“Uma das características mais notáveis da
ciência moral que São Tomás, seguindo aqui a Aristóteles, prescreve dever ser
ensinada aos que se preparam para a contemplação está no fato de que ela não se
esgota com a aquisição das virtudes. Ao contrário (...) afirma que mais ainda
do que as virtudes, pertence à ciência moral mostrar o que seja a verdadeira
amizade entre os homens.”
Há
várias razões pelas quais a amizade pertence ao âmbito da ciência moral que
deve formar o aluno para a contemplação:
1)- Primeiro, porque pertence à ciência moral
tratar das virtudes; ora, a amizade não é uma virtude, mas a verdadeira amizade
tem a virtude como sua causa.
3)- Em segundo lugar, pertence à ciência
moral a consideração de todas as coisas que são necessárias à vida humana,
entre as quais é maximamente necessária a amizade, pois ninguém corretamente
disposto pelas virtudes escolheria viver possuindo todos os demais bens
exteriores sem os amigos.
3)- Em terceiro lugar, a amizade concorre
para o bem civil, ao qual se ordena a ciência moral, pois as cidades parecem se
conservar pela amizade, e por isso mesmo é que os bons legisladores
preocupam-se em conservar a amizade entre as cidades mais até do que a justiça,
acerca da qual às vezes deixam de aplicar as penas para não dar origem a
discórdias.
4)-
Em quarto lugar, porque se algumas pessoas forem amigas, não necessitarão da
justiça, pois um amigo é um outro si mesmo, e não há justiça para consigo
mesmo, já que pertence à natureza da justiça o ser a um outro; porém, se houver
pessoas que sejam justas, ainda assim necessitarão da amizade.
5)-
Finalmente, a amizade deve ser objeto da ciência moral não apenas porque é algo
necessário à vida humana, mas também porque é um bem em si mesmo.”
Três tipos de amizade
“Existem três tipos
de amizade, na medida em que existem três tipos de bens: o bem honesto, o bem
útil e o bem deleitável:
1)-Chama-se bem honesto ao bem apetecido pelo
apetite
racional por causa deste bem em si mesmo;
2)-Chama-se
bem deleitável ao bem apetecido pelo apetite sensível por causa deste bem
em si mesmo;
3)-Chama-se
bem útil ao bem apetecido não por causa dele mesmo, mas por causa de um outro,
honesto ou deleitável, que não pode ser conseguido senão através do
útil.
Correspondendo
a estes três modos de bem, haverá também três modos de amizade:
1)-
A amizade por causa do bem da virtude,
2)-A
amizade por causa do bem deleitável,
3)-
A amizade por causa do bem útil.
Segundo
estas três espécies de amizade, os amigos podem se querer bem mutuamente
segundo o que amam:
1)-Os
que se amam por causa da virtude querem para si mutuamente o bem da virtude;
2)-Os
que se amam por causa do útil querem para si mutuamente os bens úteis;
3)-Os
que pela deleitação, os bens deleitáveis.
As
amizades útil e deleitável são amizades por circunstancialidade:Naqueles que se amam
mutuamente por causa da utilidade, um não ama o outro por causa dele mesmo, mas
na medida em que do outro recebe para si algum bem; coisa semelhante ocorre
naqueles que se amam por causa da deleitação, onde um ama o outro somente na
medida em que é a si deleitável.
As
amizades por causa do útil e do deleitável são amizades por causa de coisas que
são contingentes a quem se ama:Quando, portanto, aqueles a quem se amava
deixam de ser úteis ou deleitáveis, seus amigos cessam de amá-los.
A
perfeita amizade é aquela que é dos bons e dos semelhantes entre si segundo a
virtude:Os
amigos segundo a virtude são homens bons em si mesmos, e não por acidente,
porque a virtude é uma perfeição que faz o homem ser bom, pelo que tais amigos
se quererão bem segundo si mesmos e não por causa de alguma circunstância. Pela
mesma razão a amizade segundo a virtude é duradoura; porque tais amigos se amam
entre si por serem bons, e, conseqüentemente, a amizade entre eles permanece
enquanto durar a virtude.
Ora, a virtude é um hábito permanente e não facilmente mutável; de onde que a amizade por causa da virtude é duradoura.
Ora, a virtude é um hábito permanente e não facilmente mutável; de onde que a amizade por causa da virtude é duradoura.
Ademais, a semelhança, que é o que faz e
conserva a amizade, é máxima entre os virtuosos; de fato, eles permanecem
semelhantes a si mesmos, porque não são facilmente mudados de uma em outra
coisa, e também permanecem na amizade que possuem entre si; já os homens maus
não possuem nada de firme e estável em si mesmos, porque a malícia, na qual se
obstinam, é detestável segundo si mesma, e assim os seus efeitos variam na
medida em que nada encontram em que a vontade possa repousar, de onde que nem
permanecem durante muito tempo semelhantes a si mesmos, ao contrário, querendo
o contrário das coisas que anteriormente queriam, por pouco tempo permanecem
amigos, isto é, somente enquanto gozam da malícia na qual concordam.
As
amizades por causa da virtude, porém, são raras:
Porque
esta amizade o é entre pessoas virtuosas e poucos são virtuosos. Por causa da
deleitação e da utilidade podem-se tornar mutuamente amigos homens de quaisquer
condições, tanto bons como maus, mas segundo a amizade perfeita,
pela qual os homens se amam por causa de si mesmos, somente os homens bons
podem se tornar amigos.
Fonte: Texto publicado no
site Introdução Ao Cristianismo segundo a obra de Santo Tomás de Aquino e Hugo
de São Vitor
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