A
palavra carisma tem origem no grego (“charis”) e significa graça, dom gratuito.
No Novo Testamento esta palavra pode designar todos os
dons de Deus que são irrevogáveis (Rm 11,29). O dom principal é o próprio
Cristo (Rm 5,15; 6,26). Deus nos cumulou de graça em Cristo Jesus (Ef
1,6) e nos concederá toda espécie de dom (Rm
8,32).Mas o primeiro dos dons que Jesus nos
concede, o principal de todos, é o próprio Espírito Santo, que foi infundido em
nossos corações e põe neles a caridade (Rm 5,5; 8,15). A palavra carisma
se entende a partir desta presença do Espírito Santo que se manifesta por toda
sorte de dons gratuitos (1Cor 12,1-4). Nas primeiras comunidades cristãs o uso
destes dons suscita problemas que serão examinados sobretudo pelas cartas de
Paulo. Desde o Antigo Testamento a presença do Espírito
de Deus se manifestava, nos homens que Ele inspirava, por dons extraordinários
que iam da clarividência profética (1Rs 22, 28) ao êxtase (Ez.3,12) e aos
arrebatamentos misteriosos (1Rs 18,12). Numa ordem mais geral, Isaías
relacionava também ao Espírito os dons prometidos ao Messias (Is 11,2), e
Ezequiel, a transformação dos corações humanos (Ez 36,26s), enquanto Joel
anunciava a universalidade de sua efusão sobre os homens (Jl 3,1s). É preciso
ter em mente essas promessas escatológicas para compreender a experiência dos
dons do Espírito na Igreja primitiva: ela é a realização dessas promessas.O problema se coloca na comunidade de Corinto pela importância
excessiva atribuída ao “falar em línguas” (1Cor 12-14). Esse entusiasmo
religioso, que se traduz por falar “em diversas línguas” (At 2,4), não está
isento de ambigüidades. A embriaguez causada pelo Espírito corre o risco
de ser confundida pelos espectadores com a embriaguez do vinho (At 2,13), ou
mesmo com a extravagância da loucura (1Cor 14,23). De aparência semelhante aos
arroubos entusiásticos das práticas dos pagãos em certos cultos orgíacos, ela
corre até o risco de levar a inconseqüências os fiéis que não distinguissem a
ação do Espírito divino das suas contrafacções e que os exaltassem a ponto de
favorecer o cisma (1Cor 12). Mas ao regular esta questão prática, Paulo eleva o
debate e propõe uma doutrina bem geral.Os dons do
Espírito Santo são dos mais diversos, como são diversos os ministérios na
Igreja e as operações dos homens. Sua unidade profunda consiste em virem eles
do único Espírito, como os ministérios vem do mesmo Senhor, e as operações vem
do único Deus (1Cor 12,4ss). Os homens são, cada um conforme o seu carisma,
administradores duma graça divina única e multiforme (1Pd 4, 10). A
comparação do corpo humano permite entender mais facilmente a referência de
todos os dons divinos ao mesmo fim: são dados em vista do bem comum (1Cor
12,7); eles concorrem juntos para a utilidade da Igreja, Corpo de Cristo, assim
como todos os membros concorrem para o bem do corpo humano, cada um conforme
sua função (1Cor 12,12-27). A distribuição dos dons é
ao mesmo tempo obra do Espírito (1Cor 12,11) e de Cristo que dá como bem
entende a graça divina (Ef.4,7-10). Mas no uso destes dons deve cada um
pensar antes de tudo no bem comum! Paulo não se preocupou em dar-nos uma
classificação racional dos carismas, embora os enumere diversas vezes (1Cor
12,8ss.28ss; Rm 12,6ss; Ef 4,11; 1Pd 4,11). É, contudo, possível reconhecer os
diversos domínios de aplicação em que os dons do Espírito tem lugar. Em
primeiro lugar, certos carismas são relativos às funções do ministério (Ef
4,12); os dos apóstolos, evangelistas, profetas, doutores, pastores (1Cor
12,28; Ef4,11). Outros concernem às diversas atividades úteis à comunidade:
serviço, ensinamento, exortação, sabedoria ou de ciência, fé eminente, dom de
línguas, discernimento dos espíritos (1Cor 12,8ss), obras de misericórdia (Rm
12,7).Essas operações carismáticas, que manifestam a presença atuante do
Espírito, não constituem evidentemente funções eclesiásticas particulares e
podem encontrar-se nos titulares de outras funções: assim Paulo, o apóstolo,
fala em línguas e opera milagres. A profecia ora é mencionada como atividade
aberta a todos (1Cor 14,29ss.39), ora apresentada como função (1Cor 12,28; Ef
4,11). As vocações particulares dos cristãos são
igualmente fundadas sobre carismas: um é chamado ao celibato, outro recebe
outro dom (1Cor 7,7). Enfim, a prática da caridade, essa primeira virtude
cristã, é também ela um dom do Espírito Santo (1Cor 12,31-14,1). Vê-se que os
carismas não são coisa coisa excepcional, mesmo se alguns dentre eles são fora
do comum, como o poder de fazer milagres. Toda a vida dos cristãos e todo o
funcionamento das instituições da Igreja dependem inteiramente deles. É por
eles que o Espírito de Deus governa o novo povo sobre o qual ele foi efundido
em abundância, dando a uns poder e graça para levar a cabo suas funções, a
outros poder e graça para responder à sua vocação própria e para ser úteis à
comunidade, a fim de que se edifique o Corpo de Cristo (Ef 4,12). Se é necessário “não apagar o Espírito”, é
preciso contudo verificar a autenticidade dos carismas (1Ts 5,19s) e “provar os
espíritos” (1Jo 4,1). Esse discernimento, que é ele próprio um fruto da graça (1Cor 12,10), é essencial. Paulo e João estabelecem neste ponto uma primeira regra que
dá um critério absoluto: os verdadeiros dons do Espírito se reconhecem pelo
fato de se confessar que Jesus é o Senhor (1Cor 12,3), que Jesus Cristo, vindo
na carne, é de Deus (1Jo 4,1ss). Essa regra permite eliminar todo o falso
profeta, ao qual estaria animando o espírito do anticristo (1Jo 4,3; 1Cor
12,3). Além disso o uso dos carismas deve subordinar-se ao bem comum;
deve por isso respeitar a hierarquia. As funções eclesiásticas se classificam segundo uma
ordem de importância, na cabeça da qual vêm os apóstolos (1Cor 12,28; Ef 4,11).
Mesmo as atividades às quais podem aspirar todos os
fiéis devem ser apreciadas não de acordo com o seu caráter espetacular, mas de
acordo com a sua utilidade efetiva. Todos devem em primeiro lugar buscar a
caridade, depois os demais dons espirituais. Entre esses a profecia vem
em primeiro lugar (1Cor 14,1).Paulo se demora longamente em mostrar sua
superioridade sobre o falar em línguas; pois de maneira ininteligível a
comunidade com isso não é edificada, e esta edificação de todos continua sendo
o essencial (1Cor 14,2-25; 1Pd 4,10ss). Mesmo os carismas autênticos devem
ficar sujeitos a regras práticas para que reine a boa ordem nas assembléias
religiosas (1Cor 14,33). Pelo que, Paulo dá à comunidade de Corinto ordens a
observar estritamente (1Cor 14,26-38). Essa intervenção do Apóstolo num terreno
em que se manifesta a atividade do Espírito mostra que em qualquer
circunstância os carismas estão sujeitos à autoridade eclesiástica (1Jo 4,6). Enquanto os apóstolos estão vivos, o seu poder nesta matéria
provém do fato de ser o apostolado o primeiro dos carismas. Mas depois deles, seus delegados participam também da mesma
autoridade, como o mostram as ordens recolhidas nas epístolas pastorais (1Tm
1,18-4,16). É que esses delegados receberam também eles um dom
particular do Espírito pela imposição das mãos (1Tm 4,14; 2Tm 1,6).Se não podem possuir o carisma dos Apóstolos, nem por isso
deixam de ter um carisma de governo, que lhes dá o direito de pregar e ensinar
(1Tm 4,11) e que ninguém tem o direito de desprezar (1Tm 4,12). Assim,
na Igreja tudo está sujeito a uma hierarquia de governo que é, ela própria, de
ordem carismático. (esta reflexão está tirada do livro: “Vocabulário de
Teologia Bíblica” de Léon-Dufour)
Iuvenescit Ecclesia (a igreja
rejuvenesce)
Congregação para a doutrina da fé - Carta Iuvenescit Ecclesia aos
Bispos da Igreja católica-(SOBRE A RELAÇÃO ENTRE DONS HIERÁRQUICOS E
CARISMÁTICOS PARA A VIDA E MISSÃO DA IGREJA)
INTRODUÇÃO: Os dons do Espírito Santo na Igreja em missão
1. A Igreja rejuvenesce com a força do
Evangelho e o Espírito Santo renova-a continuamente, edificando-a e guiando-a
“com diversos dons hierárquicos e carismáticos”[1]. O
Concílio Vaticano II pôs repetidamente em relevo a obra maravilhosa do Espírito
Santo que santifica o Povo de Deus, guia-o, adorna-o de virtudes e enriquece-o
de graças especiais em vista da sua edificação. A ação do divino Paráclito na
Igreja é multiforme, como amam evidenciar os Padres. Escreve João Crisóstomo:
«Quais são as graças que operam a nossa salvação que não nos são concedidas
pelo Espírito Santo? Por seu intermédio, somos libertos da escravidão e
chamados à liberdade, somos conduzidos à adoção filial e, por assim dizer,
formados de novo, após ter deposto o pesado e odioso fardo dos nossos pecados. Pelo Espírito Santo, vemos assembleias de sacerdotes e
possuímos multidões de doutores; desta nascente brotam dons de revelação,
graças de cura e todos os outros carismas que adornam a Igreja de Deus»[2]. Graças
à mesma vida da Igreja, às numerosas intervenções do Magistério e à
investigação teológica, felizmente cresceu a consciência da multiforme ação do
Espírito Santo na Igreja, despertando assim uma atenção particular aos dons carismáticos,
dos quais, em todo o tempo, o povo de Deus se enriqueceu para o desenvolvimento
da sua missão.A tarefa de comunicar eficazmente o
Evangelho torna-se particularmente urgente no nosso tempo. O Papa Francisco, na
Exortação Apostólica Evangelii gaudium, recorda que «se alguma coisa nos deve
santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos
nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo,
sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de
vida»[3]. O convite a ser Igreja «em saída» leva a reler de toda a vida
cristã em chave missionária[4]. A tarefa de evangelizar
diz respeito a todos os âmbitos da Igreja: a pastoral ordinária, o anúncio
àqueles que abandonaram a fé cristã e particularmente àqueles que ainda não
foram alcançados pelo Evangelho de Jesus ou que sempre o recusaram[5]. Neste
trabalho imprescindível de nova evangelização é mais do que necessário
reconhecer e valorizar os numerosos carismas capazes de despertar e alimentar a
vida de fé do povo de Deus.
As multiformes agregações
eclesiais
2. Tanto antes como depois do Concílio
Vaticano II, surgiram numerosas agregações eclesiais que constituem uma grande
fonte de renovação para a Igreja e para a urgente «conversão pastoral e
missionária»[6] de toda a vida eclesial. Ao valor e à riqueza de todas as
realidades associativas tradicionais, caraterizadas por propósitos
particulares, bem como dos Institutos de vida consagrada e Sociedades de vida
apostólica, juntam-se aquelas realidades mais recentes que podem ser descritas
como agregações de fiéis, movimentos eclesiais e novas comunidades, sobre as
quais se detém o presente documento. Estas não podem ser entendidas
simplesmente como um associar-se voluntário de pessoas que desejam alcançar um
objetivo particular de caráter religioso ou social. O
caráter de «movimento» distingue-os dentro do panorama eclesial enquanto
realidades fortemente dinâmicas, capazes de suscitar particular atração pelo
Evangelho e de sugerir uma proposta de vida cristã tendencialmente global que
abarca todos os aspetos da existência humana. O agregar-se dos fiéis com uma
forte partilha de vida, com a intenção de incrementar a vida de fé, esperança e
caridade, exprime bem a dinâmica eclesial como mistério de comunhão para a
missão e manifesta-se como um sinal de unidade da Igreja em Cristo. Neste
sentido, estas agregações eclesiais, com origem num carisma partilhado, tendem
a ter como propósito «o fim apostólico geral da Igreja»[7]. Nesta perspetiva,
agregações de fiéis, movimentos eclesiais e novas comunidades propõem formas
renovadas de seguimento de Cristo, de modo a aprofundar a communio cum Deo e a
communio fidelium, levando a novos contextos sociais o fascínio do encontro com
o Senhor Jesus e a beleza da existência cristã vivida na sua integralidade. Nestas realidades, exprime-se também uma peculiar forma de
missão e de testemunho, com o objetivo de favorecer e desenvolver, quer uma
consciência viva da própria vocação cristã, quer itinerários estáveis de
formação cristã, quer ainda percursos de perfeição evangélica. Podem participar
nestas realidades agregativas, de acordo com os diversos carismas, fiéis de
estados de vida distintos (leigos, ministros ordenados e pessoas consagradas),
manifestando desta forma a pluriforme riqueza da comunhão eclesial. A
forte capacidade agregativa destas realidades representa um testemunho
significativo de como a Igreja não cresce «por proselitismo mas por
“atração”»[8]. João Paulo II, dirigindo-se aos representantes
dos movimentos e das novas comunidades fez questão de reconhecer neles uma
«resposta providencial»[9] suscitada pelo Espírito Santo perante a necessidade
de comunicar de modo persuasivo o Evangelho por todo o mundo, tendo em
consideração os grandes processos de transformação existentes a nível
planetário, marcados frequentemente por uma cultura fortemente secularizada. Tal
fermento do Espírito «trouxe à vida da Igreja uma novidade inesperada, e por
vezes até explosiva»[10]. O mesmo Pontífice recordou que se abre a todas estas
agregações eclesiais o tempo da «maturidade eclesial», o qual implica a sua
plena valorização e inserção «nas Igrejas locais e nas paróquias, sempre
permanecendo em comunhão com os Pastores e atentos às suas indicações»[11]. Estas
novas realidades, por cuja existência o coração da Igreja se enche de alegria e
gratidão, são chamadas a relacionar-se de forma positiva com todos os outros
dons presentes na vida eclesial.
Objetivo do presente documento
3. A Congregação para a Doutrina da Fé,
com o presente documento, deseja referir-se, à luz da relação entre dons
hierárquicos e carismáticos, aos elementos teológicos e eclesiológicos cuja
compreensão possa favorecer uma fecunda e ordenada participação das novas
agregações na comunhão e missão da Igreja. Com este objetivo, serão
primeiramente apresentados alguns elementos chave, quer da doutrina sobre os
carismas presente no Novo Testamento quer da reflexão do Magistério sobre estas
novas realidades. De seguida, partindo de alguns princípios de ordem
teológico-sistemática, serão oferecidos elementos identitários dos dons
hierárquicos e carismáticos juntamente com alguns critérios para o
discernimento das novas agregações eclesiais.
I. OS CARISMAS SEGUNDO O NOVO
TESTEMENTO
Graça e carisma
4. «Carisma» é a transcrição da palavra
grega chárisma, cujo uso é frequente nas cartas paulinas e aparece também na
Primeira Carta de Pedro. Tem o sentido genérico de «dom generoso» e no Novo
testamento é usado somente em relação a dons divinos. Em algumas passagens, o
contexto confere-lhe um sentido mais específico (cf. Rm 12, 6; 1 Cor 12, 4. 31;
1 Pe 4, 10), cujo traço fundamental é a distribuição diferenciada de dons[12].
Esse é também o significado preponderante nas línguas modernas da palavra
derivada deste vocábulo grego. Um carisma não é um dom distribuído por todos
(cf. 1 Cor 12, 30), diferentemente das graças fundamentais, como seja a graça
santificante ou os dons da fé, da esperança e da caridade, que são
indispensáveis a todo o cristão. Os carismas são dons
particulares que o Espírito Santo distribui «como lhe apraz» (1 Cor 12, 11).
Para explicitar a necessária presença dos diversos carismas na Igreja, os dois
textos mais explícitos (Rm 12, 4-8; 1 Cor 12, 12-30) utilizam a comparação do
corpo humano: «É que, como num só corpo, temos muitos membros, mas os membros
não têm todos a mesma função, assim acontece conosco: os muitos que somos
formamos um só corpo em Cristo, mas, individualmente, somos membros que
pertencem uns aos outros. Temos dons que, consoante a graça que nos foi
dada, são diferentes» (Rm 12, 4-6). A diversidade entre os membros do corpo não
é uma anomalia a evitar. Pelo contrário, é uma necessidade benéfica que torna
possível o cumprimento das diversas funções vitais. «Se todos fossem um só
membro, onde estaria o corpo? Há, pois, muitos membros, mas um só corpo» (1 Cor
12, 19-20). Paulo, em Rm 12, 6, e Pedro,
em 1 Pe 4, 10[13], atestam uma estreita relação entre os carismas particulares
(charísmata) e a graça (cháris) de Deus. Os carismas são reconhecidos como uma
manifestação da «multiforme graça de Deus». Não se
trata, portanto, de meras capacidades humanas. A sua origem divina expressa-se
de diversas formas: de acordo com alguns textos, eles provêm de Deus (cf. Rm 12,
3; 1 Cor 12, 28; 2 Tim 1, 6; 1 Pe 4, 10); segundo Ef 4, 7, provêm de Cristo;
segundo 1 Cor 12, 4-11, do Espírito. Uma vez que esta última passagem é a mais
insistente (nomeia sete vezes o Espírito), os carismas são habitualmente
apresentados como «manifestações do Espírito» (1 Cor 12, 7). É claro, no
entanto, que esta atribuição não é exclusiva nem contradiz as duas precedentes.
Os dons de Deus implicam sempre todo o horizonte trinitário, como sempre foi
afirmado pela teologia desde os seus inícios, tanto no ocidente como no
oriente[14].
Dons dispensados «ad utilitatem»
e o primado da caridade
5. Em 1
Cor 12, 7, Paulo declara que «a cada um é dada a
manifestação do Espírito, para proveito». Muitos tradutores acrescentam: «para
proveito comum», porque a maioria dos carismas mencionados pelo Apóstolo, ainda
que nem todos, têm diretamente um proveito comum. Esta finalidade à
edificação de todos foi bem compreendida, por exemplo por Basílio Magno, quando
diz: «Cada um recebe estes dons mais para os outros que para si mesmo […]. Na vida comum é necessário que a força do Espírito Santo dada
a um seja transmitida a todos. Quem vive para si próprio, talvez possa ter um
carisma, mas torna-o inútil ao conservá-lo inativo, porque o enterrou dentro de
si mesmo»[15]. De qualquer modo, Paulo não exclui que um carisma possa
ser útil somente à pessoa que o recebeu. Tal é o exemplo de falar em línguas,
diferente neste caso do dom da profecia[16]. Os
carismas que têm uma utilidade comum, sejam carismas de palavra (de sabedoria,
de conhecimento, de profecia, de exortação) ou de ação (de autoridade, de
ministério, de governo), têm também uma utilidade pessoal, uma vez que o seu
exercício em prol do bem comum favorece o progresso na caridade em quem os
possui. A este propósito, Paulo observa que, se não houver caridade, nem
os carismas mais elevados são úteis à pessoa que os recebe (cf. 1 Cor 13, 1-3).
Uma passagem severa do Evangelho de Mateus (Mt 7, 22-23) exprime a mesma
realidade: o exercício de carismas vistosos (profecias, exorcismos, milagres)
infelizmente pode coexistir com a ausência de uma relação autêntica com o
Salvador. Por conseguinte, tanto Pedro como Paulo insistem na necessidade de
orientar todos os carismas para a caridade. Pedro
oferece uma regra geral: «Como bons administradores das várias graças de Deus,
cada um de vós ponha ao serviço dos outros o dom que recebeu» (1 Pe 4, 10). Paulo
preocupa-se particularmente com o uso dos carismas nos encontros da comunidade
cristã e afirma: «que tudo se faça de modo a edificar» (1 Cor 14, 26).
A variedade dos carismas
6. Em
alguns textos encontramos um elenco de carismas, umas vezes de forma sumária
(cf. 1 Pe 4, 10), outras vezes de forma mais detalhada (cf. 1 Cor 12, 8-10.
28-30; Rm 12, 6-8). Dentre os elencados, estão dons excecionais (de cura, de
obras de autoridade, de variedade de línguas) e dons ordinários (de ensino, de
serviço, de beneficência), ministérios para a condução das comunidades (cf. Ef
4, 11) e dons concedidos por meio da imposição das mãos (cf. 1 Tm 4, 14; 2 Tm
1, 6). Nem sempre é claro que todos estes dons sejam
considerados «carismas» propriamente ditos. Os dons excecionais, mencionados
repetidamente em 1 Cor 12-14, de facto desaparecem dos textos posteriores; o
elenco de Rm 12, 6-8 apresenta somente carismas menos vistosos que possuem uma
utilidade constante para a vida da comunidade cristã. Nenhum desses elencos
pretende ser exaustivo. Noutro local, por exemplo, Paulo sugere que a opção
pelo celibato por amor de Cristo seja vista como fruto de um carisma, tal como
a opção pelo matrimónio (cf. 1 Cor 7, 7, no contexto de todo o capítulo). Ambas
são exemplos que dependem do grau de desenvolvimento atingido pela Igreja
daquela época e que, por isso, são suscetíveis de acrescentos posteriores. A
Igreja, de facto, cresce sempre no tempo graças à ação vivificante do Espírito.
O bom exercício dos carismas na
comunidade eclesial
7. De tudo o que foi observado, torna-se
evidente que não existe nos textos escriturísticos uma oposição entre os vários
carismas, mas antes harmoniosa conexão e complementaridade. A antítese entre
uma Igreja institucional de tipo judeo-cristão e uma Igreja carismática de tipo
paulino, afirmada por algumas interpretações eclesiológicas redutoras, na
verdade não encontra um fundamento adequado nos textos do Novo Testamento. Longe de colocar os carismas de um lado e as realidades
institucionais de outra, ou de opor uma Igreja “da caridade” a uma Igreja “da
instituição”, Paulo recolhe num único elenco aqueles que possuem carismas de
autoridade e ensino, de carismas que são úteis à vida ordinária da comunidade e
carismas mais clamorosos[17]. O mesmo Paulo descreve o seu ministério de
apóstolo como «ministério do Espírito» (2 Cor 3, 8). Ele sente-se investido de
autoridade (exousía) dada pelo Senhor (cf. 2 Cor 10, 8; 13, 10), uma autoridade
que se alarga inclusive aos confrontos com os carismáticos. Tanto ele como
Pedro dão instruções aos carismáticos sobre o modo como exercer os carismas. A
sua atitude é acima de tudo de acolhimento favorável; estão convictos da origem
divina dos carismas; no entanto, não os consideram como dons que permitam a
dispensa de obediência à hierarquia eclesial ou confiram o direito a um
ministério autónomo. Paulo tem consciência dos
inconvenientes que um exercício desordenado dos carismas pode provocar na
comunidade cristã[18]. Por isso, o apóstolo intervém com autoridade para
estabelecer regras precisas sobre o exercício dos carismas «na Igreja» (1 Cor
14, 19.28), ou seja nos encontros da comunidade (cf. 1 Cor 14, 23.26). Por
exemplo, ele limita o uso da glossolalia[19]. Regras semelhantes são
apresentadas também para o dom da profecia (cf. 1 Cor 14, 29-31)[20]
Dons hierárquicos e carismáticos
8. Em síntese, partindo de uma análise
dos textos bíblicos sobre os carismas, fica claro que o Novo Testamento, ainda
que não oferecendo uma doutrina sistemática completa, apresenta afirmações de
grande importância que orientam a reflexão e a praxis eclesial. Deve-se ainda reconhecer que o termo “carisma” não é aí usado
de forma unívoca; é, pelo contrário, importante constatar uma variedade de
significados que a reflexão teológica e o Magistério ajudam a compreender no
âmbito de uma visão complexiva do mistério da Igreja. No presente documento, a
atenção é colocada sobre o binómio posto em destaque no nº 4 da Constituição
dogmática Lumen gentium, onde se fala de «dons hierárquicos e carismáticos» e
das suas estreitas e articuladas conexões. Eles têm a mesma origem e o mesmo
propósito. São dons de Deus, do Espírito Santo, de Cristo, dados com a
finalidade de contribuir, de formas diversas, para a edificação da Igreja. Quem
recebeu o dom de governar na Igreja tem também a missão de vigiar sobre o bom
exercício dos outros carismas, de modo que tudo concorra para o bem da Igreja e
para a sua missão evangelizadora, sabendo que é o Espírito Santo que distribui
os dons carismáticos por cada um, da forma que lhe apraz (cf. 1 Cor 12, 11). O mesmo Espírito dá á hierarquia da Igreja a capacidade de
discernir os carismas autênticos, de os acolher com alegria e gratidão, de os
promover com generosidade e de os acompanhar com paternidade vigilante. A
própria história testemunha a multiforme ação do Espírito, mediante a qual a
Igreja, edificada «sobre o alicerce dos Apóstolos e dos Profetas, tendo por
pedra angular o próprio Cristo Jesus» (Ef 2, 20), vive a sua missão no mundo.
II – A RELAÇÃO ENTRE DONS
HIERÁRQUICOS E CARISMÁTICOS NO MAGISTÉRIO RECENTE
O Concílio Vaticano II
9. O
aparecimento dos diferentes carismas nunca deixou de se fazer sentir ao longo
da secular história da Igreja e, no entanto, somente nos tempos mais recentes é
que se desenvolveu uma reflexão sistemática sobre eles. A este respeito, é dado um espaço significativo à doutrina dos carismas no
Magistério expresso por Pio XII na Carta encíclica Mystici corporis[21],
enquanto que os ensinamentos do Vaticano II avançam com um passo significativo
para uma compreensão adequada sobre a relação entre os dons hierárquicos e
carismáticos. As passagens relevantes a este respeito[22], além de fazerem
referência à Palavra de Deus, escrita e transmitida, aos Sacramentos e ao
ministério hierárquico ordenado na vida da Igreja, referem também a presença de
dons, de graças especiais ou carismas, derramados pelo Espírito entre os fiéis
de todas as condições. A passagem emblemática a este respeito é-nos
oferecida pela Lumen gentium, n. 4: «O Espírito […] conduz a Igreja à verdade
total (cf. Jo 16, 13) e unifica-a na comunhão e no ministério, enriquece-a e
guia-a com diversos dons hierárquicos e carismáticos e adorna-a com os seus
frutos (cf. Ef 4, 11-12; 1 Cor 12, 4; Gál 5, 22)[23]. Desta forma, a
Constituição dogmática Lumen gentium, ao apresentar os dons do mesmo Espírito,
sublinha, mediante a distinção entre dons hierárquicos e dons carismáticos, a
sua diferença na unidade. São também significativas as
afirmações feitas pela Lumen gentium 12 sobre a realidade carismática no
contexto da participação do povo de Deus na missão profética de Cristo, na qual
se reconhece que o Espírito Santo «não só santifica e conduz o Povo de Deus por
meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes» mas «distribui
também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam
aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a
renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja».Por fim,
descreve-se o seu caráter pluriforme e providente: «estes carismas, quer sejam
os mais elevados, quer também os mais simples e comuns, devem ser recebidos com
ação de graças e consolação, por serem muito acomodados e úteis às necessidades
da Igreja»[24]. Reflexões semelhantes encontram-se também no Decreto conciliar
sobre o apostolado dos leigos[25]. O mesmo documento
afirma que esses dons não devem ser considerados como algo facultativo na vida
da Igreja; melhor, «a receção destes carismas, mesmo dos mais simples, confere
a cada um dos fiéis o direito e o dever de os atuar na Igreja e no mundo, para
bem dos homens e edificação da Igreja, na liberdade do Espírito Santo»[26].
Por conseguinte, os carismas autênticos são considerados dons de irrenunciável
importância para a vida e para a missão eclesial. Por fim, é constante nos
ensinamentos conciliares o reconhecimento do papel essencial dos pastores no
discernimento dos carismas e dos seu exercício dentro da comunidade
eclesial[27]
O Magistério pós-conciliar
10. As
intervenções do Magistério sobre este assunto no período a seguir ao Concílio
Vaticano II multiplicaram-se[28]. Isto deve-se à crescente vitalidade dos novos
movimentos, agregações de fiéis e comunidades eclesiais, juntamente com a
necessidade de precisar o lugar da vida consagrada dentro da Igreja[29]. João Paulo II, ao longo do seu Magistério, insistiu
particularmente no princípio da co-essencialidade destes dons: «Repetidas vezes
sublinhei que na Igreja não existe contraste nem contradição entre a dimensão
institucional e a dimensão carismática, da qual os Movimentos são uma expressão
importante. Tanto uma como outra são co-essenciais na constituição divina da
Igreja fundada por Jesus, uma vez que concorrem conjuntamente para tornar
presente o mistério de Cristo e a sua obra salvífica no mundo»[30]. O
Papa Bento XVI, além de sublinhar a sua co-essencialidade, aprofundou a
afirmação do seu predecessor recordando que «tal como na Igreja as instituições
essenciais são carismáticas, assim os carismas devem de uma forma ou de outra
institucionalizar-se, para que haja coerência e continuidade. Assim, ambas as
dimensões, originárias do Espírito Santo através do Corpo de Cristo, concorrem
conjuntamente para tornar presente o mistério e a obra salvífica de Cristo no
mundo»[31]. Tanto os dons hierárquicos como os
carismáticos resultam desta forma reciprocamente relacionados desde a sua
origem. Finalmente, o Papa Francisco recordou «a harmonia» que o Espírito
estabelece entre os diversos dons e apelou às agregações carismáticas para uma
abertura missionária, para a obediência aos pastores[32] e para a imanência
eclesial, uma vez que «é no âmbito da comunidade que desabrocham e florescem os
dons que o Pai nos concede em abundância; e é no seio da comunidade que aprendemos
a reconhecê-los como um sinal do seu amor por todos os seus filhos»[33]. Portanto,
para concluir, é possível reconhecer uma convergência do Magistério eclesial
recente sobre a co-essencialidade entre os dons hierárquicos e carismáticos. A
sua contraposição, bem como a sua justaposição, seria sintoma de uma errada ou
insuficiente compreensão da ação do Espírito Santo na vida e na missão da
Igreja.
III. O FUNDAMENTO TEOLÓGICO DA
RELAÇÃO ENTRE DONS HIERÁRQUICOS E CARISMÁTICOS
Horizonte trinitário e cristológico
dos dons do Espírito Santo
11.
Para poder apreender as razões profundas da relação entre dons hierárquicos e
carismáticos é oportuno fazer referência ao seu
fundamento teológico. De facto, a necessidade de superar qualquer tipo de
contraposição estéril ou intrínseca justaposição entre dons hierárquicos e
carismáticos é exigida pela própria economia da salvação, a qual compreende a
relação intrínseca entre as missões do Verbo incarnado e do Espírito Santo. Na
realidade, todos os dons do Pai implicam a referência à ação conjunta e
diferenciada das missões divinas: todos os dons provêm do Pai, por meio do
Filho, no Espírito Santo. O dom do Espírito na Igreja está ligado á missão do
Filho, consumada plenamente no seu mistério pascal. O próprio Jesus relaciona
o cumprimento da sua missão com o envio do Espírito à comunidade dos
crentes[34]. Por isso, o Espírito Santo não pode, seja de que forma for,
inaugurar uma economia diversa à do Logos divino incarnado, crucificado e
ressuscitado[35]. De facto, toda a economia sacramental
da Igreja é a realização pneumatológica da Incarnação: por isso, o Espírito
Santo é considerado pela Tradição como a alma da Igreja, Corpo de Cristo. A
ação de Deus na história implica sempre a relação entre o Filho e o Espírito Santo,
aos quais Ireneu de leão chama sugestivamente «as duas mãos do Pai»[36]. Neste
sentido, nenhum dom do Espírito pode deixar de estar em relação com o Verbo
feito carne[37].A relação originária entre os dons hierárquicos, conferidos
pela graça sacramental da Ordem, e os dons carismáticos, livremente
distribuídos pelo Espírito Santo, tem, portanto, a sua raiz última na relação
entre o Logos divino incarnado e o Espírito Santo, que é sempre Espírito do Pai
e do Espírito. Precisamente para evitar visões teológicas
equívocas que requeressem (levassem a) uma «Igreja do Espírito» diversa e
separada da Igreja hierárquica-institucional, é oportuno sublinhar que as duas
missões divinas se implicam reciprocamente em todos os dons concedidos à
Igreja. Na realidade, a missão de Jesus Cristo implica, já por si própria, a
ação do Espírito. João Paulo II, na sua Carta encíclica sobre o Espírito Santo,
Dominum et vivificantem, tinha já mostrado a importância decisiva da ação do
Espírito na missão do Filho[38]. Bento XVI aprofundou este pensamento na
Exortação apostólica Sacramentum caritatis, recordando que o Paráclito «ativo
já na criação (Gn 1, 2), está presente em plenitude na vida inteira do Verbo
encarnado». Jesus Cristo «é concebido no seio da Virgem Maria por obra do
Espírito Santo (Mt 1, 18; Lc 1, 35); no início da sua missão pública, nas
margens do Jordão, vê-O descer sobre Si em forma de pomba (Mt 3, 16 e par.);
neste mesmo Espírito, age, fala e exulta (Lc 10, 21); e é n’Ele que Jesus pode
oferecer-Se a Si mesmo (Heb 9, 14). No chamado «discurso de despedida» referido
por João, Jesus põe claramente em relação o dom da sua vida no mistério pascal
com o dom do Espírito aos Seus (Jo 16, 7). Depois de ressuscitado, trazendo na
sua carne os sinais da paixão, pode derramar o Espírito (Jo 20, 22), tornando
os seus discípulos participantes da mesma missão d’Ele (Jo 20, 21). Em seguida,
será o Espírito que ensina aos discípulos todas as coisas, recordando-lhes tudo
o que Cristo tinha dito (Jo 14, 26), porque compete a Ele, enquanto Espírito da
verdade (Jo 15, 26), introduzir os discípulos na verdade total (Jo 16, 13).
Segundo narram os Actos, o Espírito desce sobre os Apóstolos reunidos em oração
com Maria no dia de Pentecostes (2, 1-4), e impele-os para a missão de anunciar
a boa nova a todos os povos»[39].
A ação do Espírito Santo nos dons
hierárquicos e carismáticos
12.
Destacar o horizonte trinitário e cristológico dos dons divinos também ilumina
a relação entre dons hierárquicos e carismáticos. De facto, nos dons hierárquicos,
enquanto ligados ao sacramento da Ordem, surge em primeiro plano a relação com
o agir salvífico de Cristo, como por exemplo a instituição da Eucaristia (cf.
Lc 22, 19s; 1 Cor 11, 25), o poder de perdoar os pecados (cf. Jo 20, 22s), o
mandato apostólico com a tarefa de evangelizar e batizar (cf. Mc 16, 15s; Mt
28, 18-20); ao mesmo tempo, é evidente que nenhum sacramento pode ser conferido
sem a ação do Espírito Santo[40]. Por outro lado, os
dons carismáticos dispensados pelo Espírito Santo, «que sopra onde quer» (cf.
Jo 3, 8) e distribui os seus dons «como lhe apraz» (1 Cor 12, 11), são
objetivamente relacionados com a vida nova em Cristo, uma vez que «cada um pela
sua parte» (1 Cor 12, 27) é membro do seu Corpo. Portanto, a correta
compreensão dos dons carismáticos é feita somente em relação à presença de
Cristo e ao seu serviço; tal como afirmou João Paulo II, «os verdadeiros
carismas não podem senão tender para o encontro com Cristo nos
Sacramentos»[41]. Portanto, tanto os dons hierárquicos como os carismáticos
aparecem unidos relativamente à relação intrínseca entre Jesus Cristo e o
Espírito Santo. O Paráclito é, contemporaneamente, Aquele que, através dos
sacramentos, difunde eficazmente a graça salvífica oferta por Cristo morto e
ressuscitado, e Aquele que dispensa os carismas. Na tradição litúrgica dos
cristãos do Oriente, especialmente na siríaca, o lugar do Espírito Santo,
representado na imagem do fogo, ajuda a tornar tudo isto muito claro. O grande
teólogo e poeta Efrém, o Sírio, afirma com efeito que «o fogo da compaixão
desceu e veio habitar no pão»[42], indicando a sua ação transformadora em
relação não só aos dons mas também aos fiéis que comerão o pão eucarístico. A
perspetiva oriental, com a eficácia das suas imagens, ajuda-nos a compreender
como, ao aproximarmo-nos da Eucaristia, Cristo nos dá o Espírito. O mesmo
Espírito, seguidamente, por meio da sua ação nos fiéis, alimenta a vida em
Cristo, conduzindo-os novamente a uma mais profunda vida sacramental, sobretudo
na Eucaristia. Deste modo, a ação livre da Santíssima Trindade na história
alcança para os fiéis o dom da salvação e simultaneamente anima-os, afim que
eles correspondam livremente e plenamente com o compromisso da própria vida.
IV. A relação entre dons
hierárquicos e carismáticos na vida e na missão da Igreja
Na Igreja como mistério de
comunhão
13. A Igreja apresenta-se como «um povo
reunido pela unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo»[43], no qual a
relação entre dons hierárquicos e carismáticos tem como fim a plena participação
dos fiéis na comunhão e missão evangelizadora. Fomos
gratuitamente predestinados em Cristo a esta vida nova (Rom 8, 29-31; Ef 1,
4-5). O Espírito Santo «realiza esta maravilhosa comunhão entre os fiéis e
une-os de tal modo intimamente em Cristo, que se torna o princípio da unidade
da Igreja»[44]. É, de facto, na Igreja, que os homens são convocados
para se tornarem membros de Cristo[45] e é na comunhão eclesial que se unem em
Cristo, como membros uns dos outros. Comunhão é sempre
uma «dupla participação vital: a incorporação dos cristãos na vida de Cristo e
a circulação dessa mesma caridade em todo o tecido dos fiéis, neste mundo e no
outro. União a Cristo e em Cristo; e união entre os cristãos, na Igreja»[46]. Neste
sentido, o mistério da Igreja resplandece «em Cristo como um sacramento ou
sinal e instrumento da união íntima com Deus e da unidade de todo o género
humano»[47]. Aqui desponta a raiz sacramental da Igreja como mistério de
comunhão: «Trata-se fundamentalmente da comunhão com Deus, por meio de Jesus
Cristo, no Espírito Santo. Uma comunhão que vem da Palavra de Deus e dos
Sacramentos. O Baptismo» – em estreita unidade com a Confirmação – «é a porta e
o fundamento da comunhão na Igreja. A Eucaristia é a
fonte e ponto culminante de toda a vida cristã»[48]. Estes sacramentos da
iniciação são constitutivos da vida cristã e sobre eles se apoiam os dons
hierárquicos e carismáticos. A vida da comunhão eclesial, assim internamente
ordenada, vive na escuta religiosa permanente da Palavra de Deus e é alimentada
pelos Sacramentos. A própria Palavra de Deus apresenta-se-nos profundamente
ligada aos Sacramentos, em particular à Eucaristia[49], dentro do único
horizonte sacramental da Revelação. A própria tradição oriental vê a Igreja,
Corpo de Cristo animado pelo Espírito Santo, como uma unidade ordenada, o que
também se expressa ao nível dos seus dons. A presença eficaz do Espírito
no coração dos crentes (cf. Rom 5, 5) é a raiz desta unidade também para as
manifestações carismáticas[50]. Os carismas dados às
pessoas singulares, de facto, fazem parte da mesma Igreja e são destinados a
uma mais intensa vida eclesial. Esta perspectiva surge também nos escritos do
Beato John Henry Newman: «Assim, o coração de cada cristão deveria representar
em miniatura a Igreja católica, pois um só Espírito faz a Igreja inteira e faz
de cada membro desta o Seu Templo»[51]. Isto torna ainda mais evidente o
motivo pelo qual não são legítimas quaisquer contraposições ou justaposições
entre dons hierárquicos e dons carismáticos. Em síntese, a relação entre os
dons carismáticos e a estrutura eclesial sacramental confirma a
coessencialidade entre dons hierárquicos – de por si estáveis, permanentes e
irrevocáveis – e dons carismáticos. Apesar destes últimos, nas suas formas
históricas, não serem garantidos para sempre[52], a dimensão carismática nunca
pode faltar à vida e à missão da Igreja.
Identidade dos dons hierárquicos
14. Em ordem à santificação de cada um dos
membro do povo de Deus e à missão da Igreja no Mundo, entre os diversos dons,
«sobressai a graça própria dos apóstolos, a cuja autoridade o mesmo Espírito
sujeitou também os carismáticos»[53]. O próprio Jesus
Cristo quis que existissem dons hierárquicos para assegurar a contemporaneidade
da Sua única mediação salvífica: «Cristo enriqueceu os apóstolos com a efusão
especial do Espírito Santo (cf. At 1, 8; 2, 4; Jo 20, 22-23); os apóstolos, por
sua vez, transmitiram aos seus colaboradores, pela imposição das mãos, este dom
do Espírito (cf. 1Tm 4,14; 2Tm 1,6-7)»[54]. Por isso, a atribuição dos dons
hierárquicos deve ser elevada sobretudo à plenitude do sacramento da Ordem,
conferida pela consagração episcopal, que comunica «juntamente com o múnus de
santificar, os ofícios de ensinar e de governar, que, por sua natureza, não
podem exercer-se senão em comunhão hierárquica com a cabeça e com os membros do
colégio.»[55]. Por isso, «na pessoa dos bispos, coadjuvados pelos
presbíteros, está presente no meio dos fiéis o Senhor Jesus Cristo […]; através
do seu ministério excelso, Ele prega a palavra de Deus a todos os povos e
administra continuamente os sacramentos da fé aos crentes; e, graças ao ofício
paternal dos mesmos (cf. 1 Cor 4, 15), vai incorporando por geração
sobrenatural novos membros ao seu corpo; finalmente, pela sabedoria e prudência
dos bispos, dirige e orienta o povo do Novo Testamento na sua peregrinação para
a eterna bem-aventurança»[56]. A tradição cristã
oriental, tão vivamente ligada aos Padres, lê tudo isto na sua peculiar
concepção da taxis. Segundo Basílio Magno, é evidente que a organização da
Igreja é obra do Espírito Santo e até a ordem (taxis) em que Paulo elenca os
carismas (cf. 1 Cor 12, 28) «está de acordo com a distribuição dos dons do
Espírito»[57], indicando como primeiro dentre estes o dos apóstolos. A
partir da referência à consagração episcopal, compreendem-se também os dons
hierárquicos relacionados com os outros graus da Ordem; antes de mais, os dos
presbíteros que são «consagrados para pregar o Evangelho, apascentar os fiéis e
celebrar o culto divino» e, «sob a autoridade do bispo, santificam e dirigem a
porção da grei do Senhor que lhes foi confiada», bem como tornando-se, por sua
vez, «modelos do povo, governem e estejam ao serviço da sua comunidade
local»[58]. Aos bispos e presbíteros, no sacramento da Ordem, pela unção
sacerdotal, são «configurados a Cristo sacerdote, de tal modo que possam agir
na pessoa de Cristo cabeça»[59]. A esses devem acrescentar-se os dons
concedidos aos diáconos, «que receberam a imposição das mãos, não para o sacerdócio,
mas para o ministério»; e que «confortados pela graça sacramental, servem o
povo de Deus no ministério da liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão
com o bispo e o seu presbitério»[60]. Em síntese, os dons hierárquicos próprios
do sacramento da Ordem, nos seus vários graus, são concedidos, para que, na
Igreja, como comunhão, nunca falta a cada fiel a oferta objetiva da graça nos
sacramentos, o anúncio normativo da Palavra de Deus e o cuidado pastoral.
Identidade dos dons “carismáticos”
15. Se
pelo exercício dos dons hierárquicos é assegurada, ao longo da história, a
oferta da graça de Cristo a favor de todo o povo de Deus, todos os fiéis são
chamados a acolhê-la e a corresponder-lhe pessoalmente nas circunstâncias
concretas da própria vida. Os dons carismáticos são,
por isso, distribuídos livremente pelo Espírito Santo, para que a graça
sacramental produza fruto na vida cristã de modo diversificado e a todos os
níveis. Sendo estes carismas «perfeitamente acomodados e úteis às necessidades
da Igreja»[61], através da sua riqueza multiforme, o povo de Deus pode viver em
plenitude a missão evangelizadora, examinando e interpretando os sinais dos
tempos à luz do Evangelho[62]. De facto, os dons carismáticos levam os
fiéis a responder, em plena liberdade e num modo adequado aos tempos, ao dom da
salvação, fazendo de si próprios um dom de amor para os outros e um testemunho
autêntico do Evangelho diante de todos os homens.
Os dons carismáticos partilhados
16. Neste contexto é útil lembrar quanto os
dons carismáticos podem ser diversos entre si, não só pelas suas
características específicas, mas também pela sua extensão na comunhão eclesial.
Os dons carismáticos «são dados ao indivíduo, mas
também podem ser partilhados por outros e de tal modo perseveram no tempo como
uma herança preciosa e viva, que gera uma afinidade espiritual entre as
pessoas»[63]. A ligação entre o carácter pessoal do carisma e a
possibilidade de participação nele exprime um elemento decisivo da sua
dinâmica, na medida em que tem que ver com a relação que, na comunidade
eclesial, liga sempre a pessoa e a comunidade[64]. Na sua prática, os dons
carismáticos podem gerar afinidade, proximidade e parentescos espirituais,
através dos quais se pode participar no património carismático a partir da
pessoa do fundador e aprofundá-lo, dando vida a verdadeiras e autênticas
famílias espirituais. As agregações eclesiais, nas suas variadas formas,
apresentam-se como dons carismáticos partilhados. Movimentos eclesiais e novas
comunidades mostram como um determinado carisma originário pode agregar fiéis e
ajuda-los a viver plenamente a própria vocação cristã e o próprio estado de
vida ao serviço da missão eclesial. As formas históricas concretas desta
partilha podem em si ser diversificadas, pelo que, a partir de um carisma
originário, fundacional, possam surgir várias fundações, como mostra a história
da espiritualidade.
O reconhecimento por parte da
autoridade eclesiástica
17. Entre os dons carismáticos livremente
distribuídos pelo Espírito, há imensos que, acolhidos e vividos pela pessoa no
seio da comunidade cristã, não necessitam de regulamentações particulares.
Quando, por outro lado, um dom carismático se apresenta como «carisma
originário» ou «fundacional», então ele requer um reconhecimento específico,
para que a sua riqueza se articule adequadamente na comunhão eclesial e se
transmita fielmente através dos tempos. Aqui surge a
tarefa decisiva de discernimento, que pertence à autoridade eclesiástica[65].
Reconhecer a autenticidade do carisma não é uma tarefa sempre fácil, mas é um
serviço imprescindível que os Pastores devem realizar. Na realidade, os fiéis
têm o «direito de ser advertidos pelos Pastores sobre a autenticidade dos
carismas e sobre a credibilidade dos que se apresentam como seus
depositários»[66]. Para tal, a autoridade deverá ser consciente da efetiva
imprevisibilidade dos carismas suscitados pelo Espírito Santo, valorizando-os
de acordo com a regra da fé, tendo em vista a edificação da Igreja[67]. Trata-se
de um processo que se alonga no tempo e que requer etapas adequadas à sua
autenticação, passando através de um discernimento sério, até chegar ao
reconhecimento eclesial do seu caráter genuíno. A realidade agregadora que
brota de um carisma deve ter um tempo oportuno de experimentação e de
consolidação, que vá além do entusiasmo inicial, até chegar a uma configuração
estável. Ao longo de todo o itinerário de verificação, a autoridade da Igreja
deve acompanhar benevolamente a nova realidade agregadora. Trata-se de um acompanhamento
por parte dos pastores que nunca deve diminuir, pois nunca diminui a
paternidade daqueles que, na Igreja, são chamados a ser vicários do Bom Pastor,
cujo amor solícito não deixa nunca de acompanhar o Seu rebanho.
Critérios para o discernimento
dos dons carismáticos
18. Neste quadro, podem ser retomados alguns
critérios para o discernimento dos dons carismáticos em relação às agregações
eclesiais, que o Magistério da Igreja pôs em evidência ao longo dos últimos
anos. Estes critérios têm o objetivo de contribuir para
o reconhecimento de uma autêntica eclesialidade dos carismas.
a) Primado da vocação de cada cristão à santidade. Cada
realidade que nasce da participação de um carisma autêntico deve ser sempre
instrumento de santidade na Igreja e, consequentemente, de incremento da
caridade e de autêntica tensão rumo à perfeição do amor[68].
b) Empenho na difusão missionária do Evangelho. As
realidades carismáticas autênticas são «presentes do Espírito integrados no
corpo eclesial, atraídos para o centro que é Cristo, donde são canalizados num
impulso evangelizador»[69]. Para tal, devem realizar «a conformidade e a
participação na finalidade apostólica da Igreja», manifestando um claro
«entusiasmo missionário que as torne, sempre e cada vez mais, sujeitos de uma
nova evangelização»[70].
c) Confissão da fé católica. Cada realidade carismática deve ser um
lugar de educação para a fé na sua integralidade,
«acolhendo e proclamando a verdade sobre Cristo, sobre a Igreja e sobre o
homem, em obediência ao magistério da Igreja que autenticamente a
interpreta»[71]; portanto, é de evitar de se aventurar «ultrapassando (proagon)
a doutrina e a comunidade eclesial»; de facto, se «se deixa de permanecer
nelas, não se está unido ao Deus de Jesus Cristo (cf. 2 Jo 9)»[72].
d) Testemunho de uma comunhão ativa com toda a Igreja. Isto
comporta uma «relação filial com o Papa, centro perpétuo e visível da unidade
da Igreja universal, e com o Bispo, “princípio visível e fundamento da unidade”
da Igreja particular»[73]. Esta relação implica a «disponibilidade leal em
aceitar os seus ensinamentos doutrinais e orientações pastorais»[74], assim
como «a disponibilidade em participar nos programas e nas atividades da Igreja,
tanto a nível local como nacional ou internacional; o empenhamento catequético
e a capacidade pedagógica de formar os cristãos»[75].
e) Reconhecimento e estima da complementaridade recíproca de outras
realidades carismáticas na Igreja. Daqui deriva também a
disponibilidade para uma colaboração recíproca[76]. De facto, «um sinal claro
da autenticidade de um carisma é a sua eclesialidade, a sua capacidade de se
integrar harmoniosamente na vida do Povo santo de Deus para o bem de todos. Uma
verdadeira novidade, suscitada pelo Espírito, não precisa de fazer sombra sobre
outras espiritualidades e dons, para se afirmar a si mesma»[77].
f) Aceitação dos momentos de prova no discernimento dos carismas. Uma vez
que o dom carismático pode possuir «uma dose de novidade de vida espiritual
para toda a Igreja, que, num primeiro momento, pode aparentar ser incómoda», um
critério de autenticidade manifesta-se na «humildade em suportar os
contratempos: a relação justa entre carisma genuíno, perspectiva de novidade e
sofrimento interior comporta uma constante histórica de ligação entre carisma e
cruz»[78]. O aparecimento de tensões eventuais exige, por parte de todos, a
prática de uma caridade maior, tendo em vista uma comunhão e unidade eclesiais
cada vez mais profundas.
g) Presença de frutos espirituais, tais como caridade, alegria,
humanidade e paz (cf. Gal 5, 22); «viver ainda mais intensamente a vida da
Igreja»[79], um zelo mais intenso pela «escuta e meditação da Palavra de
Deus»[80]; «um gosto renovado pela oração, a contemplação, a vida litúrgica e
sacramental; a animação pelo florescimento de vocações
ao matrimónio cristão, ao sacerdócio ministerial, à vida consagrada»[81].
h) Dimensão social da evangelização. É necessário reconhecer que,
graças ao impulso da caridade, «o querigma possui um conteúdo inevitavelmente
social: no próprio coração do Evangelho, aparece a vida comunitária e o
compromisso com os outros»[82]. Neste critério de
discernimento, referido não exclusivamente às realidades laicais na Igreja,
sublinha-se a necessidade de ser «correntes vivas de participação e de
solidariedade para construir condições mais justas e fraternas no seio da
sociedade»[83]. Neste âmbito, são significativos «o impulso em ordem a uma
presença cristã nos vários ambientes da vida social e a criação e animação de
obras caritativas, culturais e espirituais; o espírito de desapego e de pobreza
evangélica em ordem a uma caridade mais generosa para com todos»[84]. É também
decisiva a referência à Doutrina Social da Igreja[85]. Em particular, «deriva
da nossa fé em Cristo que se fez pobre e sempre Se aproximou dos pobres e
marginalizados, a preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais
abandonados da sociedade»[86], que não pode faltar numa realidade eclesial
autêntica.
V. Prática eclesial
da relação entre dons hierárquicos e dons carismáticos
19. Por fim, é necessário tratar alguns
elementos da prática eclesial concreta no que diz respeito à relação entre dons
hierárquicos e carismáticos que se configuram como agregações carismáticas no
seio da comunhão eclesial.
Referência recíproca
20. Antes de mais, a prática da boa relação
entre os vários dons na Igreja exige uma inserção ativa das realidades
carismáticas na vida pastoral das Igrejas particulares. Isto implica, sobretudo,
que as diversas agregações reconheçam a autoridade dos pastores na Igreja como
uma realidade interna da própria vida cristã, desejando sinceramente ser
reconhecidas, acolhidas e eventualmente purificadas, colocando-se ao serviço da
missão eclesial. Por outro lado, os que foram
investidos dos dons hierárquicos, levando a cabo o discernimento e o
acompanhamento dos carismas, devem acolher cordialmente o que o Espírito
suscita no seio da comunhão eclesial, tendo-o em conta na ação pastoral e
valorizando o seu contributo como uma autêntica riqueza para o bem de
todos.
Os dons carismáticos na Igreja
universal e particular
21. Relativamente à difusão e à
particularidade das realidades carismáticas, deve-se ter em conta a relação
imprescindível e constitutiva entre Igreja universal e Igrejas particulares. A este propósito, é oportuno sublinhar que a Igreja de
Cristo, como professamos no Símbolo apostólico, «é a Igreja universal, ou seja,
a comunidade universal dos discípulos do Senhor, que se torna presente e
operante na particularidade e diversidade das pessoas, grupos, tempos e
lugares»[87]. A dimensão particular é, portanto, intrínseca à universal
e vice-versa; de facto, entre Igrejas particulares e Igreja universal existe
uma relação de «mútua interioridade»[88]. Os dons hierárquicos próprios do
Sucessor de Pedro exercitam-se, neste contexto, ao garantir e favorecer a
imanência da Igreja universal nas Igrejas locais; assim como a tarefa
apostólica de cada bispo não se limita à própria diocese, mas deve fluir para
toda a Igreja, através da colegialidade ativa e efetiva, sobretudo através da
comunhão com aquele centrum unitatis Ecclesiae que é o Romano Pontífice. Este,
de facto, enquanto «sucessor de Pedro, é o princípio e o fundamento perpétuo e
visível da unidade, quer dos bispos, quer da multidão dos fiéis. Por sua vez,
cada bispo é o princípio e o fundamento visível da unidade na sua Igreja
particular, formada à imagem da Igreja universal: nas quais e a partir das
quais resulta a Igreja católica una e única»[89]. Isto implica que, em cada
Igreja particular «está e opera verdadeiramente a Igreja de Cristo, una, santa,
católica e apostólica»[90]. Por isso, a referência à autoridade do Sucessor de
Pedro – a comunhão cum Petro et sub Petro – é constitutiva de cada Igreja
local[91]. Deste modo, estão colocadas as bases para relacionar dons
hierárquicos e carismáticos dentro da relação entre Igreja universal e Igrejas
particulares. De fato, por um lado, os dons
carismáticos são dados a toda a Igreja; por outro, a dinâmica destes dons não
se pode realizar sem ser ao serviço de uma diocese concreta, a qual é «a porção
do povo de Deus, que se confia aos cuidados pastorais de um bispo, coadjuvado
pelo seu presbitério»[92]. A este
propósito, pode ser útil lembrar o caso da vida consagrada; esta, de facto, não
é uma realidade externa ou independente da vida da Igreja local, mas constitui
um modo peculiar, marcado pela radicalidade evangélica, de estar presente no
seu seio, com os seus dons específicos. A tradicional da “isenção”, associada a
muitos institutos de vida consagrada[93], tem como significado não uma
supra-localidade desencarnada ou uma autonomia mal entendida, mas sim uma
interação mais profunda entre as dimensões universal e particular da
Igreja[94]. Analogamente, as novas realidades
carismáticas, sempre que possuam caráter supra-diocesano, não devem conceber-se
a si próprias num modo totalmente autónomo no que diz respeito à Igreja
particular. Pelo
contrário, devem enriquecê-la e servi-la por força das próprias peculiaridades
partilhadas para além dos confins de uma diocese singular.
Os dons carismáticos e os estados
de vida do cristão
22. Os dons carismáticos dispensados pelo
Espírito Santo podem ser visto em relação a toda a ordem da comunhão eclesial,
tanto em referência aos Sacramentos, como à Palavra de Deus. De acordo com as
suas variadas peculiaridades, eles permitem que se dê muito fruto na realização
daquelas tarefas que emanam do Baptismo, do Crisma, do Matrimónio e da Ordem,
assim como possibilitam uma maior compreensão espiritual da Tradição
apostólica, a qual, para além do estudo e da pregação dos que receberam o
charisma veritatis certum[95], pode ser aprofundada com «a íntima inteligência
que experimentam das coisas espirituais»[96]. Nesta
perspectiva, é útil enumerar as questões fundamentais relativas às ligações
entre dons carismáticos e os diferentes estados de vida, com uma referência
particular ao sacerdócio comum do Povo de Deus e ao sacerdócio hierárquico, os
quais «apesar de diferirem entre si essencialmente e não apenas em grau,
ordenam-se um para o outro; de facto, ambos participam, cada qual a seu modo,
do sacerdócio único de Cristo»[97]. De facto, trata-se de «dois modos de
participação no único sacerdócio de Cristo, no qual estão presentes duas
dimensões, que se unem no ato supremo do sacrifício da cruz»[98].
a) Em primeiro lugar, é necessário reconhecer a bondade dos diversos
carismas que estão na origem de agregações eclesiais entre todos os fiéis,
chamados a fazer frutificar a graça sacramental, sob a guia dos pastores
legítimos. Esses dons representam uma possibilidade
autêntica para viver e desenvolver a própria vocação cristã[99]. Estes dons
carismáticos permitem aos fiéis viver na existência quotidiana o sacerdócio comum do Povo de Deus: como «discípulos de Cristo,
perseverando juntos na oração e no louvor de Deus (cf. At 2,42-47), ofereçam-se
a si mesmos como hóstia viva, santa, agradável a Deus (cf. Rm 12,1); dêem
testemunho de Cristo em toda a parte; e, àqueles que por isso se interessarem,
falem da esperança, que está neles, da vida eterna (cf. 1Pe 3,15)»[100]. Nesta
linha colocam-se também as agregações eclesiais que podem ser particularmente
significativas para a vida cristã no matrimónio, as quais podem validamente
«fortalecer com a doutrina e a ação os jovens e os próprios esposos,
especialmente os recém-casados e formá-los para a vida familiar, social e
apostólica »[101].
b) Também os ministros ordenados, na participação numa realidade
carismática, poderão encontrar, tanto um apelo ao sentido do próprio Baptismo,
com o qual se tornaram filhos de Deus, quer à sua vocação e missão específica. Um fiel
ordenado poderá encontrar, numa determinada agregação eclesial, força e ajuda
para viver a fundo o que lhe é pedido pelo seu ministério específico, quer
perante todo o Povo de Deus, e em particular a porção que lhe está confiada,
quer no que diz respeito à obediência sincera devida ao próprio Ordinário[102].
Pode-se afirmar o mesmo analogamente no que diz respeito aos casos de
candidatos ao sacerdócio que provenham de uma determinada agregação eclesial,
como afirmado na Exortação pós-sinodal Pastores dabo vobis[103]. Essa ligação
deverá exprimir-se na docilidade ativa à própria formação específica, na qual
se deverá inserir a riqueza proveniente do carisma de referência. Por fim, a
ajuda pastoral que o sacerdote poderá oferecer à agregação eclesial, de acordo
com as caraterísticas do próprio movimento, poderá realizar-se na observância
do regime previsto na comunhão eclesial para a Ordem sagrada, no que diz
respeito à incardinação[104] e à obediência devida ao próprio Ordinário[105].
c) O contributo de um dom carismático ao sacerdócio baptismal e ao
sacerdócio ministerial é expresso emblematicamente pela vida consagrada, que,
com tal, se situa na dimensão carismática da Igreja[106]. Um
carisma, que realiza «a conformação especial a Cristo virgem, pobre e
obediente»[107] como forma de vida estável[108], mediante a profissão dos
conselhos evangélicos, é concedido para «conseguir fruto mais abundante da
graça baptismal»[109]. A espiritualidade dos Institutos de vida consagrada pode
tornar-se, tanto para o fiel leigo, como para o presbítero, num auxílio para
viver a própria vocação. Além disso, não é raro que membros de vida consagrada,
com a necessária anuência do respetivo superior[110], encontrem na relação com
as novas agregações um apoio importante para viver a própria vocação específica
e oferecer, por seu lado, um «testemunho gozoso, fiel e carismático da vida
consagrada», permitindo assim um «enriquecimento recíproco»[111].
d) Por fim, é significativo que o espírito dos conselhos evangélicos
seja recomendado pelo Magistério também a cada ministro ordenado[112].
Inclusive o celibato, pedido aos presbíteros na venerável tradição latina[113],
insere-se claramente na linha do dom carismático. Não se
trata de uma realidade primariamente funcional, mas «constitui uma especial
conformação ao estilo de vida do próprio Cristo»[114], em que se realiza a
plena entrega pessoal, tendo em vista a missão conferida mediante o sacramento
da Ordem[115].
Formas de reconhecimento eclesial
23. O presente documento pretende esclarecer
a colocação teológica e eclesiológica das novas agregações eclesiais, a partir
da relação entre dons hierárquicos e dons carismáticos, de modo a favorecer a
identificação concreta das modalidades mais adequadas para o reconhecimento
eclesial destes últimos. O Código de Direito Canónico
atual prevê diversas formas jurídicas de reconhecimento das novas realidades eclesiais
que se baseiam em dons carismáticos. Essas formas deverão ser consideradas
atentamente[116], evitando situações que não tenham em adequada consideração
nem os princípios fundamentais do direito nem a natureza e a peculiaridade das
diversas realidades carismáticas. Do ponto de vista da relação entre
dons hierárquicos e carismáticos é necessário respeitar dois critérios
fundamentais que devem ser considerados inseparavelmente:
a) o respeito pela peculiaridade carismática de cada agregação
eclesial, evitando formas jurídicas forçadas que anulem a novidade trazida pela
experiência específica. Deste modo, evitar-se-á que os vários
carismas possam ser considerados como dotes indiferenciados dentro da Igreja.
b) o respeito do regime eclesial fundamental, favorecendo a inserção
real dos dons carismáticos na vida da Igreja universal e particular, evitando
que a realidade carismática seja concebida paralelamente à vida eclesial e sem
uma referência ordenada aos dons hierárquicos.
Conclusão
24. Atendendo à efusão do Espírito Santo, os
primeiros discípulos eram assíduos e concordes na oração, juntamente com Maria,
a mãe de Jesus (cf. At 1, 14). Ela foi perfeita a acolher e a fazer frutificar
as graças singulares com as quais tinha sido enriquecida de forma
superabundante pela Santíssima Trindade, em que a primeira entre todas foi a
graça de ser Mãe de Deus. Todos os filhos da Igreja podem admirar a Sua plena
docilidade à ação do Espírito Santo: docilidade na fé, sem rupturas, e numa
humildade cristalina. Assim, Maria testemunha em plenitude o acolhimento
obediente e fiel de cada dom do Espírito. Mas mais ainda, como ensina o
Concílio Vaticano II, a Virgem Maria «com Seu amor de Mãe, cuida dos irmãos de
seu Filho, que ainda peregrinam e se debatem entre perigos e angústias, até que
sejam conduzidos à Pátria feliz»[117]. Uma vez que Ela «se deixou-Se conduzir
pelo Espírito, através dum itinerário de fé, rumo a uma destinação feita de
serviço e fecundidade», também nós, «hoje, fixamos n’Ela o nosso olhar, para que
nos ajude a anunciar a todos a mensagem de salvação e para que os novos
discípulos se tornem operosos evangelizadores»[118].Por este motivo, Maria é
reconhecida como Mãe da Igreja e nós recorremos a Ela, cheios de confiança,
para que, com a Sua ajuda eficaz e com a Sua potente intercessão, os carismas
abundantemente distribuídos pelo Espírito Santo entre os fiéis sejam por estes
acolhidos com docilidade e produzam fruto para a vida e a missão da Igreja e
para o bem do mundo.O Sumo Pontífice Francisco, na
Audiência concedida no dia 14 de março de 2016 ao sobescrito Cardeal Prefeito
da Congregação para a Doutrina da Fé, aprovou a presenta Carta, decidida na
Sessão Plenária deste Dicastério, e ordenou a sua publicação.Dado em
Roma, na Sede da Congregação para a Doutrina da Fé, a 15 de maio de 2016,
Solenidade de Pentecostes.
Gerhard
Card. Müller
Prefeito
+ Luis
F. Ladaria, S.I.
Arcebispo
Titular de Thibica - Secretário
REFERÊNCIAS:
[1]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 4.
[2]
João Crisóstomo, Homilia de Pentecoste, II, 1: PG 50, 464.
[3]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium (24 de novembro de 2013), n. 49: AAS
105 (2013), 1040.
[4] Cf.
ibid., nn. 20-24: AAS 105 (2013), 1028-1029.
[5] Cf.
ibid., n. 14: AAS 105 (2013), 1025.
[6]
Ibid., n. 25: AAS 105 (2013), 1030.
[7]
Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Apostolicam actuositatem, n. 19.
[8]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 14: AAS 105 (2013), 1026; cf.
bento XVI, Homilia na Eucaristia de inauguração da V Conferência Geral do
Episcopado Latino-Americano e do Caribe no Santuário da “Aparecida” (13 de Maio
de 2007): AAS 99 (2007), 43.
[9]
João Paulo II, Discurso aos membros dos movimentos eclesiais e às novas
comunidades na vigília de Pentecostes, (30 maio 1998), n. 7: Insegnamenti di
Giovanni Paolo II, XXI,1 (1998), 1123.
[10]
Ibid., 6: Insegnamenti di Giovanni Paolo II, XXI,1 (1998), 1122.
[11]
Ibid., 8: Insegnamenti di Giovanni Paolo II, XXI,1 (1998), 1124.
[12]
«Há diversidade de charísmata» (1 Cor 12, 4); «temos charísmata que são
diferentes» (Rm 12, 6); «cada um recebe de Deus o seu próprio chárisma, um de
uma maneira, outro de outra» (1 Cor 7, 7).
[13] Em
grego as duas palavras (chárisma e cháris) têm origem na mesma raiz.
[14]
Cf. Origenes, De principiis, I, 3, 7; PG 11, 153: «aquilo que é chamado dom do
Espírito é transmitido por obra do Filho e feito por obra do Pai».
[15]
Basílio de Cesareia, Regulae fusius Tractae., 7, 2: PG 31, 933-934.
[16]
«Quem fala em línguas, edifica-se a si mesmo, mas quem profetiza, edifica a
assembleia» (1 Cor 14, 4). O apóstolo não despreza o dom da glossolalia,
carisma de oração útil para a relação pessoal com Deus, e reconhece-o como um
autêntico carisma, ainda que sem uma utilidade comum direta: «Graças a Deus, eu
falo mais em línguas que todos vós. Mas, numa assembleia, prefiro dizer cinco
palavras com a minha inteligência, para instruir também os outros, do que dez
mil, em línguas» (1 Cor 14, 18-19).
[17]
Cf. 1 Cor 12, 28: «aqueles que Deus estabeleceu na Igreja são, em primeiro
lugar, apóstolos; em segundo, profetas; em terceiro, mestres; em seguida, há o
dom dos milagres, depois o das curas, o das obras de assistência, o de governo
e o das diversas línguas».
[18]
Nos encontros comunitários, a superabundância das manifestações carismáticas
pode criar mal-estar, produzindo uma atmosfera de rivalidade, desordem e
confusão. Os cristãos menos dotados correm o risco de se sentirem
inferiorizados (cf. 1 Cor 12, 15-16); pelo seu lado, os grandes carismáticos
são tentados a assumir uma atitude de soberba e desprezo (cf. 1 Cor 12, 21).
[19] Se
na assembleia não se encontra ninguém para interpretar as palavras misteriosas
de quem fala em línguas, Paulo acrescenta que estes se devem calar. Se existe
um intérprete, o apóstolo consente que dois, no máximo três, falem em línguas
(cf. 1 Cor 14, 27-28).
[20]
Paulo não aceita a ideia de uma inspiração profética incontrolável; pelo
contrário, ele afirma que «as inspirações dos profetas devem submeter-se aos
profetas, porque Deus não é um Deus de desordem, mas de paz» (1 Cor 14, 32-33).
Ele afirma que «se algum de vós julga ser profeta ou estar na posse dos dons do
Espírito, deve reconhecer, no que vos escrevo, um preceito do Senhor. Mas se
alguém não o reconhecer, também não será reconhecido» (1 Cor 14, 37-38). No
entanto, conclui de forma positiva, convidando a aspirar à profecia e a não
impedir que se fale em línguas (cf. 1 Cor 14, 39).
[21]
Cf. Pio XII, Carta enc. Mystici corporis (29 de junho de 1943): AAS 35 (1943),
206-230.
[22]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, nn. 4, 7, 11, 12, 25, 30,
50; Const. dogm. Dei Verbum, n. 8; Decr. Apostolicam actuositatem, nn. 3, 4,
30; Decr. Presbyterorum ordinis, nn. 4, 9.
[23]
Id., Const. dogm. Lumen gentium, n. 4.
[24]
Ibid., n. 12.
[25]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Apostolicam actuositatem, n. 3: «O Espírito
Santo – que opera a santificação do Povo de Deus por meio do ministério e dos
sacramentos – concede também aos fiéis, para exercerem este apostolado, dons
particulares (cf. 1 Cor 12, 7), “distribuindo-os por cada um conforme lhe
apraz” (1 Cor 12, 11), a fim de que “cada um ponha ao serviço dos outros a
graça que recebeu” e todos atuem, “como bons administradores da multiforme
graça de Deus” (1 Pe 4, 10), para a edificação, no amor, do corpo todo (cf. Ef
4, 1)».
[26]
Ibid.
[27]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 12: «O juízo acerca da
sua autenticidade e recto uso, pertence àqueles que presidem na Igreja e aos
quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e
conservar o que é bom (cf. 1 Tess 5, 12. 19-21)». Apesar de se referir
diretamente ao discernimento dos dons extraordinários, quanto se afirma aqui
vale, por analogia, para todo e qualquer carisma.
[28]
Cf. Por ex. Paulo VI, Exort. Apost. Evangelii nuntiandi (8 de dezembro de
1975), n. 58: AAS 68 (1976), 46-49; Congregação para os Religiosos e os
Institutos Seculares – Congregação para os Bispos, Notas diretivas Mutuae
relationes (14 de maio de 1978): ASS 70 (1978), 473-506; João Paulo II, Exort.
Apost. Christifideles Laici (30 de dezembro de 1988): AAS 81 (1989), 393-521;
Exort. Apost. Vita Consecrata (25 de março de 1996): AAS 88 (1996), 377-486.
[29] A
afirmação do supracitado documento interdicasterial Mutuae relationes é
emblemática ao recordar que «seria grave erro tornar independentes — mais grave
ainda seria contrapô-las — a vida religiosa e as estruturas eclesiais, como se
pudessem subsistir quais duas realidades distintas, carismática uma,
institucional a outra; ao passo que ambos os elementos, isto é, os dons
espirituais e as estruturas eclesiais, formam uma só, ainda que complexa,
realidade» (34).
[30]
João Paulo II, Mensagem aos participantes no Congresso mundial dos Movimentos
eclesiais, promovido pelo Conselho Pontifício para os Leigos (27 de maio de
1998), n. 5: Insegnamenti di Giovanni Paolo II, XXI, 1 (1998), 1065: cf. também
ID., Mensagem aos movimentos eclesiais reunidos para o II Colóquio
internacional (2 de março 1987): Insegnamenti di Giovanni Paolo II, X, 1
(1987), 476-479.
[31]
Bento XVI, Discurso aos participantes na Peregrinação promovida pela
fraternidade de Comunhão e Libertação, por ocasião do XXV Aniversário do
Reconhecimento Pontifício (24 de março de 2007): Insegnamenti di Benedetto XVI,
III, 1 (2007), 558.
[32] «O
caminhar juntos na Igreja, guiados pelos Pastores – que para isso têm um
carisma e ministério especial – é sinal da ação do Espírito Santo; uma
característica fundamental para cada cristão, cada comunidade, cada movimento é
a eclesialidade»: Francisco, Homilia na Solenidade de Pentecostes com os
Movimentos, as Novas Comunidades, as Associações e as Agregações laicais (19 de
maio de 2013): Insegnamenti di Francesco, I, 1, (2013), 208.
[33]
Id., Audiência Geral (1 de outubro de 2014): L’Osservatore Romano (2 de outubro
de 2014), 8.
[34]
Cf. Jo 7, 39; 14, 26; 15, 26; 20, 22.
[35]
Cf. Congregação para a doutrina da fé, Decl. Dominus Jesus (6 de agosto de
2000), nn. 9-12: AAS 92 (2000), 749-754.
[36]
Ireneu De Leão, Adversus haereses, IV, 7, 4: PG 7, 992-993; V, 1, 3: PG 7,
1123; V, 6, 1: PG 7, 1137; V, 28, 4: PG 7, 1200.
[37]
Cf. Congregação para a doutrina da fé, Decl. Dominus Jesus, n. 12: AAS 92
(2000), 752-754.
[38]
Cf. João Paulo II, Carta enc., Dominum et vivificantem (18 de maio de 1986), n.
50: AAS 78 (1986), 869-870; cf. Catecismo da Igreja Católica, 727-730.
[39]
Bento XVI, Exort. Apost. Sacramentum caritatis (22 de fevereiro de 2007), n.
12: AAS 99 (2007), 114.
[40]
Cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 1104-1107.
[41]
João Paulo II, Discurso aos membros dos movimentos eclesiais e das novas
comunidades na vigília de Pentecostes (30 de maio de 1998), n. 7: Insegnamenti
di Giovanni Paolo II, XXI, 1 (1998), 1123.
[42]
Efrem, o Sírio, Inni sulla fede, 10, 12: CSCO 154, 50.
[43]
Cipriano de Cartago, De oratione dominica, 23: PL 4, 553; cf. Conc. Ecum. Vat.
II, Const. dogm. Lumen gentium, 4.
[44]
Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 2.
[45] Cf. Congregação para a doutrina da fé, Decl.
Dominus Iesus, n. 16: AAS 92 (2000), 757: “a plenitude do mistério salvífico de
Cristo pertence também à Igreja, unida de modo inseparável ao seu Senhor”.
[46]
Paulo VI, Alocução de quarta-feira (8 de Junho de 1966): Insegnamenti di Paolo
VI, IV (1966), 794.
[47]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 1.
[48] II
Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo Dos Bispos, Ecclesia sub Verbo
mysteria Christi celebrans pro salute mundi. Relatio finalis (7 de dezembro de
1985), II, C, 1: Enchiridium Vaticanum, 9, 1800; cf. Congregação para a
doutrina da fé, Carta Communionis notio (28 de maio de 1992), nn. 4-5: AAS 85
(1993), 839-841.
[49]
Cf. Bento XVI, Exort. apost. Verbum Domini (30 de setembro de 2010), n. 54: AAS
102 (2010), 733-734; Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 174: AAS
105 (2013), 1092-1093.
[50]
Cf. Basílio de Cesareia, De Spiritu Sancto, 26: PG 32, 181.
[51]
J.H. Newman, Sermons Bearing on Subjects of the Day, London, 1869, 132.
[52]
Cf. o que se afirma paradigmaticamente para a vida consagrada por João Paulo
II, Audiência geral (28 de setembro de 1994), 5: Insegnamenti di Giovanni Paolo
II, XVII, 2 (1994), 404-405.
[53]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 7.
[54]
Ibid., n. 21.
[55]
Ibid.
[56]
Ibid.
[57]
Basílio de cesareia, De Spiritu Sancto, 16, 38: PG 32, 137.
[58]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 28.
[59]
Id., Decr. Presbyterorum ordinis, nn. 2, 3.
[60]
Id., Const. dogm. Lumen gentium, n. 29.
[61]
Ibid., n. 12.
[62]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. Gaudium et spes, nn. 4, 11.
[63]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici, n. 24: AAS 81 (1989), 434.
[64]
Cf. ibid., n. 29: AAS 81 (1989), 443-446.
[65]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 12.
[66]
João Paulo II, Audiência geral (9 de março de 1994), n. 6: Insegnamenti di
Giovanni Paolo II, XVII, 1 (1994), 641.
[67]
Cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 799s; Congregação para os Religiosos e os
Institutos Seculares – Congregação para os Bispos, Notas directivas Mutuae
relationes, n. 51: AAS 70 (1978), 499-500; João Paulo II, Exort. apost. Vita
consecrata, n. 48: AAS 88 (1996), 421-422; Id., Audiência geral (24 de junho de
1992), n. 6 Insegnamenti di Giovanni Paolo II, XV, 1 (1992), 1935-1936.
[68]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, nn. 39-42; João Paulo II,
Exort. apost. Christifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989), 446.
[69]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 130: AAS 105 (2013), 1074.
[70]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989), 447;
cf. Paulo VI, Exort. apost. Evangelii nuntiandi, n. 58: AAS 68 (1976), 49.
[71]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989),
446-447.
[72]
Francisco, Homilia na Solenidade de Pentecostes com os Movimentos, as Novas
Comunidades, as Associações e as Agregações laicais (19 de maio de 2013):
Insegnamenti di Francesco, I, 1 (2013), 208.
[73]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989), 447;
cf. Paulo VI, Exort. apost. Evangelii nuntiandi, n. 58: AAS 68 (1976), 48.
[74]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici,n. 30: AAS 81 (1989), 447.
[75]
Ibid.: AAS 81 (1989), 448.
[76]
Cf. Ibid.: AAS 81 (1989), 447.
[77]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 130: AAS 105 (2013), 1074-1075.
[78]
Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares – Congregação para os
Bispos, Notas Directivas Mutuae relationes, n. 12: AAS 70 (1978), 480-481; Cf.
João Paulo II, Discurso aos pertencentes aos movimentos eclesiais e às novas
comunidades na vigília de Pentecostes (30 de maio de 1998), n. 6; Insegnamenti
di Giovanni Paolo II, XXI, 1 (1998), 1122.
[79]
Paulo VI, Exort. apost. Evangelii nuntiandi, n. 58: AAS 68 (1976), 48.
[80]
Ibid.; cf. Francisco, Exort. Apost. Evangelii gaudium, nn. 174-175: AAS 105
(2013), 1092-1093.
[81]
João Paulo II, Exort. apost. Chistifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989), 448.
[82]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 177: AAS 105 (2013), 1094.
[83]
João Paulo II, Exort. apost. Christifideles laici, n. 30: AAS 81 (1989), 448.
[84]
Ibid.
[85]
Cf. Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, nn. 184, 221: AAS 105 (2013),
1097, 1110-1111.
[86]
Ibid., n. 186: AAS 105 (2013), 1098.
[87]
Cf. Congregação para a doutrina da fé, Carta Communionis notio, n. 7: AAS 85
(1993), 842.
[88]
Ibid., n. 9: AAS 85 (1993), 843.
[89]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 23.
[90]
Id., Decr. Christus Dominus, n. 11.
[91]
Cf. Ibid., 2; Congregação para a doutrina da fé, Carta Communionis notio, nn.
13-14, 16: AAS 85 (1993), 846-848.
[92]
Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Chistus Dominus, n. 11.
[93]
Cf. Ibid., 35; Código de Direito Canónico, can. 591; Código dos Cânones das
Igrejas Orientais, can. 412, § 2; Congregação para os Religiosos e os
Institutos Seculares – Congregação para os Bispos, Notas Directivas Mutuae
relationes, n. 22: AAS 70 (1978), 487.
[94]
Cf. Congregação para a doutrina da fé, Carta Communionis notio, n. 15: AAS 85
(1993), 847.
[95]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, n. 8; Catecismo da Igreja
Católica, nn. 888-892.
[96]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, n. 8.
[97]
Id., Const. dogm. Lumen gentium, n. 10.
[98]
João Paulo II, Exort. apost. Pastores gregis (16 de outubro de 2003), n. 10:
AAS 96 (2004), 838.
[99]
Cf. Id., Exort. apost. Christifideles laici, n. 29: AAS 81 (1989), 443-446.
[100]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 10.
[101]
Id., Const. past. Gaudium et spes, n. 52; cf. João Paulo II, Exort. apost.
Familiaris consortio (22 de novembro de 1981), n. 72: AAS 74 (1982), 169-170.
[102]
Cf. João Paulo II, Exort. apost. Pastores dabo vobis (25 de março de 1992), n.
68: AAS 84 (1992), 777.
[103]
Cf. ibid., nn. 31, 68: AAS 84 (1992), 708-709, 775-777.
[104]
Cf. Código de Direito Canónico, can. 265; Código dos Cânones das Igrejas Orientais,
can. 357, § 1.
[105]
Cf. Código de Direito Canónico, can. 273; Código dos Cânones das Igrejas
Orientais, can. 370.
[106]
Cf. Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares – Congregação para
os Bispos, Notas directivas Mutuae relationes, nn. 19, 34: AAS 70 (1978),
485-486, 493.
[107]
João Paulo II, Exort. apost. Vita consecrata, n. 31: AAS 88 (1996), 404-405.
[108]
Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 43.
[109]
Ibid., 44; cf. Decr. Perfectae caritatis, n. 5; João Paulo II, Exort. apost.
Vita consecrata, nn. 14, 30: AAS 88 (1996), 387-388, 403-404.
[110]
Cf. Código de Direito Canónico, can. 307 § 3; Código dos Cânones das Igrejas
Orientais, can. 578, § 3.
[111]
Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e sociedades de vida
apostólica, Instr. Partir de Cristo (19 de maio de 2002), n. 30: Enchiridion
Vaticanum, 21, 472.
[112]
Cf. João Paulo II, Exort. apost. Pastores dabo vobis, nn. 27-30: AAS 84 (1992),
700-707.
[113]
Cf. Paulo VI, Carta enc. Sacerdotalis caelibatus (24 de junho de 1967): AAS 59
(1967), 657-697.
[114]
Bento XVI, Exort. apost. Sacramentum caritatis, n. 24: AAS 99 (2007), 124.
[115]
Cf. João Paulo II, Exort. apost. Pastores dabo vobis, n. 29: AAS 84 (1992),
703-705; Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Presbyterorum ordinis, n. 16.
[116] A
forma jurídica mais simples para o reconhecimento das realidades eclesiais de
natureza carismática é ainda hoje a da Associação privada de fiéis (cf. Código
de Direito Canónico, cann. 321-326; Código dos Cânones das Igrejas Orientais,
cann. 573, § 2 – 583). No entanto, devem considerar-se atentamente também
outras formas jurídicas com as suas características específicas próprias, como,
por exemplo, as Associações públicas de fiéis (cf. Código de Direito Canónico,
cann. 312-320; Código dos Cânones das Igrejas Orientais, cann. 573, § 1 – 583),
as Associações de fiéis “clericais” (cf. Código de Direito Canónico, can. 302),
os Institutos de vida consagrada (cf. Código de Direito Canónico, cann.
573-730; Código dos Cânones das Igrejas Orientais, cann. 410-571), as
Sociedades de vida apostólica (cf. Código de Direito Canónico, cann. 731-746;
Código dos Cânones das Igrejas Orientais, can. 572) e as Prelaturas pessoais
(cf. Código de Direito Canónico, cann. 294-297).
[117]
Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 62.
[118]
Francisco, Exort. apost. Evangelii gaudium, n. 287: AAS 105 (2013), 1136.
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