Esta
reflexão tem como objetivo não impedir a ação e o trabalho social dentro da
Igreja, que deve sim ser motivado e abraçado por nós Cristãos. Objetiva
refletir para melhor ver, julgar e agir,
pois entendemos tudo como uma questão de princípios: Se nós virmos de forma
reducionista, seletiva e parcial, julgaremos mal e não agiremos com eficácia,
consequentemente, teremos pouco comprometimento e engajamento.
A interpretação marxista da história e da religião, adaptado ao
ver, julgar e agir da TL:
Na Mater et Magistra, o
papa João XXIII, definiu como o melhor método para a formação nos princípios da
justiça social aquele que depois foi consagrado pela Igreja latino-americana: conhecer
a situação concreta, examinar essa realidade à luz da Palavra e da doutrina da
Igreja e, por fim, agir “de acordo com as circunstâncias de tempo e de lugar”
(MM, 236). Lembrava ainda que o “papa buono”, neste mesmo parágrafo da
encíclica definia tal método como ver, julgar, agir. Salientava que, segundo o papa, é
necessário “que os jovens, não só conheçam esse método, mas o empreguem,
concretamente, na medida do possível, a fim de que os princípios adquiridos não
permaneçam para eles no campo das ideias abstratas, mas sejam traduzidos na
prática” (MM, 237).Em princípio, não há nada
o que dizer contra esse método. Isso porque não há nada que possamos dizer
contra a necessidade de uma verdadeira contextualização do evangelho, de uma
evangelização cristocêntrica e, portanto, encarnacional. Toda a ideia de
apresentar o evangelho como a resposta divina ao drama humano em suas diversas
manifestações históricas parece expressar o âmago do próprio evangelho. Nesse
sentido, eu diria que o esquema “ver-julgar-agir”, usado da forma correta, e de
forma “INTEGRAL” como nos pede a Igreja,é um método verdadeiramente teológico e
evangélico, pressupondo a própria verdade evangélica em sua constituição.Não
é possível, a despeito disso, prosseguir dizendo que não há nada de inadequado
com as aplicações que tem sido dadas a esse método na América Latina. O
primeiro momento do método contextual é o “ver”, o estágio da interpretação da
condição humana, anterior ao julgamento teológico, que surge num segundo
momento. Nesse primeiro momento, da interpretação do contexto, há um intenso
diálogo com as ciências humanas que sem dúvida constitui um mérito da teologia
contextual latino-americana. Mas é impossível ignorar que o método lança a
reflexão teológica para o segundo estágio, o juízo. A primeira fase fica sob o
controle das ciências humanas; elas nos capacitam a “ver”, para que depois a
teologia diga alguma coisa a respeito.
VEMOS
INTEGRALMENTE, OU SOMENTE AQUILO QUE QUEREMOS VER DE FORMA SELETIVA?
Será que podemos “ver”
alguma coisa antes do evangelho? “Sim, com certeza”, será a resposta de muitos.
Vamos refazer a pergunta: Será que o que vemos antes do evangelho é o
mesmo que vemos depois? Evidentemente que não, e a Bíblia é clara a
esse respeito, quando, por exemplo, nos mostra, em Provérbios, que não há
verdadeiro conhecimento sem o temor de Deus; ou em Rm 1,18-32, ensinando que o
pecado forçou os homens a construírem imagens distorcidas da divindade e, em
conseqüência, de si mesmos (Santa Teresinha dizia: “Eu não sou aquilo
que os outros pensam de mim,e não não aquilo que eu mesma penso de mim, mas sou
aquilo que Deus pensa de mim...”),e da própria realidade circundante, por
conseguinte, diz Paulo que a redenção envolve, também, a renovação da mente (Rm
12,1-2); ou em 1Cor 2,14, quando nega ao homem natural a compreensão das coisas
espirituais.Semelhante situação faz
com que Jesus pareça impaciente no evangelho de hoje Mc 8, 14-21. Vendo os
discípulos apreensivos porque tinham pouco pão, Jesus, o grande autor, trabalha
a memória e a atenção dos companheiros. Jesus resgata como ele agiu na falta de
pão para aquelas multidões, não uma vez, mas duas. Ele poderia passar o dia
inteiro lembrando aos discípulos inúmeras oportunidades onde nada faltou
àqueles que estavam com Ele, como assegura em Mt 6, 25-34: “Considerai como
crescem os lírios do campo”. Contudo, se não paramos para “considerar” tudo o
que Deus nos tem feito não conseguiremos ver aquilo que Ele faz e ainda deseja
fazer em nós. Ficamos com o coração endurecido, tardamos a compreender Sua obra
em nós. Para isso é necessário a contemplação, como quem olha para a história
(pessoal e da igreja) e vê a mão de Deus. A contemplação conduz a compreensão,
que conduz ao reconhecimento, que conduz a esperança, que conduz ao Louvor ,
que podemos arrematar com este ensinamento de Jesus em João3,10-12:“Disse
Jesus: "Sois mestre em Israel e não entende essas coisas? Asseguro-lhe que
nós falamos do que conhecemos e testemunhamos do que vimos, mas mesmo assim
vocês não aceitam o nosso testemunho. Eu lhes falei de coisas terrenas e vocês
não deram crédito; como darão crédito se lhes falar de coisas do alto...”Com esses pontos
teológicos em mente, podemos passar a uma discussão dos instrumentos utilizados
para “ver” a situação latino-americana. Esses instrumentos foram denominados
mediações socioanalíticas, e foram aplicados com o propósito de fornecer uma
interpretação científica da situação de missão no contexto Latino Americano. O
antropólogo Tito Paredes, ao discutir o uso das ciências sociais na missão da
Igreja, resume as teorias de antropologia cultural em três correntes
principais, que ganharam certa importância no contexto latino-americano:
1)- A corrente
funcionalista-relativista.
2)-A corrente conflitiva.
3)- As teorias da
dependência.
Segundo Paredes, a
abordagem funcionalista, fundada por B. Malinowsky e A. R. Radcliffe-Brown, vê
o sistema cultural como uma combinação de várias partes que contribuem para
sustentar todo o sistema de forma similar aos órgãos de um organismo. Ele
critica essa abordagem pois, ao tratar as instituições de um determinado
sistema cultural como se fossem neutras, ou até mesmo necessárias ao sistema, o
funcionalismo rejeita a possibilidade de modificar a estrutura social. Além
disso, nega que aspectos de certa cultura possam ser julgados a partir de outra
cultura e modificados. Embora essa postura favoreça o respeito por culturas
diferentes, acaba por introduzir um forte relativismo cultural que bloqueia
toda crítica à injustiça presente em estruturas sociais, deixando intocado o
status quo. É exatamente esse tipo de “amoralismo” sociológico que
Paredes vê no movimento de crescimento da igreja (Donald McGavran, Peter
Wagner), que, assumidamente, utiliza a abordagem funcionalista e se sente livre
para falar de “crescimento da igreja” ignorando quase completamente o problema
da injustiça social, como se a evangelização pudesse ocorrer sem afetar diretamente
a organização social.A abordagem “conflitiva”
tem suas origens em Marx, compreendendo a sociedade não como um
sistema harmônico, mas como uma estrutura dialética e irracional, mas
progredindo dinamicamente para uma síntese. Essa dialética se traduz no
conflito de classes; e essa luta de classes seria o critério fundamental de
análise sociológica. Além disso, segundo a ideologia Marxista, as
sociedades evoluiriam em três estágios necessários:
1)- O comunismo primitivo (onde
?).
2)- A etapa capitalista,
na qual ocorre a propriedade privada e a luta de classes.
3)- E finalmente o
comunismo desenvolvido (real,ou utópico?), no qual a
propriedade privada é abolida e a divisão do trabalho cessa totalmente.
A luta de classes da etapa
capitalista seria o motor da história, conduzindo-a inexoravelmente à revolução
socialista. A análise marxista de uma sociedade enfatiza as tensões de
classes e se compromete com a superação do sistema capitalista, rejeitando a
via da reforma social como algo que meramente prolonga o sistema. Ao mesmo
tempo em que a abordagem conflitiva se opõe frontalmente à funcionalista,
exigindo a transformação na estrutura social, e encontrando na divisão do
trabalho a estrutura básica da sociedade, aproxima-se, em certo sentido, da
abordagem funcionalista ao negar qualquer papel significativo à reforma social.
Finalmente, temos a teoria
da dependência. Essa teoria surge ao final da década de 60, quando o
desenvolvimentismo internacional começa a ser questionado por pensadores
latino-americanos ligados ao CEPAL, uma instituição associada à UNESCO. Segundo
eles o subdesenvolvimento e a pobreza dos países do terceiro mundo não seriam
frutos de problemas internos desses países, como pressupunham os programas
internacionais de auxílio nessa época, mas da dinâmica do capitalismo
internacional. Este seria dividido em metrópoles, que seriam os centros
econômicos e políticos, e a periferia, o mundo subdesenvolvido. A
condição para a riqueza da metrópole seria a exploração da periferia, não
havendo possibilidade, nessa estrutura imperialista, de uma superação do subdesenvolvimento
nos países do (à época, denominado) terceiro mundo.Trata-se de uma abordagem
conflitiva mais ampla.Paredes tece algumas
críticas à teoria da dependência. Em primeiro lugar, ela dá grande ênfase à
dimensão estrutural e coletiva do pecado, mas ignora a dimensão pessoal. Isso
cria um maniqueísmo que tende a tratar o sistema capitalista como a origem do
mal, e o sistema socialista ideal como o sistema “justo”, que evitaria a
opressão. Outro problema se encontra nas categorias “oprimido/opressor”,
como categorias básicas de análise social. Segundo ele, “Estas categorias não fazem
justiça à complexidade da realidade social, pois ignoram os “microprocessos” de
dependência que se distribuem dentro de um sistema social, por vezes obscurecendo
a linha divisória “oprimido X opressor”.A teoria da dependência
rapidamente encontrou apoio entre teólogos latino-americanos, tanto entre
católicos, como evangélicos e alguns Cristão Ortodoxos. O compromisso com a missão de
Deus no contexto latino-americano passou a ser identificado, em muitos
círculos, com o compromisso com a luta contra o imperialismo norte-americano e
com um posicionamento político de esquerda, acusando-se a “elite internacional”
do capital, e as “elites entreguistas” do capital nacional como as responsáveis
primárias pela miséria do povo. O Êxodo e os textos proféticos do AT
forneceram bastante munição teológica para o ataque desses teólogos aos países
ricos e aos partidos de direita e centro, que na VISÃO deles, seriam os únicos responsáveis
por esta situação de opressão.
O que devemos pensar dessas teorias?
Já vimos algumas críticas
do Dr. Paredes à abordagem funcionalista. Em sua opinião a interpretação funcionalista
pode ser útil, inicialmente, para compreender como as diversas partes do
sistema se organizam, desde que se evite o relativismo cultural e a tentação de
tratar unidades sociais ou sociedades simples como sistemas fechados.Quanto à teoria marxista,
haveria muito o que dizer. Trata-se de uma teoria “utópica” que seculariza a
noção bíblica de história e de reino de Deus, esperando um paraíso terreno sem
transcendência; utópica ainda por não levar a sério a dimensão pessoal do mal, como
se os homens fossem santos e não precisassem de conversão, como se a mera transformação
estrutural solucionasse o problema da injustiça.São Felipe Neri
durante 40 anos, foi o melhor catequista de Roma e conseguiu transformar a cidade.
Ele tinha o grande dom de saber confessar muito bem, como
também, guiava a todos que o procuravam com grande compaixão no caminho da santidade.Ele
mesmo dizia: “É possível mudar as estruturas com santidade, jamais o contrário...”Além
disso, a aplicação do critério da luta de classes como “chave mestra” válida
para qualquer situação cultural é extremamente reducionista desconsiderando o
papel de outras dimensões da cultura na estruturação da sociedade.No caso da
teoria da dependência, seu valor está em desvelar os mecanismos internacionais
de exploração e empobrecimento, mostrando que o imperialismo nas relações
internacionais está diretamente ligado aos dramas do povo latino-americano.
Conseqüentemente, é necessário que os modelos de missão e ministério se engajem
numa crítica consciente dos mecanismos ideológicos que sustentam a exploração
dos países pobres e mascaram a divisão internacional do trabalho.Esse valor
fundamental da teoria da dependência não pode nos fazer esquecer de suas
afinidades naturais com o reducionismo marxista; a teoria pressupõe que a causa
principal da pobreza na America Latina é de fato econômica, e que a dinâmica
básica por trás dos problemas sociais do continente seria o conflito de
classes. E foi exatamente esse posicionamento político-econômico que dominou
boa parte da reflexão teológica latino-americana. Poucos crêem hoje que este modelo seria suficiente para
explicar a pobreza e a desigualdade do continente, ignorando, por exemplo, o
impacto da cultura e das diferentes moralidades nacionais.Assim o “Ver”, no
pensamento da Teologia da Libertação na AL caracterizou-se por um
estreitamento conflitivo da interpretação da situação do pobre. Este
estreitamento teve um efeito deletério, mas a origem do problema é um
equívoco metodológico e, em última instância, teológico.A
tentativa de simplesmente aplicar uma mediação sócio analítica como
interpretação fundamental da realidade, para só então, a posteriori, emitir
juízos teológicos, é um equívoco fatal.Mesmo que nosso “ver”
científico sempre seja incompleto e falho, não podemos nos dar ao luxo de aplicar essas
mediações sem confrontá-las seriamente com as Escrituras. A acusação de
compartimentalização teórica, tantas vezes lançada sobre o fundamentalismo, é
repetida naqueles pensadores latino-americanos que utilizam as ciências sociais
sem reformá-las a partir da cosmovisão bíblica.
Estamos “Vendo” Corretamente?
Ninguém em sã consciência
negaria que o mercado tem profunda influência sobre a vida social, e que
há de fato uma dimensão estrutural na pecaminosidade humana; que há
estruturas perversas que alienam os homens de si mesmos tornando-os
instrumentos do capital.Mas essa
teoria parece ter se tornado o critério central para a interpretação da
condição humana na América Latina. Nessa linha interpretativa a causa da
injustiça social é localizada no sistema econômico e político, fazendo-se
necessário “encarnar” o evangelho numa ideologia de resistência ao poder
econômico e político central, que é a América do Norte.Conseqüentemente, muitos
dos projetos de transformação tem um caráter marcadamente socialista, identificando
na luta política e na restrição do capital a chave para a solução do problema
da pobreza. Se o problema é unicamente e meramente estrutural, concordo
que as soluções devem ser estruturais, e unicamente estruturas tratando esses
aspectos como fundacionais em relação a outros.O ponto fraco dessa
abordagem é que as outras dimensões da cultura são vistas como neutras em
comparação com o capital. É como se a os fatores naturais, a cultura
local, os sistemas de moralidade e o modo de organização da sociedade civil
fosses inocentes e insignificantes em relação à injustiça social, uma vez que a
origem dessa é sempre o sistema econômico. Isso não é dito explicitamente,
mas parece ser tacitamente assumido. Por essa razão, simplesmente não
encontramos tratamentos críticos a respeito da cultura latino-americana que
apontem as conexões entre a injustiça social e a cultura.Percebe-se aqui dois
problemas básicos.
1)- O primeiro é que a teoria da
dependência é utilizada de um modo antropologicamente míope, estabelecendo como
causa suficiente da pobreza e da injustiça social o sistema político e
econômico, sem deixar espaços teóricos claros para a influência de fatores
locais não políticos e não econômicos. Na verdade, não se pode
esperar de um socialismo de matiz marxista interpretações do sistema econômico
que coloquem as condições materiais da existência como produtos de fatores religiosos,
morais, teóricos, etc. visto que um dos compromissos do socialismo
marxista é a leitura materialista da sociedade. Embora a maioria dos
teólogos moderados sejam geralmente coerentes em rejeitar essa leitura
materialista, ao falar a respeito do “contexto latino-americano” quase sempre o
interpretam a partir de uma versão estreita da teoria da dependência,
atribuindo à dinâmica do capitalismo internacional a situação de miséria que
nossos países vivem.
2)- O outro problema é a redução
da “responsabilidade social da igreja”, entendida como sendo fundamentalmente a
transformação das estruturas sociais, políticas e econômicas. Onde
estão as outras dimensões da vida humana? Porque pouco se diz a respeito da
ciência e da tecnologia, das artes e da literatura? E sobre a concepções éticas
e capitais morais? E sobre valores culturais, moralidades e sobre o agora
onipresente problema do capital afetivo? Porque eles precisam ter significado
político-econômico para serem dignos de atenção e acabam submersos nessa linha
de reflexão?
O Ponto Cego
Tomemos o caso particular
da educação; esse tema parece ser um ponto cego na produção da teologia contextual
da TL. A maior parte dos grandes tratamentos a respeito da missão
integral concentra-se em problemas relacionados à crítica do “imperialismo”
norte-americano como o grande vilão, ignorando da forma mais superficial
possível outras abordagens como a de Jonathan Edwards, e a discussões de
caráter sócio-político. Essas últimas chegam até a um certo grau de profundidade. Fala-se a respeito
de política, de economia, de eleições, de denúncia profética, de compromisso
com os pobres, de justiça. Mas passa-se ao largo em se tratando de
educação, ou seja, de se fazer neste campo como todos os países desenvolvidos
fizeram um revolução na educação de base e superior. No máximo temos
apenas algumas parcas reflexões e reinvindicações meramente de caráter
financeiro, referentes a planos de carreira e mais oportunidades de crescimento
do corpo docente, que é extremamente corporativista. Na verdade, a ausência vai
muito mais longe. Faltam discussões sobre uma série de assuntos essenciais à
vida humana: ética, ciência, arte, literatura, teoria política, filosofia na
América Latina, ação empresarial, família, etc. Talvez seja muito trabalho para
poucas pessoas, de fato; mas porque ao menos alguns, desses assuntos não foram
discutidos? Porque tudo se resumiu a reflexões políticas e econômicas?
Em busca de um “Ver” Integral
Não é nosso propósito aqui
chegar a uma conclusão a respeito de quantas são as dimensões da vida humana,
para estabelecer uma taxonomia da cultura. Para nós é suficiente, aqui, apontar
a noção de que existiriam esferas distintas numa sociedade, que são coerentes
entre si e inseparáveis. A partir desse pressuposto, podemos admitir
os insights da teoria da dependência, mas precisaremos ir além, reconhecendo
outras causas sociais da pobreza econômica bem como as origens ideológicas e
culturais da pobreza, sugeridas na obra de Max Weber e, mais recentemente, nos
trabalhos de David Landes, que nos ajudam a ampliar nossa “VISÃO” de outros
fatores que contribuiriam também, para a situação de pobreza.Desse modo, ao analisar a
condição da sociedade, precisamos considerar, por um lado, as demais dimensões
“estruturais”; não somente o político e o econômico, mas também as outras
esferas (instituições, arte, sexualidade), como dimensões soberanas e não menos
“estruturais”. Além disso, é necessário considerar o ideológico num sentido
mais amplo: a cosmovisão daquela sociedade (idéias sobre o mundo, a sociedade,
o dinheiro, o trabalho, moralidade, etc).Colocando de outro modo: sem afirmar a
prioridade de um sobre o outro, precisamos ver os fatores ideológicos e os
fatores estruturais num sentido mais amplo (não só político e econômico) como
dois pólos em interação constante, contribuindo para a transformação mútua. O
papel das estruturas não seria necessariamente maior que o da cosmovisão na
constituição da vida humana; isso teria de ser verificado em cada situação em
sua peculiaridade. Uma “mediação” socioanalítica integral (seria melhor
falarmos em contextualização socioanalítica) precisa incluir mais do que a
teoria da dependência, no contexto latino-americano; precisa desenvolver
instrumentos de análise da cosmovisão latino-americana e de seu papel na produção
do subdesenvolvimento.
COMO JULGAR BEM ?
Este tipo de julgamento,
entendemos que tem o sentido de iluminar, criticar, de confrontar a realidade à
luz da ótica cristã, exigindo fidelidade a Deus e aos irmãos. Trata-se de
analisar as causas e conseqüências dos fatos observados de forma integral;
questionar criticamente o que se vê; discernir o que está a serviço da vida ou
da morte. Mas se exige três importantes critérios para se julgar de modo
coerente:
1)- Um bom conhecimento da
realidade humana e social (ver de forma integral).
2)- Discernimento crítico
à luz da fé.
3)- Conhecimento amplo e Intimidade
com a Palavra de Deus, numa leitura contextualizada, não fundamentalista e
livre de correntes ideológicas, para que se prevaleça verdadeiramente a
vontade e o projeto de salvação e libertação do homem todo e de todos os
homens, pois Cristo não se encarnou para salvar e libertar apenas uma classe
social, mas toda a humanidade, ou seja, pobres e ricos, bem como todas
as raças e povos.
São também critérios importantes para
a formação de opinião do julgar um bom conhecimento da DOUTRINA SOCIAL DA
IGREJA (DSI), a escuta da Palavra de Deus que se revela no hoje dos
acontecimentos da história (espiritualidade e mística), humildade (estar sempre
disposto a aprender algo novo), capacidade de superar preconceitos e mudar
de opinião, e reconhecer que não estamos sempre certos, e que, embora nos
aproximando da verdade, não somos donos dela. De forma resumida, são
três os pontos de apoio para uma boa formação de opinião sobre o julgar:
1)-O
bom senso - Todos
os dogmas da Igreja, são sempre precedidos de um “SEI DISSO” tão forte,
que nem precisam ser rediscutidos, ou questionados, pois é tudo muito lógico e
óbvio. O Bom Senso nos faz perceber as manipulações da falsa religião, seja
ela Progressista, Conservadora, Carismática, Protestante, Ortodoxa, e
qualquer outra corrente religiosa até mesmo ideológica, ou filosófica. Na
filosofia, o senso comum (ou conhecimento vulgar) é a primeira suposta
compreensão do mundo resultante da herança fecunda de um grupo social e das
experiências atuais que continuam sendo efetuadas. É um
tipo de conhecimento que se acumula no nosso cotidiano, chamado de senso comum
como fruto maduro de tentativas coletivas de acertos e erros (O Povo Europeu é
arredio a novidades por terem sido vítimas de muitas experiências negativas). Sensus
fidei (sentido da fé), também chamada de sensus fidelium (sentido dos fiéis),
quando exercida pelo corpo dos fiéis como um todo, é "a apreciação
sobrenatural da fé por parte de todo o povo, quando, a partir da bispos ao
último dos fiéis, eles manifestam um consentimento universal em matéria de fé e
moral ". Citando o documento Lumen gentium do Concílio Vaticano II , do
Catecismo da Igreja Católica acrescenta:"Por esta valorização da fé , excitado e
sustentado pelo Espírito da verdade, o Povo de Deus, guiado pelo Magistério
sagrado, recebe a fé uma vez por todas que foi entregue aos santos, o povo infalivelmente,
adere a esta fé, penetra-a mais profundamente com o juízo (Bom
Senso) e aplica-o mais plenamente na vida cotidiana ".
2)-
A Palavra de Deus revelada nas escrituras, e na sagrada tradição.
3)- A Doutrina Social da Igreja.
COMO “AGIR EFICAZMENTE” COM
COMPROMETIMENTO E ENGAJAMENTO DOS FIEIS?
O agir é o momento de encaminhar uma
ação transformadora da realidade constatada e ampla e integralmente debatida, da
realidade ou situação. Quando falamos de AGIR não se fala de fazer
coisas, mas estamos falando de uma mudança de atitude diante da vida, ou seja,
uma transformação pessoal e integral, atingindo todos os níveis da pessoa,
causando conseqüências diretas e indiretas na sociedade, comprometendo não só
os indivíduos isolados da sociedade, mas toda a comunidade eclesial.
Qual a
condição “Sine qua non” para
a implantação eficaz do método VJA:
A existência de um ponderável senso
crítico. O tema do trabalho vem desmembrado em três partes: Abordamos
inicialmente questões relativas ao método ver, julgar e agir. Vamos tentar
agora adentrar na busca da dimensão da fé neste processo, pistas para o
despertar do senso crítico, como enfrentar o medo, o desânimo e a frustração. A
utilização das experiências pastorais com o método ver, julgar e agir. Trabalhar
a necessária revisão, o planejamento e a ação transformadora.Para o sucesso dessa reflexão, há que
se postular o modo que, de um ponto de vista bíblico, ainda que seja impossível negar a
existência de numerosos insights e de autênticos tesouros produzidos por mentes
caídas e afastadas do Criador, devidos unicamente à sua misericórdia, não há
como tratar a produção cultural e científica dos incrédulos como algo neutro do
ponto de vista religioso. (Não é que os pensadores regenerados tenham
mais perspicácia, ou inteligência,conhecimento, ou que cometam menos erros
lógicos, ou que não tenham motivações pecaminosas; a questão é que o incrédulo,
na medida em que transporta essa incredulidade para dentro de sua metodologia
científica, necessariamente produzirá teorias estruturalmente comprometidas com
a incredulidade).Então não haveria problema em aproveitar todo tipo de descoberta
produzida por incrédulos, e até mesmo metodologias apropriadas, desde que essas
distorções estruturais pudessem ser identificadas e removidas por um processo
de crítica filosófico-teológica. Nesse processo, o próprio evangelho
precisa ser um princípio crítico, de modo a comunicar sua força renovadora
dentro do ambiente científico, para que possamos não meramente “ver”, mas
“ver” evangelicamente.Procuremos explicar brevemente o que
significa a análise marxista, exatamente condenada pelo documento da Sagrada
Congregação para a Doutrina da Fé, indicando como atua na história e na
religião.Os liberacionistas nos dizem que tomam elementos da análise marxista
como um método, sem endossar a ideologia marxista. Não podemos acreditar na
sinceridade de seus propósitos, quando não dispomos de capacidade avaliadora
para pesar imparcialmente as consequências dessa análise, a priori já
tachada acriticamente, como “científica”. Ora, a análise
marxista reduz toda a história à luta de classe. Os liberacionistas, baseados
no valor “científico” da análise marxista, sustentam que ela tem os elementos úteis e
eficazes para eliminar a injustiça social e que o uso desses elementos é uma
conquista do progresso e, repetimos, não implica necessariamente na aceitação
da ideologia marxista, que eles mesmos condenam, porque visceralmente é ateia
por necessidade ontológica à própria ideologia.Outros negam simplesmente o uso da
analise marxista, pois dela não temos necessidade, pois católicos, temos a DSI
e podemos usar o método Jocista de Cardjin: “ver, julgar, agir” (não esquecendo-se
que esses três momentos na Ação Católica, se faziam à luz do Evangelho).Segundo
a análise marxista, a dialética da história da humanidade, essencialmente de luta
de classes, conduz à vitória do socialismo: a ordem ideal da sociedade e da
economia. A Teologia da Libertação crê efetivamente numa perfeita sociedade, para
o futuro, mas é muito vaga sobre essa futura sociedade socialista, pois não
pode ignorar o fato evidente que o marxismo, por toda a parte onde lutou e
conseguiu o poder, não conduziu à libertação do homem, mas sim à supressão de
sua liberdade.Tentam justificar-se diferenciando entre socialismo real e
utópico (que nunca se realiza pelos fatores amplamente expostos no início desta
reflexão propositiva).O Papa, na sua encíclica sobre o
trabalho humano, afirma que um capitalismo primitivo que maneja o homem como
instrumento do capital, é contrário à dignidade humana, mas também o
coletivismo marxista, que tem a totalidade da economia, controla o poder
político, militar, cultural e propagandístico. A história nos tem demonstrado
que a liberdade dos homens de trabalho está melhor garantida em uma ordem
econômica com milhões de patrões e sindicatos livres, do que num sistema em que
o Estado é o único patrão e os sindicatos são meros instrumentos do Estado.Em 2007, no Brasil, no santuário Mariano
de Aparecida, os bispos latino-americanos debateram e confrontaram-se
precisamente sobre isto. E na ocasião o ainda arcebispo Jorge Mario
Bergoglio(Papa Francisco), foi decisivo para fazer prevalecer o primado
da fé em relação à primazia do pobre em nome de uma leitura “ideologizada” da
realidade.Já convertido em Papa, Bergoglio não se esqueceu deste embate.
Pelo contrário, durante a sua recente viagem ao Rio de Janeiro, quando se
dirigiu, no dia 28 de julho aos representantes das conferências episcopais
latino-americanas, advertiu-os que o “reducionismo socializante”, derrotado em Aparecida,
continua tentando a Igreja ainda hoje.A prolongada atividade que provocaram
as duas instruções da Congregação para a Doutrina da Fé, em 1984 (Libertatis
Nuntius) e em 1986 (Libertatis Conscientia), e o que delas derivou, levou ao
maravilhoso acontecimento de graça que foi a Conferência de Aparecida. Seu
ponto de partida não foi a análise social, mas a fé de um povo feito em sua
grande maioria de pobres, fazendo uso do método ver, julgar e agir, “a partir
dos olhos e do coração de discípulos missionários”. No n. 19 do
documento final está escrito:“Em continuidade com as Conferências Gerais anteriores do Episcopado
Latino-americano, este documento faz uso
do método ‘ver, julgar e agir’. Este método implica em contemplar a deus com os
olhos da fé através de sua Palavra revelada e o contato vivificador dos
Sacramentos, a fim de que, na vida cotidiana, vejamos a realidade que nos
circunda à luz de sua providência e a julgamentos segundo Jesus Cristo,
Caminho, Verdade e Vida, e atuemos a partir da Igreja, Corpo Místico de Cristo
e Sacramento universal de salvação, na propagação do Reino de Deus, que se
semeia nesta terra e que frutifica plenamente no Céu”.Assim, o esquema do documento valoriza
a tradição da teologia e da pastoral latino-americana, mas, ao mesmo tempo, coloca em
evidência a perspectiva da fé.Certamente ela não estava ausente, mas em
certos desenvolvimentos tinha sido dada como descontado, devendo preocupar-se,
sobretudo, com a gravidade de uma situação social cheia de conflitos e,
especialmente, com o clamor dos pobres. Neste sentido, a posição do frei e
teólogo Clodovis Boff ajuda a entender toda a problemática a partir de um
artigo publicado na Revista Eclesiástica Brasileira sobre a questão do pobre
como princípio epistemológico da Teologia da Libertação:“Quando se questiona o pobre como princípio e se pergunta se não é antes
o Deus de Jesus Cristo, a Teologia da Libertação costuma recuar e não nega. E
nem poderia, pois Deus está em primeiro lugar, por definição.O que faz problema
na Teologia da Libertação é sua indefinição sobre uma questão que é capital na
esfera do método. O dado da fé representa apenas um dado pressuposto, que ficou
para trás, e não um princípio operante, que continua sempre ativo. Pois o
primado da fé, como não pode ser dado por descontado do ponto de vista
existencial, também não pode sê-lo do ponto de vista epistemológico...” (Teologia
da Libertação e volta ao fundamento, in REB, fasc. 268, out/2007, passim pp.
1002-1004). - (Grifos do Blog Beraka: “A
epistemologia também pode ser vista como a filosofia da ciência. A
epistemologia trata da natureza, da origem e validade do conhecimento, e estuda também o grau de certeza do
conhecimento cientifico nas suas diferentes áreas, com o objetivo principal de
estimar a sua importância para o espírito humano. A epistemologia
contemporânea questionou o valor realista da teoria científica e propôs uma
tese convencionalista, que faz da teoria não uma descrição do real mas um
mecanismo formal (modelo) e conceptual das observações experimentais. Quando confrontada com um um determinado
conhecimento, uma pessoa pode assumir diferentes atitudes: dogmatismo,
cepticismo, relativismo, perspectivismo).Esta ambiguidade é superada pela
Conferência de Aparecida, tanto na estrutura geral do documento quanto na
presença viva da fé em cada momento de seu desenvolvimento; desde o olhar para
a dura realidade até o seu julgamento e a consequente prática.Trata-se, porém,
de uma ambiguidade sempre presente. Por isso, o Papa Francisco, em sua recente
viagem ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude, no encontro com a
presidência do Celam, voltava sobre o assunto no ponto 4, quando, ao apresentar
algumas tentações contra o discipulado missionário, falou da “ideologização da
mensagem evangélica” e afirmava:“É uma tentação que se verificou
na Igreja desde o início: procurar uma hermenêutica de interpretação evangélica
fora da própria mensagem do Evangelho e fora da Igreja. Um exemplo: em um
dado momento, Aparecida sofreu essa tentação sob a forma de “assepsia”. Foi
usado, e está bem, o método de “ver, julgar, agir” (cf. n. 19). A tentação se encontraria em optar por um
"ver" totalmente asséptico, um “ver” neutro, o que é inviável. O ver
é sempre influenciado pelo olhar. Não há uma hermenêutica asséptica. Então a
pergunta era: com que olhar vamos ver a realidade? Aparecida respondeu: Com o
olhar de discípulo. Assim se entendem os números 20 a 32. Existem outras
maneiras de ideologização da mensagem, e, atualmente, aparecem na América
Latina e no Caribe propostas desta índole. Menciono apenas algumas:O
reducionismo socializante. É a ideologização mais fácil de descobrir. Em alguns
momentos, foi muito forte. Trata-se de uma pretensão interpretativa com base em
uma hermenêutica de acordo com as ciências sociais. Engloba os campos mais
variados, desde o liberalismo de mercado até as categorizações marxistas...”Se o papa fala disso, significa que
ainda podem subsistir as tentações e as ambiguidades. E aqui corre-se o risco de com
estas ambiguidades da TL, em tratar a verdade divina e teológica sobre a pessoa
e a obra de Cristo como um exemplar de uma verdade abstrata e universal, a qual
se manifestaria, de forma incompleta e inferior, em uma série de situações similares qualitativamente
equivalentes. O exemplo acabado desse mindset entre os Cristãos
progressistas tem sido, naturalmente, a confusão entre a morte messiânica de Cristo na cruz do
Calvário, de uma vez por todas, com o
sofrimento das vítimas inocentes nas mãos dos opressores do sistema e, enfim, o
sofrimento do trabalhador nas mãos do grande capital. Analogias morais,
sociais, e políticas podem ser observadas entre a morte de Cristo o sofrimento
dos oprimidos, sim; mas sempre nesses níveis.O problema dessa abordagem é que
não há analogia dentro da esfera da fé, onde se manifesta e se apreende o
sentido “teológico-religioso” ou espiritual, ou “existencial” (a esfera a
partir da qual se distingue a morte de Cristo das outras “mortes”), entre o
sofrimento das criaturas caídas e “inocentes” sob a opressão do mundo e o
sofrimento de Cristo; pois o sofrimento do “inocente” é, na verdade, do
resultado e a revelação da maldição humana coletiva, de seu estado de queda,
absolutamente carente de valor redentivo. A vitimização de Cristo é qualitativamente
diferente, porque consiste na inversão da
maldição e sua transformação em bênção para todos os homens, e não apenas
como querem o marxistas materialistas, verem Cristo e sua morte apenas como um
processo injusto das elites de seu tempo.A identificação da morte de Cristo com
a opressão do trabalhador sob o capital só poderia acontecer se algum filtro
ideológico bloqueasse a percepção da transcendência e da irredutibilidade do
sacrifício de Cristo em relação a outros eventos de opressão e de sofrimento
que não tem esse significado, e uma consequente redução do significado
teológico singular do evento pascal a um nível de significação apenas
sociológico, político, ou até mesmo
moral, como se revelou na aproximação absolutamente equivocada entre a
“cruz Trans”, a “cruz de Espinal” e a Cruz de Cristo. Nesse caso a equivocidade
de significado entre a vitimização de criaturas caídas sob opressões sociais e
a vítima divina, o Cordeiro Pascal que se entregou livremente para a nossa
salvação passa quase imperceptível, como se fosse uma mensagem subsidiária ou,
até mesmo, extrínseca ao fato histórico, constituída tão somente pelo olhar
subjetivo do fiel ou como uma construção puramente teo-lógica.
As escrituras colocam por terra qualquer dúvida sobre a morte
salvífica e libertadora de Cristo:
João 10,11-18: “Eu sou o bom Pastor; o bom
Pastor dá a sua vida pelas ovelhas. Mas o mercenário, e o que não é pastor, de
quem não são as ovelhas, vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as
arrebata e dispersa as ovelhas. Ora, o mercenário foge, porque é mercenário, e
não tem cuidado das ovelhas. Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas,
e das minhas sou conhecido. Assim como o
Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai, e dou a minha vida pelas
ovelhas. Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me
convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um
Pastor. Por isto o Pai me ama, porque
dou a minha vida para tornar a tomá-la. Ninguém ma tira de mim, mas eu de mim
mesmo a dou livremente; tenho poder para a dar, e poder para tornar a
tomá-la...”
Tanto na teologia latino americana da
Libertação quanto na teologia Missão Integral, quando essa não é
evangelicamente autoconsciente, essas mediações científicas na interpretação da
condição humana são quase sempre dominadas por uma teoria da ideologia que
trata a formulação teológica e a confissão de fé como epistemologicamente
secundárias em relação às condições materiais de sua produção, ou seja, sempre
dominadas por alguma forma explícita ou tácita de filosofia da práxis, onde a
imagem Cristológica passa a ser formatada por um procedimento “bottom-up” em que o sentido de Cristo é sempre uma
resposta à situação “concreta”, nos termos postos por essa situação, por sua
vez “descoberta” pelo pensamento social.Como já sugeria
Albert Schweitzer (nem por isso inocente do mesmo erro), o Cristo discernido no
espelho d’água ao fundo desse poço hermenêutico-arqueológico é, via de regra,
não uma superação do Cristo da Igreja Cristã pelo rosto do Cristo histórico,
mas o rosto do próprio intérprete.Se procurássemos classificar esse erro
em termos das heresias clássicas, poderíamos dizer que temos, aqui, uma espécie
de “gnosticismo” teológico, no qual se procura
fugir do escândalo da particularidade, eliminando a singularidade da
cruz de Cristo e tornando-a um exemplar de um princípio abstrato
destemporalizado. Por este procedimento, a messianidade e poder redentivo da
única cruz é pulverizado e disperso para todas as situações de opressão
contempladas messianicamente pelo pensamento progressista, seja ele ortodoxo ou
New Left: a messianização do pobre, do negro, do homoafetivo, da criança, do
doente.Algum tipo de fragilidade metodológica tornou possível que muitos
teólogos adotassem práticas de
permanente ressignificação da linguagem Cristã a partir de novos
contextos, inadvertidamente tornando a doutrina Cristã em uma derivação de
respostas situacionais mais conectadas uma
tradição politizada de práxis do que às fontes Cristãs e evangélicas
cujo caráter é cada vez mais epigenético
e superestrutural. Uma nova forma de misticismo semântico emergiu, assim, no
contexto do progressismo crsitão. Não é de se admirar, por sinal, que vários
praticantes dessa forma de teologização sejam adeptos do pensamento de Paul
Tillich, cuja teoria do símbolo religioso sistematiza de forma rigorosa esse
procedimento de reinterpretação da proclamação Cristã em termos de categorias
seculares.Acredito que essa mesma fragilidade metodológica (com seu fundo
teológico) afeta diretamente a imaginação prática do movimento de missão
integral, quando este constrói seu discurso e suas prioridades estratégicas.
CONCLUSÃO:
Pescar em águas turvas é tática da
Teologia da Libertação, graças às ambiguidades empregadas tanto na “opção pelos
pobres” como nas “comunidades eclesiais de base”. A genuína “opção pelos pobres” e
as verdadeiras “comunidades eclesiais de base” estão no coração da Igreja, mas
de forma muito diversa daquela empregada pela Teologia da Libertação.Por
isso, quando se rejeita essa releitura facciosa, os liberacionistas nos rotulam
de inimigos dos pobres, da democracia e do povo oprimido, e quando não, nos
apontam como fautores e aliados dos capitalistas e dos Estados Unidos. A ambigüidade é útil para os
prestidigitadores e exploradores, não, porém, para os doutrinadores, que, como
ensina o Evangelho, devem evitar a confusão, afirmando, negando ou
distinguindo. O ataque feito de certa forma à Escolástica de Santo Tomás de
Aquino, começa porque o Santo Doutor da Igreja exigia, antes de
tratar qualquer questão, a definição dos termos, sua delimitação e clareza e em
que sentido eram tomados. Nunca a clareza e exatidão das expressões
fizeram mal aos bons e são exigidas para a promoção da justiça.Usar de
ambiguidades e subterfúgios e, por vezes, até de mentiras, não oferece nenhuma
garantia de credibilidade. O homem honesto não as aceita.A teologia latino-americana na
libertação é reconhecida no mundo teológico pela atenção, reflexão e prática em
temas ligados à pobreza e à opressão socioeconômica contra os excluídos. Para a
elaboração de sua teologia, a teologia latino-americana na libertação segue um
método o qual descreveremos, tanto como suas característica.A elaboração da
teologia latino-americana na libertação se dá através do método
ver-julgar-e-agir, que tem como principal característica, a visão das
possibilidades de transformação social e política, e tem o reino de Deus como
referência básica, pois são tomadas as experiências bíblicas de libertação as
quais são relidas e colocadas como base para a luta.Em uma nova forma de ser igreja esta
teologia se apóia na visão bíblica do Êxodo e da ação dos profetas bíblicos, e
parte para busca de um mundo igualitário, participativo e firmado nos
princípios da justiça social, visto que tal justiça sempre fora alvo tanto no
êxodo, quanto nos profetas, devendo segundo esta teologia ser o principal alvo
da igreja militante.Neste aspecto a espiritualidade ao receber tal influência,
torna-se ativa para o processo de busca de respostas às questões prementes da
situação vivida pela humanidade, tendo sempre a Bíblia, como fonte básica, e
recorrendo a eventos passados ocorridos na história da igreja e também fatos
ocorridos no mundo religioso e cultural e com isso pontua e define sua esfera
de ação.Uma vez coletadas tais informações que são se dão a partir da reflexão
de cada pessoa ou grupo, onde se dá encontro entre a comunidade da fé e a
mensagem bíblica, e são constituídas uma esfera de ação definida, a igreja tem
diante de si todas as condições favoráveis para que tome decisões, consciente
ou inconscientemente, ante as demandas surgidas pelo encontro com a mensagem
cristã. A norma bíblica do Êxodo contribui para a consciência da necessidade de
uma tomada de posição, para uma ação libertadora e busca de saídas diante de um
quadro de situação de degradação humana vivida em meio aos processos
socioeconômicos do contexto de exclusão social próprio do sistema econômico. A
norma bíblica do Êxodo contribui para a consciência da necessidade de uma
tomada de posição, para uma ação libertadora e busca de saídas diante de um
quadro de situação de degradação humana vivida em meio aos processos
socioeconômicos do contexto de exclusão social próprio do sistema econômico de
caráter selvagem e também, ateu. Já mediante uma necessidade de precaução
diante o risco do imediatismo, pragmatismos e instrumentalizações
sociopolíticas indevidas gerados pela pressão da responsabilidade social e
política da fé cristã; a “sabedoria” bíblica nos conscientiza a “esperar”, pois
apela para as dimensões profundas da existência humana. Sendo assim “êxodo e sabedoria” é
um imperativo de “agir e aguardar”.Um fruto genuíno da Teologia da
Libertação é a publicação da História da Igreja na América Latina pela CEHILA
(Comissão de História Eclesiástica para a América Latina), dirigida por
Henrique Dussel. Não é história mas hipótese de história, pré-fabricada no
materialismo histórico, nos moldes “acríticos e acientíficos” da luta de
classe. Faz pena ver como essa história destrói a própria história, como o
demonstrou exuberantemente Américo Jacobina Lecombe em “A Obra Histórica do Pe.
Hoornaert”, no que se refere ao Brasil.A Teologia da Libertação dando à
economia um caráter decisivo na sociedade, trilhando a análise marxista, ameaça
limitar unilateralmente, com a dimensão econômica, a história e a atividade da
Igreja, como uma opção política, errada no passado e no presente, que estaria
sempre ao lado dos opressores mas deve redimir-se e assumir, quando necessário,
a mesma revolução na luta pela libertação da opressão, pois aí se encama o
“amor universal”.Segundo esta versão, teria sido revolucionária a Igreja, já no
seu fundador, Jesus Cristo, considerado perigoso e subversivo por Pôncio
Pilatos, mas, desde o período constantiniano, unindo-se ao poder e aos
poderosos, tornou-se cúmplice da exploração.Só com a reforma das estruturas e o
engajamento sócio-político, a Igreja se tornará libertadora. As violências não
são ideais, mas se for preciso “matar por amor”, devemos recorrer à força
quando nos falta outro caminho. Exatamente aqui está um grande erro: o
caminho da violência, da luta, do ódio não é, nem pode ser, o caminho de
Cristo: único caminho, verdade e vida.Para justificar suas posições, a
Teologia da Libertação precisa reformar o cristianismo. As duas consequências
normais da Teologia da Libertação no cristianismo são principalmente as
seguintes:
1. Parte-se da suposição, admitida sem nenhum
espírito crítico de conformidade ou não com a realidade, como verdade
científica que toda à história da humanidade deve ser interpretada como luta de
classe, dos opressores contra os oprimidos. E que os oprimidos,
despertados e sacudidos por esta injustiça social, se devem libertar.É
evidentemente um exagero: a economia fortemente influi na história, mas não a
decide. O cristianismo não pregou a luta de classes, mas Cristo encareceu a
fraternidade e o amor entre os homens. A maior transformação social,
operada na humanidade, se deve exatamente ao cristianismo. Cristo, em outras
palavras, não foi um revolucionário libertador dos pobres e escravos, mas o
Salvador de todos os homens, de qualquer situação social ou econômica. Não
armou os escravos contra os senhores, mas ensinou que o escravo é nosso irmão,
não só com a dignidade humana mas até mesmo como filho adotivo de Deus.Um
exemplo desastroso dessa análise marxista da história da Igreja nos é dado pela
CEHILA, na História da Igreja na América Latina, como já nos referimos. Há
evidente má vontade em distorcer os latos e as personalidades e ignorância
supina de nossas tradições religiosas. Assim a Igreja no Brasil teria sido a
opressora dos pobres, enquanto, em homenagem ao ecumenismo, os invasores
protestantes holandeses e franceses teriam sido os heróis da libertação da
nossa Pátria.Recordemos ainda que a pessoa de Cristo liberacionista lhe tira a
auréola de Filho de Deus feito homem, e o considera um simples homem, como o “tal Jesus”, fabricado
nos moldes secularizantes da Teologia da Libertação.
2. Claramente essa concepção da história e da
realidade presente se projeta não só em Cristo mas também na própria Igreja,
dividindo-a em Igreja dos pobres (Igreja Popular, tipicamente classista) e
Igreja dos ricos (a Igreja institucional que se compromete com os ricos para
exercer um paternalismo com os pobres).Leva à divisão na Igreja, exigindo uma
nova linha pastoral que combate não só os ricos, inimigos da classe proletária,
mas se opõe às próprias exigências da autoridade eclesiástica que não concorda
com a tese liberacionista.
Caminheiro, caminhemos juntos! pois é
caminhando que se faz caminhada!
BIBLIOGRAFIA:
- “O senso crítico e o método ver-julgar-agir
para pequenos grupos de base” - Jorge Boran, Ed. Loyola, 1978.
- “Libertatis Nuntius” -
Instrução da Congregação para a Doutrina da Fé,1984.
- “Libertatis Conscientia” - Instrução
da Congregação para a Doutrina da Fé, 1986.
- “História da Igreja na América Latina pela
CEHILA” - Henrique Dussel- Comissão de História Eclesiástica para a
América Latina.
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