(foto reprodução)
Por Thácio Lincon Soares de Siqueira - Zenit
Depois da entrevista concedida à revista dos
jesuítas La Civiltá Cattolica, e publicada no dia 16 desse mês, ZENIT
entrevistou o Presidente da Comissão Episcopal Pastoral da Vida e Família da
CNBB, Dom João Carlos Petrini. O bispo de Camaçari,
compartilhou com os nossos leitores algumas das suas impressões a respeito de
temas que o Pontífice vem repetindo desde que assumiu a Sede de Pedro.
Acompanhe a
entrevista na íntegra:
1)- ZENIT: Como você interpreta os temas que a mídia veio
polemizando e que o Papa tratou na sua recente entrevista à Civilta Cattolica?
Por acaso, o Papa está falando que agora é certo o que antes era condenado como
errado na Igreja?
Dom Petrini: O Papa Francisco apresenta de
maneira nova a grande tradição da Igreja. Nesse sentido, O Papa recorda aos
membros da Igreja e aos homens e às mulheres que buscam caminhos de luz e de
paz na vida pessoal e social que existe Algo que vem antes de qualquer
julgamento moral, antes de dizer se uma atitude é certa ou errada.O que vem antes é o olhar de Jesus Cristo, pronto
para acolher e perdoar, se apenas encontra uma abertura do coração. Um exemplo disso é o olhar de misericórdia sobre Zaqueu, que era o
chefe da máfia da época, mas procurava ver Jesus. E Jesus não se apressou a condena-lo
pelas suas atitudes reprováveis (rico, corrupto, e opressor). Antes, lhe disse: “Desce depressa porque hoje
quero ir à tua casa”. E Zaqueu, depois do encontro com Jesus começou a mudar de
vida, como o próprio evangelho comenta. (Lucas, 19, 1-10).
O Papa fala que a coisa mais importante é “curar as feridas e aquecer
os corações dos fieis, a proximidade!”
Esta atitude corresponde ao modo como Jesus se
comportava. Por isso, havia fariseus que reclamavam porque ele frequentava a
casa dos pecadores e tomava as refeições com eles! Esta atitude que acolhe,
ampara, derrama óleo sobre as feridas, como fez o bom samaritano quando viu um
homem caído na beira da estrada, é o que vem antes de qualquer juízo moral. Na
medida em que a pessoa, tocada dessa maneira por Jesus Cristo, se dá conta do
que está acontecendo, se liga e procura corresponder ao afeto que a abraça.
O Papa não quer substituir juízos negativos sobre
certas atitudes com juízos positivos, não quer dizer agora que está certo o que
a Igreja, há séculos, vem dizendo que está errado. Ele chama a nossa
atenção sobre uma postura parecida com a atitude de Jesus para enfrentar os
dramas humanos: antes acolher e amar, deter-se naquilo que vem antes de
qualquer juízo: antes vem Jesus, seu olhar de misericórdia, sua ternura que
acolhe e procura curar as feridas.
2)- ZENIT: Como é possível isso?
Dom Petrini: O que mais o Papa pede aos membros
da Igreja é que encontrem as pessoas com o mesmo coração e com o mesmo olhar
com o qual Jesus encontrava as pessoas do seu tempo. Ele acolhia sem restrições a todos, inclusive aos piores pecadores.
Somente condenava com dureza os hipócritas, isto é, aqueles que encobriam com
uma casca de falsidade, de pura aparência, suas atitudes reprováveis,
procurando fazer passar por justiça o que era injusto. Mas, a quem se
apresentava com simplicidade, com um coração pobre, isto é, sem nada a
defender, Jesus dava o perdão e a possibilidade de uma vida nova. Por isso,
Jesus é reconhecido como “o Salvador”, Aquele que pode salvar o homem e a
mulher do nosso tempo da insensatez, do vazio, da solidão, do desespero.
3)-ZENIT: E sobre as mulheres?
Dom Petrini: As
mulheres tiveram uma participação muito relevante na história de Jesus, a
começar por Maria que aceitou ser mãe do Filho de Deus. Mas muitas mulheres
acompanhavam Jesus durante os anos de sua vida pública. E a história da Igreja
está repleta de grandes mulheres que realizaram obras admiráveis, reformaram
congregações, persuadiram Papas a tomarem atitudes mais corajosas. Até mesmo na
Idade Media tão maltratada como idade de trevas, brilharam muitas mulheres como
estrelas de primeira grandeza. O Papa Francisco, já na viagem de retorno do Rio
de Janeiro a Roma, tinha se referido a elas recomendando que seja aprofundado o
conhecimento dessa realidade e que se estude mais a teologia da mulher. Isto já
é uma grande novidade que poderá abrir novas possibilidades de integração das
mulheres na vida da Igreja. É bom ficarmos com as palavras do Papa, sem querer
forçar para atribuir a ele outras intenções.
4)- ZENIT: Para o Papa o que é mais importante para a Igreja
nesse momento?
Dom Petrini: O Papa fala do
nosso mundo, tão desenvolvido com suas tecnologias sedutoras que resolvem
muitos problemas do quotidiano é, ao mesmo tempo, um mundo de sofrimentos, de
violências, de solidão. E o
pior é que todos estão tão atarefados em correr atrás de suas fantasias de
felicidade que os dramas humanos dos quais dificilmente alguém escapa, essas
dores são ignoradas, essas solidões não são vistas. O
mundo, diz o Papa, se parece com um hospital de campo depois de uma batalha.
Depois da batalha de cada dia, muitos ambientes de vida são parecidos a um
hospital de campo, cheios de feridos. O Papa, dirigindo-se aos católicos diz:
não percam tempo a verificar o colesterol ou a glicose no sangue. O momento apresenta
outra urgência: cuidar das feridas. Por isso, é importante – e ele deve ter
repetido essa idéia uma dúzia de vezes – acolher, cuidar, acompanhar, mostrar
nossa proximidade humana, sair de casa para ficar perto dessas pessoas que
sofrem e anunciar-lhes que Alguém as ama, mais do que pai e mãe. Depois, não
faltarão oportunidades para cuidar de outras questões. Quero terminar repetindo algumas palavras dessa
importante entrevista do Papa:
“Os
ministros do Evangelho devem ser pessoas capazes de aquecer o coração das
pessoas, de caminhar na noite com eles, de saber dialogar e também descer em
sua noite, na sua escuridão, sem perder-se.”
Fonte: Zenit
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