Deturparam Marx – Aprenda a Refutar essa Falácia - Deturparam
Adam Smith, também
(Por: Paulo Antonio
Papini)
Sabe quando seu
amigo/professor universitário marxista, ou outra pessoa que tem certa
Autoridade Intelectual, lhe diz que:
“O verdadeiro socialismo/marxismo nunca existiu!”
Pois bem, não aceite
esse argumento. Explicaremos o porquê de não podermos acatar esse argumento
que, em
verdade, não passa de um sofisma [muito mal elaborado]. Sempre que
discutimos com um marxista/socialista e o confrontamos com dados concretos
como:
a)-Cubanos que fogem,
arriscam suas vidas num mar infestado por tubarões para ir [fugir] para
Miami[1].
b)-Holodomor, ou o
Holocausto Ucraniano [mais de 5.000.000 de pessoas foram mortas de fome em
razão de uma política de extermínio populacional da URSS[2]].
c)-A própria
existência do Muro de Berlim (Capitalistas constroem pontes, para irmos até eles, pois todos ganham e as riquezas aumentam. Comunistas constroem muros, para que ninguem saia dele).
d)- Os Gulags da
antiga União Soviética[3] (Campos de trabalho forçado da ex-União Soviética (URSS), criados após a Revolução Comunista de 1917 para abrigar os "inimigos” do Estado)
e)- A existência de
Campos de Concentração na Coreia do Norte onde o sistema penal prevê que os
filhos, na ausência/morte dos pais, os filhos devem substitui-los no cumprimento
da Pena[4], dentre outras atrocidades que somente o socialismo pôde proporcionar
à humanidade [Revolução Cultural na China, genocídio no Cambodja, perseguição a
homossexuais em Cuba, para ficar nos casos mais óbvios]; eles [os
socialista-marxistas] nos dão a seguinte resposta que justificaria todo esse
rol de atrocidades:
“Deturparam Marx e Engels”
Quando dizem que
Deturparam Marx e Engels estão, na verdade, a dizer que o verdadeiro socialismo
jamais fora implementado razão pela qual as experiências supracitadas não
poderiam ser rotuladas como “o verdadeiro socialismo”.
Será mesmo? Será que devemos aceitar esse sofisma?!
Óbvio que não, em hipótese alguma. Explicamos: talvez o marxismo ideal
nunca tenha existido. Da mesma forma, o Capitalismo
ideal preconizado por Adam Smith[5] também nunca existiu. O modelo ideal de
capitalismo prevê a Mão Invisível do Mercado para que os empresários mais
qualificados compitam entre si e sempre aprimorem seus produtos.Ocorre,
que na prática isso não necessariamente ocorre.
Nos EUA, Preston
Tucker desenvolvera, em fins dos anos 40 do Século XX, um veículo
revolucionário[6]. O que ocorreu: as grandes montadoras, Chrysler, Ford e General Motors
uniram-se entre si e ao governo para, através de processos e manobras
políticas, sufocar aquele fabricante, que acabou abrindo processo
falimentar[7]. No Brasil temos os
casos de Gurgel[8] e Engesa. No
Brasil, temos ainda o próprio sistema bancário a servir como exemplo. Nosso
sistema bancário é altamente regulamentado de forma que seja, em termos
práticos, dificílima a criação/entrada de novos players no mercado financeiro[9].
Por exemplo, no Brasil é permitido aos Bancos cobrarem juros compostos
[de forma quase ilimitada], empréstimos que muitas vezes chegam aos 400% ao
ano. Pois bem, dentro de um cenário altamente regulamentado é proibido, pela
Lei de Usura[10], a um cidadão emprestar o próprio dinheiro, ainda que a taxas
muito menores, a terceiros.
Lembrando que o
cidadão normalmente emprestaria dinheiro próprio a terceiros e os Bancos, por
seu turno, trabalham com dinheiro alheio [o meu, o seu, etc].
Ora, com efeito, Adam Smith[11] quando “desenhou” o capitalismo ele
certamente não imaginara um sistema onde empresários ineficientes e corruptos
pudessem associar-se ao Governo para impedir inovações tecnológicas (ou para
emprestar juros absurdos à sociedade). Certamente que ele não acordou sua casa
em Edimburgo, em algum momento do Século XVIII e
pensou: “puxa, vou bolar um sistema que privilegie empresários ineficientes em
detrimento daqueles que podem gerar riqueza à sociedade!” Não,
certamente que não.
A grande verdade é que sistemas ideais só existem na
imaginação humana, razão pela qual normalmente sistemas ideais são chamados de
“utopias”.
Ocorre que, mesmo sem o mundo jamais ter vivido um “capitalismo ideal” o
fato é que este modo de produção político-econômico-social gerou, e continua a
gerar, no mundo um certo grau de prosperidade.
Basta analisarmos,
por exemplo, que mesmo num país onde a cartelização da economia é grande, sim,
estamos falando do Brasil a obesidade é um problema de saúde mais grave que a
subnutrição[12] (ao passo que, em nosso vizinho socialista, a Venezuela exista
hoje uma crise de falta de alimentos[13]).
Em suma, o que queremos dizer é que, se por um lado, deturparam Marx e
Engels; por outro, também deturparam Smith e Mises. Noutras palavras, a Mão
Invisível do Mercado nunca existiu na plenitude proposta por Adam Smith.
Contudo, como já
dissemos alhures, com todas essas mazelas e vícios intrínsecos, o
capitalismo-liberal funciona e gera um considerável grau de prosperidade nas
sociedades onde é implementado, algo que nunca ocorreu com os países que
implementaram o socialismo.
REFERÊNCIAS
[1] E essa rota de
fuga nunca se dá em sentido inverso.
[2] Para saber mais
ver as seguintes referências:
1)http://historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/holodomor.htm;
2) https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1046;
3)
http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/holodomor.htm
[3]http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/holodomor.htm
[4] Sobre este tema
vale a leitura de: Fuga do Campo 14.
[5] E já no século XX
por Mises e Hayek.
[6] Chamado Torpedo.
[7] Para saber mais:
Tucker, um homem e seu sonho
-https://www.youtube.com/watch?v=xK3rWU1C-dE
-http://americanhistory.si.edu/blog/preston-tuckers-sedan-showcasing-beautiful-business-failure
[8] Para saber mais:
Gurgel. Uma história de Fibra. https://www.youtube.com/watch?v=ygElODwFsHU
[9] Em termos
práticos temos 5 Bancos que dominam o mercado brasileiro, que gera um
fortíssimo Cartel. São eles: Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa
Econômica Federal.
[10] Decreto-lei
22626/1933.
[11] Que poucos
sabem, mas também era jurista.
[12]
https://www.endocrino.org.br/numeros-da-obesidade-no-brasil/
[13] Para saber mais:
-http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/12/1944435-enquanto-venezuela-entra-em-colapso-as-criancas-estao-morrendo-de-fome.shtml
e
-http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2017-09/desnutricao-atinge-355-das-criancas-po...
Quem foi Adam Smith?
Adam Smith
(Kirkcaldy, 5 de junho de 1723 – Edimburgo, 17 de julho de 1790) foi um
filósofo e economista britânico nascido na Escócia. Teve como cenário para a
sua vida o atribulado “Século das Luzes”, o século XVIII. É o pai da economia moderna, e é
considerado o mais importante teórico do liberalismo econômico. Autor de Uma
Investigação sobre a Natureza e a Causa da Riqueza das Nações, a sua obra mais
conhecida, e que continua sendo usada como referência para gerações de
economistas, na qual procurou demonstrar que a riqueza das nações resultava da
atuação de indivíduos que, movidos inclusive (e não apenas exclusivamente) pelo
seu próprio interesse (self-interest), promoviam o crescimento econômico e a
inovação tecnológica. Adam Smith ilustrou bem seu pensamento ao
afirmar:
"Não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro
que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu
auto-interesse".
Assim acreditava que
a iniciativa privada deveria agir livremente, com pouca ou nenhuma intervenção
governamental, sendo defensor do free banking (sistema bancário livre).A
competição livre entre os diversos fornecedores levaria não só à queda do preço
das mercadorias, mas também a constantes inovações tecnológicas, no afã de
baratear o custo de produção e vencer os competidores.Ele analisou a divisão do
trabalho como um fator evolucionário poderoso a propulsionar a economia. Uma frase
de Adam Smith se tornou famosa:
"Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas pelo seu próprio
interesse (self-interest), é levado por uma "mão invisível" a
promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da
sociedade."
Como resultado da
atuação dessa "mão invisível", o preço das mercadorias deveria descer
e os salários deveriam subir.Aos 14 anos, Smith matriculou-se na Universidade
de Glasgow, onde estudou Filosofia moral com o "inesquecível" Francis
Hutcheson.Em 1740, entrou para o Balliol College da Universidade de Oxford,
mas, como disse William Robert Scott:
"Oxford deste tempo deu-lhe pouca ajuda (se é que a deu) para o que
viria a ser a sua obra."
E acabou por abdicar
da sua bolsa em 1746. Em 1748 começou a dar aulas em Edimburgo sob o patronato
de Lord Kames. Algumas destas aulas eram de retórica e de literatura, mas mais
tarde dedicou-se à cadeira de "progresso da opulência", e foi então,
em finais dos anos 1740, que ele expôs pela primeira vez a filosofia econômica
do "sistema simples e óbvio da liberdade natural" que ele viria a
proclamar na sua Investigação sobre a Natureza e a Causa da Riqueza das Nações.
Por volta de 1750, conheceu o filósofo David Hume, que se tornou um dos seus
mais próximos amigos.
Smith também era amigo de Edmund Burke — o filósofo que viria a ser
conhecido como o "pai do conservadorismo moderno" — que inclusive fez
resenhas elogiosas de suas duas grandes obras, A Riqueza das Nações e Teoria sobre
os Sentimentos Morais.
Em 1751, Smith foi
nomeado professor de Lógica na Universidade de Glasgow, passando, no ano
seguinte, a dar a cadeira de filosofia moral.Nas suas aulas, cobria os campos
da ética, retórica, jurisprudência e política econômica ou ainda "política
e rendimento". O
economista e filósofo Adam Smith, celibatário, foi viver com sua mãe seus
derradeiros anos em Edimburgo, onde morreu em 17 de julho de 1790, depois de
uma dolorosa doença.
As falhas, incoerências e falácias do arcabouço intelectual de Karl Marx
(Por: Eugen von Böhm-Bawerk)
O principal trabalho
teórico de Marx é sua grande obra em três volumes, sobre o capital. Os
fundamentos de sua teoria da exploração estão expostos no primeiro destes
volumes, o único a ser publicado em vida do autor em 1867. O segundo, editado postumamente por Engels,
em 1885, está em total harmonia com o primeiro, quanto ao conteúdo. Menos
harmônico é sabidamente o terceiro volume, publicado novamente após um
intervalo de vários anos, em 1894. Muitas pessoas, entre elas o autor
destas linhas, acreditam que o conteúdo do terceiro volume seja incompatível
com o do primeiro, e vice-versa. Mas, como o próprio Marx não admitiu isso e,
ao contrário, também no terceiro volume exigiu que se considerassem totalmente
válidas as doutrinas do primeiro, a crítica deve considerar as teses expostas
nesse primeiro livro expressão da verdadeira e permanente opinião de Marx. Mas
é igualmente válido — e necessário — abordar no momento adequado as doutrinas
do terceiro volume, como ilustração e crítica.
A teoria de Marx sobre o valor
Marx parte do principio de que o
valor de toda mercadoria depende unicamente da quantidade de trabalho empregada
em sua produção. Marx coloca este
princípio no ápice de sua teoria, dedicando-lhe uma explicação extensa. O campo de pesquisa que Marx se propõe a
examinar para entender a origem do valor dos bens fica limitado originalmente
às mercadorias, o que, para Marx, não significa todos os bens econômicos,
mas apenas os produtos de trabalho criados para o mercado.
Ele começa com uma análise da mercadoria
A mercadoria é, por um lado, uma coisa útil cujas qualidades satisfazem algum tipo de necessidade humana, um valor de uso; por outro, constitui o suporte material do valor de troca. A análise passa agora para este último. O valor de troca aparece de imediato como a relação quantitativa, a proporção na qual valores de uso de um tipo se trocam com valores de uso de outro tipo, relação essa que muda constantemente, conforme tempo e lugar. Portanto, parece ser algo casual. Mas nessa troca deveria haver algo de permanente, que Marx trata de pesquisar. E faz isso na sua conhecida maneira dialética:
Tomemos duas mercadorias, por
exemplo, trigo e ferro. Seja qual for a
sua relação de troca, pode-se representá-la sempre numa
equação segundo a qual uma quantidade dada de trigo é igualada a uma quantidade
de ferro, p. ex., um moio de trigo x quintais de ferro. O que
significa essa equação? Que existe algo de comum, do mesmo tamanho, em duas
coisas diferentes, ou seja, em um moio de trigo e x quintais de ferro.
Portanto, as duas coisas se equiparam a uma terceira, que em si não é nem uma
nem outra. Cada uma das duas, portanto, na medida em que tem valor de troca,
deve ser reduzível a essa terceira.
Dialética do valor em Marx
Esse elemento comum
não pode ser uma característica métrica, física, química, ou outra
característica natural das mercadorias. Suas características corporais, aliás,
só entram em consideração na medida em que as tornam úteis, e são, portanto, valores
de uso. Mas, por outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente
se caracteriza por se abstrair dos valores de uso dessas mercadorias. Segundo
ela, o valor de uso vale tanto quanto qualquer outro, desde que apareça na
proporção adequada. Ou, como diz o velho Barbon:
... Um tipo de mercadoria é tão bom quanto outro, quando seu valor de troca
for igual. Não existe distinção entre coisas do mesmo valor de troca.Como
valores de uso, as mercadorias são principalmente de qualidades diferentes,
como valores de troca só podem ser de quantidades diferentes e, portanto, não
contêm um átomo sequer de valor de uso. Abstraindo o valor de uso das
mercadorias, elas guardam ainda uma característica, a de serem produtos de
trabalho. No entanto, também o produto de trabalho já se transformou em nossas
mãos. Se abstrairmos o seu valor de uso, também estaremos abstraindo os
elementos e formas corporais que o tornam valor de uso. Não se trata mais de
mesa, ou casa, ou fio, ou outra coisa útil. Todas as suas características
sensoriais estão apagadas. Ele também já não é o produto da marcenaria, ou da
construção, ou da tecelagem, ou de qualquer trabalho produtivo. Com o caráter
utilitário dos produtos de trabalho, desaparece o caráter utilitário dos
trabalhos neles efetuados, e somem também as diversas formas concretas desses
trabalhos. Eles já não se distinguem entre si [p.283]: reduziram-se todos ao
mesmo trabalho humano, trabalho humano abstrato.
Consideremos agora o que restou dos produtos de trabalho
Nada resta deles senão aquela
mesma objetualidade espectral, mera gelatina de trabalho humano indistinto, ou
seja, o gasto de forças de trabalho humanas sem consideração pela forma desse
dispêndio. Essas coisas apenas nos dizem que na sua produção se gastou força de
trabalho humano, se acumulou trabalho humano. Como cristais dessa substancia
social comum, eles são valores.
Assim se define e se determine o conceito de valor
Segundo a teoria
dialética, ele não é idêntico ao valor de troca, mas relaciona-se com ele de
maneira íntima e inseparável: ele é uma espécie de destilado conceitual do
valor de troca. Para usar as palavras do próprio Marx, ele é "a parte comum que
aparece na relação de troca ou valor de troca das mercadorias". O reverso é igualmente válido: "o valor
de troca é a expressão necessária ou a manifestação do valor".
O "tempo de trabalho socialmente necessário" de
Marx
Marx passa da
determinação do conceito de valor para a exposição de sua medida e
grandeza. Como o trabalho é a substância do
valor, consequentemente a grandeza do valor de todos os bens se mede pela
quantidade de trabalho neles contido, ou seja, pelo tempo de trabalho. Mas não aquele tempo de trabalho individual,
que aquele indivíduos que produziu o bem casualmente precisou gastar, mas o
"tempo de trabalho necessário para produzir um valor de uso, nas condições
sociais normais de produção disponíveis, e com o grau de habilidade e
intensidade do trabalho possíveis nessa sociedade".
Só a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o tempo de
trabalho socialmente necessário para produzir um valor de uso é que determina o
seu valor.
A mercadoria isolada
vale aqui como exemplo médio da sua espécie. Mercadorias contendo igual
quantidade de trabalho, ou que podem ser produzidas no mesmo tempo de trabalho,
têm por isso o mesmo valor. O valor de uma mercadoria relaciona-se com o valor
de outra mercadoria, da mesma forma que o tempo de trabalho necessário para a
produção de uma delas se relaciona com o tempo de trabalho necessário para a produção
da outra. Como valores, todas as mercadorias são apenas medidas de tempo de
trabalho cristalizado.
A "lei do valor" de Marx
De tudo isso,
deduz-se o conteúdo da grande "lei de valor", que é "imanente à
troca de mercadorias" e que domina as condições de troca. Essa lei significa — e só pode significar —
que as mercadorias se trocam entre si segundo as condições de trabalho médio,
socialmente necessário, incorporado nelas.
Há outras formas de expressão da mesma lei: nas palavras de Marx, as
mercadorias "se trocam entre si conforme seus valores" ou
"equivalente se troca com equivalente".
É verdade que, em
casos isolados, segundo oscilações momentâneas de oferta e procura, também
aparecem preços que estão acima ou abaixo do valor. Só que essas "constantes oscilações dos
preços de mercado (...) se compensam, se equilibram mutuamente e se reduzem ao
preço médio, que é sua regra interna".
Porém, no longo prazo, "nas relações de troca casuais e sempre
variáveis", "o tempo de trabalho socialmente necessário acaba sempre
se impondo à força, como lei natural imperante".
Marx considera essa lei como sendo a "eterna lei de troca de
mercadorias", como "racional", como "a lei natural do
equilíbrio".
Os casos eventuais em
que mercadorias são trocadas a preços que se desviam do seu valor são
considerados "casuais" em relação à regra, e os próprios desvios
devem ser vistos como "infração da lei de troca de mercadorias".
A "mais-valia" de Marx
Sobre essa base da
teoria do valor, Marx ergue a segunda parte de sua doutrina, a sua famosa
doutrina da mais-valia. Ele examina a
origem dos ganhos extraídos pelos capitalistas dos seus capitais. Os capitalistas tomam determinada soma em
dinheiro, transformam-na em mercadorias, e, por meio da venda, transformam as
mercadorias em mais dinheiro — com ou sem um processo intermediário de
produção. De onde vem esse incremento,
esse excedente da soma de dinheiro obtida em relação à soma originalmente
aplicada, ou, como diz Marx, essa mais-valia"? Marx começa limitando as
condições do problema, na sua peculiar maneira de exclusão dialética. Primeiro, ele explica que a mais-valia não
pode vir do fato de que o capitalista, como comprador, compra as mercadorias
regularmente abaixo do seu valor e, como vendedor, regularmente as vende acima
do seu valor. Portanto, o problema é o
seguinte:
"Nosso ( ... ) dono do dinheiro tem de comprar as mercadorias pelo
seu valor, e vendê-las pelo seu valor, mas, mesmo assim, no fim do processo,
tem de extrair delas um valor mais alto do que o que nelas aplicou. . . Essas são as condições do problema. Hic
Rhodus, hic salta!" [Aqui é Rodes, então salte aqui!" (N. do T.)]
Marx encontra a
solução dizendo que existe uma mercadoria cujo valor de uso tem a singular
faculdade de ser uma fonte de valor de troca.
Essa mercadoria é a 'capacidade de trabalho', ou seja, a força de
trabalho. Ela é posta à venda no mercado
sob dupla condição: a primeira, de que o trabalhador seja pessoalmente livre —
caso contrário não seria a força de trabalho o que ele estaria vendendo, mas
ele próprio, sua pessoa, como escravo; e a segunda, de que o trabalhador seja
destituído "de todas as coisas necessárias para a realização de sua força
de trabalho", pois, se delas dispusesse, ele preferiria produzir por conta
própria, pondo à venda seus produtos, em vez de sua força de trabalho.
Pela negociação com essa mercadoria, o capitalista obtém
a mais-valia. O processo se dá da seguinte forma:
O valor da mercadoria
"força de trabalho" depende, como o de qualquer outra mercadoria, do
tempo de trabalho necessário para sua produção, o que, nesse caso, significa
que depende do tempo de trabalho necessário para produzir todos os alimentos
que são indispensáveis à subsistência do trabalhador. Se, por exemplo, para os alimentos
necessários para um dia for preciso um tempo de trabalho de seis horas, e se
esse tempo de trabalho corporificar três moedas de ouro, a força de trabalho de
um dia poderia ser comprada por três moedas de ouro. Caso o capitalista tenha
efetuado essa compra, o valor de uso da força de trabalho lhe pertence, e ele a
concretiza fazendo o trabalhador trabalhar para ele. Se o fizesse trabalhar apenas as horas
diárias corporificadas na força de trabalho pelas quais ele teve de pagar
quando comprou essa força de trabalho (seis horas), não existiria a mais-valia.
Ou seja, as seis horas de
trabalho não podem atribuir ao produto em que elas se corporificam mais do que
três moedas, uma vez que foi isso que o capitalista pagou como salário. Contudo, os capitalistas não agem dessa
maneira. Mesmo que tenham comprado a
força de trabalho por um preço que corresponde só a seis horas de trabalho,
fazem o trabalhador trabalhar o dia todo.
Então, no produto criado durante esse dia, se corporificam mais horas de
trabalho do que as que o capitalista pagou, o que faz o produto ter valor mais
elevado do que o salário pago. A diferença é a "mais-valia", que fica
para o capitalista.
Tomemos um exemplo:
Suponhamos que um
trabalhador possa tecer em seis horas cinco quilos de algodão em fio, com o
valor de três moedas. Suponhamos,
também, que esse algodão tenha custado vinte horas de trabalho para ser
produzido e que, por isso, tem um valor de dez moedas; suponhamos, ainda, que o
capitalista tenha despendido, por meio de sua máquina de tecer utilizada para
estas seis horas de tecelagem, o correspondente a quatro horas de trabalho, que
representam um valor de duas moedas. Assim, o valor total dos meios de produção
consumidos na tecelagem (algodão + máquina de tecer) equivalerá a doze moedas,
correspondentes a vinte e quatro horas de trabalho. Se acrescentarmos a isso as seis horas do
trabalho de tecelagem, o tecido pronto será pois, no total, produto de trinta
horas de trabalho, e terá, por isso, valor de quinze moedas. Se o capitalista deixar o trabalhador
trabalhar apenas seis horas por dia, a produção do fio vai custar-lhe 15
moedas: 10 pelo algodão, 2 pelo gasto dos instrumentos, 3 em salário. Não existe mais-valia.
Muito diferente
seriam as circunstâncias se este mesmo capitalista fizesse o trabalhador
cumprir 12 horas diárias. Nestas 12 horas, o trabalhador processaria 10 quilos
de algodão, nos quais já teriam sido corporificadas, anteriormente, 40 horas de
trabalho, com um valor de 20 moedas. Os
instrumentos teriam consumido o produto de 8 horas de trabalho, no valor de 4
moedas, mas o trabalhador acrescentaria ao material bruto um dia de 12 horas de
trabalho, ou seja, faria surgir um valor adicional de 6 moedas. As despesas do capitalista — 20 moedas pelo
algodão, 4 moedas pelo gasto dos instrumentos, e 3 pelo salário — somariam
apenas 27 moedas. Iria, então, sobrar
uma "mais-valia" de 3 moedas.
Portanto, para Marx, a mais-valia é uma consequência do fato de o
capitalista fazer o trabalhador trabalhar para ele sem pagamento durante uma
parte do dia.
O dia de trabalho se
divide, assim, em duas partes: na primeira, o "tempo de trabalho
necessário", o trabalhador produz seu próprio sustento, ou o valor deste;
por essa parte do trabalho, ele recebe o equivalente em forma de salário. Durante a segunda parte, o "superávit em
tempo de trabalho", ele é "explorado", e produz a
"mais-valia", sem receber qualquer equivalente por ela. Portanto, o
capital não é apenas controle sobre o trabalho, como diz Adam Smith. É essencialmente controle sobre o trabalho
não-pago. Toda a mais-valia, seja qual
for a forma em que vá se cristalizar mais tarde — lucro, juro, renda etc. — é,
substancialmente, materialização de trabalho não pago. O segredo da autovalorização do capital
reside no controle que exerce sobre determinada quantidade de trabalho alheio
não pago.
Marx escolheu um método de análise defeituoso
Alguém que busque uma verdadeira fundamentação da tese em questão poderá
encontrá-la por meio de dois caminhos naturais: o empírico e o
psicológico.
O primeiro caminho
nos leva a simplesmente examinar as condições de troca entre mercadorias,
procurando ver se nelas se espelha uma harmonia empírica entre valor de troca e
gasto de trabalho. O outro — com uma
mistura de indução e dedução muito usada em nossa ciência — nos leva a analisar
os motivos psicológicos que norteiam as pessoas nas trocas e na determinação de
preços, ou em sua participação na produção.
Da natureza dessas condições de troca poderíamos tirar conclusões sobre
o comportamento típico das pessoas.
Assim, descobriríamos, também, uma relação entre preços regularmente
pedidos e aceitos, de um lado, e a quantidade de trabalho necessária para
produzir mercadorias de outro. Mas
Marx não adotou nenhum desses dois métodos naturais de investigação. É muito interessante constatar, em seu
terceiro volume, que ele próprio sabia muito bem que nem a comprovação dos
fatos nem a análise dos impulsos psicológicos que agem na
"concorrência" teriam bom resultado para a comprovação de sua tese.Marx
opta por um terceiro caminho de comprovação, aliás, um caminho bastante
singular para esse tipo de assunto: a prova puramente lógica, uma dedução
dialética tirada da essência da troca.
Marx já havia encontrado no velho Aristóteles que "a troca não pode
existir sem igualdade, e a igualdade não pode existir sem a
comensurabilidade".
Marx adota esse
pensamento. Ele imagina a troca de duas
mercadorias na forma de uma equação, deduz que nas duas coisas trocadas —
portanto igualadas — tem de existir "algo comum da mesma grandeza", e
conclui propondo-se a descobrir o que é essa coisa em comum, à qual as coisas
equiparadas podem ser reduzidas como valores de troca.
Fatos que antecedem uma troca devem evidenciar antes
desigualdade do que igualdade
Gostaria de intercalar aqui um comentário:
Mesmo a primeira pressuposição —
a de que na troca de duas coisas existe uma "igualdade" das duas,
igualdade essa que se manifesta, o que, afinal, não significa grande coisa — me
parece um pensamento muito pouco moderno e também muito irrealista, ou, para
ser bem claro, muito precário. Onde reinam igualdade e equilíbrio perfeitos não
costuma surgir qualquer mudança em relação ao estado anterior. Por isso, quando no caso da troca tudo
termina com as mercadorias trocando de dono, é sinal de que esteve em jogo
alguma desigualdade ou preponderância que forçou a alteração. Exatamente como
as novas ligações químicas que surgem a partir da aproximação entre elementos
de corpos: muitas vezes o "parentesco" químico entre os elementos do
corpo estranho aproximado não é forte, mas é mais forte do que o
"parentesco" existente entre os elementos da composição anterior. De
fato, a moderna ciência econômica é unânime em dizer que a antiga visão
escolástico-teológica da "equivalência" de valores que se trocam é
incorreta. Mas não darei maior
importância a esse assunto, e volto-me agora ao exame crítico daquelas
operações lógicas e metódicas através das quais o trabalho termina por surgir
como aquela coisa em "comum" à qual as coisas equiparadas se poderiam
reduzir.
Método intelectual errôneo de Marx
Para a sua busca
desse algo em "comum" que caracteriza o valor de troca, Marx procede
da seguinte maneira: coteja as várias características dos objetos equiparados
na troca e, depois, pelo método de eliminação das diferenças, exclui todas as
que não passam nessa prova, até restar, por fim, uma única característica, a de
ser produto de trabalho. Conclui, então,
que seja esta a característica comum procurada.É um procedimento estranho, mas
não condenável. É estranho que, em vez
de testar a característica de modo positivo — o que teria levado a um dos dois
métodos antes comentados, coisa que Marx evitava —, ele procure convencer-se,
pelo processo negativo, de que a qualidade buscada é exatamente aquela, pois
nenhuma outra é a que ele procura, e a que ele procura tem de existir. Esse método pode levar à meta desejada quando
é empregado com a necessária cautela e integridade, ou seja, quando se tem,
escrupulosamente, o cuidado necessário para que entre realmente, nessa peneira
lógica, tudo o que nela deve entrar para que depois não se cometa engano em
relação a qualquer elemento que porventura fique excluído da peneira.
Mas como procede Marx?
Desde o começo, ele
só coloca na peneira aquelas coisas trocáveis que têm a característica que ele
finalmente deseja extrair como sendo a "característica em comum",
deixando de fora todas as outras que não a têm.
Faz isso como alguém que, desejando ardentemente tirar da urna uma bola
branca, por precaução coloca na urna apenas bolas brancas. Ele limita o campo da sua busca da substância
do valor de troca às "mercadorias".
Esse conceito, sem ser cuidadosamente definido, é tomado como mais
limitado do que o de "bens" e se limita a produtos de trabalho, em
oposição a bens naturais.
Consequentemente, fica óbvio que,
se a troca realmente significa uma equiparação que pressupõe a existência de
algo "comum da mesma grandeza", esse "algo comum" deve ser
procurado e encontrado em todas as espécies de bens trocáveis: não só nos
produtos de trabalho, mas também nos dons da natureza, como terra, madeira no
tronco, energia hidráulica, minas de carvão, pedreiras, jazidas de petróleo,
águas minerais, minas de ouro etc.[1]
Excluir, na busca do
algo "comum" que há na base do valor de troca, aqueles bens trocáveis
que não sejam bens de trabalho é, nessas circunstâncias, um pecado mortal
metodológico. É como se um físico que quisesse
pesquisar o motivo de todos os corpos terem uma característica comum, como o
peso, por exemplo, selecionasse um só grupo de corpos, talvez o dos corpos
transparentes, e, a seguir, cotejasse todas as características comuns aos
corpos transparentes, terminando por demonstrar que nenhuma das características
— a não ser a transparência — pode ser causa de peso, e proclamasse, por fim,
que, portanto, a transparência tem de ser a causa do peso.
A exclusão dos dons
da natureza (que certamente jamais teria ocorrido a Aristóteles, pai da ideia
da equiparação na troca) não pode ser justificada, principalmente porque muitos
dons naturais, como o solo, são dos mais importantes objetos de fortuna e
comércio. Por outro lado, não se pode aceitar a afirmação de que, em relação
aos dons naturais, os valores de troca são sempre casuais e arbitrários: não só
existem preços eventuais para produtos de trabalho, como também, muitas vezes,
os preços de bens naturais revelam relações nítidas com critérios ou motivos
palpáveis. É conhecido que o preço de
compra de terras constitui um múltiplo da sua renda segundo a porcentagem de
juro vigente. É também certo que, se a madeira
no tronco ou o carvão na mina obtêm um preço diferente, isso decorre da
variação de localização ou de problemas de transporte e não do mero acaso. Marx
se exime de justificar expressamente o fato de haver excluído do exame anterior
parte dos bens trocáveis. Como tantas vezes, também aqui sabe deslizar sobre
partes espinhosas de seu raciocínio com uma escorregadia habilidade dialética:
ele evita que seus leitores percebam que seu conceito de "mercadoria"
é mais estreito do que o de "coisa trocável". Para a futura limitação no exame das
mercadorias, ele prepara com incrível habilidade um ponto de contato natural,
através de uma frase comum, aparentemente inofensiva, posta no começo do seu
livro:
"A riqueza das sociedades em que reina a produção capitalista
aparece como uma monstruosa coleção de mercadorias."
Essa afirmação é
totalmente falsa se entendermos o termo "mercadoria" no sentido de
produto de trabalho, que o próprio Marx lhe confere mais tarde. Pois os bens da natureza, incluindo a terra,
são parte importante e em nada diferente da riqueza nacional. Mas o leitor desprevenido facilmente passa
por essas inexatidões, porque não sabe que mais tarde Marx usará a expressão
"mercadoria" num sentido muito mais restrito. Aliás, esse sentido
também não fica claro no que se segue a essa frase. Ao contrário, nos primeiros parágrafos do
primeiro capitulo fala-se alternadamente de "coisa", de "valor
de uso", de "bem" e de "mercadoria", sem que seja
traçada uma distinção nítida entre estes termos. "
A utilidade de uma coisa", escreve ele na p. 10, "faz dela um
valor de uso". "A mercadoria. . . é um valor de uso ou bem". Na p. 11, lemos: "o valor de troca aparece... como
relação quantitativa... na qual valores de uso de uma espécie se trocam
por valorem de uso de outra."
Note-se que aqui se
considera primordialmente no fenômeno do valor de troca também a equação 'valor
de uso = bem'. E com a frase
"examinemos a coisa mais de perto", naturalmente inadequada para
anunciar o salto para outro terreno, mais estreito, de análise, Marx
prossegue: "Uma só mercadoria, um
'moio' de trigo, troca-se nas mais diversas proporções por outros
artigos." E ainda: "tomemos
mais duas mercadorias" etc. Aliás,
nesse mesmo parágrafo ele volta até com a expressão "coisas", e logo
num trecho muito importante, em que diz que "algo comum da mesma grandeza
existe em duas coisas diferentes" (que são equiparadas na troca).
A falácia de Marx consiste em uma seleção tendenciosa de
evidências
No entanto, na p. 12,
Marx prossegue na sua busca do "algo comum" já agora apenas para o
"valor de troca das mercadorias", sem chamar a atenção, com uma
palavra que seja, para o fato de que isso estreitará o campo de pesquisa,
direcionando-o para apenas uma parcela das coisas trocáveis. Logo na página seguinte (p. 13), ele abandona
de novo essa limitação, e a conclusão, a que há pouco havia chegado para o
campo mais restrito das mercadorias, passa a ser aplicada ao círculo mais amplo
dos valores de uso dos bens. "Um valor de uso ou bem, portanto, só tem um
valor, na medida em que o trabalho humano abstrato se materializa ou se
objetiva nele!" Se, no trecho decisivo, Marx não houvesse limitado sua
pesquisa aos produtos de trabalho, mas tivesse também procurado o "algo
comum" entre os bens naturais trocáveis, ficaria patente que o trabalho
não pode ser o elemento comum. Se Marx
houvesse estabelecido essa limitação de maneira clara e expressa, tanto ele quanto
seus leitores infalivelmente teriam tropeçado nesse grosseiro erro
metodológico. Teriam sorrido desse
ingênuo artifício, através do qual se "destila", como característica
comum, o fato de "ser produto de trabalho", pesquisando num campo do
qual antes foram indevidamente retiradas outras coisas trocáveis que, embora
comuns, não são "produto do trabalho". Só seria possível lançar mão deste artifício
da maneira como o fez — ou seja, sub-repticiamente — com uma dialética ríspida,
passando bem depressa pelo ponto espinhoso da questão. Expresso minha admiração sincera pela
habilidade com que Marx apresentou de maneira aceitável um processo tão errado,
o que, sem dúvida, não o exime de ter sido inteiramente falso.
Continuemos
Por meio do artifício
acima descrito, Marx conseguiu colocar o trabalho no jogo. Através da limitação artificial do campo de
pesquisa, o trabalho se tomou a característica "comum". No entanto, além dele, há outras
características que deveriam ser levadas em conta, por serem comuns. Como afastar essas concorrentes?
Marx faz isso por meio de dois raciocínios, ambos muito
breves, e ambos contendo um gravíssimo erro de lógica
No primeiro, Marx
exclui todas as "características geométricas, físicas, químicas ou
quaisquer outras características naturais das mercadorias". Isso porque "suas características
físicas só serão levadas em conta na medida em que as tornam úteis, portanto as
transformam em valores de uso. Mas por
outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente se caracteriza
pela abstração de seus valores de uso".
Pois "dentro dela (da relação de troca) um valor de uso cabe tanto
quanto outro qualquer, desde que exista aí em proporção adequada".
O que diria Marx do argumento que segue?
Em um palco de ópera, três cantores,
todos excelentes — um tenor, um baixo e um barítono —, recebem, cada um, um salário de 20.000 moedas por ano. Se alguém perguntar qual é a circunstância
comum que resulta na equiparação de seus salários, respondo que, quando se
trata de salário, uma boa voz vale tanto quanto outra: uma boa voz de tenor
vale tanto quanto uma boa voz de baixo, ou de barítono, o que importa é que a
proporção seja adequada. Assim, por
poder ser, "aparentemente", afastada da questão salarial, a boa voz
não pode ser a causa comum do salário alto.
É claro que tal argumentação é falsa!
É igualmente claro
também que é incorreta a conclusão a que Marx chegou, e que foi por mim aqui
transcrita. As duas sofrem do mesmo
erro. Confundem a abstração de uma
circunstância em geral com a abstração das modalidades específicas nas quais
essa circunstância aparece. Em nosso
exemplo, o que é indiferente para a questão salarial é apenas a modalidade
específica da boa voz, ou seja, se se trata de voz de tenor, baixo ou
barítono. Mas não a boa voz em si.Da
mesma forma, para a relação de troca das mercadorias, abstrai-se da modalidade
específica sob a qual pode aparecer o valor de uso das mercadorias, quer sirvam
para alimentação, quer sirvam para moradia ou para roupa. Mas não se pode abstrair
do valor de uso em si. Marx
deveria ter deduzido que não se pode fazer abstração desse último, pelo fato de
que não existe valor de troca onde não há valor de uso. Fato que o próprio Marx é forçado a
reconhecer repetidamente.[2]
Mas coisa pior acontece
com o passo seguinte dessa cadeia de argumentação. "Se abstrairmos do valor de uso das
mercadorias", diz Marx textualmente, "resta-lhes só mais uma
característica: a de serem produtos de trabalho". Será mesmo?
Só mais uma característica? Acaso
bens com valor de troca não têm, por exemplo, outra característica comum, qual
seja, a de serem raros em relação à sua oferta?
Ou de serem objetos de cobiça e de procura? Ou de serem ou propriedade privada ou
produtos da natureza?
E ninguém diz melhor nem mais claramente do que o próprio Marx que as
mercadorias são produtos tanto da natureza quanto do trabalho: Marx afirma que
"as mercadorias são combinação de dois elementos, matéria-prima e
trabalho", e conclui dizendo que "o trabalho é o pai (da riqueza) e a
terra é sua mãe".
Por que, pergunto eu,
o princípio do valor não poderia estar em qualquer uma dessas características
comuns, tendo de estar só na de ser produto de trabalho? Acresce que, a favor dessa última hipótese,
Marx não apresenta qualquer tipo de fundamentação positiva. A única razão que apresenta é negativa, pois
diz que o valor de uso, abstraído, não é princípio de valor de troca. Mas essa argumentação negativa não se aplica,
com igual força, a todas as outras características comuns, que Marx ignorou? E
há mais ainda! Na mesma p. 12, em que
Marx abstraiu da influência do valor de uso no valor de troca, argumentando que
um valor de uso é tão importante quanto qualquer outro, desde que exista em
proporção adequada, ele nos diz o seguinte sobre o produto de trabalho:
Mas também o produto de trabalho
já se transformou em nossas mãos. Se
abstrairmos do seu valor de uso, abstrairemos também dos elementos materiais e
das formas que o tornam valor de uso.
Ele já não será mesa, casa ou fio, ou outra coisa útil. Todas as suas características sensoriais
serão eliminadas. Ele não será produto
de trabalho em marcenaria, construção ou tecelagem, ou outro trabalho
produtivo. O caráter utilitário dos
trabalhos corporificados nos produtos de trabalho desaparece se desaparecer o
caráter utilitário destes produtos de trabalho, da mesma forma que desaparecem
as diversas formas concretas desse trabalho: elas já não se distinguem; são
reduzidas a trabalho humano igual, a trabalho humano abstrato.
Será que se pode
dizer, de modo mais claro e explícito, que, para a relação de troca, não apenas
um valor de uso, mas uma espécie de trabalho, ou produto de trabalho,
"vale tanto quanto qualquer outro, desde que exista na proporção
adequada"?
E que se pode aplicar
ao trabalho exatamente o mesmo critério em relação ao qual Marx antes
pronunciou seu veredito de exclusão contra o valor de uso?
Trabalho e valor de uso têm, ambos, um aspecto quantitativo
e outro qualitativo
Assim como o valor de
uso é qualitativamente diverso em relação a mesa, casa ou fio, assim também são
qualitativamente diferentes os trabalhos de marcenaria, de construção ou de
tecelagem. Por outro lado, trabalhos de
diferentes tipos podem ser diferenciados em função de sua quantidade, enquanto
é possível comparar valores de uso de diferentes tipos segundo a magnitude do
valor de uso. É absolutamente
inconcebível que circunstâncias idênticas levem, ao mesmo tempo, à exclusão de
alguns elementos e à aceitação de outros!Se, por acaso, Marx houvesse alterado
a sequência de sua pesquisa, teria excluído o trabalho com o mesmo raciocínio
com que exclui o valor de uso. Com o
mesmo raciocínio com que premiou o trabalho, proclamaria, então, que o valor de
uso, por ser a única característica que restou, é aquela característica comum
tão procurada. A partir daí poderia
explicar o valor como uma "cristalização do valor de uso".
Creio que se pode
afirmar, não em tom de piada, mas a sério, que nos dois parágrafos da p. 12
onde se abstrai, no primeiro, a influência do valor de uso e se demonstra, no
segundo, que o trabalho é o "algo comum" que se buscava, esses dois
elementos poderiam ser trocados entre si sem alterar a correção lógica
externa. E que, sem mudar a estrutura da
sentença do primeiro parágrafo, se poderia substituir "valor de uso"
por "trabalho e produtos de trabalho", e na estrutura da segunda
colocar, em lugar de "trabalho", o "valor de uso"!
Assim é a lógica e o método com que Marx introduz em seu sistema o
princípio fundamental de que o trabalho é a única base do valor.
Julgo totalmente
impossível que essa ginástica dialética fosse a fonte e a real justificativa da
convicção de Marx. Um pensador da sua categoria — e considero-o um pensador de
primeiríssima ordem —, caso desejasse chegar a uma convicção própria,
procurando com olhar imparcial a verdadeira relação das coisas, jamais teria
partido por caminhos tão tortuosos e antinaturais. Seria impossível que ele tivesse, por mero e
infeliz acaso, caído em todos os erros lógicos e metodológicos acima descritos,
obtendo, como resultado não conhecido nem desejado, essa tese do trabalho como
única fonte de valor.Creio que a situação real foi outra.
Não duvido de que Marx estivesse
sinceramente convencido de sua tese. Mas os motivos de sua convicção não são
aqueles que estão apresentados em seus sistemas. Ele
acreditava na sua tese como um fanático acredita num dogma. Sem dúvida, foi dominado por ela por causa
das mesmas impressões vagas, eventuais, não bem controladas pelo intelecto, que
antes dele já tinham desencaminhado Adam Smith e David Ricardo, e sob
influência dessas mesmas autoridades.
E ele, certamente, jamais alimentou a menor dúvida quanto à correção
dessa tese. Seu princípio tinha, para
ele próprio, a solidez de um axioma. No
entanto, ele teria de prová-lo aos leitores, o que não conseguiria fazer nem
empiricamente nem segundo a psicologia que embasa a vida econômica.
Voltou-se, então, para essa especulação lógico-dialética
que estava de acordo com sua orientação intelectual
E trabalhou, e revolveu os pacientes concertos e premissas, com uma
espécie de admirável destreza, até obter realmente o resultado que desejava e
que já de antemão conhecia, na forma de uma conclusão externamente honesta.
Conforme vimos acima,
Marx teve pleno sucesso nessa tentativa de fundamentar
convincentemente sua tese, enveredando pelos caminhos da dialética.
Mas será que teria obtido algum amparo se tivesse seguido aqueles caminhos
específicos que evitou, ou seja, o empírico e o psicológico?
REFERÊNCIAS:
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[1] Karl Knies objeta
com muito acerto contra Marx: "Na exposição de Marx não há nenhum motivo
pelo qual a equação 1 "moio" de trigo = x quintais de madeira
produzida na floresta não permita uma segunda equação, também válida, que diga:
1 "moio" de trigo = w quintais de madeira virgem = y acres de terra
virgem = z acres de terra cultivada com prados naturais." (Das Geld, Iª
ed. p. 121;1 2ª ed p. 157).
[2] Por exemplo, na
p. 15, final: "Por fim, nenhuma coisa pode ter valor sem ser objeto de
uso. Se for inútil, o trabalho nela contido será inútil, não valerá como
trabalho (sic!), e por isso não constituirá valor."Já Karl Knies chamara
atenção para o erro lógico do texto. Veja-se Das Geld, Berlim, 1873, p. 123 ss.
(2ª ed. p. 160 ss). Estranhamente, Adler (Grundlagen der Karl Marxschen Kritik,
Tübingen, 1887, p. 211 ss) entendeu mal meu argumento, quando me censura
dizendo que "boas vozes" não são mercadorias no sentido marxista.
Para mim, não se tratava de considerar "boas vozes" como bens
econômicos, segundo a lei marxista de valor, mas sim de dar o exemplo de um
silogismo que revela o mesmo erro de Marx. Eu poderia muito bem escolher outro
exemplo, que não tivesse nenhuma relação com o terreno econômico. Por exemplo,
poderia ter demonstrado que, segundo a lógica marxista, o "algo
comum" está em haver colorido em sabe-Deus-o-quê, mas não em haver uma
mistura de várias cores. Pois uma mistura de cores — por exemplo, branco, azul,
amarelo, preto, violeta — vale para a qualificação "colorido" o mesmo
que a mistura de verde, vermelho, laranja, azul etc., desde que as cores
apareçam em proporção adequada. Portanto, vamo-nos abstrair, no momento, das
cores e das misturas de cor!
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
-https://papini.jusbrasil.com.br/artigos/542536591/deturparam-marx-aprenda-a-refutar-essa-falacia
-https://www.mises.org.br/article/1600/as-falhas-incoerencias-e-falacias-do-arcabouco-intelectual-de-karl-marx
-https://www.youtube.com/watch?v=RXeGtgqRuK0&t=6s
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