“Aprendi a
não tentar convencer ninguém. O trabalho de convencer é uma
falta de respeito, é uma tentativa proselitista de colonização do outro...” (José de Sousa Saramago ).
Estamos constatando que vigora atualmente muito ódio e raiva na sociedade, seja pela situação geral de insatisfação que perpassa a humanidade, mergulhada numa profunda crise civilizacional, sem que ninguém nos possa dizer como seria a sua superação e para onde este voo cego nos poderia conduzir. O inconsciente coletivo detecta este mal-estar como já antes Freud o descrevera em seu famoso texto O mal estar na cultura (1929-1930) e que, de alguma forma, previa os sinais de uma nova guerra mundial. Uma sociedade que deixa esse espírito se alastrar, destrói os laços mínimos de convivência sem os quais ela não se sustenta. Corre o risco de romper o ritmo democrático e instaurar a violência social. Depois da penosa conquista da democracia, devemos, por todos os modos lícitos e Cristãos, evitar as condições que tornem o caminho da violência incontrolável ou até irreversível.
Como desmontar este ódio ao diferente ?
1)- Em
primeiro lugar, na linha sábia de Bresser Pereira, faz-se urgente um novo pacto
social que vá além daquele criado pela constituição de 1988, pacto que reuna
empresários, trabalhadores, movimentos sociais, meios de comunicação, partidos
e intelectuais que distribua melhor os ônus da superação da atual crise
nacional (que é global) e que, claramente convoque os rentistas e os grandes
ricos, geralmente articulados com os capitais transnacionais a darem a sua
contribuição. Eles também devem ser um Simão Cireneu que ajudou o Mestre a
carregar a cruz.
2)- Deve-se
mudar não apenas a música mas também a letra. Em outras palavras, importa
pensar mais no Brasil como nação e menos nos partidos. Estes devem dar
centralidade ao bem geral e unir forças ao redor de alguns valores e princípios
fundamentais, buscando convergências na diversidade, em função de um
projeto-Brasil viável e que torne menos perversa a desigualdade, outro nome,
para a injustiça social.Estimo que amadurecemos para esta estratégia do
ganha-ganha coletivo e que seremos capazes de evitar o pior e assim não gastar
tempo histórico que nos faria ainda mais retardatários face ao processo global
de desenvolvimento social e humano.
3)-
Temos que acreditar na força transformadora do amor como vem expresso na Oração
de São Francisco:”onde houver ódio que eu leve o amor”. O amor aqui é mais que
um afeto subjetivo; ele ganha uma feição coletiva e social: o amor a uma causa
comum, amor ao povo como um todo, especialmente, àqueles mais penalizados pela
vida, amor à nação (precisamos de um sadio nacionalismo), amor como
capacidade de escutar as razões do outro, como abertura ao diálogo e à
troca.Se não encontrarmos nem escutarmos o outro, como vamos saber o que pensa
e pretende fazer? Então começamos a imaginar e a projetar visões distorcidas,
alimentar preconceitos e destruímos as pontes possíveis que ligam as margens.
4)- Precisamos
dar mais espaço à nossa “cordialidade” positiva (pois há também a negativa) que
nos permite sermos mais generosos, capazes de olhar para frente e para cima e
deixar para trás o que ficou para trás e não deixar que o ressentimento
alimente a raiva, a raiva o ódio e o ódio, a violência que destrói a
convivência e sacrifica vidas.
5)- As
igrejas, os caminhos espirituais, os grupos de reflexão e ação, especialmente a
mídia e todas as pessoas de boa-vontade podem colaborar no desmonte desta carga
negativa. E contamos para isso com a força integradora dos contrários que é o
Espírito Criador que perpassa a história e a vida pessoal de cada
um.
Adaptado de texto de Leonardo Boff
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