A minha filha mais velha, sempre foi muito questionadora, e me lembro
que quando ela tinha uns 12 anos me perguntou assim a queima roupa: “Pai, se Deus sabe tudo, pra que a gente pedir alguma coisa pra Ele, se
Ele já sabe tudo que precisamos?” - Confesso que na hora fiquei meio atordoado sem saber dar uma resposta
convincente. Até citei um texto da bíblia que diz, “quem procura acha e quem
pede recebe”, mas senti que a minha resposta não a convenceu. Bom, ela não me questionou mais, porém, eu é que
fiquei querendo dar uma resposta a mim mesmo que me convencesse. Por graça de
Deus, fui assistir a missa de domingo na Catedral com o nosso bispo Dom.
Mariano Manzana, um bispo muito sábio! E na sua homilia ele me deu a resposta
que eu tanto procurava, quando explicava a parábola do fariseu e do publicano.
Numa simples frase Dom Mariano explicou tudo! “Os pobres são realmente os preferidos de Deus, mas os humildes são de
sua especial predileção, porque muitas vezes o pobre é orgulhoso e não sabe
pedir, mas exigir de Deus aquilo que lhe é de direito, mas o humilde mesmo
precisando, reconhece sua condição, se abaixa e pede a Deus: Sr. Tem piedade de mim porque sou pecador...”Eureka! - Encontrei a resposta que tanto eu procurava! A minha filha
estava na missa comigo, e como toda criança da sua idade não prestou atenção em
nada, mas expliquei a ela na volta pra casa, dessa vez senti que ela realmente
entendeu o porquê devemos pedir a Deus, mesmo que Ele saiba o que precisamos,
pois é um exercício da humildade. Então minha filha me bombardeou de novo: “Pai,
e o que é humildade?...” - Bom, isto é assunto para outra matéria. Predileção é
inclinação, preferência. Preferência está mais para primazia, privilégio, opção
e seleção. Grande engano quem pensa que ser pobre é sinônimo de humildade. Sei
que os “humildes de plantão” vão se incomodar muito e caso você seja uma dessas
pessoas que se incomodam, então está aí mais uma prova que de fato não há
nenhuma humildade em você! É possível ser milionário e ser humilde, assim como
é possível ser pobre, e não ser humilde. Sim, é possível ser rico, próspero, e
ter humildade.
Comentário de S.
João Crisóstomo (c. 345-407), presbítero em Antioquia, depois Bispo de
Constantinopla e Doutor da Igreja:
“Um fariseu e um publicano subiram até ao Templo para a oração. O
fariseu começou por enunciar as suas
qualidades, e proclamava: Ó Deus, dou-te graças por não ser como o resto dos homens, que são ladrões,
injustos, adúlteros; nem como este cobrador de impostos... Miserável, que te
atreves a julgar toda a terra! Porque espezinhas o teu próximo? E ainda sentes
necessidade de condenar este publicano! ... A terra não te foi suficiente?
Acusaste todos os homens, sem exceção: por não ser como o resto dos homens, nem
como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de
tudo quanto possuo. Infeliz! Quanta presunção nestas palavras! Quanto ao publicano, que ouviu muito bem estas afirmações,
podia ter retorquido: Quem és tu para te atreveres a proferir tais murmurações
sobre mim? Donde me conheces? Nunca viveste no meu meio, nem pertences ao grupo
dos meus íntimos. Porquê tamanho orgulho? Aliás, quem pode comprovar as tuas
boas ações? Porque fazes dessa maneira o teu próprio elogio, e quem te incita a
gloriares-te desse modo? Mas não fez nada disso, muito pelo contrário! Prostrou-se
por terra e disse: Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador. Porque fez prova de humildade, saiu justificado. O fariseu
abandonou o Templo privado de qualquer absolvição, enquanto o publicano foi
embora com o coração renovado pela justiça reencontrada. E, no entanto, não havia nele ponta de
humildade, no sentido em que usamos este termo quando algum nobre desce do seu
estado. No caso do publicano, portanto, não era de humildade que se tratava,
mas de simples verdade, porque ele dizia a verdade” (Homilias sobre a
Conversão, 2 (a partir da trad. da col. Pères dans la Foi, 8, DDB 1978, p. 46)
“Não sou digno de
que entres em minha casa,mas ordena com a tua palavra, e o meu empregado
ficará curado” (Lc 7,6-7)
Neste belo relato do Evangelho de Lucas nos é apresentado, com
simplicidade, a força e a intrepidez que se revelam numa pessoa de fé. Podemos
imaginar o que significou para aquele centurião romano o gesto de ter que
acudir a alguém do povo a quem dominava, buscando a cura de seu empregado. Teve
de superar muitas barreiras e impedimentos e esvaziar-se de seu orgulho e amor
próprio para realizar aquele gesto humilde de solicitar ajuda a um judeu.
Para Jung, a humildade é a coragem de olhar a própria sombra. Cultivar a humildade é uma das maiores e mais difíceis virtudes humanas. Ela está vinculada ao amor à verdade. "Ser humilde é amar a verdade mais que a si mesmo", escreve o filósofo Comte-Sponville. Em outras palavras, é assumir tudo o que a pessoa é, reconhecer-se diante de Deus e dos outros, ativando seus recursos e capacidades e acolhendo suas limitações, sua fragilidade e seus medos, com a disposição de viver o caminho do crescimento. A humildade não deve ser entendida como humilhação, mas como a capacidade de ser verdadeiro, transparente em nossa vida, reconhecendo-nos necessitados dos outros e de Deus. Humildade, dizia S. Teresa, é andar na verdade. Não se trata de atrofiar e esconder nossas próprias capacidades ou de desvalorizar-nos. Trata-se de reconhecer e expressar, com simplicidade, quem somos. Humildade é agradecer as capacidades e talentos e superar as limitações e fragilidades. É a virtude que mais humaniza, pois nos faz descer em direção à nossa própria humanidade e, a partir desta perspectiva, entrar no movimento que nos leva para além de nós mesmos. A radicalidade que o Evangelho nos propõe é a radicalidade de ser radicalmente humanos. E a humildade nos despoja de tudo o que é ilusão, falsas imagens de nós mesmos, vazias pretensões de poder, prestígio e vaidade. Fazendo emergir o que há de mais humano, portanto, mais divino, em nosso interior. Na história da humanidade e da Igreja grandes homens e mulheres deixaram transparecer em suas vidas a marca da humildade; e a humildade se expande no coração daquele que vive sinceramente sua existência.
O termo latino “humilis” deriva-se de “humus” (terra ou o solo)
É próprio do amor abaixar-se para elevar como Jesus fez. Todos surgimos
deste fecundo húmus fundamental, onde “humildemente” acolhemos o dom da vida,
onde toda existência funda suas raízes que a nutrem e se faz humilde e
verdadeiramente humana. Nós somos o solo, o húmus, onde o Deus-semente pode
germinar, criar raízes e florir.
Só admitindo nossa
própria fragilidade e limite e descendo ao fundo de nossa realidade, podemos
retornar transformados e com abundantes riquezas descobertas no garimpo do
nosso coração!
O caminho de descida
ao nosso próprio “húmus”, à nossa própria condição terrena onde Deus plantou
sua tenda, nos revela quem realmente somos, nos preserva de considerarmos como
“deuses” e nos liberta do orgulho e do auto-centramento que nos destroem. À
medida que, verdadeira e completamente, nos aceitamos e nos acolhemos como
húmus, mergulhamos na graça de Deus, pois
ela já fala dentro de nós desde nosso nascimento. Todas as
grandes correntes espirituais, tanto do Oriente como do Ocidente, conduzem à
humildade.
Reconhecer nossa
realidade humana é a condição não apenas para a humanização autêntica, mas
também para a verdadeira experiência de Deus!
Sem humildade, facilmente corremos o risco de nos apossarmos de Deus;
sem humildade, facilmente procuraríamos nos identificar
com Deus. “Sereis como deuses” (Gen. 3,5): este é o grande pecado de origem.
A humildade é a virtude do ser humano que reconhece não ser “deus”. Nesse
sentido, ela é a virtude dos santos e santas.
“Onde está a
humildade, está também a caridade” (S. Agostinho)
É que a humildade leva ao amor, e todo amor verdadeiro a supõe; sem a humildade, o eu ocupa o espaço disponível, e só vê o
outro como objeto ou como inimigo. A humildade é essa atitude pelo qual o eu se
liberta das ilusões que tem sobre si mesmo. Nesse sentido, a humildade
significa adotar uma atitude gratuita e receptiva, de um amor agradecido que
dirige tudo a Deus e entrega-se por completo à Sua Vontade.
A humildade é o contrário do orgulho, soberba, prepotência... que abrem
a porta para todas as injustiças: o desprezo do fraco, a exploração do pobre, a
exclusão do marginalizado e o ferido da vida. Só
podemos aceitar o presente da graça divina quando temos consciência de nossa
própria condição humana. Por isso, aqueles que mais avançaram no caminho
espiritual foram os que mais viveram a humildade. Eles passaram pela
experiência de que só podemos nos aproximar de Deus com humildade.
A humildade é o polo terreno em nossa caminhada espiritual. Para permitir que Deus atue nas
profundezas de nosso ser faz-se necessário o auto-esvaziamento, para ser
preenchido por Sua presença!
Agora, sim, podemos escutar a voz de Deus e sentir a sua presença em
nosso próprio coração, em nossos sonhos e desejos, em nossas paixões, em nosso
corpo e nossos sentimentos. Nós “subimos” a Deus quando
“descemos” à nossa humanidade. Este é o caminho da liberdade, este é o caminho
do amor e da humildade, da mansidão e da misericórdia; é o caminho de Jesus
também para nós.O coração, a quem não é estranho nada do que é “humano”,
alarga-se, enche-se do amor de Deus, que transforma tudo o que é humano. O
caminho da humildade é o caminho da transformação.Ao fazer, junto com Jesus
Cristo, o caminho da “descida”, o ser humano vai ao encontro de sua realidade e
coloca-se diante de Deus para que Ele transforme em amor tudo quanto existe
nele, para que ele seja totalmente perpassado pelo Espírito de Deus.No
Novo Testamento, a humildade é entendida não apenas como atitude para com Deus,
mas também para com os outros. Por isso, a humildade é vista juntamente com a
mansidão, brandura, perdão... Os elevados “ideais de
perfeição” nos impedem de envolver-nos com as pessoas reais e com suas feridas.
A humildade pressupõe um descentramento, um êxodo para o encontro com o outro,
acolhendo-o tal como é; ela nos conduz à pura gratuidade do amor
desinteressado; ela pressupõe, essencialmente, o reconhecimento da alteridade. Por
isso, não é possível viver a alteridade sem efetuar essa renúncia à posição
narcisista na qual a pessoa se centra sobre si mesma, caindo numa fria
insensibilidade diante de tudo o que acontece ao seu redor. Quando alguém encontrou sua própria condição humana,
reconcilia-se com tudo aquilo que é humano, quebra a rigidez na relação com o
mais fraco e o enfermo, com o imperfeito e o fracassado. Vê tudo
envolvido pelo olhar de bondade e misericórdia de Deus.
A oração significa
uma necessária “escavação”, esse esvaziamento que finalmente abrirá um lugar
para Deus.
Somos chamados à santidade. Entretanto, como
tudo na Criação, também a santidade está em processo, em gestação, em
crescimento, em trabalho de auto-esvaziamento. Ela floresce na
liberdade, na abertura e na humildade que leva à ação eficaz.
Pe. Adroaldo Palaoro, SJ - Centro de Espiritualidade Inaciana – Brasília
SOMENTE A VERDADEIRA
HUMILDADE PROPORCIONA A “PERFEITA ALEGRIA” QUE É RADICAL, SURPREENDENTE, E
INCOMPREENSÍVEL PARA ESTE MUNDO!
Vindo São Francisco certa vez de Perusa para Santa Maria dos Anjos com
frei Leão, em tempo do inverno e atormentado pelo fortíssimo frio, frei Leão
pediu-lhe:
-Pai Francisco peço-te, da parte de Deus, que me digas onde está a
perfeita alegria.
E São Francisco assim lhe respondeu:
-Quando chegarmos a Santa Maria dos Anjos, inteiramente molhados pela
chuva e transidos de frio, cheios de lama e aflitos de fome, e batermos à porta
do convento, e o porteiro chegar irritado e disser: Quem são vocês?
E nós dissermos:
‒ Somos dois dos vossos irmãos, e ele disser:
‒ Não dizem a verdade; são dois vagabundos que andam enganando o mundo e
roubando as esmolas dos pobres; fora daqui!
E não nos abrir e deixar-nos estar ao tempo, à neve e à chuva, com frio
e fome até à noite: então, se suportarmos tal injúria e
tal crueldade, tantos maus tratos, prazenteiramente, sem nos perturbarmos e sem
murmurarmos contra ele (…) escreve que nisso está a perfeita alegria!!! E
se ainda, constrangidos pela fome e pelo frio e pela noite batermos mais e
chamarmos e pedirmos pelo amor de Deus com muitas lágrimas que nos abra a porta
e nos deixe entrar, e se ele mais escandalizado disser:
‒ Vagabundos importunos, pagar-lhes-ei como merecem!
E sair com um bastão nodoso e nos agarrar pelo capuz e nos atirar ao
chão e nos arrastar pela neve e nos bater com o pau de nó em nó.Se nós
suportarmos todas estas coisas pacientemente e com alegria, pensando nos sofrimentos
de Cristo bendito, as quais devemos suportar por seu amor:Ó irmão Leão, escreve
que aí e nisso está a perfeita alegria, e ouve, pois, a conclusão, irmão Leão:
“Acima de todas as graças e de todos os dons do Espírito Santo, os quais
Cristo concede aos amigos, está o de vencer-se a si
mesmo, e, voluntariamente, pelo amor, suportar trabalhos, injúrias, opróbrios e
desprezos”.
(Excerto dos “Fioretti de São Francisco”, via Contos e Lendas Medievais)
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