da espécie humana, mas não cabe a ela, de modo nenhum, instrumentar-se de mentiras doces e de vãs lucubrações somente para, sentada no trono de "mãe das ciências", governar o "Reino de Utopia", de tal forma a envergonhar até mesmo o grande Thomas Morus, que provavelmente se contorceria em seu túmulo de tanto asco e revolta.






CONCLUSÃO













O filósofo do pessimismo, como ficou conhecido Arthur Schopenhauer, tem muitas coisas positivas a ensinar tanto aos miseráveis quanto aos prósperos, tanto aos bípedes sem instrução quanto aos bípedes bem-instruídos, tanto aos pessimistas quanto aos otimistas. 
A beleza de sua filosofia não é óbvia e vulgar como alguns gostariam que fosse, ela é como o véu de Maya dos hindus, que impõe ao comum dos homens uma ilusão multicolorida, enquanto esconde por trás de si o esplendor da eternidade. O próprio filósofo pode nos dizer algo sobre isso, para que tudo o que aqui foi dito não fique como não dito: 




"Mas certamente a verdade será sempre "paucorum hominum" ("algumas pessoas") -  e portanto deve esperar, tranquila e comodamente, pelos poucos que, por terem um modo de pensar fora do comum, possam achá-la. A vida é curta, mas a verdade vai longe e tem vida longa; falemos a verdade".

 

 
















*Jaya Hari Das  - Revista Filosofia – Conhecimento Prático  - Graduado em filosofia pela Universidade Federal do Maranhão - UFMA, professor da rede estadual de ensino do Maranhão e colaborador da revista Conhecimento Prático Filosofia.








FONTE:http://conhecimentopratico.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/27/artigo191876-4.asp






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5 de outubro de 2016 às 21:31

Lido. E talvez eu seja um dos dois ou três que vai concordar com esse texto. Ok

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