O Evangelho nos
apresenta a oração do próprio Cristo:
“Pai Santo, guarda-os em teu
nome, o nome que me deste, PARA QUE ELES SEJAM UM ASSIM COMO NÓS SOMOS UM.
Quando eu estava com eles, guardava-os em teu nome, o nome que me deste. Eu
guardei-os e nenhum deles se perdeu, a não ser o filho da perdição, para se
cumprir a Escritura... Não te peço que os tires do mundo, mas que os
guardes do Maligno...CONSAGRA-OS
NA VERDADE; a tua palavra é verdade. Como tu me enviaste ao mundo, assim
também eu os enviei ao mundo. EU ME CONSAGRO POR ELES, A FIM DE QUE ELES TAMBÉM SEJAM CONSAGRADOS NA VERDADE” (Jo. 17,
11b-19).
Jesus reza e pede ao
Seu Pai por “eles”, pela Sua Igreja, a única e verdadeira Igreja: a Santa
Igreja Uma, Santa, Católica e apostólica, consagrada pela Verdade, pois foi Ele
mesmo que A fundou (Mt. 16, 18); Ele, o Cristo, que é Deus, e que é não só o
Caminho e a Vida, mas a própria Verdade (Jo. 14, 6). Jesus reza pela unidade
desta Igreja, já que “extra Ecclesiam nulla sallus” - “fora da
Igreja não há salvação”. E é por isso mesmo que a Santíssima Virgem
Maria pediu em Fátima a “conversão dos pecadores”, incluindo os hereges e
cismáticos, para que eles se salvem pela Igreja e na Igreja.O Cristo pede ao
Seu Pai: “que os guardes do Maligno”. Pede, porque é o diabo aquele que divide
(“diabolos”, “diabulum”), aquele que seduz com o afastamento da única e
verdadeira Igreja, que cria as suas próprias “igrejas” e, travestido muitas
vezes de anjo de luz (2Cor. 11, 14), e na imitação da Igreja de Cristo, sugere
que são todas elas legítimas e verdadeiras, incluindo até aquelas que negam seu
sacrifício redentor e sua divindade, tudo em nome de uma FALSA UNIDADE. A oração de Cristo
deixa à mostra a farsa de certas
“orações pela unidade cristã”, pois só existe unidade na Verdade da
única Igreja de Cristo, na Santa Igreja Católica. Como é possível rezar pela
unidade com um conjunto de seitas que se contradizem e quando a própria oração
é proposta por “conselhos” como o CONIC e o Conselho Mundial de igrejas (do
qual a Igreja Católica Romana se recusa a participar formalmente), e que estão
comprometidos, não com a Verdade e nem com a salvação, mas com um esquema
criminoso de poder comunista? Como é possível rezar por uma unidade na mentira
e sobre uma ideologia ante Cristã e atéia? Mentira que chega a constranger e
contaminar pessoas honestas e de bom coração que, na defesa dessa “união”,
acabam considerando até que ela é semelhante à harmonia entre a Santíssima
Trindade. Ora, como se fosse possível o Pai, o Filho e o Espírito Santo pregarem
coisas não só distintas, mas contrárias e contraditórias, chegando inclusive à
rejeição e ao insulto contra a Santíssima Virgem Maria,e outras verdades
ESSENCIAIS á salvção, e mesmo assim permanecer uma tal “trindade” ainda em
“harmonia”. Bom, todos sabem quem
é o príncipe deste mundo: o pai da mentira. E é por isso que Jesus reza e pede
ao Seu Pai Santo para que nos guarde – para que guarde a Sua Santa Igreja
Católica do Maligno. Jesus, que não fez apenas uma oração, “Cristo amou a
Igreja, e por ela se entregou a si mesmo, para a santificar” (Ef. 5, 21-33).
Para santificá-La na Verdade, enquanto em certas paróquias, dioceses, e em tantas outras
igrejas, se pede uma oração para rebaixá-la a uma unidade na mentira. É preciso falar um
pouco mais sobre certas “orações pela unidade cristã” de caráter Marxistas e
ideológicas, estranhas ao Cristianismo pregado por Cristo e seus apóstolos e
confirmado pelo magistério da Igreja. Alguns entusiastas paroquianos estão
invocando Pentecostes para legitimar uma falsa e superficial “unidade dos
cristãos”. Contudo, no Cenáculo, verdade seja dita, estavam presentes somente
os apóstolos da única Igreja “apostólica”. Lucas atesta uma presença especial,
que revela a farsa da “unidade” que hoje se prega: a presença de “Maria, mãe de
Jesus” (At. 1, 14). A Santíssima Virgem Maria, Mãe de Jesus, o Deus encarnado,
e Mãe da única e verdadeira Igreja fundada por Seu Filho e ungida pelo Espírito
Santo: a Santa Igreja Católica e apostólica.
O recurso à oração
sacerdotal de Jesus para legitimar esta atual farsa de “unidade dos cristãos” é
evidentemente descabido. Ora, quando Cristo a pronunciou não existiam as seitas
chamadas “cristãs”, mas apenas a Igreja, fundada sobre o primado de Pedro (Mt.
16, 18). Portanto, é óbvio que Jesus reza pela unidade desta Santa Igreja
Católica fundada sobre Pedro e não sobre homens posteriormente depois,
apartados desta Igreja fundada visivelmente sobre o primado de Pedro. E reza
também por aqueles que “vão acreditar em mim por meio da palavra deles(Jo. 17,
20) ou seja, por aqueles que serão convertidos. Pois só há unidade na Verdade,
e não na mentira, na divergência e na contradição da multiplicidade e
pulverização de seitas, na encenação que conserva a heresia e o cisma, a fraude
e até o desprezo para com a Santíssima Virgem Maria, tudo sob o véu da
“tolerância” e do “respeito”. Os que não cedem à
proposta escabrosa desta falsa e IRENISTA “unidade dos cristãos” são acusados
de promover a “divisão”. Sim, eu mesmo ouvi isso em vários sermões, recheados
de falsa humildade. Ora, tal discurso constrange os mais desavisados a cederem
a uma fraude, e é capaz de inocular na consciência deles um peso devido à sua
negativa. Por isso, talvez fosse justo e honesto que os entusiastas e
pregadores da “unidade” colocassem para o discernimento dos católicos: “quem der testemunho de mim diante dos homens, também eu darei
testemunho dele diante de meu Pai que está nos céus. Aquele, porém, que me
negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai que está nos
céus.Não julgueis que vim trazer a paz à terra. Vim trazer não a paz, mas a
espada. Eu vim trazer a DIVISÃO entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe,
entre a nora e a sogra, E OS INIMIGOS DO HOMEM SERÃO AS PESSOAS DE SUA PRÓPRIA
CASA...” (Mt. 10, 32-36). Essa passagem me
parece significativa para o católico que assiste dentro de sua própria Casa a
pregação de uma falsa “unidade cristã”, para o católico que está disposto a dar
o testemunho de que a sua é a única e verdadeira Igreja de Cristo.
Vejamos
algumas verdades proclamadas pelo sagrado magistério Católico:
1)- Como se pode distinguir A IGREJA DE JESUS
CRISTO de tantas sociedades e SEITAS fundadas pelos homens, e que se dizem
cristãs?
-Pode-se distinguir A VERDADEIRA
IGREJA DE JESUS CRISTO de tantas sociedades ou SEITAS fundadas pelos homens e
que se dizem cristãs por quatro notas características. A verdadeira Igreja de
Cristo é: UNA, SANTA, CATÓLICA e
APOSTÓLICA.
2)- Não poderia haver mais de uma Igreja
visível fundada por Cristo?
- NÃO PODE HAVER MAIS DE UMA
IGREJA, porque, ASSIM COMO HÁ UM SÓ DEUS, UMA SÓ FÉ E UM SÓ BATISMO, assim
também NÃO HÁ NEM PODE HAVER SENÃO UMA SÓ IGREJA VERDADEIRA.
3)- Pode alguém salvar-se fora da Igreja Una,
Santa, Católica e Apostólica?
- FORA DA IGREJA UMA, SANTA,
CATÓLICA e APOSTÓLICA, NINGUÉM PODE
SALVAR-SE por orgulho, sendo consciente desta verdade, como ninguém pôde
salvar-se do dilúvio fora da arca de Noé, que era figura desta Igreja.
4)- Somos obrigados a acreditar em todas as
verdades SOLENES que a Igreja ensina para nossa salvação?
- SIM, SOMOS OBRIGADO A ACREDITAR
EM TODAS AS VERDADES SOLENES QUE A IGREJA PROCLAMOU EM NOME DE CRISTO PARA
NOSSA SALVAÇÃO, E NOS ENSINA, e Jesus Cristo declarou que QUEM NÃO CRÊ JÁ ESTÁ
CONDENADO.
5)- Somos também obrigados a fazer tudo o que a
Igreja manda, mesmo sem ter sido SOLENEMENTE proclamado como dogma?
SIM, SOMOS OBRIGADOS
A FAZER TUDO O QUE A IGREJA MANDA, porque Jesus Cristo disse aos Pastores da
Igreja: “Quem vos ouve, a Mim me ouve, e quem vos despreza, a Mim me despreza”.
6)- A Igreja Católica é então infalível?
- SIM, a Igreja Católica é infalível quando proclama SOLENEMENTE um
dogma de fé, pela autoridade concedida por Deus de ligar e desligar e o auxílio
do Espírito Santo que não erra. Por isso AQUELES QUE REJEITAM AS SUAS
DEFINIÇÕES PERDEM A VERDADEIRA FÉ APOSTÓLICA, E TORNAM-SE HEREGES.
7)- Há outros deveres dos católicos para com a
Igreja?
TODO E QUALQUER CRISTÃO DEVE TER
PARA COM A IGREJA UM AMOR ILIMITADO, considerar-se feliz e infinitamente
honrado por ter sido escolhido por Deus para pertencer a Ela, pois Ele mesmo
diz que “não fomos nós que o escolhemos,
mas Ele que nos escolheu”, e EMPENHAR-SE PELA SUA GLÓRIA, AUMENTO e
santificação D’ELA, POR TODOS OS MEIOS AO SEU ALCANCE.
Os pregadores
paroquianos da falsa “unidade dos cristãos” proposta pelo CONIC e pelo Conselho
Mundial de igrejas pretendem agora legitimá-la propagandeando uma “união” para
realizar “obras”, obras de caridade, como se Cristo tivesse vindo ao mundo
unicamente para tratar de esgoto, saneamento básico e melhorar as condições dos
encarcerados. Uma justificativa fundada no mero ativismo é por si só grotesca,
e ela pressupõe a omissão das verdades solenemente proclamadas pela Santa
Igreja Católica. Por isso, é importante recordar a lição do Papa emérito Bento
XVI: [...] “Estou ciente dos desvios e
esvaziamentos de sentido que a caridade não cessa de enfrentar com o risco, daí
resultante, de ser mal-entendida” [...] “Daqui a necessidade de conjugar a
caridade com a VERDADE, não só na direção assinalada por S. Paulo da ‘veritas
in caritate’ (Ef. 4, 15), mas também na direção inversa e complementar da
‘caritas in veritate’” [...] “SÓ NA
VERDADE É QUE A CARIDADE REFULGE E PODE SER AUTENTICAMENTE VIVIDA. A verdade é
luz que dá sentido e valor à caridade. Esta luz é SIMULTANEAMENTE A LUZ DA
RAZÃO E A DA FÉ” [...] SEM VERDADE, A CARIDADE CAI NO SENTIMENTALISMO. O
amor torna-se um invólucro vazio, que se pode encher arbitrariamente. É o risco
fatal do amor numa CULTURA SEM VERDADE; acaba
prisioneiro das emoções e opiniões contingentes dos indivíduos, uma palavra
abusada e adulterada chegando a significar o oposto do que é realmente. A VERDADE
LIBERTA A CARIDADE DOS ESTRANGULAMENTOS DO EMOTIVISMO” [...] “No actual
contexto social e cultural, em que aparece generalizada a TENDÊNCIA DE
RELATIVIZAR A VERDADE, viver a caridade na verdade leva a compreender que a
adesão aos valores do cristianismo é um elemento útil e mesmo indispensável
para a construção duma boa sociedade e dum verdadeiro desenvolvimento humano
integral. UM CRISTIANISMO DE CARIDADE SEM VERDADE PODE SER FACILMENTE
CONFUNDIDO COM UMA RESERVA DE BONS SENTIMENTOS, ÚTEIS PARA A CONVIVÊNCIA
SOCIAL, MAS MARGINAIS”. [...] “Sem verdade, cai-se numa visão empirista e
céptica da vida, incapaz de se elevar acima da acção porque não está
interessada em identificar os valores – às vezes nem sequer os significados –
pelos quais julgá-la e orientá-la. A
fidelidade ao homem exige A FIDELIDADE À VERDADE, a única que é garantia de
liberdade (cf. Jo. 8, 32) e da possibilidade dum desenvolvimento humano
integral. É por isso que a Igreja a procura, ANUNCIA INCANSAVELMENTE e
reconhece em todo o lado onde a mesma se apresente. PARA A IGREJA, ESTA MISSÃO
AO SERVIÇO DA VERDADE É IRRENUNCIÁVEL”.
Da Unidade da Igreja Católica - Vigiai, o inimigo vem disfarçado
“Vós sois o sal da terra” (Mt 5,3), diz o
Senhor, e ainda nos recomenda que seijamos simples pela inocência e prudentes
na simplicidade [Mt 10,16]. Nada pois é mais importante para nós, irmãos
diletíssimos, quanto vigiar com todo o cuidado para descobrir logo e, ao mesmo
tempo, compreender e evitar as ciladas do inimigo traiçoeiro. Sem isso, embora
sejamos revestidos de Cristo [Rom 13,14; Gál 3,27], que é a Sabedoria de Deus
Pai [1Cor 1,24], nos mostraríamos menos sábios na defesa da salvação.De fato,
não devemos temer só a perseguição e os vários ataques que se desencadeiam
abertamente para arruinar e abater os servos de Deus. Quando o perigo é
manifesto, a cautela é mais fácil. O nosso espírito está mais pronto para lutar
contra um adversário abertamente declarado. É mais necessário ter medo e
guardar-nos do inimigo que penetra às escondidas, e se vai insinuando oculta e
tortuosamente com falsas imagens de paz. Bem lhe convém o nome de serpente!
Essa foi sempre a sua astúcia, esse foi sempre o tenebroso e pérfido engano com
que tenta seduzir o homem.Já no começo do mundo mentiu e enganou as almas
crédulas e ingênuas (dos nossos primeiros pais), acariciando-as com palavras
falazes [Gên 3,1ss] . Igualmente ousou tentar a Cristo, nosso Senhor, e se
aproximou dele insinuando, disfarçando, mentindo. Foi contudo desmascarado e
repelido. Desta vez, foi derrotado porque foi reconhecido e descoberto [Mt
4,1ss].Acima de tudo: cumprir os mandamentos de Cristo! Sirvam-nos estes
exemplos. Evitemos o caminho do homem velho, para não cair no laço da morte.
Sigamos as pisadas de Cristo vencedor, para que, usando cautela diante do
perigo, alcancemos a verdadeira imortalidade.Mas, como poderíamos chegar à imortalidade,
sem observar os mandamentos de Cristo? São eles os únicos meios para combater e
vencer a morte. Ele nos avisa: “Se queres chegar à vida, observa os
mandamentos” (Mt 19,17), e, de novo: “Se fizerdes o que vos mando, já não vos
chamarei servos, mas amigos” (Jo 15,15).Esses são os que ele diz serem fortes e
firmes. Esses têm fundamento sólido na pedra, e gozam de inabalável resistência
contra todas as tempestades e as rajadas do século. “Quem ouve as minhas
palavras – diz ele – e as cumpre é semelhante ao homem sábio que construiu a
sua casa sobre a pedra. Desceu a chuva, desabaram as correntes, sopraram os
ventos, batendo contra aquela casa, e ela não caiu porque fora fundada na
pedra” (Mt 7,25).Devemos, pois, prestar atenção às suas palavras, devemos
aprender e praticar o que ele ensinou e o que fez. Como poderia asseverar que
acredita em Cristo aquele que não cumpre o que Cristo mandou? E como conseguirá
o prêmio da fé aquele que recusa a fé no que foi mandado? Fatalmente ele irá
vacilando, à ventura, e, arrastado pelo espírito do erro, será varrido como pó
agitado pelo vento.Nunca poderão conduzir à salvação os passos daquele que não
adere à verdade da única via que salva.
O demônio é o autor dos cismas
Devemos pois
guardar-nos, irmãos caríssimos, não só dos males que aparecem claramente como
tais, mas também, como já disse, daqueles que nos enganam pela sutileza da
astúcia e da fraude.Pois bem, vede agora a que ponto chega a astúcia e a
sutileza do inimigo. Veio Cristo ao mundo. Veio a luz para os povos e
resplandeceu para a salvação dos homens [Lc 2,32]. Com isto ficou descoberto e
derrotado o antigo adversário. Os surdos abrem os ouvidos às graças
espirituais, os cegos abrem os olhos a Deus, os enfermos ficam são ao ganhar a
saúde eterna, os coxos correm à Igreja, os mudos soltam as suas línguas na
oração [Mt 11,5; Lc 7,22]. Aumenta dia a dia o povo fiel, abandonam-se os
velhos ídolos, tornam-se desertos os seus templos.Então, o que faz o malvado?
Inventa nova fraude para enganar os incautos com o próprio título do nome
cristão. Introduz as heresias e os cismas para derrubar a fé, para contaminar a
verdade e dilacerar a unidade. Assim, não podendo mais segurar os seus na
cegueira da antiga superstição, os rodeia, os conduz ao erro por novos
caminhos. Rouba à Igreja os homens e, fazendo-lhes acreditar que alcançaram a
luz e se subtraíram à noite do século, envolve-os ainda mais nas trevas: não
observam a lei do Evangelho de Cristo e se dizem cristãos, andam na escuridão e
pensam que possuem a luz, nisto são iludidos e lisonjeados pelo adversário,
que, como diz o Apóstolo, “se transfigura em anjo de luz” (2Cor 11,14).Disfarça
seus ministros em ministros de justiça, ensina-lhes a dar à noite o nome de
dia, à perdição o nome de salvação, ensina-lhes a propalar o desespero e a
perfídia sob o rótulo da esperança e da fé, a apregoar o Anticristo com o nome
de Cristo. Mestres na arte de mentir, diluem com as suas sutilezas toda a
verdade.Isto acontece, irmãos caríssimos, porque não se bebe à fonte mesma da
verdade, não se busca aquele que é a Cabeça, nem se observam os ensinamentos do
Mestre celestial.
“Tu és Pedro, e sobre esta pedra EDIFICAREI A MINHA
IGREJA”
Quem presta atenção
a estes ensinamentos não precisa de longo estudo, nem de muitas demonstrações.
A prova da nossa fé é fácil e compendiosa.Assim fala o Senhor a Pedro: “Eu te
digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas
dos infernos não a vencerão. Dar-te-ei as chaves do Reino dos céus e tudo o que
ligares na terra será ligado também nos céus, e tudo o que desligares na terra
será desligado também nos céus” (Mt 16,18-19).Sobre um só edificou a sua
Igreja. Embora, depois da sua ressurreição, tenha comunicado igual poder a
todos os Apóstolos, dizendo: “Como o Pai me enviou, eu vos envio a vós. Recebei
o Espírito Santo, a quem perdoardes os pecados ser-lhe-ão perdoados, a quem os
retiverdes ser-lhe-ão retidos” (Jo 20,21-23), todavia, para tornar manifesta a
unidade, dispôs com a sua autoridade que a origem da unidade procedesse de um
só.É verdade que os demais Apóstolos eram o mesmo que Pedro, tendo recebido
igual parte de honra e de poder, mas a primeira urdidura começa pela unidade a
fim de que a Igreja de Cristo aparecesse uma só.O Espírito Santo, falando na
pessoa do Senhor, designa esta Igreja única quando diz no Cântico dos Cânticos:
“Uma só é a minha pomba, a minha perfeita, única filha da sua mãe e sem igual
para a sua progenitora” (Cânt 6,9).Aquele que não guarda esta unidade poderá
pensar que ainda guarda a fé? Aquele que resiste e faz oposição à Igreja poderá
confiar que ainda está na Igreja?Paulo apóstolo inculca o mesmo ensinamento e
mostra o sacramento da unidade, dizendo: “Um só corpo e um só espírito, uma é a
esperança da vossa vocação, um Senhor, uma fé, um Batismo, um só Deus” (Ef
4,4-5).E, depois da ressurreição, diz ao mesmo: “Apascenta as minhas ovelhas”
(Jo 21,17). Sobre ele só constrói a Igreja e lhe manda que apascente as suas
ovelhas. Embora comunique a todos os Apóstolos igual poder, todavia institui
uma só cátedra, determinando assim a origem da unidade.É verdade que os demais
[Apóstolos] eram o mesmo que Pedro, mas o primado é conferido a Pedro para que
fosse evidente que há uma só Igreja e uma só cátedra. Todos são pastores, mas é
anunciado um só rebanho, que deve ser apascentado por todos os Apóstolos em
unânime harmonia.Aquele que não guarda esta unidade, proclamada também por
Paulo, poderá pensar que ainda guarda a fé? Aquele que abandona a cátedra de
Pedro, sobre o qual foi fundada a Igreja, poderá confiar que ainda está na
Igreja?
Da Igreja única e universal: muitos são os raios, mas de
uma só luz divina
Esta unidade devemos
guardar e exigir com firmeza, especialmente nós, bispos, que na Igreja
presidimos, para dar prova de que o episcopado também é um e indiviso. Ninguém
engane os irmãos com mentiras, ninguém corrompa a pureza da fé com pérfidos
desvios.Uma só é a ordem episcopal e cada um de nós participa dela
completamente. Mas a Igreja também é uma, embora, em seu fecundo crescimento,
se vá dilatando numa multidão sempre maior.Assim muitos são os raios do sol, mas uma só
é a luz, muitos os ramos de uma árvore, mas um só é o tronco preso à firme
raiz. E quando de uma única nascente emanam diversos riachos, embora
corram separados e sejam muitos, graças ao copioso caudal que recebem, todavia
permanecem unidos na fonte comum.Se pudéssemos separar o raio do corpo do sol,
na luz assim dividida já não haveria unidade. Quando se quebra um ramo da
árvore, o ramo quebrado já não pode vicejar. Se separamos um regato da fonte,
ele secará.Igualmente a Igreja do Senhor, resplandecente de luz, lança seus
raios no mundo inteiro, mas a sua luz, difundindo-se em toda a parte, continua
sendo a mesma e, de modo nenhum, é abalada a unidade do corpo.Na sua exuberante
fertilidade, estende os seus ramos em toda a terra, derrama as suas águas em
vivas torrentes, mas uma só é a cabeça, uma a fonte, uma a mãe, tão rica nos
frutos da sua fecundidade. Do parto dela nascemos, é dela o leite que nos
alimenta, dela o Espírito que nos vivifica.
Única Esposa de Cristo: não pode ter Deus por Pai, quem
não tem a Igreja por mãe
A Esposa de Cristo
não pode tornar-se adúltera, ela é incorruptível e casta [Cf Ef 5,24-31].
Conhece só uma casa, observa, com delicado pudor, a inviolabilidade de um só
tálamo. É ela que nos guarda para Deus e torna partícipes do Reino os filhos
que gerou.Aquele que, afastando-se da Igreja, vai juntar-se a uma adúltera,
fica privado dos bens prometidos à Igreja. Quem abandona a Igreja de Cristo não
chegará aos prêmios de Cristo. Torna-se estranho, torna-se profano, torna-se
inimigo.Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe. Como ninguém
se pôde salvar fora da arca de Noé, assim ninguém se salva fora da Igreja
[nota: aqui Cipriano fala dos obstinados que, conhecendo a verdade, insistem,
por ódio ou comodismo pagão, em se apartar da Igreja de Cristo].O Senhor nos
alerta e diz: “Quem não está comigo está contra mim, quem comigo não recolhe,
dissipa” (Mt 12,30). Quem rompe a paz e a concórdia de Cristo trabalha contra
Cristo. Quem faz colheita alhures, fora da Igreja, esse dissipa a Igreja de
Cristo.Diz ainda o Senhor: “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30), e do Pai, do Filho
e do Espírito Santo está escrito: “Estes três são um” (1Jo 5,7). Como poderá
alguém pensar que esta unidade da Igreja, decorrente da própria firmeza da
unidade divina, e tão conforme com este celeste mistério, pode ser rompida e
sacrificada ao arbítrio de vontades opostas? Quem não observa esta unidade não
observa a lei de Deus, não observa a fé do Pai e do Filho, não possui nem a
vida, nem a salvação.
A túnica inconsútil de Cristo
Este sacramento da
unidade, este vínculo de concórdia inviolada e sem rachadura, é figurado também
pela túnica do Senhor Jesus Cristo. Como lemos no Evangelho, ela não foi
dividida, nem, de modo algum, rasgada, mas sorteada. Isto quer dizer que quem
toma a veste de Cristo e tem a dita de se revestir do próprio Cristo [Rom
13,14; Gál 3,27], deve receber a sua túnica toda inteira e possuí-la intacta e
sem divisão.Diz a divina Escritura: “Quanto à túnica, visto que, desde a parte
superior, era feita de uma única tecedura, sem costura alguma, disseram: não a
dividamos, mas lancemos-lhe a sorte para ver a quem toca” (Jo 19,23-24). A
unidade da túnica derivava da sua parte superior – em nosso caso, do céu e do
Pai celeste. Aquele que a recebia e guardava não podia rasgá-la de modo nenhum,
de fato ela era resistente e sólida por ser constituída de um modo inseparável (Veja
também REFLEXÃO PATRÍSTICA - "O
VERBO FEITO CARNE DIVINIZA O HOMEM" - Santo Hipólito de Roma, +235).Não
pode possuir a veste de Cristo aquele que rasga e divide a Igreja de Cristo.O
contrário aconteceu à morte de Salomão, quando o seu reino e o povo deviam ser
divididos. O profeta Aías, indo ao encontro do rei Jeroboão no campo, cortou o
seu manto em doze partes, dizendo: “Toma para ti dez partes, porque assim diz o
Senhor: eis que eu divido o reino da mão de Salomão, a ti darei dez cetros e
dois ficarão para ele, por causa do meu servo Davi e de Jerusalém, a cidade
eleita em que eu pus o meu nome” (1Rs 11,30-36). Para separar as doze tribos de
Israel, o profeta dividiu O seu manto.Mas o povo de Cristo não pode ser
dividido, e por isso a sua túnica, que era um todo feito de uma só tecedura,
não foi dividida por aqueles que a deviam possuir. Ficando uma só, bem firme na
sua contextura, ela mostra a união e a concórdia do nosso povo, isto é,
daqueles que são revestidos de Cristo. Por este sinal sagrado da sua veste,
proclamou ele a unidade da Igreja.
Figuras do Antigo Testamento: Raabe, o cordeiro pascal
Portanto quem será
tão celerado e pérfido, tão louco pelo furor da discórdia, para pensar como
possível ou até para ousar romper a unidade de Deus, a veste do Senhor, a
Igreja de Cristo?Ainda uma vez nos avisa ele no Evangelho dizendo: “E haverá um
só rebanho e um só pastor” (Jo 10,16). E como se pode pensar que, num mesmo
lugar, existam muitos pastores e muitos rebanhos?O apóstolo Paulo, por sua vez,
inculcando esta mesma unidade, suplica e exorta: “Rogo-vos, irmãos, pelo nome
de nosso Senhor Jesus Cristo, que todos digais as mesmas coisas e não se dêem
cismas entre vós. Sede unidos no mesmo sentimento e no mesmo pensamento” (1Cor
1,10) E de novo: “Sustentando-vos mutuamente no amor, esforçando-vos por
conservar a unidade do Espírito na união da paz” (Ef 4,2-3).Achas tu que alguém
pode afastar-se da Igreja, fundar, a seu arbítrio, outras sedes e moradias
diversas e ainda perseverar na vida? Ouve o que foi dito a Raabe, na qual era
prefigurada a Igreja: “Recolhe teu pai, tua mãe, teus irmãos e toda a tua
família junto de ti, na tua casa, e qualquer um que ouse sair fora da porta da
tua casa, será ele próprio culpado da sua perda” (Jos 2,18-19).Igualmente o
sacramento da Páscoa [antiga], como lemos no Êxodo, exigia que o cordeiro,
morto como figura de Cristo, fosse comido numa só casa. Eis as palavras de
Deus: “Seja comido numa só casa, não jogueis fora da casa carne alguma dele”
(Ex 12,46). A carne de Cristo, o Santo do Senhor [Nota: “Sanctum Domini” O
Santo do Senhor – era como os primeiros cristãos chamavam a Eucaristia – O
Corpo e Sangue de Cristo Jesus], não pode ser jogado fora. Para os que nele
crêem, não há outra casa a não ser a única Igreja.O Espírito Santo anuncia e
significa esta casa, esta morada da união dos corações, dizendo nos salmos:
“Deus faz habitar na casa aqueles que são unânimes” (Sl 67,7). Na casa de Deus,
na Igreja de Cristo, os moradores são unidos e perseveram na concórdia e na
simplicidade.
A pomba, exemplo de sociabilidade e concórdia
Por isto também o
Espírito Santo desceu em forma de pomba [Mt 3,16; Mc 1,10], animal simples e
alegre, sem amargura alguma de fel, incapaz de se enfurecer; não morde, não
arranha com as unhas. Prefere as moradias dos homens e gosta de habitar numa
mesma casa. Quando criam, as pombas cuidam dos filhotes juntamente, quando
viajam, voam pertinho umas das outras. Passam o tempo em tranqüilos arrulhos,
manifestam a concórdia e a paz beijando-se no rosto. Enfim, em todas as coisas
seguem a lei da boa harmonia.Esta é a simplicidade que deve reinar na Igreja,
essa a caridade que devemos realizar: o amor fraternal imite as pombas, a
mansidão e a brandura sejam iguais às dos cordeiros e das ovelhas.Como podem
estar no coração de um cristão a ferocidade dos lobos, a raiva dos cães, o
veneno mortífero das serpentes ou a crueldade sanguinária das feras?Devemos
alegrar-nos quando os que têm esses sentimentos se separam da Igreja. Assim as
pombas e as ovelhas de Cristo não serão contagiadas pela sua maldade e pelo seu
veneno. Não podem conciliar-se e juntar-se amargura e doçura, trevas e luz,
chuva e céu sereno, guerra e paz, esterilidade e fecundidade, secura e manancial,
tempestade e bonança.Não acreditem que os bons possam deixar a Igreja: não é o
trigo que o vento carrega, o furacão não arranca as árvores que têm sólidas
raízes. Ao contrário são as palhas vazias que a tormenta agita, são as árvores
vacilantes que a força dos turbilhões abate. Contra esses o apóstolo S. João
manifesta a sua repulsa, dizendo: “Saíram do nosso meio, mas não eram dos
nossos. Se tivessem sido dos nossos, sem dúvida teriam ficado conosco” (1Jo
2,19).
Origem e maldade das heresias
A origem de onde
nasceram freqüentemente e continuam nascendo as heresias é a seguinte: há
mentes perversas e sem paz, que, discordando em sua perfídia, não podem
suportar a unidade. O Senhor, por seu lado, respeita a liberdade do arbítrio
humano, permite e tolera que isto aconteça, a fim de que o crisol da verdade
purifique os nossos corações e as nossas mentes, e, na provação, resplandeça
com luz inequívoca a integridade da fé.O Espírito Santo nos previne, por meio
do Apóstolo: “Convém que haja heresias para que entre vós se tornem manifestos
os que resistem à prova” (1Cor 11,19). Assim, aqui mesmo, antes do dia do
juízo, são divididas as almas dos justos e dos perversos e as palhas são
separadas do trigo.Esses são os que, por própria iniciativa e sem chamamento
divino, se põem a encabeçar temerários grupinhos. Contra toda a lei da
ordenação, se constituem superiores e, sem que ninguém lhes dê o episcopado, se
atribuem a si mesmos o nome de bispos. A eles faz alusão o Espírito Santo, no
Salmo, falando dos que estão sentados em cátedras de pestilência, porque são
peste infecciosa da fé. Mestres na arte de corromper a verdade, eles enganam
com bocas de serpente, vomitando de suas línguas pestilentas peçonhas
mortíferas. Os seus discursos brotam como chaga cancerosa, o trato com eles
deixa no fundo de cada coração um veneno mortal.
O Batismo cismático
Contra esses homens
brada o Senhor, para afastar ou retirar deles o seu povo desviado: “Não
escuteis os sermões dos pseudoprofetas, porque vivem iludidos pelas alucinações
do seu coração. Falam, mas não as palavras do Senhor. Aos que rejeitam a
palavra de Deus dizem eles: tereis a paz, vós e todos os que andam segundo as
próprias vontades. Não virá mal algum, ainda sobre aqueles que seguem os erros
do próprio coração. Eu não lhes falei e eles vão profetando. Se tivessem
atendido ao meu conselho, ouvido as minhas palavras e as tivessem ensinado ao
meu povo, eu os teria convertido dos seus perversos pensamentos” (Jer
23,16-22).E de novo fala deles o Senhor: “Abandonaram a mim, que sou a fonte da
água viva, e escavaram para si covas escuras, que nem podem dar água” (Jer 2,13
[Nota: Tradução literal do texto latino antigo. As versões tiradas do hebraico
dizem: “cisternas fendidas, que não retêm a água”]).Enquanto não pode haver
senão um Batismo, eles pensam que podem batizar. Abandonaram a fonte da vida e
ainda prometem a graça da água que dá a vida e a salvação. Lá os homens não são
purificados, mas, ao contrário, mais poluídos. Lá os pecados não são perdoados,
mas, antes, aumentados. Aquele nascimento não gera filhos para Deus, mas para o
demônio [Nota: Esta recusa do batismo dos hereges é conseqüência do pensamento
vigente. Este pensamento afirmava que qualquer violação na unidade da Igreja
significava perversão total da fé. Hoje, a Igreja aceita o batismo das
denominações protestantes tradicionais.].Os que pretendem nascer por meio da
mentira não recebem absolutamente as promessas da verdade. Gerados pela
perfídia, não alcançam a graça da fé. Aqueles que, no delírio da discórdia,
quebraram a paz do Senhor, não podem chegar ao prêmio da paz.
“Onde dois ou três…”
(Mt 18,20)
Alguns se enganam a
si mesmos com uma presunçosa interpretação das palavras do Senhor, que disse:
“Onde quer que se encontrem dois ou três reunidos em meu nome, eu mesmo estou
com eles” (Mt 18,20).São falsificadores do Evangelho e intérpretes mentirosos.
Apegam-se ao que é dito depois, esquecendo o que foi dito antes, lembram-se de
uma parte da frase e, astutamente, deixam do lado a outra. Assim como eles se
separaram da Igreja, do mesmo modo truncam o sentido de uma única sentença.De
fato, o que queria dizer nosso Senhor? Para inculcar aos seus discípulos a
união e a paz, diz ele: “Eu vos afirmo que, se dois de vós concordarem
na terra em pedir qualquer coisa, ela lhes será outorgada por meu Pai que está
nos céus” (Mt 18,19). E continua: “Onde quer que se encontrem dois ou três
reunidos em meu nome, eu mesmo estou com eles”, mostrando que o que mais vale na
oração não é o número dos que oram, mas a sua união de espírito.“Se
dois de vós concordarem na terra”, diz ele. Antes exige a união, põe na frente
a paz: o seu primeiro e mais firme preceito é que entre nós haja acordo. E como
poderá estar de acordo com alguém aquele que está em desacordo com o corpo da
Igreja e a totalidade dos irmãos?Como poderão estar reunidos dois ou três em
nome de Cristo, se é patente que estão separados de Cristo e do seu Evangelho?
De fato não somos nós que nos apartamos deles, mas eles de nós. E quando, em
seguida, formando entre si vários grupos, deram origem a heresias e cismas,
abandonaram a cabeça e a fonte da verdade.O Senhor quer falar da sua Igreja e
dirige aquelas palavras àqueles que estão na Igreja, dizendo que, se dois ou
três deles estiverem concordes, como ele ensinou e mandou, e se reunirem em um
só espírito para rezar, embora sejam só dois ou três, impetrarão da majestade
de Deus o que pedem.“Onde quer que se encontrem reunidos em meu nome dois ou
três, eu mesmo estou com eles”, quer dizer com os simples, com os pacíficos,
com os que temem a Deus e observam os seus preceitos. Com esses, ainda que não
fossem mais do que dois ou três, prometeu que estaria, assim como esteve com os
três jovens na fornalha ardente, e, porque permaneciam simples com Deus e
unidos entre si, até no meio das chamas, os animou com uma brisa de orvalho
(Dan 3,50).Do mesmo modo esteve presente aos dois Apóstolos encerrados na
cadeia, porque eram simples e unânimes. Ele mesmo abriu as portas do cárcere e
os conduziu de novo à praça para que pregassem à multidão a palavra que tão
fielmente anunciavam.Por conseguinte, quando o Senhor coloca entre os seus
preceitos estas palavras: “Onde quer que se encontrem dois ou três reunidos em
meu nome, eu mesmo estou com eles”, não quer separar os homens da Igreja, pois
ele mesmo instituiu e formou a Igreja, mas ao contrário, repreendendo os
pérfidos pela discórdia e encarecendo, com a sua própria voz, a paz aos fiéis,
quer mostrar que ele está mais com dois ou três que oram unânimes, do que com
muitos que oram na dissidência, e que obtém mais a prece concorde de poucos que
a oração sediciosa de muitos.
Não achará a Deus propício quem não está em paz com o
irmão
Por isto, quando
ensinou o modo de orar, acrescentou: “Quando estiverdes em pé para orar,
perdoai, se por acaso tendes mágoa contra alguém, a fim de que o vosso Pai que
está nos céus vos perdoe também os pecados” (Mc 11,25). E se alguém vier ao
sacrifício, estando de mal com alguém, ele o afasta do altar e ordena que,
antes, se ponha de acordo com o irmão, e só depois volte em paz para oferecer a
Deus a sua dádiva [Cf Mt 5,24].Deus não olhou aos presentes de Caim [Gên 4,5],
porque aquele que, pelo rancor da inveja, não tinha paz com o irmão, não podia
encontrar a Deus propício.Que espécie de paz podem pretender os inimigos dos
irmãos? Que sacrifício pensam eles oferecer, enquanto não são que rivais dos
sacerdotes? Julgam que Cristo esteja presente nas suas reuniões, enquanto se
reúnem fora da Igreja de Cristo?
DOS FALSOS MÁTIRES E MARTÍRIOS: Nem o martírio lava a
mancha da discórdia
Ainda que esses
homens fossem mortos pela confissão do nome cristão, o seu sangue não lavaria
esta mancha. O pecado da discórdia é tão grande e tão imperdoável, que não se
apaga nem pelos tormentos. Não pode ser mártir quem não está na Igreja,
não pode alcançar o Reino quem abandonou aquela que nasceu para reinar.Cristo
nos deu a paz. Ele nos mandou que fôssemos concordes e unidos, ordenou que os
laços do amor e da caridade fossem conservados intactos e sem rachadura. Não
pode iludir-se de ser mártir aquele que não conservou a caridade fraterna.O
apóstolo Paulo ensina e testemunha isto mesmo quando diz: “Ainda que eu tivesse
fé para remover as montanhas, mas não tivesse a caridade, eu nada seria, ainda
que distribuísse em alimento dos pobres tudo o que é meu, e entregasse o meu
corpo às chamas, mas não tivesse a caridade de nada adiantaria. A caridade é
magnânima, a caridade é benigna, a caridade não rivaliza, não faz mal, não se
pavoneia, não se irrita, não pensa com maldade, tudo ama, tudo crê, tudo
espera, tudo suporta. A caridade jamais termina” (1Cor 13,1-9).A caridade nunca
termina, ela estará sempre no Reino, durará eternamente pela unidade dos irmãos
em mútua harmonia. A discórdia não entra no Reino dos céus. Quem, com pérfida
divisão, violou a caridade de Cristo, não poderá chegar aos prêmios do mesmo Cristo,
que disse: “Este é o meu mandamento, que vos ameis mutuamente como eu vos amei”
(JO 15,12).Quem vive sem caridade está sem Deus. Eis a voz do bem-aventurado
apóstolo João: “Deus é amor. Quem permanece no amor permanece em Deus e Deus
nele” (1Jo 4,16). Não podem permanecer com Deus os que não quiseram estar
unidos na Igreja de Deus. Ainda que, lançados no fogo, fossem consumidos pelas
chamas ou perdessem a vida sendo expostos às feras, tudo isto não seria unia
coroa da fé, mas, antes, um castigo da sua perfídia, não seria o desfecho
glorioso de uma vida religiosa intrépida, mas um fim sem esperança.Um homem
assim poderia ser morto, mas não coroado. Ele confessa que é cristão do mesmo
modo que o diabo, muitas vezes, engana dizendo ser ele o Cristo. Escutemos o
aviso do Senhor: “Muitos virão com o meu nome, dizendo: sou eu o Cristo, e
enganarão a muitos” (Mc 13,16). Como o diabo não é Cristo, embora tome este
nome, assim não pode passar por cristão aquele que não permanece na verdade do
Evangelho e na fé de Cristo.
A lei do amor e a unidade
É certamente coisa
incomum e admirável profetizar, expulsar demônios e fazer obras portentosas
aqui na terra, mas quem faz todas essas coisas não conseguirá o Reino celeste
se não anda no caminho reto e certo.Ouçamos ainda o Senhor: “Muitos me dirão
naquele dia: Senhor, Senhor, não te lembras que em teu nome profetizamos e em
teu nome expulsamos demônios e em teu nome fizemos obras portentosas? Eu porém
lhes direi: jamais vos conheci, apartai-vos de mim, vós que praticais a
iniqüidade” (Mt 7,21-23). É necessária a justiça para que alguém possa ser
premiado por Deus. É necessário obedecer aos seus mandamentos e aos seus
avisos, para que os nossos méritos alcancem a recompensa.O Senhor, no Evangelho,
querendo mostrar-nos em breve resumo a senda da nossa fé e da nossa esperança,
disse: “O Senhor, teu Deus, é um só”, e continua: “Amarás ao Senhor, teu Deus,
de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças” (Mc
12,29-31). “Eis o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a ele: amarás ao
teu próximo como a ti mesmo. Nestes dois preceitos funda-se toda a lei e também
os profetas” (Mt 22,39-40).Com a sua autoridade ensinou, ao mesmo tempo, a
unidade e o amor. Em dois preceitos compendiou a lei e todos os Profetas. Mas
que unidade observa, que amor pensa praticar aquele que, como doido pelo furor
da discórdia, divide a Igreja, destrói a fé, perturba a paz, aniquila a
caridade, profana o Sacramento?
Essas atuais aberrações foram preditas
Este mal, ó irmãos
fidelíssimos, já tinha começado algum tempo atrás, mas agora, como triste
calamidade, foi crescendo dia a dia e a venenosa praga da heresia e dos cismas
aparece e pulula sempre mais. Assim deve acontecer no fim do mundo, como nos
vaticina e nos avisa o Espírito Santo por meio do Apóstolo: “Nos últimos dias,
diz ele, chegarão tempos difíceis e haverá homens que só buscam os próprios
gostos, soberbos, arrogantes, avarentos, blasfemos, desobedientes aos pais,
ingratos, desalmados, sem afeição e sem respeito de compromisso, caluniadores,
incontinentes, violentos, sem nenhum amor ao bem, traidores, atrevidos,
estupidamente altivos, amando mais os prazeres que Deus, ostentando um verniz
de religiosidade, mas conculcando todo valor religioso. Deles são os que se
insinuam nas casas e conquistam mulherzinhas carregadas de pecados, que se
deixam levar por várias volúpias e se mostram sempre curiosos de saber, mas
nunca chegam ao conhecimento da verdade. E como Jamnes e Mambres fizeram resistência
contra Moisés, assim estes resistem à verdade. Mas não serão bem sucedidos,
porque a sua incapacidade será a todos manifesta, como aconteceu àqueles” (2Tim
3,1-9).Tudo o que tinha sido preanunciado se está cumprindo e, enquanto se
aproxima o fim do mundo, tudo se realiza nas pessoas e nos acontecimentos.O
adversário está solto. Cada vez mais, o erro vai espalhando os seus enganos. A
insensatez gera orgulho, arde a inveja, a cobiça chega até à cegueira, a
impiedade deprava, a soberba incha, a discórdia exaspera, a ira enfurece.
Não ceder ao escândalo! Evitar cair na heresias! PERSEVERAR NA VERDADE!
Porém não nos
impressione nem perturbe essa desmedida e temerária perfídia de muitos. Ao
contrário, torne-se mais forte a nossa fé ao constatarmos a verdade do que foi
profetizado. Alguns fizeram-se traidores, porque assim fora predito; os demais
irmãos, em virtude da mesma profecia, acautelem-se contra essas coisas,
escutando a voz do Senhor, que diz: “Vós, porém, acautelai-vos, porque eis que
eu vos predisse tudo” (Mc 13-23).Evitai, pois, eu vo-lo peço, irmãos, esses
homens e repeli, de vosso lado e de vossos ouvidos suas perniciosas conversas,
como se repele um contágio mortífero. Está escrito: “Cerca os teus ouvidos com
uma sebe de espinhos e não ouças a língua maldosa” (Eclo 28,24). E ainda: “As
péssimas conversas corrompem até as pessoas de boa índole” (1Cor 15,33). O
Senhor nos recomenda que evitemos essa gente. “São cegos, diz ele, e guias de
cegos. Quando é um cego que conduz outro cego, caem juntos na fossa” (Mt
15,14).Convém estar longe e fugir de qualquer um que se separou da Igreja. É um
transviado, um culpado, ele se condena por si próprio [Cf Ti 3,11]. Poderá
pensar que está com Cristo aquele que está tramando contra os sacerdotes de
Cristo e se separa da comunidade do seu clero e do seu povo? Ele levanta armas
contra a Igreja e resiste às ordens de Deus. Adversário do altar, rebelde
contra o Sacrifício de Cristo, traidor na fé, sacrílego na religião, servo
intratável, filho ímpio, irmão inimigo, despreza os bispos e abandona os
sacerdotes de Deus e ousa erguer um outro altar, pronunciar com voz ilícita uma
outra prece, profanar, com falsos sacrifícios, a Hóstia do Senhor, e esquece
que quem vai contra as ordens de Deus será punido com os divinos castigos pela
sua atrevida audácia.[Nota: Parece até intolerância de S. Cipriano, mas defender a fé não é
intolerância. A culpa não é tanto estar fora da Igreja “in-fidelis“, mas em ter
saído da Igreja e teimar numa fé espúria e pervertida “perfídia”. S. Cipriano
deseja defender os que permanecem na Igreja, das falsas doutrinas dos hereges,
e não incitar um preconceito gratuito].
Castigos dos profanadores do culto
Assim Coré, Datã e
Abirão receberam, sem demora, o castigo da sua presunção, porque, violando as
ordens de Moisés e do sacerdote Aarão, pretenderam usurpar o direito de
oferecer sacrifícios [Cf Num 16,31-35]. A terra perdeu a sua firmeza, fendeu-se
numa profunda voragem, e o chão, assim aberto, os engoliu vivos e em pé. A
justiça indignada de Deus não atingiu só os autores daquele gesto, mas também
os outros duzentos e cinqüenta, seus companheiros, que foram cúmplices e
solidários com eles. De repente saiu do Senhor um fogo punitivo e os consumiu.
Isto deve valer como demonstração e sinal de que foi ofensa contra Deus tudo o
que aqueles perversos tentaram, com suas vontades humanas, para frustrar as
ordens do próprio Deus.Assim aconteceu também ao rei Ozias, quando segurou o
turíbulo e, com violência, pretendeu oferecer ele mesmo o incenso, violando a
lei de Deus e desobedecendo ao sacerdote Azarias, que a isto se opunha [Cf
2Crôn 26,16-20]. Lá mesmo foi confundido pela divina indignação e acometido por
uma espécie de lepra na fronte. Pela sua ofensa a Deus, foi punido justamente
naquela parte do corpo, onde recebem o sinal (da cruz) os eleitos de Deus.Também
os filhos de Aarão, por ter colocado no altar um fogo profano, contra os
preceitos do Senhor, foram mortos no mesmo instante pela divina vingança [Cf
Lev 10,1-2; Num 3,4].
Menos grave é o pecado dos lapsos* (Apóstatas):
*[Lapsos era o nome
dado aos cristãos que durante a perseguição tinham sacrificado incenso aos
ídolos, o que significava renúncia à fé. Para serem reintegrados na comunidade
da Igreja deviam se submeter às penitências prescritas].
São esses os exemplos
que seguem e imitam os que buscam doutrinas estranhas, introduzem ensinamentos
de invenção humana e desprezam a divina tradição. A eles aplicam-se as
repreensões e as censuras do Evangelho: “Rejeitais o mandamento de Deus para
apegar-vos à vossa própria tradição (pagã)” (Mc 7,90).Este
crime é pior do que aquele que se pensa terem cometido os lapsos, ao menos se
falarmos dos que estão arrependidos e rogam a Deus perdão do seu pecado,
dispostos a dar completa satisfação. Os lapsos, com súplicas, procuram a
Igreja, os cismáticos combatem-na. Os primeiros podem ter sido vítimas de
alguma pressão, os segundos erram no pleno uso da sua liberdade. O lapso,
pecando, se prejudicou unicamente a si mesmo, ao passo que aquele que tenta
criar heresias e cismas engana a muitos, arrastando-os à sua seita.
Lá há detrimento de uma só alma, aqui o perigo é de muitos. O lapso reconhece
que certamente pecou, disto lamenta-se e chora, o cismático, cheio de orgulho
no seu coração e comprazendo-se dos seus próprios erros, arranca os filhos à
mãe, afasta, com aliciamentos, as ovelhas do Pastor, arrasa os divinos
Sacramentos.O lapso pecou só uma vez, o outro continua pecando a cada dia. Por
fim, o lapso, mais tarde, poderá enfrentar o martírio e conseguir as promessas
do Reino, o cismático, ao contrário, se for morto enquanto está fora da Igreja,
não alcançará os prêmios da Igreja.
Confessores* que não perseveraram
*[Os confessores eram
os cristão que afirmavam a fé perante os perseguidores, e por um motivo ou
outro, não eram condenados a morte. Alguns deles, cheios de soberba pelo ato de
fé que praticou, achavam que tinham o direito de dar o aval aos lapsos (ver
nota acima) e reintegrá-los na comunidade sem as penitências. Alguns
confessores se tornaram cismáticos].
Não deveis estranhar,
irmãos diletíssimos, que até entre os confessores haja alguns que caíram nestes
crimes. Acontece também que alguns deles cometam outros pecados graves e
vergonhosos. A confissão da fé não torna uma pessoa imune das ciladas do
demônio. A quem ainda vive neste mundo ela não comunica uma perpétua segurança
contra as tentações, os perigos e o ímpeto dos ataques mundanos. Se assim
fosse, não veríamos, em confessores, os roubos, os estupros e os adultérios,
que agora, com imensa tristeza, devemos lamentar em alguns deles.Quem quer que
seja um confessor, ele não poderá ser maior, melhor e mais amigo de Deus que
Salomão. Entretanto, este, durante o tempo em que se manteve nos caminhos do
Senhor, conservou a benevolência com que o mesmo Senhor o tinha favorecido, mas
quando se desviou destes caminhos, perdeu também a benevolência do Senhor [3Rs
11,9].Por isto diz a Escritura: “Segura o que tens, para que um outro não tome
a tua coroa” (Ap 3,11). Se lá o Senhor ameaça tirar a alguém a coroa da
justiça, é sinal que quem renuncia à justiça fica privado também da coroa.
Honra da “confissão” aumenta o dever do bom exemplo
A confissão da fé é
um preâmbulo da glória, mas não é ainda a posse da coroa. Não é a glória
definitiva, mas só o início do mérito. Está escrito: “O que perseverar até o
fim, este será salvo” (Mt 10,22). Tudo pois o que fazemos antes do fim é só um
passo com o qual vamos subindo ao monte da salvação, mas só ao fim da subida
chegaremos à posse perfeita do cume.Trata-se de um confessor? Ora, depois da
confissão da fé, o perigo torna-se maior, porque o adversário está mais
enraivecido contra ele.É confessor? Por isto, mais do que nunca, deve
permanecer fiel ao Evangelho do Senhor, ele que pelo Evangelho conseguiu esta
honra. Diz o Senhor: “A quem muito é dado, muito será pedido e a quem é
concedida maior dignidade, deste exigem-se maiores serviços” (Lc 12,48).
Ninguém se deixe levar à perdição pelo mau exemplo de algum confessor. Ninguém
aprenda, do seu modo de proceder, a injustiça, a arrogância ou a perfídia.É
confessor? Seja humilde e tranqüilo em todo o seu comportamento, seja
disciplinado e modesto, de modo que, como é chamado confessor de Cristo, imite
também aquele Cristo que confessa “Quem se exalta será humilhado e quem se
humilha será exaltado” (Lc 18,14). Assim disse ele, e foi exaltado pelo Pai,
porque, sendo ele a Palavra, a Virtude e a Sabedoria de Deus Pai, se humilhou a
si mesmo na terra. E como poderia amar a altivez, ele que, com a sua lei nos
preceituou a humildade, e, em prêmio da sua humildade, recebeu do Pai o nome
mais sublime? [Cf Flp 2,9].Alguém foi confessor
de Cristo? Muito bem, mas, depois, por sua culpa, não sejam blasfemadas a
majestade e a santidade do próprio Cristo. A língua que confessou a Cristo não
seja maldizente nem sediciosa, não se ouça vociferando em altercações e brigas;
depois de palavras tão divinas de louvor não vá vomitando veneno de serpente
contra os irmãos e contra os sacerdotes de Deus.Em suma, se alguém, depois da
confissão, se tornou culpável e detestável, se aviltou a sua confissão com maus
comportamentos, se manchou a sua vida com torpezas indignas, se, afinal,
abandonou a Igreja, na qual se tornara confessor, e, quebrando a harmonia da
unidade, trocou a fé de então com a perfídia, um tal homem não pode
lisonjear-se, presumindo da sua confissão, de ser como que predestinado ao
prêmio da glória. Ao contrário, por isto mesmo, aumentaram seus títulos para o
castigo.
Elogio dos confessores
Vemos também que
chamou a Judas entre os Apóstolos, e este Judas, em seguida, traiu o Senhor. A
fé e a perseverança dos Apóstolos não esmoreceram pelo fato que Judas traidor
tinha pertencido ao seu grupo. Igualmente em nosso caso: a santidade e a
dignidade dos confessores não ficam destruídas, se naufragou a fé em alguns
deles.O bem-aventurado apóstolo Paulo diz numa das suas cartas: “Se
alguns decaíram da fé, será que a sua infidelidade tornou vã a fidelidade de
Deus? De modo algum. De fato, Deus é verídico e todo homem é mentiroso” (Rom
3,3-4; Sl 115,11).A maioria e a parte melhor dos confessores mantém-se
no vigor da sua fé e na verdade da lei e da disciplina do Senhor. Lembrando-se
de ter alcançado a graça e a benevolência de Deus na Igreja, não se afastam da
paz da mesma Igreja. Nisto merecem mais amplo louvor pela sua fé, porque,
desligando-se da perfídia daqueles que já foram seus companheiros na confissão,
resistiram ao contágio do mal. Iluminados pela luz verdadeira do Evangelho,
brilhando na pura e cândida claridade do Senhor, mostram-se tão dignos de
encômio na conservação da paz de Cristo, quanto o foram no combate, quando se
tornaram vencedores do demônio.
Apelo aos que foram enganados
Quanto a mim, irmãos
diletíssimos, não deixo de exortar e insistir, porque desejo que, se for
possível, nenhum dentre os irmãos pereça, e a mãe feliz (a Igreja) abranja no
seu regaço o seu povo, unido na concórdia como um só corpo. Se, todavia, este
salutar conselho não consegue reconduzir ao caminho da salvação certos chefes de
cismas e certos autores de dissensão, preferindo eles obstinar-se em sua cega
demência, ao menos os demais, os que foram surpreendidos na sua simplicidade,
ou se deixaram desviar por algum equívoco, ou foram enganados pelo ardil de uma
astúcia dissimulada, ao menos vós sacudi os laços falaciosos, livrai dos erros
os vossos passos extraviados, sabei reconhecer o caminho reto que conduz ao
céu. Ouvi a voz do Apóstolo, que clama: “Em nome de nosso Senhor Jesus Cristo,
nós vos mandamos, diz ele, que vos afasteis de todos os irmãos que andam
desordenadamente e não segundo a tradição que receberam de nós” (2Tes 3,6). E
de novo: “Ninguém vos engane com vãs palavras. Por causa disto veio a ira de
Deus sobre os filhos da contumácia. Não estejais, pois, ao lado deles” (Ef
5,6-7).Deveis evitar os delinqüentes e até fugir deles, para que não aconteça
que, juntando-se aos que trilham os caminhos do erro e do crime, alguém se
desvie também da verdade e se torne culpado de igual delito. Deus é um, Cristo é
um, uma é a sua Igreja, uma a fé e o povo (cristão) é também um, aglutinado
pela concórdia como na compacta unidade de um corpo. Esta unidade não pode ser
quebrada. Um corpo não pode ser dividido, desarticulando as suas junturas. Não
pode ser reduzido a pedaços, dilacerando e arranhando as suas vísceras. Tudo o
que se separa do centro vital não pode continuar a viver ou a respirar porque
fica privado do alimento indispensável à vida.
Bem-aventurados os pacíficos
O Espírito Santo
assim nos fala: “Quem é o homem que quer viver e deseja ver dias excelentes?
Refreia do mal a tua língua, e os teus lábios não falem insidiosamente. Evita o
mal e faze o bem, busca a paz e segue-a” (Sl 33,13-15). O filho da paz deve
buscar a paz, deve procurá-la. Quem conhece e ama o vínculo da caridade deve
guardar a sua língua do flagelo da dissensão.O Senhor, já próximo à paixão, entre
outros preceitos e ensinamentos salutares, acrescentou o seguinte: “Eu vos
entrego a paz, eu vos dou a minha paz” (Jo 14,27). Esta é a herança que nos
deixou. Todos os dons e todos os prêmios das suas promessas estão incluídos
nisto: a inviolabilidade da paz.Se somos co-herdeiros de Cristo [Cf Rom 8,17],
permaneçamos na paz de Cristo. Se somos filhos de Deus, sejamos pacíficos.
“Bem-aventurados os pacíficos, diz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt
5,9). Convém, pois, que os filhos de Deus sejam pacíficos, mansos de coração
[Cf Mt 11,29], simples quando falam, concordes nos afetos, sempre ligados uns
aos outros pelos laços da unidade de espírito.
O exemplo dos primeiros cristãos
Essa unidade reinou
ao tempo dos Apóstolos e a nova plebe, o povo dos que acreditaram, guardava os
preceitos do Senhor e ficava fiel à sua caridade. Prova-o a divina Escritura,
dizendo: “A multidão daqueles que acreditaram se comportava como se fossem
todos uma só alma e uma só mente” (At 4,32).E antes: “Estavam perseverando
todos unânimes na oração com as mulheres e Maria, a mãe de Jesus, e seus
irmãos” (At 1,14). Por isto oravam de modo eficaz e podiam confiar em alcançar
o que estavam pedindo à misericórdia divina.
Exortação para uma vida cristã INTEGRAL
Entre nós, ao
contrário, esta união está demasiado relaxada, e ao mesmo tempo aparece muito
enfraquecida a generosidade nas obras (boas). Então vendiam as suas casas e as
suas propriedades e entregavam o preço aos Apóstolos, para que fosse distribuído
aos pobres: assim colocavam seus tesouros no céu [Cf Mt 6,19]. Hoje nem se dão
os dízimos dos patrimônios e, enquanto o Senhor diz “vendei” [Cf Lc 12,33], nós
preferimos comprar e possuir mais. Como, entre nós, murchou o vigor da fé, como
esmoreceu a força daqueles que crêem.Por isto o Senhor, falando destes nossos
tempos, diz no Evangelho: “Quando vier o Filho do homem, pensas que encontrará
fé na terra?” (Lc 18,8). Vemos que está acontecendo o que ele predisse. No que
diz respeito ao temor de Deus, à lei da justiça, ao amor, às obras, não há mais
fé. Ninguém se preocupa com as coisas que hão de vir, ninguém pensa no dia do
Senhor, na ira de Deus, nos futuros suplícios dos incrédulos, nos eternos
tormentos destinados aos pérfidos. Se crêssemos, a nossa consciência teria medo
de tudo isto. Se não temos medo é sinal que não cremos. Quem acredita se acautela,
quem se acautela se salva.Despertemos, irmãos diletíssimos, quebremos o sono da
inércia rotineira e, por quanto for possível, sejamos vigilantes em guardar e
cumprir os preceitos do Senhor. Sejamos prontos, como ele seja, quando diz:
“Estejam cingidos os vossos rins, e as lâmpadas acesas nas vossas mãos, e vós
sede semelhantes a homens que esperam o seu dono, quando voltar das núpcias,
para lhe abrirem logo que ele chegar e bater. Bem-aventurados os servos que o
Senhor, chegando, encontrar vigilantes” (Lc 12,35-37). É necessário que
estejamos cingidos, a fim de que, quando vier o dia da partida, não sejamos
surpreendidos cheios de impedimentos e de embaraços. Fique sempre viva a nossa
luz e brilhe em boas obras, para nos guiar da noite deste mundo aos esplendores
da claridade eterna. Sempre solícitos e cautos, fiquemos à espera da chegada
repentina do Senhor. Quando ele bater, encontre a nossa fé vigilante com uma
tal vigilância que mereça receber o prêmio do mesmo Senhor.Se forem observados
esses mandamentos, se forem postas em prática essas exortações, não acontecerá
que sejamos vencidos, no sono, pela falácia do demônio, mas, como servos bons e
vigilantes, reinaremos com Cristo glorioso.
FRASES DE SANTO AGOSTINHO SOBRE A UNIDADE, A
VERDADE, E AS DIVERGÊNCIAS (Santo Agostinho: 354-430)
“A verdade não é minha nem tua, para que possa ser tua e minha.”
“Senhor, instrua-me acerca do que devo ensinar, ensina-me acerca de que
maneira devo me corrigir.”
“A busca de Deus é a busca da verdade e da felicidade. Encontrar-se com
Deus é encontrar-se com a verdade e a felicidade.”
“Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a
beleza do ar, que se dilata e difunde, interroga a beleza do céu; interroga
todas essas realidades. Todas te respondem: 'Vê, nós somos belas'. A sua beleza
é uma confissão. Essas coisas belas sujeitas à mudança, quem as fez senão o
Belo, não sujeito à mudança ?”
“Se Deus nos fosse compreensível, não seria Deus.”
“A fé e a razão caminham juntas, mas a fé vai mais longe.”
“Não penses que as heresias são fruto de mentes obtusas. É necessário
uma mente brilhante para conceber e gerar uma heresia. Quanto maior o brilho da
mente, maiores as suas aberrações.”
“Não evangelizes para viver. Vive para evangelizar.”
“Na medida em que alguém ama a Igreja é que possui o Espírito Santo.”
“Eu não acreditaria no Evangelho, se a isso não me levasse a autoridade
da Igreja Católica”
“Se não podes entender, crê para que entendas, pois a fé precede, o
intelecto.”
“A Igreja é Santa, a Única Igreja, a Verdadeira Igreja, a Igreja
Católica, lutando sempre contra todas as heresias. Ela pode lutar, mas não pode
ser derrotada. Todas as heresias são expulsas por ela, como os galhos pendentes
são arrancados de uma vinha. Ela permanece presa à sua raiz, em sua vinha, em
seu amor, por isto as portas do inferno não prevalecerão contra ela.”
“As pessoas costumam amar a verdade quando esta as ilumina, porém tendem
a odiá-la quando as confrontam.”
“Vacilará a Igreja se vacila seu fundamento. Mas poderá talvez Cristo
vacilar? Visto que Cristo não vacila, a Igreja permanecerá intacta até o fim
dos tempos.”
“Infeliz quem conhece todos essas coisas (terrenas) e não Vos conhece, ó
meu Deus! Feliz quem Vos conhece, embora ignore todo o resto. Quanto a quem Vos
conhece e conhece também as coisas terrenas, não é mais feliz por conhecê-las,
mas é unicamente o conhecimento que tem de Vós que o faz feliz.”
“Se você acredita somente no que lhe agrada nos Evangelhos e rejeita o
que não gosta, não é nos Evangelhos que você crê, mas em você mesmo.”
“A verdade tem poucos amigos.”
“A Igreja avança em sua peregrinação através das perseguições do mundo e
das consolações de Deus.”
“Um homem Cristão é Católico enquanto vive no corpo; decepado deste,
torna-se um herege. O Espírito não segue um membro amputado.”
“O Espírito Santo nos foi enviado, não para informar sobre a órbita do
Sol, da Lua e das estrelas, mas para que possamos ser discípulos de Jesus.”
“Fora da Igreja Católica pode encontrar-se tudo, menos a salvação.
Pode-se ter honra, pode haver Sacramentos, pode cantar-se o 'Aleluia', pode
responder-se o 'Amém', pode defender-se o Evangelho, pode ter-se fé no Pai, no
Filho e no Espírito Santo e, inclusive, até pregá-la. Mas nunca, se não for na
Igreja Católica, pode encontrar-se a salvação. Pode-se ouvir ao final da vida:
Não vos conheço”
“Que morte pior há para a alma do que a liberdade de querer permanecer
no erro ?”
“Tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus, até as quedas, pois
delas podemos levantar-nos mais vigilantes, mais fervorosos, e mais humildes”
“O caminho é mais difícil para aquele que caminha com tristeza e pena de
si mesmo, porém é mais fácil para aquele
que caminha com amor.”
“Dois amores fundaram duas cidades, a saber: o amor próprio, levado ao
desprezo de Deus, construiu a cidade terrena; o amor a Deus, levado ao desprezo
de si próprio, construiu a cidade celestial.”
“Mais vale ser curado permanecendo no corpo da Igreja, do que serem
cortados dela como membros incuráveis. Porque não é desesperada a cura daquilo
que ainda está unido ao corpo, enquanto que, tendo sido amputado, já não pode
ser curado nem sanado, pois murcha, seca e morre”
“O homem só encontra a verdade beatificadora ao curvar sua inteligência
à fé e sua vontade à graça, pela humildade.”
“Vós, pobres, que vos falta, se tendes Deus? Vós, ricos, que tendes, se
vos falta Deus?”
“Se queres conhecer uma pessoa, não observes o que ela faz, mas o que
ela ama...”
“Os que não querem ser vencidos pela verdade, serão vencidos pelo erro.”
REFERÊNCIAS:
-BENTO XVI - “Caritas in veritate” - Site Vatican.va
-São Luís Maria G. de Montfort – “Tratado da Verdadeira
Devoção à Santíssima Virgem Maria”.
-Catecismo Maior de São Pio X
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