Como ressocializar alguém que não teve o direito de ser sociável? - Ressocializar: socializar-se novamente; voltar a fazer parte de uma sociedade: ressocializou o cidadão banido do convívio social. Sociável: adjetivo Próprio para viver em sociedade; que tende para a vida em sociedade. De convívio agradável; civilizado, urbano, afável: caráter sociável e generoso. Que age com cortesia e civilidade; urbano, civilizado. Analisando as Leis de Execução Penal localizada no Planalto, temos os Artigos 1ª, 10ª e 25ª que dizem:
Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.
Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.
Art. 25. A assistência ao egresso consiste:
I - Na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade.
Ou seja, não há de fato uma reintegração à sociedade, se essas pessoas já não são vistas como sociáveis. Sem pretensões de dar um veredito final sobre o tema, mas apenas abrir o debate, constatamos que a forma de como punir o indivíduo por uma conduta lesiva a sociedade, sempre foi alvo de inúmeros questionamentos. No decorrer dos anos, foi possível observar uma constante “evolução” no que tange a preservação dos direitos do indivíduo. Hoje não se pensa mais somente na punição do infrator de uma norma social, mas também a possibilidade da reintegração desse indivíduo na sociedade, de forma que este não reincida na prática de crimes. Atualmente no Brasil, existem três espécies de sanção penal. A pena que pode:
-Ser restritiva de liberdade.
-Restritiva de direitos.
-E a pena de multa.
-Tem-se também, a medida de segurança e as medidas alternativas.
São três formas individualizadas da execução penal, que busca da melhor maneira intimidar a prática delituosa a fim de garantir a ordem social. Atualmente existe uma intensa discussão a cerca da execução penal principalmente no que tange a maneira como um indivíduo poderá dar entrada em um presídio para ser punido pelo crime cometido, ao mesmo tempo ter possibilidade de ser reeducado afim de que não volte a cometer o ato delituoso. Nos tempos mais remotos, a pena era tida como uma
forma de vingança, “ocorria à reação da vítima, dos parentes ou até mesmo do
grupo social (tribo) que agiam sem proporção à ofensa, atingindo não só o
ofensor como também todo o seu grupo”(MIRABETE apud,MESQUITA JUNIOR, 2005, p.48),
não se tinha a concepção do que era proporcional ao dano causado ou mesmo do
seria justiça ao punir alguém.Com o passar do tempo, sentiu-se a necessidade de
organizar a sociedade e concentrar nas mãos de um soberano o poder de dizer o
certo e o errado, fala-se no Contrato Social teoria desenvolvida por Locke.
Em
vista deste contrato entre sociedade e Estado, os indivíduos cediam parte de
sua liberdade em prol de segurança, e aquele que cometesse algum crime “não era
mais capaz de honrar o contrato que virtualmente estipulou com os outros atores
sociais”. (CAMPA apud, BECÁRIA, 1997, p.16) devendo, portanto, ser punido. Por volta do século XVIII, falava-se em punição
divina, o corpo era alvo principal de suplícios, pois os “[...] povos da
antiguidade cultivavam a crença de que a violação da boa convivência ofendia a
divindade e que essa cólera fazia recair a desgraça sobre todos [...]”
(MESQUITA JUNIOR, 2002, p.24).
Os condenados eram enforcados, esquartejados,
afogados, e por conseqüência, mortos, mas estava garantida a salvação de suas
almas, ao confessarem o crime cometido e pagarem por eles com a própria
vida. Com o decorrer do
tempo, a punição deixou de ser voltada somente para o corpo , mas passou-se a
pensar no individuo e sua punição de forma humanizada.Neste sentido Cesare Bonesana Becária em sua
obra, Dos Delitos e das Penas, escrita por volta de 1763, já se manifestava
acerca das formas de punições da época, apresentando assim a humanização da
pena. Tratava-se de uma “sutileza na execução das penas”, ou seja, a partir daí
pode-se falar em penas que não se tratavam mais de torturas propriamente ditas,
mas de punições suficientemente razoáveis para intimidar a sociedade.
Via-se a possibilidade da norma prevê os crimes e suas respectivas penas, a
proporcionalidade entre as penas e os delitos, e a lei penal deveria ser clara,
objetiva e tão completa a ponto de um juiz não poder fazer qualquer tipo de
interpretação que levasse a algum tipo de privilégio ou incriminasse alguém.
Partindo-se da analise histórica é possível observar que existiram várias concepções concernentes a pena e sua finalidade, para isso três teorias buscam explicá-la:
1)- Para a teoria absoluta, a pena tem um único
fim, o retributivo. O agente é punido pelo crime, com a pena proporcional ao dano causado,
“a pena é retribuição do mal injusto praticado pelo criminoso, pelo mal justo
previsto no ordenamento jurídico”. (CAPEZ, 2007, p.359).
2)- A teoria relativa atribui à pena prevenção
geral ou especial, por meio da cominação em abstrato. A prevenção geral se dá pela
reafirmação do poder da norma, e pela intimidação da sociedade como um todo.
Será especial quando se dirigir a um único indivíduo podendo segregá-lo em um
estabelecimento penal, ou através de várias atividades e disciplinas ressocialzá-lo.
Para essa teoria a pena é uma necessidade social.
3)- Para a teoria mista, eclética, intermediária ou conciliatória, “a
pena tem fim retributivo, mas tem, também, fins de reeducação do delinqüente e
de intimidação social”. (MESQUITA JUNIOR, 2005, p.47).
No Brasil adota-se a
teoria Mista da finalidade da pena, ou seja, “a execução penal tem
por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para harmônica integração social do condenado e do
internado” (Lei de Execução Penal. LEI 7.210. art.1⁰). Como já citado, a execução da
pena como meio não só de punição e segregação, mas uma medida onde os
criminosos sejam tratados como seres humanos e com a esperança de que estes
sejam recuperados e reinseridos na sociedade, ainda é um ideal que gerações
passadas e futuras ainda têm a conquistar.
De acordo com o Código Penal
Brasileiro em seu artigo 59:
“O juiz, atendendo à culpabilidade, aos
antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às
circunstâncias do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá
conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.
Tem-se o melhor possível
idealizado pelo legislador no que tange a execução da pena, um sistema que
razoavelmente aplica a pena a um criminoso para puní-lo pelo delito cometido ao
mesmo tempo que o reeduca para, na medida do possível, reinseri-lo na
sociedade. A
Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5⁰ incisos XLVIII e XLIX, garante
a todos os indivíduos, inclusive aqueles tidos como o “lixo social” o “respeito
à integridade física e moral”, o direito de cada um cumprir sua pena em um
estabelecimento diferenciado conforme o tipo de delito cometido.
Além dos
direitos garantidos Constitucionalmente, a Lei de execução Penal prevê
preceitos que devem ser seguidos durante a execução penal, sendo de inteira
responsabilidade dos aplicadores da justiça, bem como administradores de
presídios se prontificarem a efetivar todos esses princípios: Os
presos e internados têm direito a assistência jurídica integral e gratuita,
quando não possuírem a recursos suficientes para consultar advogados (Lei de
Execução Penal. Art. 15 -16), têm direito à alimentação suficiente e vestuário,
atribuição de trabalho e sua remuneração, previdência social, proporcionalidade
na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação, o exercício
das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas
anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; assistência material,
à saúde, jurídica,educacional, social e religiosa; proteção contra qualquer
forma de sensacionalismo; entrevista pessoal e reservada com o advogado; visita
do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
chamamento nominal; igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da
individualização da pena; audiência especial com o diretor do estabelecimento;
representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; contato
com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de
outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;
atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da
autoridade judiciária competente.(Lei de Execução Penal. Art.41).Sem dúvida o sistema de execução
penal brasileiro, teoricamente é suficiente para garantir a punição do indivíduo,
bem como a sua reeducação:O
indivíduo apesar de preso tem garantida, a saúde, a educação, ou seja, o piso vital
mínimo para que ele possa viver com dignidade, pois, apesar de ter perdido o
direito a liberdade, os demais direitos que não cessam com o cumprimento da
pena continuam sendo garantidos pela carta magna. Porém, no Brasil “a prisão, conseqüentemente, em vez de
devolver à liberdade indivíduos corrigidos espalha na população delinquentes
perigosos". (FOUCAULT, 1987, p.221), pois ao contrario do que diz o
artigo 5⁰ da Lei de Execuções
Penais, não existe efetivamente a individualização da pena, observa-se nos
presídios brasileiros que os presos mais perigosos são colocados com os que
cometeram delitos mais brandos, ou seja, quem entrou para se recuperar, acaba
saindo pior do que era antes.
É muito
difícil falar em evitar que uma pessoa venha incidir no mundo do crime quando
diversos fatores a “forçam” delinquir!
Para Enrico Ferri apud Junior (2002, p. 67),
existem fatores que influenciam diretamente na formação de um individuo e na
possibilidade dele vir a cometer um delito, são os
chamados fatores criminógenos, que podem ser:Antropológicos, Físicos e sociais.Os
antropológicos são biológicos ou inerentes à personalidade da pessoa do criminoso.Os
fatores físicos são o clima, a natureza, o solo, a periodicidade diurna e
noturna, as estações do ano, a temperatura anual, as condições meteorológicas,
a produção agrícola etc; e os fatores sociais compreendem: a densidade da
população, a opinião pública , os costumes, a religião, as condições de família,
o regime educativo,condições econômicas e políticas.Partindo desse ponto de vista, o poder público tem um grande desafio à
enfrentar, pois falar em prevenção do crime, e reeducação para aqueles que já
cometeram algum delito não é tarefa fácil. A pobreza, a falta de emprego, de educação, a deteriorização da
estrutura familiar, todos são fatores que, apesar de não justificarem a prática
de crimes, são fatores que deixam um indivíduo em situação de vulnerabilidade e
aptos a fazerem qualquer coisa para conseguir seus objetivos, e a maneira
aparentemente mais fácil, é agindo em desconformidade com a lei, lesando o bem
jurídico de outrem.
Falar em prevenção é falar em eliminar essas causas influenciadoras do comportamento
criminoso tendo como principal foco as crianças e adolescentes!
Estes sempre estarão em
situação de vulnerabilidade, pois estão em fase de formação de ideias, caráter,
portanto alvo de más influências que devem ser barradas pela educação, não só
no sentido de educação escolar, mas viver em um ambiente moralmente correto,
ser preparado para enfrentar as adversidades da vida, bem como ser
profissionalizado, enfim são inúmeros os cuidados que não só o governo, mas
toda a sociedade deve tomar para que a cada menos pessoas se submetam ao
submundo do crime. Mais
do que justo, é que se pague por um crime que se tenha cometido, mas para tanto
é necessário que inúmeras medidas sejam tomadas para garantir que esse
individuo além de punido esteja disposto a não mais cometer o erro que cometera
anteriormente.É certo que no Brasil existem
inúmeras irregularidades no que tange a execução da pena, porém existe a
proposta de mudança, existe uma legislação com todos os pré-requisitos para que
haja uma execução de pena digna para qualquer indivíduo, que por infelicidade
tenha cometido um crime. Basta que esta proposta seja abraçada por todos, pela
comunidade, pelas famílias dos presos, e principalmente pelo poder público,
como enuncia Rogério Greco (2008, p. 493):Os
critérios preventivos apesar de passíveis de críticas, ainda poderão servir à
sociedade, bem como ao agente que cometeu a infração penal, principalmente no
que diz respeito à prevenção especial ou à ressocialização do condenado. Pois
que, mais que um simples problema de Direito Penal, a ressocialização, antes de
tudo, é um problema político-social do Estado, e enquanto não houver vontade
política, o problema da ressocialização será insolúvel.
As penas alternativas devem ser incentivadas,
bem como à todo momento deve ser mostrado aos condenados a possibilidades de
benefícios quando houver bom comportamento carcerário, deve-se incentivar o
trabalho de forma que estes vejam o lucro de suas atividades e que estas sejam
suficientes para garantir o aprendizado do interno. Mas não
basta a criação de políticas para o momento da execução da pena, se faz
necessária a manutenção das políticas públicas existentes, igualmente a criação de novos métodos que intimidem o
indivíduo para não cometerem crimes, incluindo-se a impunidade tão temida pelo
conjunto da sociedade.A Criminologia tradicional
informadora de nosso sistema penal tem como objeto de estudo a criminalidade,
partindo da premissa de que o crime é um fenômeno ontológico, com gênese na própria
natureza da pessoa humana:Por esse modelo, os criminosos, devido a
deformações bio-psicológicas inatas, são pessoas predestinadas à prática
delitiva.
Portanto, de acordo com o mesmo modelo, o estudo do homem criminoso
traz as razões e explicações da origem do crime, sendo este um fenômeno
singular e de ocorrência em específica e identificada faixa social. Contudo,
observa-se que o estudo realizado a partir do criminoso já julgado (selecionado
pelo Sistema) é bastante limitado em seu objeto, pois não inclui aqueles
“criminosos” que ainda não foram selecionados pelo sistema. O que força a
concluir que este estudo é incompleto por não abranger a criminalidade em sua
totalidade. Não bastasse isto, o estudo é realizado apenas do “final”, isto é,
a partir da seleção já realizada pelo sistema, deixando de fora todo o processo
(realizado pelo próprio sistema) que levou a esta “catalogação” de criminoso.
Diante desta forma de atuação do Sistema Penal são
extraídas algumas conclusões importantes e que irão demonstrar que, longe de
cumprir suas declaradas funções, na realidade, o sistema cumpre outras, muito
opostas àquelas. Isto pode ser observado claramente com relação à pena de
prisão, cujas funções declaradas norteiam-se pela ressocialização, mas que,
quando de seu cumprimento pelos estabelecimentos prisionais, contrariamente
revelam-se funções criminógenas e estigmatizantes, como se pretende demonstrar
a seguir.
A RESSOCIALIZAÇÃO COMO única FINALIDADE DA PENA ?
Perante a evidente inutilidade das penas com fins
retributivos, como também com finalidade de prevenção geral e especial
negativa, a pena carcerária, consoante o discurso oficial, deveria passar a ter
como objetivo principal, senão único, o preparo do detento para seu retorno ao
convívio social em condições de manter uma vida e uma convivência em
conformidade com os padrões tidos como normais, sendo útil à sociedade.É o fim ressocializador que as modernas legislações
penais atribuem à pena privativa de liberdade. Tem-se como função primordial
dos estabelecimentos prisionais, de acordo com a teoria da prevenção especial
positiva (ressocializadora), é proporcionar aos cidadãos (que o Estado alijou
do seio social e os mantêm reclusos) oportunidades iguais de participação na
vida social, mormente no campo do trabalho, cuja oferta de emprego é
extremamente escassa, muito aquém da demanda. Mesmo
sabendo que, em conseqüência da pena de prisão que lhes foi imposta,
encontram-se em posição de desigualdade na sociedade frente aos demais
cidadãos, pois foram selecionados pelo Sistema, jogados na prisão e,
conseqüentemente, estigmatizados. Esta “pecha”, que marca para sempre os
ex-presidiários, lhes traz grandes dificuldades na concorrência direta, em
todos os setores da vida, com aqueles que não a possuem.
Francisco Muñoz Conde, teorizando,
faz outras restrições à idéia de ressocialização:
Entende, por exemplo, que falta
legitimidade à sociedade, ao menos no campo moral, para promover
ressocialização, vez que é ela mesma quem produz e define a criminalidade,
chegando ao ponto de dizer que “Não é o delinqüente, mas sim a sociedade quem
deveria ser objeto de ressocialização”.Embora pareça muito paradoxal, há muito significado
na afirmativa. Sabe-se que a sociedade sempre foi um depositário de mazelas e
de maus exemplos comportamentais. Ora, também é sabido que os delinqüentes não
passam de produto dessa mesma sociedade. Então, não pode o Estado, sem
questionar a qualidade das regras e normas que norteiam a vida social, querer
impor aos setenciados, como padrões de comportamento social, condutas que a
sociedade vivencia e adota (ou aceita) como exemplares. Ademais, acrescenta Francisco Muñoz Conde, as
normas que regem os membros de uma sociedade não são permanentes, às quais seus
membros devam estrita adaptação. Ao contrário, elas se alteram rápida e
profundamente, em decorrência da evolução da própria sociedade. Convém lembrar também a lição de Francisco Muñoz
Conde, que afirma não existir uma absoluta correlação entre delinqüência e
ressocialização, bem por isso nem todos os delinqüentes precisam dela, pois,
mesmo que tenham cometido um delito, não rompem seus vínculos com a sociedade,
continuando a respeitar-lhe a legalidade penal.Assim, a exemplo do que se apregoa como
desnecessária a prisão para uma série de delitos menos graves, por igual,
pode-se dizer que o “treinamento” para a ressocialização, é plenamente
dispensável em relação aos autores de crimes de pequena monta ou, como usado na
Lei nº 9.099/95, os crimes de “menor potencial ofensivo”. Também, podem ser incluídos os
autores de crimes passionais, posto que, ao cometer tais crimes, as pessoas são
movidas muito mais por questões emocionais do que sociais! O mesmo autor ressalva que não são apenas os
infratores de pequenos crimes que a ressocialização não alcança. Há criminosos
de grande porte que, igualmente, não necessitam de semelhante tratamento. Como
exemplificativo, cita os criminosos de guerra, os quais, em que pese a extensão
de seus crimes, nunca se sentiram alheios à sociedade e sua reincorporação não
acarretaria maiores problemas.
ISTO É FATO: "nem
todos os apenados precisam submeter-se ao processo ressocializador"!
Para muitos é totalmente desnecessário; para outros, ineficaz. Entendida
como reinserção social, a ressocialização supõe uma transformação interior, uma
auto-conscientização, uma mudança interna. Ela não se efetiva se as alterações
de comportamento e de atitudes acontecem apenas exteriormente, pois este
aparente conformismo pode dar-se unicamente pelo medo do castigo, da inflição
da pena. Assim,
caso os meios coativos venham a ser supridos, fatalmente irão desaparecer
aquelas atitudes tidas como ressocializadas. Ora, tudo isso acontece porque, na
efetividade, não se operou a mudança desejada. A prisão, vale repetir, não se
presta para isto.A par dessa questão, convém lembrar que muitas das
práticas carcerárias em nada favorecem a ressocialização. Por exemplo, o
tratamento dispensado ao detento, por parte do Estado, através de seus
funcionários e agentes prisionais é, com freqüência (senão de regra), inibidor
e desestimulante. Efetivamente, com o intuito de manter a disciplina e
favorecer o controle, são comuns os maus tratos, o distanciamento, a
indiferença, a negação não só de favores ou benefícios como também de direitos,
gerando nos apenados um clima de revolta e de desesperança (seria interessante deixar isso claro para o apenado, no instante que inicia o cumprimento de sua pena, para que o mesmo não leve para o lado pessoal a práxis dos agentes carcerários que devem falar uma só linguagem e ter uma só conduta para com os apenados, informa-los como adquirem e perdem benefícios da pena). Enfim, com semelhante ensinamento, pode-se
reafirmar que a ressocialização, embora discurso declarado pelo sistema, não é,
na efetividade, o fim verdadeiro e principal da pena privativa de liberdade,
mas, operado pela “eficácia invertida” deste sistema, cumpre funções
criminógenas, estigmatizantes e de reincidência.
O PROCESSO DE RESSOCIALIZAÇÃO FRENTE À
SEGREGAÇÃO SOCIAL
Torna-se fato incontroverso que é impossível
socializar ou ressocializar uma pessoa mantendo-a afastada da sociedade, pois
tal tarefa exige experiências práticas, não podendo limitar-se à teoria. Contrariamente ao objetivo
ressocializador, ocorre exatamente o inverso:O detento, com seu afastamento da sociedade, perde
os elos que o ligam a ela e à família, perde o “jeito” do convívio social e
adquire outros, próprios da cultura carcerária, que, quando sair, vai sentir-se
um “estranho na multidão”. Cezar Roberto Bitencourt aponta, dentre outros
fatores negativos à ressocialização pelo cárcere, a perda da convivência social
e dos seus efeitos positivos, dizendo: “ A segregação de uma pessoa do seu meio
social ocasiona uma desadaptação tão profunda que resulta difícil de conseguir
a reinserção social do delinqüente.” E os efeitos
negativos são tanto maiores quanto mais longa for a pena de condenação. Por
isso, as penas de longa duração já não devem mais ser admitidas, pois a
sociedade sofre mudanças profundas, de forma muito rápida, que não podem,
evidentemente, ser acompanhadas por quem não está inserido nela.Uma pessoa que, por exemplo, fica 10 (dez) anos
(nem precisa tanto) recolhido a uma prisão, ao sair dela vai encontrar um
“mundo” muito diferente daquele que deixou. E na prisão o tempo pára, nada evolui.
Para o Estado, interessado na manutenção do status quo, não interessam as
evoluções. Por tudo isto, a readaptação social vai ser muito difícil (senão
impossível) de acontecer.Alessandro Baratta, sobre o
afastamento do preso da sociedade, e seus efeitos negativos, assim se
pronuncia:“Um dos elementos mais negativos da instituição
carcerária decorre do isolamento do microcosmo carcerário em relação ao
macrocosmo social, que vem simbolizado pelos muros da prisão.” E complementa
dizendo que enquanto esse estado de coisas continuar, as chances de
ressocialização são mínimas, pois “Não se pode segregar pessoas e ao mesmo
tempo pretender reintegrá-las.” - A segregação, na forma como funciona o sistema
carcerário, deva existir, ela não pode, em absoluto, fazer uma cisão entre
pesos e sociedade. Ao contrário, o vínculo deve ser mantido. E este intercâmbio
deve funcionar tanto de fora para dentro como o inverso, isto é, de dentro para
fora. Assim, não só deve ser assegurado o direito da família e parentes visitar
seus presos, como estes devem ter o direito de, amiúde, sair da prisão para
visitar sua família. E mais: esse contato
não deve resumir-se às relações preso/família, mas estender-se à comunidade
como um todo. Muitos são os meios e as oportunidades que podem viabilizar essa
integração, como sessões de esporte, culturais, educacionais, eventos
familiares e comunitários, acontecimentos sociais. De máxima importância e de
extrema utilidade é a prática de atividades laborativas, seja dando condições
para que empresas abram campos de trabalho no interior dos estabelecimentos
prisionais, aproveitando a mão de obra carcerária, seja permitindo que os
presos saiam da prisão para trabalhar nas empresas. E, o que é muito
importante, que as atividades desenvolvidas contribuam para que os presos após
criteriosa triagem de pesquisa de sua atual personalidade, encontrem mercado de
trabalho quando saírem da cadeia, favorecendo-lhes a reinserção social.
A RESSOCIALIZAÇÃO DIANTE DE SUA
QUANTIFICAÇÂO DE PENA:
A pena tem uma finalidade primordial de
ressocialização, entretanto, a classificação do criminoso é realizada pela gravidade do crime praticado, periculosidade do criminoso e pela sentença a ele atribuída. Em sendo a finalidade
principal da pena a ressocialização do apenado, cabe ser criticada a
pré-determinação da quantificação da pena a ser definida na sentença, pois o julgador
não tem condições de saber quanto tempo é necessário para alcançar o fim
perseguido. Cada sentenciado tem seus aspectos individuais, suas
características próprias, daí a necessidade da classificação de cada um, o que
deve ser feito por profissionais capacitados. Observa-se que o anterior objeto
das políticas criminais, o ato criminoso, desloca-se para o ator. Com isso,
obrigatoriamente, alterou-se o significado e a organização das prisões. A
respeito, leciona Antônio Luiz Paixão: “Seu (da prisão) objetivo já não é a custódia... mas a recuperação do criminoso. Este não é parte de uma massa
indiferenciada e amorfa. Há que identificar e diagnosticar as múltiplas
determinações causais de seu comportamento para a aplicação das terapias
eficientes de recuperação. O novo paradigma
demanda, portanto, a classificação dos criminosos. Conforme o mesmo autor, essa
classificação é necessária para determinar-se a natureza da criminalidade do
agente e deve ser realizada por equipes interprofissionais, capazes de
recomendar programas terapêuticos mais apropriados e consistentes para cada
caso. Que não precisa ser exatamente a prisão, que, é sabido, tantas vezes
desnecessária, quando não prejudicial.” Aliás, a respeito da
desprisionalização, merecem ser destacadas as seguintes considerações
oferecidas pela Comissão acerca do Projeto de Lei que altera a Parte Geral do
Código Penal:
“Item 13 – Como já afirmado, o núcleo da presente
reforma desenvolveu-se em torno do título das penas. O espírito que norteou a
reforma de 1984 continua presente nesta parte, principalmente quando
reafirmamos que ‘uma política criminal orientada no sentido de proteger a
sociedade terá de restringir a pena privativa de liberdade aos casos de
reconhecida necessidade, como meio eficaz de impedir a ação criminógena cada
vez maior do cárcere. Esta filosofia
importa obviamente na busca de sanções outras para delinqüentes sem
periculosidade ou crimes menos graves. Não se trata de combater
ou condenar a pena privativa da liberdade como resposta penal básica ao delito.
Tal como no Brasil, a pena de prisão se encontra no âmago dos sistemas penais
de todo o mundo. O que por hora se discute é a sua limitação aos casos de
reconhecida necessidade.”
Mas, retornando à questão da
quantificação das penas, cabe transcrever a seguinte lição de Foucault:
“Ela (a prisão) permite quantificar exatamente as
penas, graduá-las segundo as circunstâncias, e dar ao castigo legal as formas
mais ou menos explícita de um salário; mas corre o risco de não ter valor
corretivo, se for fixada em caráter definitivo, ao nível do julgamento. A extensão da pena não deve medir o ‘valor de troca’ da
infração; ela deve se ajustar à transformação ‘útil’ do detento no decorrer de
sua condenação. Não um
tempo-medida, mas um tempo com meta prefixada. Mais que a forma do salário, a
forma da operação” - Faz-se também um raciocínio inverso, isto é: se,
após o cumprimento de todo o tempo da pena cominada, o condenado não apresentar
melhora, deveria ser solto? Ora, como o objetivo é alcançar a ressocialização,
o que importa é a obtenção do resultado. Para tanto, o tempo deve funcionar
apenas como instrumento, a ser usado na quantidade necessária à consecução do
fim desejado.
A DISCRICIONÁRIEDADE EXISTENTE PERANTE A APLICAÇÃO DA PENA
Efetivamente, muitos dos dispositivos penais
prevêem uma elástica faixa entre o mínimo e o máximo de tempo que pode ser
cominado à pena aplicada. Assim, apenas para exemplificar, toma-se o artigo
318, do Código Penal, (corrupção passiva), cuja pena pode variar entre 1 (um) a
8 (oito) anos, e para o peculato (artigo 312, CP) a faixa situa-se entre 2
(dois) e 12 (doze) anos de reclusão.Para o crime de tráfico de entorpecentes (artigo
12, da Lei 6.368/76), a pena pode variar entre 3 (três) e 15 (quinze) anos.
Considera-se um tempo muito elástico, que fica ao livre arbítrio do juiz.E os critérios para estabelecer a quantidade de
pena vêm catalogados no artigo 59, do Código Penal, que podem ser resumidos
basicamente num exame superficial da personalidade e da periculosidade do
sentenciado. Mas é, além do mais, um exame feito por um
homem só (o juiz) e inteiramente subjetivo, conforme o atual artigo 59 do
Código Penal:
“Art.59. O juiz, atendendo à culpabilidade,
antecedentes, reincidência e condições pessoais do acusado, bem como as
oportunidades sociais a ele oferecidas, aos motivos, circunstâncias e
conseqüências do crime e ao comportamento da vítima estabelecerá conforme seja
necessário e suficiente a individualização da pena”.
O CARÁTER SUB-CULTURAL DA VIDA NO CÁRCERE
Alessandro Baratta, destaca relativamente às
mudanças de comportamento que ocorrem nas cadeias, o que normalmente se alcança
nas prisões é uma alteração aparente, de fachada, no comportamento e nas
atitudes dos reclusos, que geralmente desaparece quando longe da vigilância. Também não devem ser esquecidos os efeitos contrários
provocados pela incorporação da subcultura da mentira e da dissimulação que o
cárcere cria entre os seus reclusos. Já o autor Muñoz Conde,
relativamente à questão penitenciária, como meio pretendido com o fim de
alcançar a ressocialização, que as críticas feitas a essa atividade não vêm
apenas contra a própria ressocialização, mas também contra o meio ou sistema
empregado para consegui-la, que é o tratamento penitenciário, destacando a
falta de liberdade como fator que impede a consecução do objetivo
ressocializador do recluso. E acrescenta que a falta de liberdade imposta ao
preso, além de ser um obstáculo ao seu tratamento, produz efeitos negativos
para a ressocialização.
A respeito do tratamento dispensado
nas prisões, resume em duas objeções básicas:
Sua ineficácia, para os fins que enuncia no
discurso, em conseqüência das más condições de vida verificadas nelas, e os
perigos para os direitos fundamentais dos reclusos decorrentes da forma
impositiva do tratamento:
-No primeiro caso, a existência de uma subcultura
carcerária, com uso e respeito de um regulamento ou código de postura e
comportamento próprio, superior às normas oficiais da instituição carcerária,
em que se destaca a absoluta imperiosidade do companheirismo e lealdade entre
os presos, cujas regras vêm acompanhadas de sanções, que vão desde o isolamento
e maus tratos, podendo chegar à pena capital. À evidência, a imposição e a
gradativa adoção dessa subcultura carcerária, mais que um elemento
dificultador, é um empecilho à atividade ressocializadora.Cria no
preso a chamada “desculturação”, que é a perda das capacidades vitais e sociais
para uma vida própria, de liberdade, de auto-confiança e de auto-determinação,
passando a adquirir uma cultura que é própria do preso, a chamada “aculturação”
ou “prisionalização”, processo pelo qual o apenado passa a adotar
comportamentos e atitudes próprias da cultura prisional, incluindo-se usos e
costumes, tradição e cultura dos estabelecimentos carcerários, a tal ponto que
muitos chegam a aceitar a cultura prisional como forma padrão de vida.
-No segundo caso, ou seja a falta de liberdade do
apenado, que se traduz na imposição de tratamento e de adoção de uma cultura
que o Estado considera ideal, é de se perguntar se realmente se efetiva a
ressocialização nessas circunstâncias, ou seja, sem a aceitação, ou ao menos
sem a colaboração do ressocializando, eis que, dessa forma, haveria simples
manipulação do sistema sobre o encarcerado.O tratamento (que tratamento?) sem o consentimento do
apenado é de certa forma ofensa aos direitos fundamentais do homem, que não os
perde com a perda da liberdade. Assim, o preso tem o direito de não aceitar a
cultura que o Estado pretende impor (qual especificamente se refere o autor Muñoz Conde?) especialmente se essa contraria seus
princípios, sua escala de valores. É o “direito de não ser tratado” que, segundo
Muñoz Conde, é parte integrante do “direito de ser diferente”, o qual deve
existir em toda sociedade pluralista e democrática.
O INSTITUTO DA REINCIDÊNCIA
O alarmante índice de reincidência criminal é uma
prova de que a prisão não se presta para o fim ressocializador. Ora, se muitos
ex-detentos voltam à prática de condutas consideradas criminosas, na maioria
das vezes as mesmas pelas quais foram anteriormente condenados, a conclusão
lógica é que a pena restritiva de liberdade não foi eficaz na sua função de
ressocializar. Em sentido geral, no que concerne à questão da reincidência,
tem-se que é muito elevado o número dos que, após cumprirem pena privativa de
liberdade, voltam à prática dos mesmos considerados delitos. E, muitas vezes,
da mesma espécie daqueles pelos quais foram anteriormente condenados. Ora, tudo
isto acontece porque o “tratamento” dispensado pelas prisões não foi eficaz no
sentido de controlar a criminalidade. Ao contrário, a revolta serviu para aumentar as
condições e oportunidades para a criminalização.A primeira vista, a idéia produz um certo choque e
tende a encontrar resistência à tese de responsabilizar o agente público pela
volta à delinqüência por parte de ex-presos. Entretanto, considerando-se que
uma das funções do Estado, com o segregamento prisional é, consoante o disposto
no artigo 1º, da Lei de Execução Penal, “proporcionar condições para a
harmônica integração social do condenado e do internado”, a pretensão deve
encontrar ressonância, pois que semelhante ação é juridicamente possível e o
Estado tem, sim, legitimidade passiva ad causam. Em vez disso, o que está
ocorrendo é exatamente o inverso. O Estado que deveria ser acionado é ele que,
através do Ministério Público, aciona a máquina judiciária, objetivando ver
condenado, novamente, o ex-detento, que voltou à prática de ações etiquetadas
como criminosas. E o resultado é o retorno do ex-presidiário à cadeia, com os
gravames decorrentes da reincidência.
Considerações Finais
A instituição da pena privativa de liberdade, de
acordo com a legislação em vigor, é uma das maneiras pela qual se pune o autor
de um ato anti-jurídico, com a finalidade de, em um primeiro momento,
castiga-lo e, posteriormente, prepará-lo para o retorno ao pleno convívio
social. Hoje, a administração penal tem um grande desafio, a reintegração
social do preso, contudo, observa-se que, no caso em tela, não basta,
simplesmente, discurso político desprovido de propostas e ações concretas, que
resultem, necessariamente, na satisfação das necessidades particulares dos
apenados em relação àquilo que se propõe desenvolver.A mídia, constantemente, desmente aqueles que
tentam se utilizar do caótico sistema penitenciário, para promoção pessoal, com
notícias que registram desde a superpopulação carcerária até os mais bárbaros
desatinos, cometidos por uma parcela esquecida da sociedade que sobrevive, a
revel dos olhos do Estado, em condições subumanas.Humanizar é a proposta, ressocializando e
reintegrando o apenado, assegurando-lhe condições plenas de ocupar um papel na
cadeia produtiva de sua comunidade é o objetivo, através de três propostas
claramente definidas: educação, profissionalização e trabalho. Estamos
convictos de que somente a educação e a profissionalização pode provocar uma
severa mudança comportamental dos detentos. O trabalho, como fator, meramente, ocupacional é
contestado, porém, entendemos, que se bem dirigido, indubitavelmente, pode ser
um parceiro muito forte no processo ressocializador. A experiência e a mídia
demonstram que o modelo praticado nos estabelecimentos penais não recupera
apenado algum. Há falta de recursos, infra-estrutura nas instalações e,
praticamente, não existe prioridade alguma para com o resgate da cidadania do
preso. Sob esta ótica, tem-se procurado utilizar o trabalho dos apenados como
forma de recuperação da sua cidadania e de tentar amenizar as gritantes
deficiências do Sistema Prisional do País.Propor medidas que viabilizem o resgate da
escolaridade perdida pelos detentos ao longo de suas vidas e, ainda,
alternativas de profissionalização coerentes, direcionando a formação de modo
metódico, conforme os centros de interesses do indivíduo e as necessidades do
mercado de trabalho.Portanto,a proposta mais viável é a criação de um
Centro de Ressocialização, que favoreça um integral processo de reintegração do
preso, favorecendo o retorno à vida em sociedade dos sentenciados, aliando
educação, profissionalização e trabalho.
Testemunho de um ex
apenado:
“Sou o filho mais novo de uma família de quatro irmãos e tinha uma vida
tranquila até o ano de 1995 quando tinha 17 anos. Nesta época como todo
adolescente, tinha vários relacionamentos afetivos, até que conheci uma mulher
mais velha que eu uns 10 anos. Foi um relacionamento conturbado, difícil e
complexo. Ela tinha outros envolvimentos e por causa de um destes
relacionamentos, tudo se transformou. Um de seus amantes tentou me matar, mas
no momento do crime, acabou matando o meu irmão mais velho que eu tanto amava.
Fiquei muito revoltado com a vida e com as pessoas.Há alguns anos atrás, antes
deste fato, eu já havia conhecido algumas drogas, caminho que agora eu entrava
completamente. Comecei a usar drogas pesadas e muita bebida.Após a morte do meu
irmão, meus pais se separaram. A propósito, eles já viviam uma vida de
conflitos. Ambos eram alcoólatras, e neste momento de grande dor na família,
não suportaram as dificuldades e acabaram se separando.Fui viver com a minha
mãe, e era difícil conviver com ela, pois ela estava completamente envolvida com as
bebidas. Acabei indo morar sozinho, ocasião em que me iniciei na vida do crime.
Cometi vários assaltos à mão armada, e afundei-me nas drogas. Minha vida não
tinha mais sentido. Viver ou morrer era mesma coisa.Depois de três anos fui
preso em flagrante e levado à prisão pela primeira vez. Condenado a 6 anos e 15
dias de reclusão, comecei a conhecer o inferno. Fui torturado e tratado como um
lixo, mas o pior estava por vir. Poucos dias após a minha prisão teve uma
rebelião na cadeia onde eu me encontrava. Detonamos tudo! Quebrar as portas e
romper as grades era uma forma de vomitar todo o ódio que estava acumulado
dentro de nós! O resultado foi a minha transferência para um presídio onde
cumpri oito meses de minha condenação. Ali presenciei várias mortes. Alguns
morreram por causa de drogas e outros por causas banais. Ali se morria por um
simples pedaço de pão. Eu não tinha nenhuma esperança de vida e pensava que ali
eu iria cumprir o restante de minha pena. Os dias de visitas no presídio eram
um grande sofrimento. Esperava com expectativas a presença de meus familiares,
sobretudo minha mãe e meu pai. Minha mãe, apesar das dificuldades sempre
aparecia, mas o meu pai, nunca me visitou no presídio. Isto me fazia sofrer
muito. Me deixava ainda mais revoltado, alimentando o propósito constante de
cometer novos crimes assim que alcançasse a liberdade. Mas Deus tinha um projeto
em minha vida.Como eu havia cometido meu ultimo delito em Itaúna, pra lá eu
tinha esperança de ser transferido, pois já tinha ouvido falar na APAC, um
presídio sem polícia e com oportunidades de recuperação. No dia 31 Dezembro de
1998, véspera de ano novo, Deus me concedeu a graça de chegar na APAC. Ali, tão
logo cheguei, me senti muito bem. A ausência de policiais, o respeito que
recebi dos voluntários, a amizade dos colegas de prisão me deram a certeza de
que eu poderia me recuperar. Foi quando eu tomei a decisão de deixar as drogas
e romper definitivamente com a vida do crime. Mas eu era muito fraco. O tempo
todo se falava em Deus na APAC, mas eu ainda não havia sentido a sua presença
em minha vida, e por isto continuava dividido entre o mundo do crime e uma vida
nova. Isto durou praticamente um ano. Em
Novembro de 1999, começou uma grande confusão na APAC. Falaram que era a
Jornada de Libertação com Cristo. Eu ficava pensando: o que seria isto? Foi
então que tudo mudou em minha vida. Durante três dias me revelaram Deus, me
falaram que eu podia ser feliz, que eu não era bandido. Isto me assustou, pois
era a primeira vez que me diziam que eu não era bandido.Que eu poderia voltar à
sociedade, ter uma família, emprego, voltar a estudar. Mas de tudo o que eu
ouvi naqueles dias, o que mais me marcou foram os testemunhos de
ex-recuperandos. Eu vi como a vida de vários companheiros tinha mudado, e por
isto a minha vida também podia mudar a partir de uma decisão de vida.E tudo
isto se confirmou no final da Jornada. Após a entrega dos certificados, fomos
todos para o pátio de visitas, cada um aguardando a chegada dos seus
familiares. Havia um fundo musical sendo tocado: oração da família de
Pe.Zezinho. Eu via os parentes dos meus companheiros chegando. Era um momento
de muita emoção e expectativa. De repente eu vi quando chegou minha mãe, irmãs,
sobrinhos, cunhados e o meu querido pai que há tanto tempo eu não via. Então eu
vi que eu não estava sozinho. Que era amado e estimado pelas pessoas mais
importantes. Vi que apesar de ingrato e grande pecador, Deus me devolveu a
família e a possibilidade de viver novamente com meus entes mais queridos. Com a graça de Deus, passados cinco
meses obtive meu livramento condicional, cuja noticia chegou ao final de uma
celebração eucarística, realizada no regime fechado da APAC.Hoje, me encontro
completamente livre das drogas. Trabalho como educador em um centro de
recuperação para menores infratores. Retomei os estudos. Voltei a morar com
minha mãe, que hoje se encontra em tratamento para se livrar do alcoolismo. No
primeiro semestre de 2003, Deus me reservou mais um presente: obtive meu
Indulto natalino, e hoje me encontro totalmente livre, pronto para continuar a
viver e a sonhar.”
*Cleubert Gualberto de Oliveira - Ex recuperando da
APAC
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Fonte: urisway.org.br
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Muito bom!!
Só não entendo uma coisa, você poderia esclarecer?
Para crimes qualificados, na qual a chance de recuperação do individuo, dependendo do crime é praticamente nula. A prisão passa ter como único objetivo de só isola-lo do meio social para evitar mais conflitos? Sendo que depois de cumprir a pena ele voltaria para a vida e praticaria novamente outros crimes? Como isso é trabalhado hoje em dia?
Obrigada.
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