(foto reprodução)
A pena de excomunhão no Direito Canônico Católico:
A pena de
excomunhão possui um sentido pastoral pois protege o Povo de Deus. É costume
considerar que a excomunhão supõe a exclusão da comunhão com a Igreja.A excomunhão
é uma das penas previstas pelo Direito da Igreja. Por “excomunhão” se entende a
censura ou pena medicinal pela qual o réu de delito é excluído da comunhão com
a Igreja Católica (a Igreja não tem autoridade de condenar ninguém ao inferno,
somente Deus tem esta autoridade).Faz-se
necessário esclarecer algumas premissas antes de descrevermos a pena de
excomunhão e seus efeitos.
1)- SENTIDO
PASTORAL DA EXCOMUNHÃO
Como
dissemos, por excomunhão se entende a pena que exclui o réu de
delito da comunhão com a Igreja. Pode parecer pouco pastoral a atitude
da Igreja ao impor a sanção de excomunhão a um pecador. Já o fato de expulsar o
pecador ao invés de perdoá-lo parece ser contrário ao “perdoar setenta vezes
sete” como o Senhor recomendou (cf. Mateus 18,22). Porém, deve-se levar em
conta algumas considerações de oportunidade pastoral e de caridade.
Já dizia Victor Hugo: “Quem poupa
lobos, põe em risco todo o rebanho...”
É missão da
Igreja o cuidado pastoral de todo o Povo de Deus. Por isso, o Direito
Penal tem o seu lugar no Direito da Igreja. Pode-se dizer que é pastoral
estabelecer um Direito Penal que tipifica delitos e estabelece penas. E falando
mais propriamente da excomunhão, tem por finalidade proteger o Povo de Deus,
pois a pena de excomunhão é estabelecida para os delitos mais graves, aqueles
em que a legítima autoridade eclesiástica considera que colocam o sujeito fora
da comunhão com a Igreja. Quem comete um delito consciente
da gravidade e tipificado com a excomunhão coloca-se fora da Igreja, não por palavras,
mas por fatos. A autoridade
eclesiástica deve apontar essas condutas, de modo que toda a comunidade
eclesial conheça a gravidade dessas condutas.
Não devemos esquecer que a função da pena de excomunhão é evitar o
escândalo e não permitir que o mal fermento de propague para a massa:
1 Coríntios 5,1-7:”Geralmente se ouve que há entre vós imoralidade,
imoralidade que nem mesmo entre os gentios se vê, a ponto de haver quem vive
com a mulher de seu pai.E vós estais inchados? e nem ao menos pranteastes para
que fosse tirado do vosso meio quem praticou esse mal?Eu, na verdade, ainda que
ausente no corpo, mas presente no espírito, já julguei, como se estivesse
presente, aquele que cometeu este ultraje.Em nome de nosso Senhor Jesus, congregados
vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus,seja entregue a Satanás
para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do Senhor
Jesus.Não é boa a vossa jactância. Não sabeis que um pouco de fermento
leveda a massa toda?Expurgai o fermento velho, para que sejais massa nova, assim como sois
sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, já foi sacrificado."
Os fiéis
pequeninos e fracos na fé se escandalizariam e naufragariam na fé, se não se
castigasse com a devida proporção aquelas condutas tão graves como aderir à
heresia, profanar o Santíssimo Sacramento, ou cometer um aborto, se posicionar publicamente
contrário ao magistério da Igreja, etc. E o Senhor pronuncia palavras bastante
duras para aqueles que escandalizam (cf. Mateus 18,6). Se não se castigassem
esses delitos – ou outros delitos gravíssimos – o escândalo viria não do
delinquente, mas da autoridade eclesiástica que não os tipifica.
Portanto, é possível concluir que pode constituir verdadeira obrigação
de justiça a tipificação de delitos e a imposição da pena de excomunhão.Mas também
se deve considerar que nesta pena – como em todas – a Igreja tenta esgotar
os meios de reconciliação com o delinquente antes de proceder à imposição
da pena.O Direito
Canônico estabelece algumas medidas de cautela que fazem esgotar os
remédios possíveis antes de se chegar à excomunhão. Entre eles, existe uma
instituição de grande tradição no Direito Canônico que é a contumácia. Conforme o cânon 1347, não se
pode impor uma censura – entre as quais está a excomunhão – se não se advertiu
antes o delinquente, pelo menos uma vez, para que cesse em sua contumácia. Se
permanece contumaz, pode-se impor validamente a censura. Assim, em nenhum caso
se imporá a um fiel a censura de excomunhão sem o seu conhecimento e sem que
lhe tenha sido dada a oportunidade de corrigir-se.
Esta
instituição se aplica plenamente à excomunhão “ferendae sententiae”;
porém, também se aplica peculiarmente no caso da excomunhão “latae
sententiae” prevista no cânon 1324,§1,1 em combinação com o cânon 1324,§3,
que exime da pena aqueles que sem culpa ignoravam que a lei ou o preceito
traziam consigo uma pena “latae sententiae”. Nenhum fiel, portanto, será
excomungado “latae sententiae” de surpresa, pois para incorrer no delito
deve saber que a sua conduta será castigada com excomunhão “latae
sententiae”.
No mais, não
seria legítimo afirmar que a excomunhão não é uma instituição evangélica:
o Senhor, em Mateus 18,17, estabelece a possibilidade de a Igreja expulsar do
seu seio aqueles que cometem pecados especialmente graves. Os primeiros
cristãos já a praticavam: São Pedro, em Atos 8,21, expulsou Simão Mago da
Igreja, por este pretender comprar o poder de administrar o sacramento da
confirmação (cometeu o delito de “simonia”, que recebe este nome em razão
daquele episódio); São Paulo, em 1Coríntios 5,4-5, também expulsou da Igreja um
delinquente incestuoso (nessa ocasião, o texto de sua Carta deixa claro que a
finalidade da pena é medicinal: a fim de que o espírito seja salvo no Dia do
Senhor; sem rodeios, São Paulo exige que os coríntios apliquem-lhe a pena: “Afastai
dentre vós esse malvado!” (1Coríntios 5,13).
2)- NATUREZA
E EFEITOS DA PENA DE EXCOMUNHÃO?
A
excomunhão, como já foi dito, é uma das penas medicinais ou censuras.
As censuras são penas que estão orientadas especialmente à correção do
delinquente. É por isso que a imposição da pena está ligada à contumácia
do delinquente. Dentre as censuras, a excomunhão é a pena mais grave. De
fato, costuma a ser considerada a pena mais grave na Igreja, seja a pena
medicinal ou não. Por isso, o cânon 1318 recomenda ao legislador não
estabelecer censuras, especialmente a excomunhão, a não ser com a máxima
moderação e apenas para os delitos mais graves. Ainda que o
Código de Direito Canônico não a defina assim, costumeiramente se considera que
o efeito da excomunhão é a expulsão do delinquente da Igreja.
Pela excomunhão o delinquente não pertenceria mais à Igreja. Naturalmente, esta
afirmação merece uma reflexão, visto que os batizados não perdem o selo
batismal nem sua condição de batizados. Neste sentido, não se pode dizer que os
excomungados deixem de pertencer à Igreja, pois os vínculos de comunhão
espiritual e invisível não se alteram; rompem-se, porém, os vínculos
extrínsecos da comunhão.
A excomunhão
pode ser infligida “ferendae sententiae” ou “latae sententiae”. A
excomunhão “ferendae sententiae” obriga ao réu a partir do momento em
que é imposta; a excomunhão “latae sententiae” obriga a partir do
momento em que o delito é cometido. Se a pena é aplicada “ferendae
sententiae” , para que haja delito requer-se decreto do Bispo ou sentença
judicial (cf. cânon 1341 e seguintes). No entanto, quando se aplica a
excomunhão “latae sententiae”, não é necessária a declaração da legítima
autoridade para que se esteja obrigado a cumprir a pena (cf. cânon 1314); é
costumeiro dizer que o juízo é feito pelo delinquente mediante seu próprio ato
delitivo.
O delito que
carrega consigo a excomunhão “latae sententiae”, portanto, pode
encontrar-se no foro da consciência do delinquente. A autoridade legítima,
contudo, pode considerar oportuno declarar a excomunhão; assim, deve-se
distinguir entre excomunhões “latae sententiae” declaradas e não-declaradas.
3)- Os efeitos da excomunhão encontram-se claros no cânon 1331:
Cânon 1331
§1 - Proíbe-se ao excomungado:
1. Possuir qualquer participação ministerial na celebração do Sacrifício
Eucarístico ou em quaisquer outras cerimônias de culto;
2. Celebrar os sacramentos ou sacramentais e receber os sacramentos;
3. Desempenhar ofícios, ministérios ou cargos eclesiásticos ou realizar
atos de regime.
§2 - Quando a excomunhão foi imposta ou declarada, o réu:
1. Se quiser
agir contra o que é prescrito no §1, deverá ser rejeitado ou deve cessar a
cerimônia litúrgica, a não ser que obste uma causa grave;
2. Realiza
invalidamente os atos de regime, que conforme o §1,3 são ilícitos;
3. Está
proibido de gozar dos privilégios que anteriormente lhe foram concedidos;
4. Não pode
obter validamente uma dignidade, ofício ou outra função na Igreja;
5. Não tem
para si os frutos de uma dignidade, ofício, função ou pensão que tenha na
Igreja.
O §1 se
refere ao excomungado em geral, sem oferecer maiores especificações. Portanto,
diz respeito a todos os excomungados, sejam “latae sententiae” ou
“ferendae sententiae”.
Por outro
lado, o §2 refere-se apenas àqueles que foram excomungados “ferendae sententiae”
(excomunhão imposta) ou “latae sententiae” declarada; excluem-se
aqueles que incorreram em excomunhão “latae sententiae” não-declarada.
Além disso,
deve-se considerar que o cânon 1355 suaviza os efeitos da excomunhão todas as
vezes que objetive atender a um fiel em perigo de morte. Esta indicação
se refere ao ministro que incorreu em excomunhão.
O cânon 976,
por sua vez, concede faculdade a qualquer sacerdote, ainda que não esteja
aprovado, de absolver de qualquer censura.
Para a cessação da excomunhão deve-se ter em
conta as normas do Direito Canônico sobre a cessação das censuras
eclesiásticas.
Autor: Pedro
María Reyes Vizcaíno - Tradução: Carlos Martins Nabeto
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