Ora, se o mundo jaz sob o poder do maligno,
é evidente que o demônio também, vai usar a política para interferir no plano
de Deus! Muitos falam de justiça, mas sem princípios morais. Só a justiça é critério
suficiente para a boa política? Este despretensioso
post quer despertar o papel do cristão na política e perceber a ação do maligno
neste contexto. Para muitos, ela é “coisa do diabo”. Para outros, é meio
de sobrevivência. Para outros tantos, incluindo leigos e religiosos é
impossível separar a vida em igreja da vida politico-partidária, fazendo do
altar palanques políticos. O que a Bíblia fala sobre política? O que ela sugere
a respeito da participação do cristão na esfera pública? O que os nossos pais
na fé e o magistério da Igreja têm a contribuir com o assunto?
A PRIMEIRA TENTAÇÃO A CRISTO: O PODER
POLÍTICO
Por Rodrigo Antônio Chaves
Nunca tinha lido o Evangelho nesta ótica, mas lendo a obra do Jesuíta Jean Laplace, um dos maiores pregadores de retiros da Companhia de Jesus, aprendi uma coisa muito importante: a primeira tentação do demônio a Cristo era de procurar que Jesus fizesse de si mesmo um rei político, ou que Jesus produzisse o seu poder material e instantaneamente! Relembremos a primeira tentação: Cristo foi ao deserto, e por lá jejuou por quarenta dias; durante este período nada comeu nem bebeu. O diabo vendo que ele estava com fome, disse a ele:
"SE VOCÊ É O FILHO DE DEUS, FAÇA COM QUE ESTA PEDRA SE TRANSFORME EM PÃO!"
Veja: “se você é o filho de Deus”. Aqui se revela algo bom: o demônio não é onisciente! Ele tem dúvidas se Jesus é realmente o filho de Deus, do contrário, se fosse ciente disto perceberia a idiotice de sua tentação. Ora a tentação inicial era relacionada ao poder político. Se Deus tem realmente poder, o demônio queria incitá-lo a terminar logo com a fome do mundo. A começar saciando a própria fome de Jesus! Dando pão ao povo, transformando as estruturas (não adianta trocar a coleira se o cachorro continua o mesmo), e as coisas materiais em pão, assim Deus seria um super-homem que resolveria todos os problemas do nosso mundo instantaneamente! O demônio não entendeu e continua sem entender absolutamente nada do plano de Deus (Ele só revela aos amigos conf. João 15,15), bem como muitos ainda hoje, até bem intencionados, também, não entenderam nada e chegam até a querer agir paralelamente ao plano de Deus dizendo:
"Não podemos falar de Salvação, Céu e inferno para quem não tem o que comer e vive escravo de um sistema opressivo e opressor"
Quem a princípio não veria nessas palavras algo realmente justo pelo que abraçar e lutar? Acabar com a fome e injustiças do mundo para somente depois, tratar de salvação, céu e inferno!
Ora, se o homem tem o trabalho, tem a
saúde, tem o mercado, e tem o Estado, seria necessário que ele se unisse para
destruir a miséria, e não imputasse a Deus a responsabilidade que nós temos!
O DEMÔNIO SEMPRE USA UM
BEM (eX.: A LIBERDADE) E o COLOCA SORRATEIRAMENTE COMO MAL (A LIBERTINAGEM), OU NOS TENTA PARA O MAL (opressão ditatorial) USANDO UM BEM: A LUTA PELA JUSTIÇA
Transformar pedras em pães, era a tentação e a ilusão, de que resolvendo o problema da fome, teríamos todos os problemas resolvidos, mas no plano de Deus a coisa não é tão cartesiana assim, e não foi assim que Jesus ensinou e agiu quando este caminhando com os apóstolos. Isso porquê Jesus era um alienado e com tendências fascistas? Não! Mas simplesmente por que Ele não é um político aos moldes do mundo, e nos ensinou claramente em Mateus 20,25-26 - como devemos agir. No plano divino e na sua economia Teândrica, percebemos que a Trindade não quer intervir arbitrariamente naquilo que o homem pode fazer. Igualmente, Jesus não se encarnou para vir resolver todos os problemas sociais e políticos do mundo como um super herói, ou gênio da lâmpada. Para isso Deus nos deu luzes, orientações, sabedoria, e capacidade de trabalhar colaborando com Ele.Pedir a Deus o trabalho é uma coisa, pedir a Deus o alimento é outra coisa, agora pedir a Deus que nos dê o que precisamos, sem fazer a nossa parte, é outra coisa muito diferente. Com relação a fome e miséria ninguém é a favor, mas o homem tem meios para fugir da fome, com o seu trabalho, com a sua dignidade. Ora jesus não veio para simplesmente dar pão material ao povo, Ele veio para dar a libertação e salvação eterna, e não apenas apenas a uma classe social, mas a todos os pecadores, sem distinção. Ele não foi contra se comer, ou matar a fome, mas sim contra ao uso errado do pão e da fome, usando-a como troca de benesses e apoio político. O poder político populista é falso. Ele engana-nos com coisas boas, travestidas como tais, embora com intenções diferentes.
Os que dão pão, e facilitam as coisas para o pobre, muitas vezes querem apenas O PODER!
Eles não estão preocupados com a alma do homem; se tivessem seria uma maravilha, mas não estão, realmente, estão preocupados apenas em dar um “jeitinho na vida”, fazer seu pé-de-meia e tirar o pe-da-lama,Não me pergunte porquê que eu não sei, mas o demônio usou o pão e a fome, para tentar arrancar o PODER DE JESUS. Embora neste mundo ele tenha poder maior que o ser humano. Isto é, ele está sob as vestes desta tentação em alguns governos.Até hoje isso se repete na política, alguns dão pão, ao pobre, mas não se preocupam com o homem por inteiro em sua dignidade de filho de Deus, pois visam apenas a conquista e perpetuação no poder.Repetem a tentação do demônio. E o seguem como pai. Destruindo a todos para tentar enganar com um bem, o mal que estão fazendo.O pior, chegam a dizer que são melhores que Jesus Cristo, quando falam que alimentaram não sei quantos milhões de pessoas. Isso parece ser bom. Mas a fundo é mentiroso, tal qual pode ter apenas uma veste de bom. Ora, é exatamente igual ao demônio, eles cumprem a tentação do demônio e ainda tentam a Cristo dizendo que são melhores que Ele porque dizem trabalhar pela justiça e dão pão ao homem, não importando se os fins justificam os meios.Transformar as pedras em pães, usar da fome “ajudando” ao pobre… Será? Será que intenção é boa? Jesus era pobre e nunca aceitou benefícios. Sempre trabalhou. E naquela época não tinha política pública nem previdenciária nenhuma, tinha impérios.O Pe. Laplace fez esta e outras reflexões, mas sobre esta eu nunca pensei por este lado, que o demônio tem o poder político não para ajudar o homem, contudo, para usá-lo para o próprio mal.
O diabo e a política
Por Carlos Heitor Cony
Naquela aldeia, todos roubavam de todos, matava-se, fornicava-se, jurava-se em falso, todos caluniavam todos. Horrorizado com os baixos costumes, o frade da aldeia resolveu dar o fora, pegou as sandálias, o bordão e se mandou. Pouco adiante, já fora dos muros da aldeia, encontrou o Diabo encostado numa árvore, chapéu de palha cobrindo seus chifres. Tomava água de coco por um canudinho, na maior sombra e água fresca desde que se revoltara contra o Senhor, no início dos tempos.
O frade ficou admirado e perguntou:
"O que está fazendo aí, nessa boa
vida? Eu sempre pensei que você estaria lá na aldeia, infernizando a vida dos
outros. Tudo de ruim que anda por lá era obra sua, assim eu pensava até agora.
Vejo que estava enganado. Você não quer nada com o trabalho. Além de diabo,
você é um vagabundo!"
Sem pressa, acabando de tomar o seu coco
pelo canudinho, o Diabo olhou para o frade com pena:
"Para quê? Eu trabalho desde o início
dos tempos para desgraçar os homens e confesso que ando cansado. Mas não tinha
outro jeito. Obrigação é obrigação, sempre procurei dar conta do recado. Mas
agora, lá na aldeia, o pessoal resolveu se politizar. É partido pra lá, partido
pra cá, todos têm razão, denúncias, inquéritos, invocam a ética, a
transparência, é um pega-pra-capar generalizado. Eu estava sobrando, não
precisavam mais de mim para serem o que são, e viverem no inferno em que
vivem".
Jogou o coco fora e botou um charuto na
boca. Não precisou de fósforo, bastou dar uma baforada e de suas entranhas saiu
o fogo que acendeu o charuto e completou:
"Quando entra a política, eu dou o fora, não precisam mais de mim...".
*Este texto foi publicado na Folha Online alguns anos atrás. Reproduzo-o pela sua atualidade
A política e o diabo
Por Carlos Batista Prado - Historiador
Poderíamos estabelecer alguma relação entre Hitler, Bin Laden, Bush e os políticos brasileiros? O historiador Rémi Kauffer, observou em seus estudos que governos autoritários trazem em seu bojo a síndrome da diabolização. Mas o que isso significa? Essa prática sempre esteve ligada a ditaduras, na qual o tirano, diaboliza seus opositores e adversários, com o objetivo de justificar e legitimar o perverso tratamento reservado a eles.Vejamos o caso de Hitler. Na Alemanha, o líder do III Reich apontava com os dedos seus satãs. Antes mesmo de alcançar o poder, seus adversários já estavam bem definidos no livro “Minha luta”, que escreveu enquanto esteve preso na fortaleza de Landsberg. Logo depois que ascendeu ao poder em 1933, Hitler iniciou a caça as bruxas vermelhas e aos judeus. Para legitimar seu poder e suas atitudes, ele luciferizou os descendentes dos hebreus e os marxistas. Em seus discursos, satanizava os seus adversários, pois, eles apareciam como os grandes responsáveis por todo o mal e todas as dificuldades que a Alemanha poderia sofrer. Seus opositores eram pintados como traidores em analogias com o próprio demônio. No entanto, esse estranho fenômeno político de diabolização dos opositores não é reservado apenas aos ditadores. Na década de 1980, o presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, qualificou a União Soviética de “Império do Mal”. Mais recentemente, os atuais inimigos dos EUA, receberam a denominação de “Eixo do Mal”. Essa designação serve para legitimar a ofensiva de uma guerra preventiva contra a Al-Qaeda, o Hezbollah, o Hamas, o Irã, a Síria, a Coréia do Norte e o Iraque, que também não fugiu a essa lógica. O objetivo dessa prática é criar no imaginário da população, uma relação entre esses grupos ou países com o “Terror”. Mediante essa vinculação com o mal, está forjada a base que sustenta e justifica as ações tomadas para combatê-los. Do lado oposto, Osama Bin Laden, também utiliza constantemente dessas analogias. O líder da Al-Qaeda qualificou o governo norte-americano de “Grande Satã”. Dentre as várias designações desse fenômeno, essa é a declaração mais evidente. Um olhar mais atento revela que essa prática política também está presente no cenário político brasileiro. No Brasil, o vocabulário utilizado muitas vezes não é tão direto e claro como os outros casos citados, mas a intenção é a mesma. Isso fica evidente em declarações, programas eleitorais e discursos de diversos políticos. Tanto a oposição quanto a situação adotam constantemente um comportamento agressivo no qual demonstram claramente a intenção de constranger e insultar seus adversários políticos.
Os partidos de oposição acusam e disparam constantemente contra a situação. Fazem declarações que o coloca como responsável de todos os problemas e fracassos. Não é raro ouvirmos acusações, como a de traidor, bandido, ladrão, vendido, canalha, corrupto, entre outros insultos. A utilização desse discurso pela oposição tem a clara intenção de provocar a desmoralização do governo, isso porque o relaciona com todas as dificuldades e problemas, ou seja, o relaciona com todo o mal que assola a sociedade. Por outro lado, os partidos da situação não fogem a essa regra. Quando o partido X, assume o cargo que antes era ocupado pelo partido Y, ele trata logo de adotar um discurso que desmoraliza o governo que o antecedeu. A culpa de uma segurança falida, de uma saúde precária, de uma educação ruim, do alto índice de desemprego e do atraso econômico é declarado como um triste legado de quem ocupava o cargo anteriormente. É muito comum ouvirmos um novo governo afirmar que está “arrumando a casa.” Nesse caso, esse discurso cumpre uma dupla função. Em primeiro lugar, o político que pratica essa retórica está satanizando seu rival. E em segundo lugar, não menos grave, está se isentando de responsabilidade.É impressionante como esse fenômeno político está cada vez mais presente em nossa democracia. E o atual cenário político, evidencia isso com uma clareza ainda maior. O tom dos discursos que os candidatos vem adotando, estão sendo indicados pelos dados das pesquisas. Dessa maneira, o candidato que está correndo atrás na intenção de voto, acaba baixando o nível de sua propaganda e passando a fazer uma campanha cada vez mais agressiva, beirando a baixaria. A síndrome da diabolização, segundo Kauffer é a negação de qualquer valor presente nas palavras e nas ações dos adversários políticos, é a recusa da veleidade da oposição. No Brasil, direita e esquerda, oposição e situação correm o risco de se perderem entre acusações e insultos. E dentro desse lamentável contexto político, as discussões de projetos, propostas e programas que objetivam satisfazer os anseios do povo, aparecem em um distante segundo plano. A síndrome da diabolização presente em nossa política é uma prova de que o filósofo Jean Paul-Sartre estava correto: “O inferno são os outros”.
PODEMOS MESMO ACREDITAR NO QUE A BÍBLIA DIZ?
Sim! Pelo menos de forma genérica, por três motivos:
1º)- O tempo de Satanás está com os dias contados, e ele sabe que no relógio de Deus, lhe resta pouco tempo (Apoc. 12,12). Deus já o tem como um derrotado e está decidido a acabar com o controle de Satanás sobre a humanidade. Deus promete ‘reduzir a nada o diabo e seus asseclas, consertando todos os estragos que ele tem causado (Hebreus 2,14).
2º)- Deus escolheu Jesus Cristo para reinar e governar o mundo. O atual governante do mundo é cruel e egoísta. Jesus é totalmente o oposto. Deus promete que Jesus, como Rei, “terá pena do humilde e do pobre, e os livrará da opressão e da violência” - (Salmo 72,13 -14).
3º)-Deus não mente e nem nos engana jamais! A Bíblia é clara ao dizer: “É impossível que Deus minta.” (Hebreus 6,18) Deus é um Ser por excelência de palavra — o que Ele promete, Ele cumpre! (Isaías 55,10-11) Sem dúvida, ‘o governante deste mundo será expulso’ ( João 12,31).
O que significa jaz e maligno?
O apóstolo João está dizendo que, por causa do pecado original, o primeiro pecado, de Adão, que todos nós, seres humanos, nascemos com este DNA gerado pelo pecado original. Nascemos, portanto, espiritualmente mortos, precisando de um antídoto para curar isto. O Senhor, pelo Seu grande amor pela humanidade, deu Seu único Filho, Jesus, que foi e é a cura (João 1,12-13; João 3,16).
Como é o amor de Deus por nós?
Tudo isto leva ao “mundo jaz no maligno”, pois o mundo está repleto de pessoas que não conhecem a Jesus, não se arrependeram, não confessaram Seu nomeAssim entendemos que o mundo está cheio de rebeldia contra o Senhor, incredulidade, orgulho, egoísmo, corrompendo assim, todos que ainda não obtiveram ou quiseram a cura.Encontramos palavras semelhantes para o significado de “jaz”, como estar no chão, estar deitado, estar morto, imóvel, sepultado. Como vimos anteriormente, isto pode nos levar a compreensão de que, por causa do pecado original, o mundo está “estendido ao chão”, imóvel, morto espiritualmente.Nesta perspectiva, se o mundo não se “curou”, com Jesus, portanto, está com DNA corrompido, só existe trevas, escuridão, sofrimento por causa do primeiro pecado.Conforme o apóstolo João bem nos avisa, que fora de Cristo, então, há o maligno, o pai da mentira e quem não está com Cristo, está com o maligno (João 8,44).
O poder do diabo sobre o mundo
A Bíblia chama o diabo de “o príncipe deste mundo”. Seu domínio não é o inferno, mas todo lugar onde o pecado reina. O pecado é rebelião contra Deus, que é o rei legítimo sobre toda a criação, e o diabo é o líder da rebelião. Quando vivemos no pecado, rejeitamos Deus como nosso rei e nos tornamos escravos do diabo (Efésios 2,1-2). Por causa disso, o diabo tem poder sobre nosso mundo.No entanto, isso não significa que o diabo tem poder absoluto sobre o mundo. Deus continua sendo o rei supremo sobre toda a criação. Ele permite que o diabo reine por um tempo sobre todos que vivem no pecado, mas Deus tem sempre a última palavra. O mundo jaz no Maligno mas Deus é maior que os dois.O mundo está debaixo do poder do diabo, mas quem é um autêntico Cristão não está! Quando uma pessoa é salva por Jesus, nasce de novo e tem uma vida diferente, vinda de Deus, livre do pecado. Por isso, não precisamos ter medo do diabo. Deus está nos protegendo.Nascer de Deus significa mudar de vida. Quem é salvo não vive mais para o pecado, mas vive para Deus. O poder do diabo sobre sua vida foi removido, porque agora pertence a Deus. O diabo ainda vai nos atacar, mas já não domina sobre nós (Efésios 6,10-11). Pelo poder de Jesus, podemos combater o diabo, vencer a tentação e viver uma vida livre do reinado do pecado. E, quando cometemos algum pecado, podemos pedir perdão a Deus e encontrar força nele para lutar contra a velha natureza. O amor de Deus nos transforma e protege da destruição do inimigo.
A importância da Política
Por Prof. Felipe Aquino - Cleofas
Infelizmente o demônio colocou na cabeça de muitos cristãos que “Política não presta”; então, os bons se afastaram dela deixando-a aos cuidados de muitos que a usam para o seu próprio bem, e não do povo, do bem comum. É claro que há políticos honrados.A Igreja sempre ensinou que a política é a arte de buscar “o bem comum”, o bem de todos, especialmente dos mais necessitados. Então, como disse o Papa Francisco, “política é arte de fazer caridade”. O verdadeiro político é um “sacerdote” que só pensa no bem dos seus concidadãos; não pensa em si mesmo. A política é boa, santa, o que não presta é a politicagem, o uso e abuso da política. O político é bom, o que não presta é o politiqueiro, que usa da política para seu enriquecimento, multiplicando as falcatruas e corrupções, os mensalões e outras práticas desonestas. Os papas têm repetido isso muitas vezes, chamando os católicos a entrarem sem medo na vida publica. O nosso Catecismo (§899) diz: “A iniciativa dos cristãos leigos é particularmente necessária quando se trata de descobrir, de inventar meios para impregnar as realidades sociais, políticas e econômicas com as exigências da doutrina e da vida cristãs. Esta iniciativa é um elemento normal da vida da Igreja.”
O Papa Francisco disse:
“A política, tão denegrida, é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o bem comum. Envolver-se na política é uma obrigação para o cristão. Nós não podemos fazer como Pilatos e lavar as mãos, não podemos. Temos de nos meter na política porque a política é uma das formas mais altas de caridade, porque busca o bem comum. Os leigos cristãos devem trabalhar na política. A política está muito suja, mas eu pergunto: está suja por que? Por que os cristãos não se meteram nela com espírito evangélico? É a pergunta que faço. É fácil dizer que a culpa é dos outros… mas, e eu, o que faço? Isso é um dever. Trabalhar para o bem comum é dever do cristão”.
João Paulo II já tinha dito na “Christifidelis laici” (n. 42):
"Para animar cristãmente a ordem temporal, no sentido que se disse de servir a pessoa e a sociedade, os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação na «política», ou seja, da múltipla e variada ação econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum"
Bento XVI pediu aos bispos que:
"Estimulem os fiéis leigos a vencer todo espírito de fechamento, distração e indiferença, e a participar em primeira pessoa na vida pública, para construir uma sociedade que respeite plenamente a dignidade humana”. Ele insistiu na importância das “iniciativas de formação inspiradas na Doutrina Social da Igreja, para que quem esteja chamado a responsabilidades políticas e administrativas não seja vítima da tentação de explorar sua posição por interesses pessoais ou por sede de poder”. (ROMA, 26 de maio de 2011 ZENIT.org).
Participar da política não é somente ser candidato a algum cargo político
Isso cabe a poucos! A maioria cristã tem de se engajar no sentido de votar bem e esclarecer a quem puder para fazer o mesmo. Precisamos vencer o pessimismo derrotista do “não tem jeito!”, “está tudo perdido!”, “não adianta fazer nada!”. Não! O Brasil é um grande país, abençoado, cheio de recursos; o que falta é educar o povo e conscientizá-lo.
Marthin Luther King, o grande pastor negro americano assassinado em 1963, disse: “Não tenho medo do grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem-caráter, dos sem-ética. Tenho medo é do silêncio dos bons.” Isso é uma tarefa política que cabe a cada um de nós. Orientar e educar o povo, os irmãos, os amigos, politicamente. Chega de dar o voto “a quem vai me beneficiar”; isso é egoísmo destruidor. Ensinemos os alienados a votar conscientemente, conhecendo a quem dá o seu voto, sem se deixar levar por conversas e promessas vazias e eleitoreiras. É possível sim levantar essa nação para o bem, a justiça e a verdade. Vimos como esse povo foi para as ruas de maneira ordeira e pacífica em junho de 2013, exigindo mais dos governantes. Agora, essa força precisa ser canalizada para as urnas. Que cada um esclareça seu próximo; ensine-o a votar com a cabeça e não com o coração ou com segundos interesses interesseiros e egoístas. Não posso votar pensando em mim, mas na Nação. Quando John Kennedy foi eleito presidente dos EUA, ele disse em seu discurso de posse: “Americano, não pergunte o que os Estados Unidos podem fazer por você, mas o que você pode fazer pelos Estados Unidos”. É preciso reformar a sociedade que está doente, mudar o nosso sistema político injusto, eliminar a corrupção e a imoralidade, restaurar a democracia; mas tudo isso começa com a eleição de pessoas honestas e capacitadas. Ensine as pessoas a não ficarem indiferentes e isentas de sua participação, isso significa abdicar do bem e da verdadeira justiça e entregar o poder aos piores, pois alguém será eleito quer gostemos ou não.
Política e espiritualidade: a justiça enquanto mediação do amor e do poder
Por Jorge Pinheiro
Em 1977, morei a metade do ano em Lisboa. Era o terceiro ano da revolução dos cravos e o país vivia o caos. Em meio daquela confusão de partidos e propostas políticas, o humor e a criatividade dos anarquistas portugueses era um caso à parte. E entre as histórias que divulgavam, havia uma que pode servir de introdução ao tema de nossa conferência. Contavam eles que certa vez uma criança perguntou ao pai: "Papai, o que é a política?" Ao que o pai respondeu: "Eu trago o dinheiro para casa, por isso sou o capitalismo. A tua mãe controla o dinheiro, portanto é o governo. O vovô quer que tudo funcione a contento, por isso é o sindicato. Nossa empregada é a classe operária. E como estamos preocupados com você, para que esteja bem, você é o povo. E o teu irmãozinho é o futuro. Entendeu?" O garoto pensou e disse ao pai que precisa pensar um pouco mais. E foi para a cama dormir. Durante a noite, acordou com o choro do irmão que estava com a fralda suja. Foi ao quarto do avô, que roncava a sono solto. Como não sabia o que fazer foi ao quarto dos pais. Viu a mãe, que dormia profundamente... Dirigiu-se, então, ao quarto da empregada e viu seu pai com ela. Eles, porém, não se deram conta da presença do menino. Frustrado porque não conseguiu falar com ninguém, o garoto voltou para a sua cama. Na manhã seguinte, o pai perguntou se ele já sabia explicar o que era política? Sim! responde o menino: "o capitalismo aproveita-se da classe operária, o sindicato não vê nada, o governo dorme, o povo é ignorado e o futuro fica na merda." A palavra política nos leva a quatro conceitos distintos: a doutrina do direito e da moral, a teoria do Estado, a arte de governar e o estudo dos comportamentos intersubjetivos. Na abordagem que estamos fazendo, ao analisar as imbricações entre espiritualidade e política, nos interessa abordar a política enquanto doutrina do direito e da moral, pois a partir daí temos elementos para entender, também, a política sob as demais perspectivas.
O conceito de política enquanto doutrina do direito e da moral foi exposto por Aristóteles na Ética
Para o filósofo grego, a investigação daquilo que deve ser o bem pertence a mais arquitetônica das ciências. Pois, a política determina quais são as ciências necessárias nas cidades, quais as que cada cidadão deve aprender e até que ponto. [1] Outro filósofo que desejamos utilizar nesta exposição, conscientes de que estamos deixando de lado muitos outros que analisaram a questão, é Spinoza. Em seu prefácio à quinta parte da sua Ética, onde trata da liberdade humana, Spinoza afirmou que sua preocupação era a potência da razão e a liberdade de alma ou beatitude. Nesse sentido, em Spinoza não podemos separar política e ética, ou como diz em seu Tratado teológico-político, “a justiça e todos os preceitos de razão, inclusive o amor ao próximo, somente pelos direitos de dominação recebem força das leis e ordenanças, ou seja, do decreto daqueles que possuem o direito de reger”. [2] A partir de Aristóteles e de Spinoza podemos dizer que a política, enquanto conhecimento que trata dos aspectos práticos da ética, e que se apóia na antropologia filosófica ou teológica, por necessitar definir uma concepção de ser humano, remete a questões como a natureza e alcance da liberdade, os diversos tipos de liberdade e a natureza e formas de justiça. Temas como estrutura e forma de governo, legitimidade do poder, fontes do poder, direitos e deveres dos membros de uma comunidade, assim como as relações entre os indivíduos e o Estado não podem ser entendidos e conscientemente vividos sem a compreensão das questões éticas e morais que aí estão presentes. Assim, entendemos que a política deve responder de forma prática à pergunta pelo bem dos membros de determinada comunidade, traduzindo esta ação nas questões do poder e das estruturas de governo.
Mas e a espiritualidade, tem algo a dizer à política?
De forma abrangente podemos dizer que espiritualidade é aquela relação do ser com a transcendência, que dá sentido à vida. O ser humano, unidade multiforme, tem em seu espírito não uma dimensão parcial da vida, mas como afirmava Lossky, irredutível. [3] Nesse sentido, o espírito é a totalidade da vida. Nas situações de perda, falta de sentido e de ameaça à vida também há experiência com a transcendência, pois mesmo na negação dela há um sentido transcendente. Quando assistimos, por exemplo, a um filme como Gandhi, [4] constatamos que o ser humano, não importando credo religioso, tem atributos potenciais para a espiritualidade. Nas religiões ditas primitivas, onde a distinção entre sagrado e profano é menos nítida, embora exista, é mais difícil para o cientista da religião delimitar e definir nessas comunidades o conceito de espiritualidade. Mas nas sociedades mais complexas, naquelas religiões onde o espaço e o tempo do sagrado e profano são mais bem definidos, envolvendo escolha, disciplina e prática levam a experiências avançadas de espiritualidade. Rudolf Otto, no seu livro "O Sagrado" classifica a experiência religiosa como algo intenso e profundo, misterium tremendum, já que traduz o numinoso para a realidade do crente, que diante daquilo que o esmaga desenvolve senso de temor. [5] Esse temor é um medo qualitativo, motivo para reflexão e energia que transformado em poder faz dele um adorador. Tais experiências com o sagrado encorajam e incorporam no adorador aquilo que lhe é distinto. Mas, apesar dessa relação de aparente intimidade, de relacionamento, permanece sempre o abismo entre adorador e sagrado. Dessa maneira, este desejo de saltar sobre o abismo que separa humano e sagrado é em última instância o móvel que dará origem à espiritualidade. A busca frenética de bens e posses materiais, tão característica da sociedade ocidental no século 20, favorece a redescoberta da espiritualidade como experiência de vida coerente e recomendável. Logicamente, dentro do próprio cristianismo, antigas correntes heterodoxas, como o gnosticismo, o mitraísmo e o maniqueísmo, herdeiras do pensamento oriental, assim como aquelas que buscavam a regeneração do mundo, herdeiras das religiões helênicas de mistério, ganharam popularidade por suas práticas ascéticas. E influenciaram, posteriormente, ainda que indiretamente, a espiritualidade dos pais do deserto e o monasticismo erudito dos capadócios, e de seus três grandes expoentes, Basílio, Gregório de Nissa e Gregório de Nazianzo. Esse processo, que a partir dos pais do deserto e dos capadócios vinha sofrendo uma mutação fundamental, a passagem da espiritualidade enquanto experiência pessoal e exclusiva a experiência comunitária e de piedade cristã, será expandido e ocidentalizado por Jerônimo, com a defesa do estudo histórico das Escrituras, Tertuliano, com seu olhar de jurista romano e, sobretudo, com Agostinho ao desenvolver na Cidade de Deus, nos livros 13 e 14, a idéia da participação no crente na vida divina através da graça. Mas será com Gregório Magno (540-604), pai da espiritualidade medieval, que sistematizou o monasticismo ocidental e defendeu que a busca da visão de Deus implica em pureza de coração, humildade e serviço, que a espiritualidade, embora aparentemente enclausurada, transpõe os marcos da individualidade e passa a olhar para as comunidades ao redor. Assim, lectio, meditatio, oratio e intento nortearão os caminhos da espiritualidade na expansão do cristianismo no mundo bárbaro. A partir desse momento em que a espiritualidade torna-se também prática e o caminho para Deus passa pelo serviço ao próximo, a espiritualidade tem algo a dizer à política. Nesse sentido, a espiritualidade dá sentido à vida cotidiana, torna-se além de mística e profética, política. Com a queda do governo militar brasileiro ressurgiu entre os evangélicos brasileiros a discussão sobre a responsabilidade política da comunidade cristã. Foi e é importante para o cristianismo brasileiro que tal discussão se faça, mas ainda faltam aos pronunciamentos evangélicos. A comunidade evangélica ainda tem que ultrapassar a espiritualidade privatizada em direção ao compromisso social efetivo e prático. Paul Tillich em seu trabalho Amor, Poder e Justiça [6] pode nos ajudar a entender o caminho a percorrer na construção desse diálogo da espiritualidade com a política. Para ele, toda e qualquer política tem sempre uma mesma essência, que é o uso do poder. [7] “L’être, c’est le pouvoir de l’être. Mais même dans son emploi métaphorique, le pouvoir suppose um objet sur lequel il peut exercer et démontrer son pouvoir”. [8] Por isso, o poder determina os caminhos da sociedade. E que será chamado de poder político porque recorre à autoridade social instituída e possibilita ao Estado exercer coerção em nome do direito dos cidadãos. As convicções pessoais acerca da soberania de Deus e do Cristo, que conquista principados e potestades, têm profundas implicações no modo em que pensamos a política. Assim, a espiritualidade privatizada ofusca o caminho a seguir e mascara práticas imorais através de atitudes aparentemente piedosas. De novo, voltemos a afirmação de Tillich, que de certa forma já tinha sido exposta por Spinoza: não há política sem o uso de poder. Embora tal afirmação seja quase óbvia, é comum encontrarmos cristãos que apresentam propostas sobre o reino de Deus e políticas que buscam uma ordem política onde o amor sem poder possa superar o poder sem amor. Ao analisar tais propostas, que ressuscitaram no século 20 a teoria social anabatista, que contrapõe as políticas de poder ao amor cristão, vemos que para esses evangélicos é impossível aceitar tais políticas e viver o estilo de vida do Jesus crucificado. Chamam à igreja a criar uma comunidade nova e a rejeitar qualquer forma de violência, representada na ordem econômica e política sob o poder do Estado. Mas ao rejeitarem as políticas de poder da sociedade, de fato estavam aceitando qualquer uso do poder, pois não defenderam uma retirada do mundo ou um abandono da missão da igreja no mundo. Neste sentido, a justiça enquanto mediação do amor e do poder, diferiam dos fundamentalismos separatistas. O que estavam propondo era a subordinação radical dos poderes do mundo ao Cristo. Acreditavam que o fracasso da política criaria as bases para a manifestação do poder de Deus através do testemunho da comunidade cristã, que enquanto agente profético apontava o caminho da redenção do mundo. Mas o que deve ser reconhecido é que tal pensamento faz crítica política, mas rejeita envolvimento e prática políticas como estratégia.
O que em última instância significa uma estratégia apolítica que rejeita o poder, rejeitando também a política. Ora, se a comunidade evangélica tem uma moral política, deve exercer poder e utilizar os meios que possibilitem chegar aos fins que busca. Rejeitar o poder é rejeitar políticas.
Tal rejeição pode até ser aceita, desde que seus agentes tenham clara a opção que estão fazendo. O problema é que fizeram uma opção pela renovação da consciência moral da comunidade evangélica, eles próprios rejeitaram a política como meio de viabilizar a opção social escolhida. Ora, enquanto a consciência evangélica acreditar que a omissão diante da política e do poder favorece à instalação do reino de Deus, teremos o apoliticismo como política evangélica, e isso só fortalece os grupos instalados no poder. E, ao contrário do que pretendem modernos fundamentalismos, não vai estabelecer neste mundo o reino do Cristo. Se não é possível falar de política, sem falar de poder, fica uma outra questão, que tem a ver com o pensamento cristão: amor e poder são compatíveis? A pergunta procede porque o cristão e a espiritualidade pós-gregoriana remetem à prática e ao serviço ao próximo. Mas, sabemos que em nome do amor, da espiritualidade e do serviço ao próximo muitos cristãos negam a possibilidade de todo e qualquer poder. “... pouvoir de l’être n’est pas une identité morte, mais lê processus dynamique dans lequel l’être n’est se separe de lui-même et retourne à lui-même. Le pouvoir,d’autre part, est d’autant plus grand, que la séparation vaincue a été plus grande.Lê processus par lequel est reuni ce qui était separe s’appelle l’amour. Plus il y d’amour réunificateur, plus il y a de non-être vaincu, et plus il a de pouvoir d’être. L’amour est la base, non la négation du puvoir”. [9] Sabemos, como nos mostra Tillich, que o amor do qual estamos falando é um ato da vontade. Não se pode forçar uma pessoa a amar ninguém. Porém, atos de ordem política contêm elementos involuntários. Assim, porque o poder do Estado é associado com ações que vão ou estão fora de nossa vontade e o ato de amor associado com ações do querer, concluímos que a ação do Estado extrapola o amor porque este não pode ser forçado. Outro fato importante, é que o amor é algo que deve ser mediado pessoalmente. Como a natureza voluntária do amor necessita a existência de uma pessoa que o ative, o amor sempre é pessoal. O Estado, como qualquer outra ordem social instituída, tem uma existência objetiva e alcança seus fins indiscriminadamente. A relação do cidadão com o Estado é eu/instituição, em lugar da relação eu/você, que possibilita a mediação pessoal que ativa o amor. Além disso, o amor é sempre sacrificial. Ou seja, possibilita ações que a despeito dos meus interesses particulares, imediatos, responde ao bem-estar do outro. Conscientemente, é um perder para que outro ganhe. Sacrificamos direitos, sem estar forçados por obrigação legal, para que o outro seja beneficiado. Assim, por ser livremente determinado, o amor vai além de uma obrigação moral ordinária. Cumprir obrigação moral é responder à necessidade moral, é um ato de dever em lugar de um testemunho moral livre. É importante entender que esse processo de ir além da obrigação moral envolve, como paradoxo, uma vontade moral implícita. Resumindo, podemos dizer que o amor é voluntário e livremente entregue, que envolve volição moral, deve ser mediado pessoalmente, é sacrificial. E, finalmente, o amor vai além do dever ou da obrigação moral, embora implique, paradoxalmente, em obrigação moral ou realização de um dever de origem. Mas política, por outro lado, envolve servidão involuntária. Sua natureza implica no uso de coerção e força para alcançar seus fins. É organização formal e opera impessoalmente. Os políticos e aqueles que atuam ao nível do Estado se ocupam de ações que levam terceiros ao sacrifício, por isso a necessidade da força e da coerção e, em última instância, do próprio Estado. A maioria da população geralmente se considera satisfeita quando vive sob determinada ordem política que pelo menos responde às exigências de sua obrigação moral. E quando isso não acontece nos sentimos tentados à rebelião contra o Estado, a fim de exigir dele a realização daquilo que consideramos sua obrigação moral. Fazendo assim agimos no sentido de que não se torne totalitário, ou seja, negando os limites de seu poder de Estado ou passando por cima das obrigações que tem com os cidadãos. Por isso, usar o poder do Estado como meio de realizar o amor entre os cidadãos é um contra-senso, pois não podemos forçar ou coagir ninguém ao amor. Tal coesão destruiria também a obrigação moral do Estado, que baliza a diferença entre poder limitado e governo totalitário. Dado a dualidade entre poder e amor e o conflito aparente entre poder sem amor e amor sem poder, como nos situaremos frente à política? Colocada a questão nestes termos, de fato é muito difícil escolher entre ser um castrado político, mas cidadão do reino, e ser um político atuante à margem da salvação. Como então seguir o caminho do amor cristão sem rebaixar a nobreza do amor no altar do poder? Há um conceito, presente na teologia cristã, que nos leva a alternativas de reconciliação entre poder sem amor e amor sem poder. É o conceito de justiça. A recusa em reconhecer as reivindicações da justiça como universais e invioláveis, cobrou um alto preço, no correr da história, à política e à teologia em termos da própria integridade da igreja. Por exemplo, a teologia de Albrecht Ritschl sofreu deste erro. Ritschl contrapôs poder sem amor e amor sem poder. Fazendo assim, criou um sistema teológico que contrastou o Deus de poder do Antigo Testamento ao Deus de amor do Novo Testamento. No processo abandonou o conceito do julgamento de Deus e retribuição aos pecadores, adotou uma visão universalista de salvação e passou a ver na igreja um amor moral que nada de substantivo apresenta. Ao nível prático, o amor moral torna-se, então, irrelevante para as questões políticas porque, nas palavras de Reinhold Niebuhr, apresenta a lei de amor como solução simplória para qualquer problema da sociedade. [10] Por isso, o conceito de justiça passa a ter tanta relevância para o cristão quanto o conceito de amor. É necessário reconhecer que as reivindicações de justiça são universais, eternas e objetivas, e têm como fonte a própria pessoalidade do Deus justo. Tal afirmação, se por um lado, traduz o fato teológico de que a justiça de Deus se faz manifesta nas ordenanças da criação, por outro nos leva a perguntar porque os elementos substantivos e características de justiça nunca foram consensuais para a humanidade? A definição mais aceita de justiça é o de dar a toda pessoa aquilo que por direito lhe pertence. Mas aí de novo temos um problema: o que por direito lhe pertence? Esta pergunta nos obriga, enquanto cristãos evangélicos, a analisar com atenção nosso conceito tradicional de justiça. “La justice est la forme dans lequelle lê pouvoir de l’être se réalise, la justice doit être en rapport avec la dynamique du pouvoir. Elle doit être capable de donner une forme aux rencontre de l’être avec un autre être. Le problème de la justice dans la recontre vient du fait qu’il est impossible de prédire comment s’organisera le rapport des forces au sein de telle rencontre. A chacun des moments, il existe de nombreuses possibilités. Et chacune de ces possibilités demande une forme particuliére”. [11] Assim, conforme Tillich, as reivindicações de justiça só podem ser operacionais numa comunidade política se forem definidas com um grau significante de particularidade. Justiça, nas palavras de Niebuhr, requer julgamentos distintos de reivindicações contraditórias. [12] Justiça como uma abstração não basta. É necessário trabalhar fora da compreensão de justiça no particular, para não cair na armadilha do moralismo político, quando não se tem nada a oferecer quando se fala de forma idêntica em tempos, espaços e situações particulares diferentes. Um exemplo clássico da questão está presente na Política de Aristóteles. Aristóteles diz que se faz justiça quando se dá a cada cidadão aquilo que lhe é por direito. Dois problemas nascem dessa afirmação: se todas as pessoas têm igualdade moral, então essa igualdade deve se estender a todo grupo social, às relações econômicas e políticas em que se fazem presentes. E se as pessoas são desiguais nas contribuições que fazem à sociedade, então essas desigualdades devem se traduzir nos grupos sociais e nas relações econômicas e políticas. Ambos os argumentos, sem dúvida, têm suas razões de ser. E, no século 20, fizeram parte do debates político de entre socialistas e liberais. Por encontrar dificuldades na formulação prática do conceito de justiça, a teoria política evangélica contemporânea tem rejeitado o conceito de justiça universalmente conhecido como ordenança da criação, enquanto compreensão de que todas as pessoas são imagem de Deus e têm um conhecimento do bem. Donde, todas as pessoas compreendem a necessidade de justiça. E defendem um novo conceito, de ordenança da redenção. Para esses cristãos, devido à queda humana, não existe um conhecimento seguro de justiça fora da revelação. Na verdade, é muito difícil discutir quando se parte da natureza caída e da crença de que a justiça era perfeita antes da queda. Apesar dessa leitura soteriológica, acredito, assim como Tillich, que a melhor base para a compreensão da justiça ainda está no conceito da justiça que parte da ordenança da criação. Rejeitar a ordenança da criação como algo que está fora da razão, por não ser revelada, é um problema de epistemológico. Tal postura afirma que a razão não tem nada que dizer fora da revelação. Esta posição tem conseqüências práticas muito sérias para as estratégias de ação política, porque só a partir da fé e da revelação se pode falar com autoridade sobre justiça. Ou seja, os cristãos não podem, em política, se comunicar ou trabalhar com não-cristãos. Não pode haver nenhuma base secular no envolvimento político dos cristãos. Assim, quando nega o conhecimento natural do bem político, a única alternativa para o cristão é omitir-se, porque política é coisa mundana, caída, ou estabelecer uma política cristã sectária. A leitura da justiça a partir da universalidade da imago Dei responde aos questionamentos contemporâneos levantados pelos cristãos em relação à política, enquanto a leitura a partir das ordenanças da redenção isola, aliena e separa o cristão da prática política. Pensadores cristãos, neo-ortodoxos, procuraram substituir as ordenanças da redenção pelas ordenanças crísticas, com a finalidade de trazer o amor moral de Jesus para as normas de justiça, que seriam assim emprenhadas pelo espírito de amor. Ora, a justiça deve estar baseada em reivindicações universais de direito. Estabelecer justiça em base de autoridade sectária é violentar a compreensão de que todas as pessoas são imagem de Deus e têm um conhecimento do bem. Donde, todas as pessoas compreendem a necessidade de justiça. Ora, assim, justiça deve ser definida dentro do contexto de uma determinada ordem social e deve ser aplicada em termos de particulares, pois fundamentar o argumento da justiça apenas na pessoa não é o bastante. Devido à universalidade das normas de justiça e à universalidade da consciência de justiça, uma pessoa pode ter procedimentos e práticas que aprofundem políticas e programas que favorecem a justiça. É exatamente isso que os direitos civis buscam trazer para as democracias constitucionais. É o reconhecimento de que os meios empregados não devem violentar os fins procurados. É necessário, ainda, reconhecer que as normas de justiça são objetivas e que elas existem independentemente de volição humana. Conseqüentemente, podem ser feitas reivindicações no nome de justiça e podem ser rejeitadas reivindicações no nome de justiça. Considerando que o amor deve ser volitivamente entregue, justiça exige reconhecimento independente da vontade humana. O Deus de amor também é um Deus de justiça, amor e justiça não podem ser contrapostas. O amor pode ir além da justiça, mas nunca pode buscar menos que a justiça. O amor pode inspirar reverência à justiça, mas nunca pode ser desculpa para esquecer as reivindicações da justiça. Se a justiça é uma qualidade objetiva que estabelece direitos e obrigações, projetos podem e devem ser desenvolvidos pelos indivíduos e sociedades para criar ações que sirvam as reivindicações de justiça. Dado o fato que nem todas as pessoas buscam a justiça de boa vontade, o poder pode ser usado legitimamente quando serve à causa de justiça. Dizemos que o amor não pode usar o poder para alcançar seus fins, mas que a justiça têm que usar o poder para alcançar seus fins. Tais distinções são necessárias porque não se pode dizer ao Estado que ame, porque suas ações têm por base o poder, e porque as reivindicações do amor estão arraigadas em reconhecimento pessoal e particular ao invés de normas universais de justiça. Como a igreja cristã proclama o Evangelho, sensibiliza a comunidade para as demandas da justiça. Conseqüentemente, permanece a justiça enquanto serviço de amor. Assim, usar o Estado como um instrumento de amor leva a um Estado sectário, quando não totalitário. Por causa disso, as normas distintivas da justiça são usadas para delimitar o que é meu e o que é teu. Negar a justiça em nome do amor é negar os direitos civis que são a base de qualquer governo constitucional. A política, com base no poder, cumpre uma função legítima quando serve as reivindicações da justiça. Amar, sem rejeitar o poder, indo além dos direitos e deveres estabelecidos pela justiça possibilita um testemunho de justiça e uma motivação moral que coroam o ato justo. Amar, através da mediação pessoal, complementa a justiça em suas demandas objetivas. Essa exposição carece de ilustrações. Por isso, vamos ouvir um ex-ativista da Juventude Universitária Católica e ex-combatente da Ação Popular, Herbert de Souza, mais conhecido como Betinho. Em artigo publicado em 1993, Betinho afirmou que a “fome é exclusão. Da terra, da renda, do salário, da educação, da economia, da vida e da cidadania. Quando uma pessoa chega a não ter o que comer, é porque tudo o mais já lhe foi negado. É uma forma de cerceamento moderno ou de exílio. A morte em vida. E exílio da terra. A alma da fome é política”. [13] É interessante que o ativista cristão e ex-combatente marxista afirme: a alma da fome é a política. Mas que política? E ele explica: A história do Brasil pode ser vista de vários modos e sob muitos ângulos, mas para a maioria ela é a história da indústria da fome e da miséria. Um modo perverso de dividir o mundo em dois, produzindo um gigantesco apartheid...Dois povos no mesmo país, na mesma cidade, muito próximos em geografia e infinitamente distante como experiência de humanidade. É gente que começa o dia sem o que comer e chega à noite sem nada. Pode-se imaginar o quadro que é o de todo dia para milhões de seres humanos: a fome de comida e de tudo. A essa altura da vida da humanidade é incrível que isso aconteça. Como morrer de fome ao lado de 70 milhões de toneladas de grãos, de 8,5 milhões de hectares de terra, se todos esses brasileiros miseráveis ficariam saciados só com os 20% do desperdício? O clamor de Betinho é um clamor para que a justiça dê sentido humano à política. E ele, já morto, acreditava nessa possibilidade, quando diz no artigo: É assustador perceber com que naturalidade fomos virando um país de miseráveis, com que rapidez fomos produzindo milhões de indigentes. Acabar com essa naturalidade, recuperar o sentido de indignação frente à degradação humana, reabsolutizar a pessoa como humana e eixo da vida da ação política é fundamental para transformar a luta no Brasil contra a fome e a miséria num imenso processo de reformulação do Brasil e de nossa própria dignidade. Por isso acabar com a fome não é só dar comida, e acabar com a pobreza não é só gerar emprego; é reconstruir radicalmente toda a sociedade, começando por incorporar agora 32 milhões de seres humanos ao mapa da cidadania. Por isso o ato de solidariedade, por menor que seja, é tão importante. É um primeiro movimento no sentido oposto a tudo o que se produziu até agora. Uma mudança de paradigma, de norte, de eixo, o começo de algo totalmente diferente. Se a exclusão produziu a miséria, a união destruirá a produção da miséria, produzirá a cidadania plena, geral e irrestrita. Democrática. Isso foi dito há dez anos. Luciano Mendes de Almeida [14] contextualiza o clamor místico, profético e político de Betinho: Considero ainda mais grave a condição de quem não alcança ou perde o sentido da vida (...). Há um vazio ontológico pela falta de discernimento dos verdadeiros valores e pela solidão profunda de quem não se abre à presença e ao amor de Deus. O ensinamento de Jesus dissipa as trevas e dúvidas e anuncia a boa nova, valores, critérios e atitudes que dão pleno sentido à vida. A injustiça será vencida pelo reconhecimento da dignidade da pessoa a luz de Deus, convertendo-os à convivência fraterna e à partilha. O perdão do Evangelho é a única resposta definitiva contra a violência e inicia um processo de apreço, respeito e diálogo, superando toda exclusão social e aproximando-nos uns dos outros, como irmãos e irmãs, na concórdia e na paz. Ao negar a justiça, a política torna-se escrava do poder. Perde o eixo da vida da ação política, conforme afirmou Betinho. Ou, agora nas palavras de Luciano Mendes de Almeida, a injustiça será vencida pelo reconhecimento da dignidade da pessoa, e esta é uma tarefa política. Para conquistar tal dignidade, o poder deve ser exercido. Assim, as análises ontológicas de Tillich nos levam à compreensão de que a síntese deste diálogo pertinente entre política e espiritualidade é a justiça.
NOTAS DE REFERÊNCIA:
[1] Aristóteles, A Ética, São Paulo, Atena Editora, 1950, 1ª parte, Livro 1o, II, 2-4, pp. 15 e 16.
[2] Benedict de Spinoza, Writings on Polital Philosophy, New York, Appleton Century Crofts Inc., p. 51.
[3] Vladimir Lossky, A l’image et la ressemblance de Dieu, Paris, 1967, p. 118.
[4] Gandhi, 1982, filme dirigido por Richard Attenborough, com Ben Kingsley e Candice Bergen.
[5] Rudolf Otto, O Sagrado, Lisboa, Edições 70, 1992, pp. 21-22.
[6] Paul Tillich, Amour, pouvoir et justice, Analyses ontologiques et applications éthiques, Revue d’Histoire et de Philosophie Religieuses, Paris, Presses Universitaires de France, 1963 et 1964, números 4 et 5.
[7] Idem, op. cit., no. 4, p. 334.
[8] Idem, op. cit., no. 4, p. 339.
[9] Idem, op. cit., no. 4, pp. 355-356.
[10] Reinhold Niebuhr, Políticas, ed. Harry R. Davis e Robert C. Good, Scribners, 1960, p. 163.
[11] Idem, op. cit., no. 4, p. 360.
[12] Reinhold Niebuhr, Amor e Justiça, ed. D. B. Robertson, World, 1967, p. 28.
[13] Herbert de Souza e Carla Rodrigues, A Alma da Fome é Política, artigo publicado no Jornal do Brasil, 12 setembro de 1993, apud, Ética e cidadania, São Paulo, Moderna, 1995, pp.22-25.
[14] Dom Luciano Mendes de Almeida, A quem iremos?, Folha de S. Paulo, 6/3/2004, p. 2.
Fonte: Revista Eletrônica Correlatio n. 6 -
Novembro de 2004
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